quarta-feira, 2 de junho de 2004


[Notas sobre a edição portuguesa d'A Filosofia Na Alcova, do Marquês de Sade]

"Não me atrevo decerto a contestar que Sade seja um grande escritor. E, mais ainda que um grande escritor, uma personalidade-padrão, uma figura emblemática, uma espécie de farol. Acho mesmo que devia ser declarado - como os faróis - objecto de utilidade pública. Ele tem, com efeito, o alto mérito de assinalar, à navegação nocturna dos nossos instintos, a existência dos piores baixios ou de correntes perigosíssimas. E, todavia, o seu espectáculo desagrada-me (...) O estilo do «Divino Marquês» apresenta-se, em geral, de uma chateza confrangedora, estereotipada e uniforme, tecido de constantes «clichés», sem o risco pessoal daqueles pormenores concretos e daquelas transposições metafóricas que dão relevo e surpresa à linguagem. Por outro lado, o seu «mundo» romanesco revela-se bastante circunscrito, aflitivamente esquemático, regido por leis quase mecânicas..." [David Mourão Ferreira, pref. á 1ª ed. d'A Filosofia na Alcova, Afrodite, 1966 - livro proibido/apreendido em 1966]

"... Quer o Meritíssimo Dr. Manso queira ou não queira, quer o Cardoso Pires lhe prefira o Laclos, o Casanova, quer as autoridades francesas queimem as edições do Pauvert - o Sade está aí, digo tudo: o Sade está entre nós. Digo mais grave: o Sade está em todos dentro de nós. Foi essa afinal a sua grande revelação: um novo segredo humano descoberto, o homem contemplando-se numa dimensão mais real no fundo dos fundos que é o abismo da nossa alma (...) O homem lobo do homem é verdade muito antiga. O Sade tirou-a cá para fora (como Freud fez depois com a libido) e exaustivamente encheu páginas (teve tempo, coitado! Em trinta anos de cárcere; e nem sei como certos nossos escribas conseguem escrever tanto, andando sempre cá por fora e ainda bem! E com várias outros empregos à mistura e ainda melhor!) a demonstrar-nos os infortúnios da virtude, essa perigosa chatice (...) Voltando a Sade: leiam-no. Não se masturbem mais do que o suficiente para poderem ainda ficar depois o suficientemente lúcidos para o apreciarem e meditarem para fora e muito acima da pornografia. O Sade também ensina a pensar, a conversar, a desfibrar em nós e perante os outros molas ocultas que somos ainda nós, quer o saibamos quer não, quer o queiramos quer o detestemos (...)" [Luiz Pacheco, ibidem]

Notas presentes na 2ª edição portuguesa d'A Filosofia na Alcova: em 1966, processo 125 foram arguidos em processo de instrução preparatória sobre liberdade de imprensa, Fernando Ribeiro de Melo (editor da Afrodite), António Manuel Trindade, Herberto Helder, Luiz Pacheco e João Rodrigues / da directoria da PJ de 5 de Abril de 1966, por despacho, foram proibidos de circular no País os seguintes livros: Manual do Erotismo Hindu (Afrodite, 1965); A Filosofia na Alcova do Marquês de Sade (trad. de Helder Henriques - aliás Herberto Helder -, pref. de David Mourão Ferreira e Luís Pacheco, edição de Fernando Ribeiro de Mello) e a Antologia da Poesia Erótica e Satírica, selecção de Natália Correia / refira-se que consta dos autos que a tradução foi encomendada por Herberto Helder a António Manuel Calado Trindade, que aliás confirma que foi ele que fez a tradução da obra de Sade do original em francês / ouvido em auto de declarações, Luiz Pacheco, reconhece que é da sua autoria um prefácio do livro / refira-se que foram pronunciados todos os citados, menos David Mourão Ferreira, e que à data da sentença João Rodrigues tinha falecido, pelo que os restantes réus foram condenados a penas de prisão e multa, tendo sido os seus defensores, Manuel João da Palma Carlos, Luís Francisco Rebelo, Fernando Rocha Calisto, João Lopes Alves e Jorge Sampaio / por último, a contestação dos réus sobre a acusação de carácter pornográfico e obsceno da obra é curiosa, nomeadamente o notável testemunho de João Rodrigues (que fez as ilustrações) e que apresentou entre as suas testemunhas abonatórias, Gérard Castello-Lopes, Alçada Baptista, Dácio de Sousa, António Veloso, Sá Nogueira, João Câmara Leme e, ainda, a contestação de Ribeiro de Mello que recorre em defesa da obra a considerandos de Bataille, Jean Cocteau, Claude Mariac, Joyce, Miller, Lawrence, etc. / as testemunhas de Herberto Helder foram Vespeira, Alexandre Babo, Sttau Monteiro, o pintor Sá Nogueira (de novo) e as testemunhas de Luiz Pacheco, Virgílio Martinho, Jaime Salazar Sampaio, Vitorino Nemésio, Jorge Listopad, Virgílio Ferreira, Ruy de Mello / pelo lado de Ribeiro de Mello, as testemunhas apresentadas foram David Mourão Ferreira, José Augusto França, João Palma Ferreira, José Blanc Portugal, Tomaz Ribas, Vítor Silva Tavares, Virgílio Martinho, Liberto Cruz e Alexandre O'Neill

Marquês de Sade [1740-1814]

n. em paris a 2 de Junho de 1740

"... As aventuras sádicas não são fabulosas: passam-se num mundo real, contemporâneo da juventude de Sade, ou seja na sociedade de Luís XV. A armadura social deste mundo é brutalmente sublinhado por Sade; os libertinos pertencem à aristocracia ou mais exactamente (a maior parte das vezes) à classe dos financeiros, tratantes e prevaricadores, numa palavra, os exploradores, enriquecidos a maior parte deles nas guerras de Luís XV e nas práticas de corrupção do despotismo.
Produz-se todavia um paradoxo: as relações de classe são, em Sade, ao mesmo tempo brutais e indirectas enunciadas conforme a radical oposição explorador-explorado, essas relações não passam para o romance como se se tratasse de as descrever a título referencial (foi isso o que fez um grande romancista «social» como Balzac); Sade pega nelas de modo diverso: não como um reflexo a pintar, mas sim como um modelo a reproduzir. Onde? Na micro-socieade dos libertinos; esta sociedade é construída como uma miniatura, uma maqueta; para ali transporta Sade a divisão de classe; de um lado, os exploradores, os possuidores, os governantes, os tiranos; do outro lado, o povinho..." [in pref. A Filosofia na Alcova, Edições Afrodite, 2ª ed.]

Locais: The Marquis de Sade A Life / Marquis de Sade / Marquis de Sade (1740 - 1814) / Sade / Selected Bibliography / Sade Bibliografia / El Divino Marqués / Oeuvres du Marquis de Sade / Marquis de Sade eLibrary / Sademania / El marqués de Sade o la estética de la perversión / Les perversions du Marquis de Sade / Sade (por Bataille) / The Marquis de Sade, Last Will and Testament

terça-feira, 1 de junho de 2004

[Quem não pode]

"Quem não pode comer tem de

fumar e nós não temos
o que fumar: vamos pá

vamos dormir
quem não pode fumar tem de

Cantar e nós não temos

o que cantar; vamos pá
vamos dormir ..."

[E.E. Cummings]

À Volta da Blogosfera

Em hors-série, num retorno de agradecimento algo tardio, daqui arremessamos ao Absurdo, Abrupto, Cruzes Canhoto, Estrada do Coco, Impensável, Letteri Café e Respublica um muito obrigado pela lembrança do nosso aniversariado. Saudações enternecidas.

A arte de Pedro Mexia, atrevidamente curiosa, deixava-se apalpar no salão do Dicionário do Diabo. Acontece que a alvorada Mexiana mudou para livro impresso, in-fólio qualquer coisa, numa pragmática do luxo que desvaneceu o espaço blogosférico. O Dicionário será encerrado (dizem!) mas Pedro Mexia resplandecerá, pastoreando (des)contentamentos vigorosos e esgrimindo graciosas aguarelas urbanas, no Fora do Mundo. Lá estaremos em visitação extraordinária.

[a propósito de crónicas, escritos, trabalhos jornalísticos & bloguísticos, em louvor e capricho de Pedro Mexia]:

"Do jornalismo, não conheço melhor definição que a de Rubem Braga, admirável cronista de um país que tem na crónica a expressão mais literária e pessoal da Imprensa:«O jornalismo é a arte superior de se morrer todos os dias»
Eis aqui resumida a condição precária dos escritos jornalísticos, que são de algum modo o que é a mesma vida, tanto como ela se confundem. Não morremos também nós todos os dias, e sem que façamos da nossa morte uma arte superior? O jornalismo vive intensamente a hora que passa e, na pressa do dia-a-dia, o hoje é amanhã um ontem já caduco, como as folhas impressas que são já folhas mortas, varridas por um melancólico vento de Outono (...) Estes escritos não são como o vinho de boa casta, tanto melhor quanto mais velho. (...)
A crónica, que no século passado se chamou folhetim e depois recebeu o nome de prosa de arte, a crónica é que concede uma como que perenidade à Imprensa, libertando-a do que ela tem de imediato, de precário, de sensacionalista ou de superficial. Essa crónica ou prosa de arte é como o vento do espírito soprando onde quer - mesmo onde o espírito parece ausente. (...)
Escritores individualistas, voltam-se para si mais do que para outros. São eles próprios a matéria dos seus escritos e, se tivessem maior sentido de equilíbrio, seriam discípulos de Montaigne, oscilando entre contrários, contradizendo-se porque a contradição está inscrita na natureza humana, coerentes enquanto crêem profundamente na impressão ou na emoção do momento em que escrevem. O eu, o moi, não lhes é odioso, embora odiosa, ou pelo menos insuportável, lhes seja por vezes a vida. (...) Esses escritos, que dir-se-ia condenados à sorte precária dos mesmo jornais que os hospedaram, resistiram ao tempo quando publicados em livro, não pela maior longevidade do livro, mas porque traziam em si as condições de sobrevivência: a cultura, a perspicácia da observação, o sal da ironia critica, a graça do estilo (...)"

[João Bigotte Chorão, Camilo e o jornalismo literário do século XIX, in Prelo, 18]

segunda-feira, 31 de maio de 2004


Walt Whitman [1819-1892]

n. em Long Island a 31 de Maio de 1819

"Nasceu em Long Island ... quem seria o maior poeta da América, e um dos mais originais e corajosos poetas líricos da poesia universal. Os seus costumes, a sua franqueza, o seu erotismo, o seu radicalismo político, a sua expressão anaforicamente tumultuária e repetitiva, o seu gosto das apóstrofes e das enumerações, o seu verso esplendidamente livre, é muito escândalo junto para ele ser o poeta nacional que ninguém foi como ele, ainda que muito mais crença na democracia que por nacionalismo. (...) Vivendo de empregos ocasionais, jornalista frustado (mas as suas reportagens da Guerra Civil da Secessão são obras primas), Whitman foi um Verlaine sem senso de pecado, e com um sentido de grandeza e da magestade do mundo e da vida, que Verlaine não teve.(...) [Jorge de Sena, in Poesia de 26 Séculos]

"... De aqui de Portugal, todas as épocas no meu cérebro,
Saúdo-te, Walt, saúdo-te, meu irmão em Universo,
Eu, de monóculo e casaco exageradamente cintado,
Não sou indigno de ti, bem o sabes, Walt,
Não sou indigno de ti, basta saudar-te para o não ser...
" [Álvaro de Campos]

"Ainda mais coragem, meu irmão ou irmã
Não vaciles - a Liberdade tem de ser servida, haja o que houver;
Que importa que ela falhe uma vez, ou duas vezes, ou muitas vezes
Ou seja ferida pela indiferença ou ingratidão do povo ou pela infidelidade
Ou pelo aparato das mordaças do poder, soldados, canhões, códigos penais.

Aquilo em que nós cremos aguarda latente em todos os continentes,
A ninguém convida, não promete nada, repousa em calma e claridade.
[é teimoso e tranquilo, não conhece o desanimo,
Esperando com paciência, esperando a sua hora ..."

[WW, A Um Revolucionário Europeu Vencido, trad. Jorge de Sena]

Jogo-Libertinagem

"... Jogo-libertinagem. Na biografia do autêntico libertino Laclos par Lui-Même, Vaillant [Roger Vaillant] anota:
«A libertinagem é um jogo dramático com figuras bem determinadas (...) Jogo de sociedade, jogo rigoroso como o xadrez, jogo dramático como a tourada»
Exemplos práticos encontram-se nas páginas de Stendhal, de Laclos, Casanova, nas cenas de sedução da marquesa de B... em Vida e Aventura do Cavaleiro de Faublas. E em Vaillant:
- na Cabra-Cega. O encontro amoroso Annie-Marat principia e acaba num esquema clássico de «geometria sentimental» à Laclos. «Jogo de mão, jogo de vilão» diz Marat ao iniciar a corte à devota amiga (...)
Vaillant afirma em Les Mauvais Coups que «os amantes autênticos nunca são desvairados de paixão». E em Laclos: «O libertino não cede à carne, satisfá-la deliberadamente» (...) Um libertino é por definição homem da liberdade; para ele «o comportamento à roleta é o mesmo que na vida» (Milan, em Les Mauvais Coups) ..."

[José Cardoso Pires, in prefácio ao livro de Roger Vaillant, Cabra-Cega, Ulisseia, 1959]

Tédio por Lisboa

"A pedra abre a cauda de ouro incessante, / só a água fala nos buracos" [HH]

Nada de calúnias sobre Lisboa. A reprimenda que se pode fazer ao longo da peregrinação pela cidade, deixemo-la aos seus cidadãos. Dizem alguns que as cidades que mais amamos "são aquelas que nunca vimos". Pode ser, não sabemos. Mas, entre aquelas que estimamos chega um dia em que o encanto se quebra. Lisboa espraia-se no irrisório da paisagem, por entre ruas e casas a cair de tédio, vielas sujas mutiladas por pessoas tristonhas e impotentes, pacientemente cotejando modernidades mil, que tardam a acudir. Mas basta soletrar o seu nome, para fazer evocar a sua soberba embebida em história lavrada que nenhum olhar consegue esquecer. Mas, regressamos ... sempre. Como se silenciosamente bordássemos um corpo lânguido de mulher.

Fora isso ... a romagem ao Chiado e Bairro Alto foi admirável. Não tínhamos entrado no mundo. Evidentemente, "le centre du monde est partout e chez nous" [Eluard]

domingo, 30 de maio de 2004


[A propósito do Rock in Rio- Lisboa]

"O cheiro de rosas velhas e tabaco
Faz-me recordar.
Há quase vinte anos
Que não te vejo
E prossegue o nosso meio amor.

Deixaste-me isto:
Esta mão, entreaberta, imóvel
Sobre uma colcha verde.
Coisa bastante para erguer
Alguns poemas de melancolia.

Tivesse eu então tocado em ti
Talvez um de nós sobrevivesse."

[Ian Hamilton, Epitáfio]
Leilão de Livros e Desenhos Gravuras e Manuscritos
da Biblioteca Salema Garção
[conclusão]

Algumas referências: Beja, sec. XVI (mans sobre pergaminho com inf. sobre bens do concelho de Beja, refª a moradores e proprietários em Moura, Alvito e Cuba) / Campo Maior, sec. XVI (mans sobre pergaminho da demarcação da vila de Campo Maior feita por Mendo Afonso) / O Beijo do Diabo, de João de Andrade Corvo (Mans autógrafo datado de 7 de Julho de 1861) / Elementos de Direito Publico de Portugal, por Ricardo Nogueira, sec. XVIII (trata-se prov. das Prelecções de Direito Pátrio que fez no ano lectivo de 1795 e 1796 Ricardo Raimundo Nogueira, natural do Porto, lente da Faculdade de Leis e Reitor do Colégio dos Nobres de Coimbra, que vieram a ser publicadas no Instituto, vol. III) / Correspondência dirigida ao 5º Conde das Galveias, sec. XVIII e XIX (100 docum.) / Apontamentos sobre Valentim Fernandes e outros Impressores, sec. XIX (texto manuscrito, prov. copiado de documentos da Torre do Tombo, com reª a Valentim Fernandes, Jacob Cromberger, João Pedro de Cremona, Germão Galhardo, João Blávio, Frutuoso Pires, João Barreira, Francisco Correia e António de Mariz / Manuscrito Monástico, redigido em português e latim, sec. XVII, de Frei José de Mendonça, onde se refere os formulários de juramentos e outros actos cerimoniais da Ordem de Cister / Mercúrio de Lisboa, 1745-1746, 54 nums (trata-se de um periódico redigido e copiado à mão, em pequeno numero e exempls, com distribuição localizada de autor desconhecido) / Livro de Orações em louvor do Profeta Maomé, 1765 (mans do Médio Oriente redigido em Árabe, com anotações marginais, datado de 1143, ...) / Pinhel, sec. XV (mans sobre pergam de uma escritura de venda de uma courela de terra no Prado de Mó, Pinhel, entre particulares cristãos (João Afonso e Isabel Esteves) e judeus (Samuel Venazo e Çimaha [ilegível]), datado de 1469 / Tavares, Mangualde (mans sobre pergam da confirmação da compra por D. Fernando Coutinho, marechal do Conselho de D. Afonso V, da terra de Tavares) / Cartas de Reis e Infantes de Portugal e outros documentos importantes, cartas manuscritas, alvarás, requerimentos, mans vários (D. Manuel II, D. Luís I, D. Carlos, D, Maria II, D. Miguel, D. João VI, D. Maria I, D. José I, Marquês de Pombal, D. Pedro II, Filipe II, Filipe IV, D. Sebastião) / Alvará do Infante D. Henrique ..., aos juízes e homens-bons de Álvaro e Pampilhosa, de doação do tabeliado desses lugares e termos a João de Aguea, morador da Certa, ... (raríssimo doc inédito do Infante D. Henrique) / Autógrafo e provas tipográficas das Cartas de Fradique Mendes (correspondência de Fradique Mendes: memórias e notas), de Eça de Queirós

sexta-feira, 28 de maio de 2004


Leilão de Livros e Desenhos Gravuras e Manuscritos da
Biblioteca Salema Garção - Dias 31 Maio, 1 e 2 de Junho (21 h]


Local: Amazónia Lisboa Hotel - Pedro de Azevedo Leiloeiro/Livreiro

Os desenhos, gravuras e manuscritos pertencentes à Biblioteca Salema Garção que vão à praça nos dias 31 de Maio e, depois, no dia 1 e 2 de Junho são notáveis. O conjunto de manuscritos, a licitar no último dia, e uma vasta documentação de documentos régios "testemunhos de sete séculos de história ... são quase todos inéditos" (Susana Tavares Pedro, in Catálogo), podendo ser "o conjunto mais importante de que há notícia nas últimas décadas" (idem), o que só por si torna surpreendente pela raridade este leilão. O último lote a ir à praça, um conjunto valioso de autógrafos, manuscritos e provas tipográficas das Cartas de Fradique Mendes, de Eça de Queirós, é apresentado no Catálogo por Anabela Rita, da Universidade de Lisboa, num admirável texto interpretativo [As Metamorfoses de Fradique] do poder e da escrita queirosiana, que a documentação do lote possibilita, como se de um "laboratório" se tratasse. Um leilão excepcional, um catálogo importante e estimado. A não perder.

Algumas referências: O Cocheiro Instruído, ou breve instrucçaõ aos cocheiros, bolieiros, e mais criados, sobre o modo de se comportar, tanto no que respeita ao ensino dos animais, como da attencaõ devida aos seus amos, por Custódio José de Albuquerque, Lisboa, 1792 / Os Gatos, de Fialho de Almeida, 57 nums em VI vols / Da Ásia de João de Barros e Diogo Couto, n. ed., Lisboa, 1778-88, 23 vols / Histoire du Brésil, depuis sa découverte en 15000 ..., por Alphonse Beauchamp, 1815, III vols / Os Estrangeiros do Lima ..., de Manuel Gomes de Lima Bezerra, Coimbra, 1785-91, II vols / Boletim da Sociedade de Bibliófilos Barbosa Machado, 1912-1917, IV vols (anos) / A set of prints engraved after the most capital painting in the collection of Her Imperial Majesty The Empress of Rússia ... , de John & Josiah Boydell, 1788, II vols / Crystalisações da Morte, por Eugénio de Castro, 1884 (1ª obra do autor) / Descripcaõ topografica e historica da cidade do Porto ..., por Agostinho Rebelo da Costa, 1789 / Lotes de Desenhos e Gravuras [Helena Roque Gameiro, Almada Negreiros, Bordalo Pinheiro, Luís Salvador, Stuart Carvalhais, etc] / Brasões da Sala de Cintra, de Anselmo Braamcamp Freire, 1899-05, III vols / 10 Xilogravuras de Manuel dos Santos Cabanas (mosteiro Alcobaça, Painéis S. Vicente, etc.) / 5 litografias de Caricatura Política ("provavelmente publicadas em A Matraca: periódico moral e político", Lisboa, 1847) / Gravura de um leilão de escravos em Goa (Ion Linschoten), 1596 / 12 gravuras de William Hoggart / Litografia de Lisboa (A Feira Franca na Avenida da Liberdade, subs. De Roque Gameiro, 1898) / 30 Gravuras dos Lusíadas, ed. do Morgado Mateus, 1817 / Ressorreiçam de Portugal e Morte Fatal de Castella ..., por Manuel Homem (1642?, trata-se de uma espécie bibliográfica rara da Restauração) / A general view of the state of Portugal ..., por James Murphy, London, 1798 (celebre livro estrangeiro sobre Portugal, com 15 gravuras) / Manejo real, escola moderna da cavallaria da brida, em que se propoem os documentos mais sólidos, para os cavalleiros ..., por José de Barros Paiva e Morais, Lisboa, 1762 (famoso tratado de cavalaria, ilustrado com gravuras)

[Continua]

In Memoriam José Augusto Seabra [1937-2004]


"Cai-me
a tristeza aos pés

E não me baixo
" [JAS, in Os Sinais e a Origem]

José Augusto Seabra nasce em Vilarouco (S. João da Pesqueira)em 1937. Forma-se em Direito na Universidade de Lisboa. Convicto opositor ao Estado Novo (fez parte do MUD Juvenil, conhece Humberto Delgado em Argel), preso e condenado por motivos políticos, tira o doutoramento em Letras na École des Hautes Études de Paris(1971) com uma tese sobre Fernando Pessoa (Analyse structurale des hétéronymes de Fernando Pesssoa: du poémodrame au poétodrame) e sob orientação de Roland Barthes do qual traduziu vários livros), tornando-se professor em Vincennes. Regressa a Portugal a seguir ao 25 de Abril de 1974, para leccionar na Faculdade de Letras do Porto. Poeta, escritor, ensaísta, diplomata (embaixador junto da Unesco, em Bucareste e Buenos Aires), colaborador em jornais e revistas (jornal República, jornal Povo Livre, revista Nova Renascença, Persona, Bandarra, Coordenada, Cadernos de Literatura, Colóquio-Letras, Gazeta Literária, Notícias do Bloqueio, Raiz e Utopia, Sílex, Vértice) foi fundador do Centro de Estudos Pessoanos (juntamente com António José Saraiva e Maria Glória Padrão) e do Centro de Estudos Semióticos e Literários, deputado à Assembleia Constituinte, Assembleia da República e Ministro da Educação do IX Governo Constitucional (1983-1984: tendo sido substituído por Deus Pinheiro), integra o Centro de Estudos Republicanos «Sampaio Bruno» e é um dos fundadores da Associação de Lusofalantes na Europa (ALFE). Morre a 27 de Maio de 2004.

"Pela noite o desejo luminoso respira
o hálito dos frutos, o rumor
dos dedos. Pela noite emudece
o silêncio das pálpebras. Os ombros
de maduros se inclinam. Pela noite
a morte desce membro a membro a alma
" [JAS, Nocturno]

"O civismo implica ... uma cultura, que poderemos designar como cívica, sem que esta se sobreponha às outras formas de cultura, antes delas seja condição e suporte. A aprendizagem da democracia exige com efeito que a formação e a realização de cada homem se abra aos mais diversificados domínios do conhecimento e da criatividade: desde a economia às questões do conhecimento, desde a filosofia e a ciência às várias manifestações estéticas, passando por uma ética de convivência assente no respeito dos direitos do humanos, tudo isso deve enfermar a personalidade de uma cidadão que se deseje culto e, portanto, politicamente esclarecido" [JAS, in Cultura Política ou a Cidade e os Labirintos]

Alguma Bibliografia:

[Poesia] - A Vida Toda, Porto, 1961 / Os Sinais e a Origem, Portugália, 1967 / Tempo Táctil, Portugália, 1972 / Desmemória, Porto, Brasília, 1977 / O Anjo, Porto, 1980 / Gramática Grega, Porto, 1985 / Fragmentos do Delírio, Ponta Delgada, 1990 / Poemas do nome de Deus, Macau, 1990 / Epígrafes, Málaga, 1991 / Enlace (em colaboração com Norma Tasca), 1993 / Sombras de Nada, 1996 / Amar a Sul, 1997 / Conspiração da Neve, Bucareste, 1999 / Oximoros, Porto, Granito, 2001 / Antologia Pessoal, Brasília, Thesaurus Editora, 2001 / Tangos Mentais, 2002

[Ensaio & Outros] - Fernando Pessoa: le retour des dieux, Paris, 1973 / Fernando Pessoa ou o Poetodrama, São-Paulo, 1974 / Portugal face à Europa: um horizonte cultural, Porto, 1977 / Alexandre Herculano ou a Cicatriz do Exílio, Porto, 1977 / Poiética de Barthes, Porto, 1980 / Um romântico no Porto, Porto, 1982 / Mors- Amor (Paixão de Barthes), Porto, 1982 / O Heterotexto Pessoano, Dinalivro, 1985 / A Pátria de Pessoa ou a Língua Mátria, Porto, 1985 / Cultura e Política ou a Cidade e os Labirintos, Vega, 1986 / Discurso cultural de D. António : um diálogo entre a fé e a cultura, Porto, 1990 / Manifesto dos emigrados da Revolução Republicana Portuguesa de 31 de Janeiro de 1891, Porto, 1991 / Poligrafias Poéticas, Porto, 1994 / O Coração do Texto novos ensaios pessoanos, Lisboa, 1996 / Edição crítica de Mensagem e Poemas Esotéricos de Fernando Pessoa (1993) / Tradução de Poemas de Mallarmé Lidos por Fernando Pessoa (1998) / Caminho Intimo para a Índia, 1999 / De Exílio em Exílio I - Resistências e Errâncias (1953-1963), Folio Edições, 2004

"Tudo se cumpre exacto como o voo
das gaivotas rasando rente ao rio:

súbitas asas ousam, quase pousam
na água da memória. Assim o exílio
" [JAS, Asas, in Tempo Táctil]

quinta-feira, 27 de maio de 2004


F. C. do Porto: uma Lição Magistral

A credibilidade do FCP deixou há muito de ser um ponto de interrogação. A respeitável tradição de exaltação dos dois clubes da capital é hoje uma deliciosa manifestação de eloquente provincianismo, que só os fundamentalistas ainda instigam. O FCP, artesão, profissional, responsável, crente, impiedoso e praticando um futebol colectivo, conquistou, definitivamente, o coração dos desportistas. Estes dois anos, com generosidade, foram dos maiores êxitos para a glória futura do clube. Hoje, então, foi magistral. A coisa resume-se a isto: o FCP soube ser moderno, apostando em novas soluções, outros riscos. A simplicidade daí decorrente, conduziu a um desempenho imaculado. Quando outros - caso do meu Benfica - foram progenitores de asneiras sem fim - vide a novela de Toni/Vilarinho, a vergonha do soez ataque a um Presidente cessante ou, no lado de Alvalade, a lógica injuriada de Sá Pinto quando da possível contratação de Mourinho e/ou as aleivosias dos seus adeptos sobre o mesmo cenário -, o clube das Antas, com a maior da naturalidade, atreveu-se a ser inteligente. Contratou um técnico profissionalmente exemplar, um naipe de jogadores dispostos a trabalhar para vencer. A perfeição foi conseguida. Hoje demonstrou-o mais uma vez. Parabéns!

quarta-feira, 26 de maio de 2004



Pushkin [1799-1837]

n. em Moscovo a 26 de Maio de 1799

Não morrerei de todo - pois que no meu canto,
sem corpo corruptível, soarei altivo.
E o meu renome imenso durará enquanto
houver na terra um poeta sobrevivo



"O homem que outrora fui, o mesmo ainda serei:
leviano, ardente. Em vão, amigos meus, eu sei,
de mim se espere que eu possa contemplar o belo
sem um tremor secreto, um ansioso anelo.
O amor não me traiu ou torturou bastante?
Nas citereias redes qual falcão aflante
não me debati já, tantas vezes cativo?
Relapso, porém, a tudo eu sobrevivo,
e à nova estátua trago a mesma antiga of'renda..."

[Pushkin, «O Homem que outrora fui...», in Poesia de 26 Séculos, Fora Texto, 1993]

Locais: Pushkin's Biography / The Pushkin Page / Aleksandr (Sergeyevich) Pushkin (1799-1837) / Alexander (Aleksandr) Pushkin / Pushkin Genealogy / Alexander Pushkin / Alexander Sergeevich Pushkin / Aleksandr Sergeevich Pushkin (1799 ? 1837) / A Collection of Poems by Aleksandr Pushkin / Pushkin' Poems

Terra Livre [nº 1, 13 de Fevereiro de 1913]

"...O semanário «Terra Livre», claramente integrado na corrente anarquista do movimento operário, foi porventura um dos jornais de maior qualidade produzido pelo movimento operário português. Com oito páginas num formato aproximado ao «tablóide» ... publicava-se às quintas-feiras e tinha como director Pinto Quartin e como editor Jaime de Castro. O seu primeiro número tem a data de 13 de Fevereiro de 1913 e na própria definição de propósitos e objectivos, «Terra Livre» afirmava: «órgão de luta social e económica - tribuna amplamente aberta às revindicações dos trabalhadores - análise e comentário dos factos capitais da vida social e política portuguesa» (...)
«Terra Livre» vai centrar boa parte do seu conteúdo numa crítica sistemática e contundente à República, ao parlamentarismo e à acção desenvolvida por Afonso Costa quer como líder do maior dos partidos republicanos quer como Presidente do Ministério que tomara posse a 9 de Janeiro de 1913 ... Esta orientação, de crítica contundente e por vezes demolidora de «Terra Livre» à recém implantada República, inseria-se de resto numa acção de crítica sistemática que Neno Vasco um dos mais conhecidos e importantes redactores, vinha exercendo desde os começos de 1911 (...)
Como escreveu Pinto Quartin, «Terra Livre tem pouca circulação entre a massa operaria» o que confirma a ideia de que o público a que primordialmente se destinava o semanário [cerca de 3.500 expls semanais] era constituído pela fracção dirigente do movimento operário, por estudantes e empregados de comércio de Lisboa, por leitores com certa formação e certa capacidade de análise (...) O semanário sofre, ao fim de poucos meses de vida, as consequências da repressão republicana que se seguiu à explosão de uma bomba na cauda do cortejo que, a 10 de Junho de 1913, comemorava Camões. Pinto Quartin é preso e expulso do país [irá para o Brasil], muitos dos seus colaboradores e redactores são detidos e o fim do «Terra Livre» chegou ... " [César de Oliveira, in Antologia da Imprensa Operária Portuguesa, P & R, 1984]

Alguns colaboradores: Vieira dos Santos, Neno Vasco, Emílio Costa, Gaspar dos Santos, Rui Forsado, Emília Garrido, Pinto Quartin, Sobral de Campos, Adolfo Lima, [cf, César de Oliveira ]
Leilão de Importante Biblioteca - 26 de Maio de 2004 [conclusão]

Algumas referências: O Anthi-Christo, por Gomes Leal, 1884 / O Bando Sinistro. Appelo aos Intellectuaes Portuguezes, por Raul Leal, Barcelona (raro) / Sodoma Divinisada, por Raul Leal, 1961 (ed. Contraponto) / O que aconteceria se o Arcebispo de Beja fosse ao Porto e dissesse que era Napoleão, folha volante de Mário Henrique-Leiria (raro) / Mais um Cadáver, por M. Henrique-Leiria, 1951 / Para bem esclarecer as gentes que ainda estão à espera, os signatários vêm informar ..., de M. Henrique-Leiria & Cesariny de Vasconcelos, 1951 (raro) / A Industria do Sal em Portugal, por Charles Lepierre, 1935 / Aviso a Tempo por Causa do Tempo, de António Maria Lisboa, 1953 (raro) / Isso Ontem Único, de A. Maria Lisboa, 1953 (raro) / A Verticalidade e a Chave, por A. Maria Lisboa (ed. Contraponto, raro) / [Manuscrito] Espólio de Acúrcio Pereira (cartas e cartões de escritores) / As Avelãs do Cesariny, por Fernando Ribeiro de Mello (folha volante "violenta" contra Cesariny feita pelo editor da Afrodite, por Cesariny se ter recusado a traduzir e prefaciar a Correspondência do Marquês de Sade) / A Arte de Escrever, por Vitorino Nemésio (sep. Instituto), 1928 / Mau Tempo no Canal, de Vitorino Nemésio, 1944 / O Poeta Povo, de Vitorino Nemésio, 1917 (2º livro em prosa do autor, publicado em Angra do Heroísmo) / Requiem Alegre para Cesariny, por Rui de Oliveira, Porto, 1959 (manifesto violento contra Cesariny) / Aldrabona Madona Maxona, por Luiz Pacheco, 1975 / Alguns Mitos Maiores, Alguns Mitos Menores Porpostos à Circulação. Cesariny ex-nudista em franca ascenção para as coroas ..., de Luiz Pacheco / O Cachecol do Artista, de Luiz Pacheco, 1965 (raro) / Comunicado ou Intervenção da Província, de Luiz Pacheco (raro) / Contraponto. O Prato do Diabo. Leitura dos Jornais, 1961 (reprod. em stencil), de Luiz Pacheco / Postal. Felizarda Botelha, de Luiz Pacheco (raro) / Requiem pelos Corpos Penados mais em Destaque no Cemitério Ulissiponense, de Luiz Pacheco, 1961 (raro) / Salve Van Kricka!, de Luiz Pacheco (folha volante) / Clepsydra, de Camillo Pessanha, 1920 (raro) / 1ª Exposição dos Surealistas (1949) / Luz Central, de Ernesto Sampaio, 1958 (raro) / XX Dessins, de Amadeo Sousa Cardoso, 1912 (raro) / Os Surrealistas Expõem (1949, rara folha volante) / Obras valiosas de Cesariny (Contraponto. Série Fantasma, 1960 ; Do Capitulo da Probidade, 1951, etc. )

terça-feira, 25 de maio de 2004

Leilão de Importante Biblioteca - 26 de Maio de 2004

A Leiria & Nascimento organiza no próximo dia 26 de Maio (21, 30 h) no Pavilhão de Exposições (Tapada da Ajuda) um leilão de livros provenientes de uma importante biblioteca, salientando-se um conjunto significativo de obras de literatura portuguesa moderna, que pode ser consultada on line.

Algumas referências: Mar-de-Leva, de Al Berto, 1976 (raro) / Adolescente, por Eugénio de Andrade, 1942 / Poema Primeiro, de António Aragão, 1962 / Memoria sobre a Pesca do Bacalháo Offerecida á Companhia de Pescarias Lisbonenses, por Jacob Frederico Torlade Pereira d'Azambuja, 1935 (raro) / Apontamentos para o Error do Mundo e Os Homens na Sombra, por R. Azancot, II vols, 1910 / Guide du Libraire, por J. de Beauchamps, Paris, 1884 / Memorias e Observações sobre o modo de aperfeiçoar a manufeactura do azeite de oliveira em Portugal, de João António Dalla Bella, 1786 (raro) / O Correio Interceptado, por José Ferreira Borges, Londres, 1825 (publ. anónimo) / Manuel du Libraire et de L'Amateur de Livres, por J.-C. Brunet, VIII vols, 1922 / Oeuvres Complètes de Buffon, XII vols, 1853 / O Cadáver-Esquisito, 1925-1975. Sua exaltação seguida de pinturas colectivas [tir. Especial comemorativa do meio-seculo da Revolução Surrealista, de apenas 20 exempls, com textos de M. Henrique-Leiria, Calvet da Costa, Cesariny, O'Neill, Raul de Carvalho, Ernesto Sampaio, etc. Raro] / Os Lusíadas de Luis de Camões, ed. do III Centenário, de publ. de Emílio Biel, 1880 / Discurso Moral e Politico sobre os Contrabandos, pelo Fr. Ignácio de S. Carlos, 1814 (raro) / Mas, de Ferreira de Castro, 1921 [raro] / Les Principales Avantures d'Admirable Don Quichotte ..., de Cervantes, 1746 / Conjunto valioso de 15 Obras de Ruy Cinatti (Borda d'Alma, 1973; Cravo Singular, 1974; Folhas Volantes, 1974-77; Salém, 1987; etc.) / Contravento, Revista Letras e Artes, IV nums, 1968-71 / Do Do. (D. Sidónio). S. Nacional de Belas Artes, 1982 [Catálogo com apresentação de Eurico Gonçalves e poesia inédita de Luiza Neto Jorge] / Exame e Juízo Critico sobre o papel, intitulado Antisebastianismo, anunciado na Gazeta de Lisboa ..., 1809 (anon.) / Hora di Bai, de Manuel Ferreira, Coimbra, 1962 / Uma Viagem ao Valle das Furnas na Ilha de São Miguel, por Bernardino José de Senna Freitas, 1845 [monografia rara] / Galeria de A Bibliófila. Catálogo da Exposição de 1 de Junho de 1950, da Livraria A Bibliófila [raro catálogo com trabalhos de M. Henrique-Leiria, Cesariny, Cruzeiro Seixas, Risques Pereira, etc.] / Grifo. Antologia de Inéditos, Grafilarte, 1970 [import. antologia com textos de Pedro Oom, António José Forte, Ernesto Sampaio, Manuel de Castro, etc.] / Conjunto valioso e raro do poeta Herberto Helder [O Bebedor Nocturno, 1968; A Colher na Boca, 1961; Electronicolirica, 1964; Fonte, de Herberto Helder, 1998 (ed. fora de mercado); Húmus, 1967; Lugar, 1962; Retrato em Movimento, 1967; etc] / Memoria sobre Lourenço Marques, de Levy Maria Jordão (Visconde de Paiva Manso), 1870

[continua]

segunda-feira, 24 de maio de 2004



Obras de Ferreira de Castro

Ferreira de Castro [1898-1974]

Nasce em Ossela (Oliveira de Azeméis) a 24 de Maio de 1898

"... Era de Inverno. Ia de chancas, friorento, enroupadito. Creio que foi minha mãe quem me acompanhou até meio do caminho. Não me recordo bem. As lembro-me, nitidamente, da minha entrada na escola. Lá estava, ao fundo, à secretária, instalada sobre um estrado, o Sr. Professor Portela. Era gordo e de carne muito branca e fofa. No primeiro plano, as carteiras com os alunos chilreantes. Alguns conhecia-os eu cá de fora. Mas tomavam, ali, para minha timidez, o papel de inimigos.
Eu sentia um respeito enorme por tudo aquilo e estava envergonhado. Sentei-me a uma das carteias e, não tendo coragem de levantar os olhos, fixei-os no abecedário, que crescia e de deformava constantemente. Nesses primeiros dias, a minha única distracção era seguir as moscas que passeavam no sujo rebordo do tinteiro.
Veio, depois, a inveja, a única que tive na minha vida: a de não ser igual aos outros, a de não possuir o seu à-vontade, a de não ter o sangue-frio de que eles dispunham e graças ao qual brilhavam nas lições mais do que eu, embora soubessem menos. Eu era bom aluno. Tinha, porém, uma existência triste e afastava-me quase sempre dos meus condiscípulos. (...)

Por esses tempos, passava, todos os dias, no largo para onde dava a escola, uma rapariga de 17 ou 18 anos - linda, linda para mim, como nunca tinha visto outra. Chamava-se Margarida (...) a Margarida continuava a cruzar, indiferente o largo, sem voltar os olhos para a janela da escola, de onde eu a seguia com sofreguidão. E se me fazia encontrado no caminho por onde ela passava, voltava a cara sem dirigir à minha timidez uma só palavra, um olhar sequer. Eu sofria com esse desdém e desesperava-me por ainda não ser homem. (...)" [Ferreira de Castro, Memórias in «Vários Estudos sobre Ferreira de Castro e a sua obra», 1938]

"A obra de Ferreira de Castro é como a de um filósofo pastoral: vive da resistência que faz às desgraças do seu século. Por isso, como a de Rousseau, parece-nos ingénua quando a moda è libertina; e é naturalmente afectiva e cordial quando toda a literatura experimenta a necessidade de incorrer em excessos. Vemos agora que essa obra preparava a clarificação duma nova era. (...) Ferreira de Castro era um desses heróis-meninos, incapazes de corrupção, por muito que sofram e conheçam o mundo. O pudor, quase o que se chamaria a nobreza dum preconceito proletário, nimbava os seus romances e narrativas. Se vivesse mais tempo, acharia os costumes insuportáveis, agora que certa debochada sinceridade, própria duma erudição sentimental e não de uma cultura cerebral, toma o lugar da experiência humana (...) [Agustina Bessa-Luís, in In Memoriam de Ferreira de Castro, 1976]

sexta-feira, 21 de maio de 2004


Infância

Hora em que a erva cresce
na memória do cavalo.
O vento pronuncia discursos ingénuos
em honra dos lilases,
e alguém entra na morte
com os olhos abertos
como Alice no país do já visto.

[Alejandra Pizarnik, trad. de There's Only Alice]

Filhos e 'Encalhados'

"Nada é mais atraente que as coisas desonestas" [Ovidio]

Confessamos a maneira branda e suave com que José Manuel Fernandes, o comissário dos bons costumes lusos, nos brindou em artigo nas páginas d'O Público sobre a magna questão da necessidade de aumento da taxa de natalidade. Em perfeito acesso de orgulho sociológico, o pontífice diz-nos que ... não temos cumprido. Mais, que a "atitude cultural dominante em Portugal" é decididamente o tão importuno modo de "viver a vida" e, evidentemente, "desvalorizar aquilo que os filhos trazem". A listagem caprichosa é quase apocalíptica. Tememos pelo nosso aconchego e suspiramos por um bom "boudoir". Para "repor as gerações".
Venha pois a sexualidade, ou a sua descoberta para os 'encalhados' desta vida, mas entendida como expressão elevada de reprodução biológica, para que a dissolução do princípio do hedonismo (t'arrenego Lyotard) se esfrangalhe, a bem da Nação. E deixemos o amor, sempre esse combate, sempre essa angústia (Bataille dixit), sempre essa ilusão, para outros. Toca, pois, a cumprir. E nós, sabendo que Sade morreu e Reich também, não nos encontramos muito bem. Mas iremos cumprir. Não tenham dúvidas.

Tommaso Campanella [1568-1639]

m. em Paris, a 21 de Maio de 1639

"...Todos determinaram, então, começar uma vida filosófica, pondo todas as coisas em comum. E, se bem que em seu país natal não esteja em voga a comunidade das mulheres, eles a adoptaram unicamente pelo princípio estabelecido de que tudo devia ser comum e que só a decisão do magistrado devia regular a igual distribuição. As ciências e, em seguida, as dignidades e os prazeres são comuns, de forma que ninguém pode apropriar-se da parte que cabe aos outros.
Dizem eles que toda espécie de propriedade tem sua origem e força na posse separada e individual das casas, dos filhos, das mulheres. Isso produz o amor-próprio, e cada um trata de enriquecer e aumentar os herdeiros, de maneira que, se é poderoso e temido, defrauda o interesse público, e, se é fraco, se torna avarento, intrigante e hipócrita. Ao contrário, perdido o amor-próprio, fica sempre o amor da comunidade (...)" [T. Campanella, in A Cidade do Sol]

quinta-feira, 20 de maio de 2004

[Sombra]

O mal não é a lama dos vestidos,
nem os limos, os líquenes dos sentidos.
O mal é esta sombra
que se deita connosco em cada cova,
se penteia connosco em cada dia
e, quando amamos, surdamente espia ...

[Orlando de Carvalho, Sobre a Noite e a Vida, 1985]


Ex-Libris

"Ex-Libris é um indicativo de propriedade, uma marca de posse bibliográfica, que vai desde o nome do possuidor, manuscrito na capa, na folha-de-guarda ou primeiras folhas do volume, até folha solta de papel, pano ou pele, de mais ou menos reduzidas dimensões, onde estão manuscritos ou impressos desenhos ou dizeres e que aparecem apostos geralmente no ante rosto do volume encadernado ou brochado (quando não é intercalado na encadernação, antes da primeira folha); abrangendo ainda desenhos e dizeres gravados a oiro ou a seco, nas pastas e lombadas das encadernações, ou pintados em pele ou marfim, ou ainda abertos a buril em chapas de metal, e que são apostos na parte anterior do volume, nos locais indicados." [Armando de Mattos, in Bibliomanias]

O Sindicalista [nº 1, 13 de Novembro de 1910- 1915]

"... os dezasseis anos de República democrática constituem uma fase durante a qual se vai destacar uma imprensa operária de cariz fundamentalmente sindical, claramente inserida nas estruturas sindicais e orientadas para os problemas centrais do movimento sindical(...)
«O Sindicalista» foi um semanário que claramente se inseriu na linha de orientação que se exprimiu, pela primeira vez, no diário «A Greve». Predominantemente sindicalista revolucionário este semanário vai cumprir, com êxito, uma dupla função: acompanhar muito atentamente o poderoso movimento reivindicativo dos trabalhadores portugueses que se desencadeia logo após a implantação da República e servir de suporte ao grande esforço organizativo que se segue a Outubro de 1910 e que se materializa na realização em 1911 do Congresso Sindical e em 1914 no Congresso Operário de Tomar que funda a União Operária Nacional(...)
Neste semanário, habitualmente em quatro páginas, deve assinalar-se a atenção como que são acompanhados os problemas das várias profissões, o cuidado que é posto na divulgação das suas aspirações e das suas lutas, o vigor que caracteriza a denúncia da repressão que a novel república fez abater sobre a actividade sindical e, sobretudo, sobre os trabalhadores em greve" [in, César de Oliveira, Antologia da Imprensa Operária Portuguesa, P & R, 1984]

Alguns colaboradores: Bernardo de Sá (condutor de obras públicas), Severino de Carvalho (ajudante de notário), Francisco Cristo, João Pedro dos Santos, Alexandre Vieira, Augusto Machado, António Evaristo, Manuel Ribeiro (escritor de A Catedral, O Deserto, a Ressurreição, foi colaborador d'O Sindicalista, A Batalha, membro do Partido Comunista e redactor da Bandeira Vermelha, etc.) [cf, Alexandre Vieira]

quarta-feira, 19 de maio de 2004


Agradecimentos

Agradecemos as amabilidades que nos foram endereçadas. Gratos, por isso.

Ao Analiticamente Incorrecto, A Natureza do Mal, A Tasca, Avatares, Aviz, Blasfémias, Bomba Inteligente, Cabo Raso, Causa Nossa, Contra a Corrente, Eclético, Fórum Comunitário, Mar Salgado, Memória Virtual, Nova Floresta, Placard, Quartzo, Feldspato & Mica, Retórica e Persuasão, Rua da Judiaria, Terras do Nunca, Tugir, Um Blog sobre Kleist, e àqueles outros que em privado nos enviaram carinhosos suplementos de alma, um muito obrigado.

De outro modo, daqui encaminhamos as maiores felicitações ao Critico Musical, Modus Vivendi e Os Tempos que Correm, que comemoraram o seu aniversário de muita e merecida estimação.


Vladimir Mayakovsky

Catálogo XLVI da Livraria Moreira da Costa

A Livraria Moreira da Costa (Rua de Avis, 30, Porto) acaba de publicar o seu Boletim bibliográfico de livros seleccionados, Catálogo XLVI, referente ao mês de Maio, de interesse monográfico e etnográfico.

Algumas referências: Alta Cultura Colonial. Discurso inaugural e conferências, 1936 [Discurso inaugural de Vieira Machado e conferências por Agostinho de Campos, Alfredo Pimenta, Manuel Múrias, Quirino da Fonseca, Reinaldo dos Santos ...] / Elucidiario do Viajante no Porto, de Francisco F. Barbosa, Coimbra, 1864 / 100 Annos de Vida . A expansão da imprensa brazileira no primeiro seculo da sua existencia Subsidios para trabalho de maior fôlego por Alberto Bessa, 1929 / Poetas e Prosadores. À margem dos livros, de Júlio Brandão, s/d / Novíssimos ou Últimos fins do Homem, pelo Barão do Castelo de Paiva, Lisboa, Typographia Universal, 1866, II vols / Contemporâneos Illustres. D. Fernando II de Portugal, de F. J. Pinto Coelho, Lisboa, 1878 / Colecção Camoneana de José do Canto, Lisboa, Imprensa Nacional, 1972 / Camões e as Artes Plásticas. Subsídios para a Iconografia Camoneana, de B. Xavier Coutinho, Porto, 1946-1948, II vols / A Ourivesaria em Portugal, por João Couto & António Gonçalves, 1960 / Mouzinho. Acção. Pensamento. A Época, de Amadeu Cunha, 1956 / A Antiga Freguesia dos Olivais, por Ralph Delgado, Lisboa, 1969 / Julgareis qual é mais excelente - No Tricentenário da Restauração de Angola, de Gastão Sousa Dias, 1948 [ref. A figuras dominantes da história de Angola] / Estudo sobre o Absentismo e a Instabilidade da Mão-de-Obra Africana, Centro de Estudos Políticos e Sociais da Junta de Investigações do Ultramar, 1959, III vols / Primeira Exposição Colonial Portuguesa, Porto, 1934 [XXI opúsculos diversos] / Ronda de Africa. Outras Terras, Outras Gentes, por Henrique Galvão / A Pátria a Luiz de Quillianan, Porto, 1884 [conjunto de reacções e homenagens prestadas ao Major Quillinan, pela reacção deste aos insultos proferidos no Parlamento Inglez, pelo deputado Jacob Bright, contra Portugal] / Exórdio em Prol da Filantropia & da Educação Física, por Fernando Pessoa, Editorial Cultura, Porto / Filosofia Tradicional dos Cabindas, de José Martins Vaz, 1969-70, II vols

terça-feira, 18 de maio de 2004


Feliz Primavera - Director!

Oferecemos hoje aos leedores caprichosos d'O Almocreve uma entrevista exclusiva com o nosso Director. Assim com D grande, que com devotos amigos e sem administração míope, a linguagem nunca é expiação.
O nosso estimado director recebe-nos no seu castelo altaneiro, nos doces campos do Mondego e, enquanto fala pausadamente em quieto jogo, vai devassando as tropelias d'O Almocreve das Petas ou não fosse um director um "decorador de interiores". A caminho da livraria, nota-se-lhe o sorriso travesso, o respeito ou paixão por coisas simples, o infortúnio da modéstia, o misticismo do olhar, o gosto e a luxúria. Diz-nos: "só é livre quem é digno da liberdade", enquanto vai afogueando o amor cívico no olhar desse vale eternamente sacro do Mondego. O rio já corre ...

[Diz-nos:] - O Almocreve das Petas é um desvelado mineiro das letras. Blog de impressões, escritos do pitoresco, que se pretendem elegantes e cuidados, uma oração ou moral disfarçada da vida para profanos sensatos. Principiou com fadigas literárias mas não pretende estacionar em isolamento suspicaz. Porque o que é assombroso e extraordinário é a tabuada politica lusitana. Assim como, as dulcíssimas palavras proclamadas em abundância pelas sentinelas liberais, o mais boçal dos dogmatismos. O rastro e soberba de alguns "infinitamente pequenos", apregoadores da "seara comum" desenvolvimentista, são meramente um agitprop "ad captandus vulgus". Virgílio Correia tinha razão quando dizia que "é mais difícil ser livre que puxar uma carroça".

[P: consta que não recebem muito bem, causam perplexidade e ...] - Meu caro, a cultura não tem preço. Não faltará n'O Almocreve atropelos à urbanidade, à etiqueta ou ofensas à gramática (Deleuze, é claro). Cada um prevarica conforme o estilo. Mas pensamos que modos finos e adamados são fadigas de desenganos, um padre-nosso liberal para ladrilhar discursos sobre a ordem do mundo. E para nós, que procuramos renascer em cada dia, o objecto da procura é mais o conhecimento do desejo do outro, daí que se deva mudar o jogo e não as peças do jogo. Não seguimos, por isso, a pastosa linguagem da chinfrineira do dia-a-dia da politika. Nessa fatwa dos escribas não desejamos cair. Como alternativa, preferimos ser mais "um cacto no cu da arte". A sugestão evocativa é mais expressiva e o rendez-vous mais malicioso.

segunda-feira, 17 de maio de 2004


[O Mar]

Era a minha vez de falar.
E disse que não somos nada.
Foi tão simples, fiquei mesmo

aliviado. E não custou nada.
Os apupos, esses, amplifiquei-os
no búzio que sempre trago

comigo. É o mar que me chama ...

[Helder Moura Pereira, Puxar ao Sentimento, in Relâmpago, nº 13]

Um Bom Português

José Mourinho é, apenas, o melhor treinador português. É um vencedor nato. Com esforço, talento, auxílio de amigos, sorte e trabalho. Como todos nós. Certamente a mãe pátria tem uma plêiade de indígenas de muita estimação, que olhamos embevecidos e puxando luminosas grandezas, para mais tarde recordar. Tanta gente feliz, por isso.

Ora, Mourinho é essa espécie de visionário à força, estudante sem cábula, valente e arrojado de tanto correr, mas enfastiado deste quintal oceânico tal a náusea que em cada testemunho nos dá conta. A bizarria assim manifestada, comum entre os altíssimos cidadãos lusitanos, dá-lhe sempre para a cantilena anedótica, para o desabafo trapaceiro, para o comentário hilariante, para a acusação gratuita. José Mourinho é o Alberto João do futebol. Uma Helena Matos de saias. Se Mourinho fosse americano estava sentado à direita de Donald Runsfeld. Como não é possível, por sadismo do futebol, passeia-se no expositor das vaidades lusas. Nem procura disfarçar. A arrogância nem bem-humorada é servida. A adoração de si mesmo é uma banalidade que tresanda a caprichos de pouca originalidade. Percebe-se porquê. Por isso, Mourinho é um bom português.

[Hoje, sem brilhantismo algum, o meu Benfica venceu. Com felicidade, mas sem favores. Lutando como podia, com o tormento de tanto tempo como praga, surpreendeu. E a imprevidente brincadeira de mau gosto e mau perder de Mourinho, documentará a história deste jogo. Para os benfiquistas é o fim do sufoco. Que nunca se duvidou.]

domingo, 16 de maio de 2004


17 de Maio - Aniversário do Almocreve


"Em forma de responso, de absolvição e de legenda"

Faz-se saber ao público, que fará amanhã um ano quando chegou o Almocreve com as petas da sua papeleira, do país e do mundo. Com dissertações úteis para criados de servir desatentos, folhetos para venda a vinagreiros lamentosos, escritos declamatórios contra a indigestão literária ou composições prudentes, já com letras, de método fácil de fazer calar as crianças quando choram, recebe na sua estalagem costumada. A festa será assombrosa. A ladainha também. A lista de mazelas não terá fim. Saúde e fraternidade.

sexta-feira, 14 de maio de 2004

Poema

"... e o sacerdote à esquerda levantou-se
e cantou
a culpa é uma carpa deserdada

e as gentes responderam o mar
apagou das nossas praias os ventos
mais amáveis que tínhamos inventado
..." [Manuel Gusmão]

A Greve [nº 1, 18 de Março de 1908]

A corrente anarquista em volta d'O Pensamento Social estava ligada teoricamente às doutrinas difundidas no "Revolté", de Reclus e Kropotkine [cf. "A Evolução Anarquista em Portugal", J. M. Gonçalves Viana, Seara Nova, 1975]. Supõe-se que a ligação foi estabelecida pela presença de "refugiados espanhóis, membros da «Mano Negra» em Lisboa e no Porto" [ibidem]. Uma polémica em torno de "um manifesto abstencionista dos anarquistas de Barcelona", levado a cabo pelo Protesto Operário (socialista) faz participar no debate Gonçalves Viana e Cardoso [ibidem], contando ainda com a própria participação de Reclus, influenciando decisivamente o desenvolvimento da corrente anarquista portuguesa. Depois do aparecimento da Revolução Social, outros grupos, mais ou menos de características comunistas-anarquistas se formam, como a Centelha, O Primeiro de Maio, Os Agitadores, Sempre Avante, Estudos Sociais, Mundo Novo, A Propaganda, A Revolta, etc, com as suas respectivas publicações.

"...A dois anos da implantação da Republica, pouco tempo depois de ter terminado a ditadura monárquica de João Franco, no ano de regicídio, os sindicalistas revolucionários decidiram concretizar, com o apoio dos anarquistas, um projecto que, tendo por certo germinado na cabeça dos mais antigos promotores do movimento operário, era impensável alguns anos antes: a publicação de um jornal diário operário, essencialmente sindical. Estava criado esse facto notável e surpreendente que foi o diário operário «A Greve» (...)
«A Greve» era propriedade do Grupo de Propaganda Social, tinha como gerente principal Evaristo Vieira e como redactor principal Alexandre Vieira [ver "Para a História do Sindicalismo em Portugal", Alexandre Vieira, Seara Nova, 1974 e Subsidios para a Hitória do movimento sindicalista em Portugal]. O jornal era redigido e composto por um colectivo de redactores e tipógrafos que trabalhavam gratuitamente e em condições praticamente artesanais e distribuído nas ruas de Lisboa, também, por operários e estudantes os quais, entretanto, haviam acabado de participar na primeira greve de estudantes, em 1907. Curiosamente o seu primeiro numero tem a data de 18 de Março (aniversário da Comuna de Paris) ..." [in, César de Oliveira, Antologia da Imprensa Operária Portuguesa, P & R, 1984]

Alguns colaboradores: José Fernandes Alves, Ladislau Batalha, César Nogueira, Césa dos Santos (todos socialistas); António José de Ávila, Pinto Quartim, Hilário Marques, João Pedro dos Santos, Francisco Cristo, José Benedi. E além de Alexandre Vieira, participou ainda, o escritor Luís Calvet de Magalhães, bem como Deolinda Lopes Vieira, Rosalina Ferreira e Lucinda Tavares. [in, Alexandre Vieira, ibidem]

quarta-feira, 12 de maio de 2004

Hoje há Expresso

Na sequência de uma noticia, amplamente citada pela blogosfera lusitana, publicada no Expresso on line de uma pretensa intenção, por parte da ANACOM, em "acabar com os blogs", parece haver vários equívocos.
Em primeiro lugar, não se vê como tal poderia ser feito tecnicamente, mesmo havendo disposições regulamentares para o efeito. É verdade que a tentação de controlar a Internet tem o seu terreno aberto há já algum tempo e várias tentativas são ou estão a ser feitas para legislar sobre essa matéria. Mas a peregrina ideia de começar pelos blogs parece ser um devaneio gratuito e grosseiro. Depois existe alguma contradição entre o que é registado n'O Expresso e o que é adiantado pelo suposto "ciberpolícia" Pedro Amorim em sua defesa, conforme se pode ler num post de Vital Moreira e noutro de José Magalhães. Não sendo totalmente credível que o "institucional" Expresso ceda ao fascínio da invocação da notícia sem fundamentação alguma, e como a própria ANACOM nada nos diz no seu site sobre o assunto, conforme seria de esperar (o que desvela o tipo de sociedade de informação que pretende difundir), ficamos sem saber o que pensar.

Dito isto, reconheça-se que o que verdadeiramente está em causa, mesmo nestas condições, é esse manifesto intento de regulamentar um território, ainda não contaminada pelo(s) poder(es). O que nos faz ficar bem vigilantes. E desconfiados.

Leilão de Importante Biblioteca Particular

Algumas referências [conclusão]: A Ordem de Cristo, por Vieira Guimarães, 1936 / História da Cidade do Porto (dir. Damião Peres), 1962-65, III vols / História da Tauromaquia (coord. Jaime Duarte de Almeida), 1951, II vols / História da Arte em Portugal, por Aarão de Lacerda, 1942-53, III vols / Historia Geral de España, de Modesto Lafuente, 1877-82, VI vols / Istoria do cativeiro dos prezos d?estado na Torre de S. Julão da Barra de Lisboa ..., de João Baptista Lopes, 1833-34, IV vols / Lusitânia: revista estudos portugueses (dir. de Carolina Michaelis de Vasconcellos, 1924-27, X nums / A Idade Maçonica, por Lusol, 1943 / Cartas de José Agostinho de Macedo a seu amigo J.J.P.L., 1827, 32 cartas / Refutação dos Princípios methafysicos, e moraes dos Pedreiros Livres Illuminados, por José Agostinho de Macedo, 1816 / Obras de Rocha Martins (entre elas: D. Carlos; Episódios da Guerra Peninsular e Europa em Guerra) / Memorias em defesa da maçonaria por hum maçon portuguez, fiel ao Rei e à Pátria, por António Gregório de Freitas [s/ Inocêncio], 1861-62, 12 vols / Historia do Regime Republicano em Portugal, de Luís de Montalvor, 1930-35, II vols / Guerra da Sucessão em Portugal pelo Almirante Carlos Napier, 1836 / O Barreiro Contemporâneo, de Armando da Silva Pais, 1965-71, III vols / Bureau de Tabac, por Fernando Pessoa, Editorial Inquérito, 1952 (raro) / A Extremadura portugueza, por Alberto Pimentel, 1908 / Revista de Portugal, direc. de Eça de Queiroz, 1889-92, IV vol. (compl) / O Paço de Sintra, pelo Conde de Sabugosa, 1903 / Discursos de Salazar, 1946-67, VI vols / O Móvel Pintado em Portugal, por Artur de Sandão, 1973 / Depois do Terramoto: subsídios para a historia dos Bairros Occidentais de Lisboa, de Gustavo de Matos Sequeira, 1967, IV vols / Dicionário Bibliográfico Portuguez, de Inocêncio Francisco da Silva, 1858-1923, 22 vols / A Talha em Portugal, de Robert Smith, 1962 / Historia Genealógica da Casa Real Portuguesa, de D. António Caetano de Sousa (nova ed. revista.), 1946-55, 13 vols / Os Judeus em Portugal no século XV, por Maria José Pimenta Farro Tavares, 1982-84 / A Sé Velha de Coimbra, de António Garcia Ribeiro de Vasconcelos, 1930-35, II vols

terça-feira, 11 de maio de 2004

Desafio

Passeava a formosa Laurentina
Pelos domínios do Marquês de Angeja,
E despontava a lua alabastrina
Por cima dos telhados da Igreja.

Com receio de que a mãe suponha, ou veja,
O que entre o par rebelde se maquina,
Dá-lhe ele a ela um frasco de morfina
E ela a ele um copásio de cerveja:

Toma! lhe diz, três vezes repetindo
A clara frase e paternal de - toma! -
Toma! lhe diz, e estende o braço lindo.

Mas ele, que três vezes foi a Roma,
Julgando que no frasco há fel, sorrindo:
- Duvido que haja puta que me coma!

[João de Deus, in Criptinas, ed. & ETC, 1981]

A Revolução Social [nº 1, 15 de Janeiro de 1888]

"... a corrente anarquista já presente embrionariamente em «O Pensamento Social» não cessou de desenvolver-se, enquadrando-se sobretudo nas associações de resistência operária e editando folhetos doutrinários de divulgação teórica. Em 1887 [?] começou a ser publicado o primeiro jornal anarquista, «A Revolução Social» que se definia como órgão dos grupos «comunista-anarquista». É um caso surpreendente este jornal. Surpreendente pela qualidade gráfica e de paginação, mas surpreendente também pela qualidade do seu conteúdo e pela tentativa de situar-se no quotidiano difícil dos trabalhadores portugueses (...) promoveu a sistemática divulgação do pensamento anarquista mais significativo do século XIX, fazendo inserir regularmente nas suas páginas artigos, traduções e «correspondência» de Malatesta, Cafiero, Reclus, S. Fuare, M. Netlau, J. Guillaume, etc ..."

[César de Oliveira, in Antologia da Imprensa Operária Portuguesa, P & R, 1984]

Leilão de Importante Biblioteca Particular

Hotel Roma - Dias 17/18/19 e 20 de Maio, pelas 21 horas

Algumas referências [cont.]: Historia de Portugal popular e ilustrada, por Pinheiro Chagas, 1899-07 (3ª ed.), 14 vols / Cinéfilo: suplemento quinzenal de O Século, Ano I, nº 1 (2 de Junho 1928) a Ano XI, nº 578 (completo) / Circulo Camoniano: revista internacional, 1889-1892, II vol., 20 fasc. (completo e raro) / Questões histórico-coloniais, por Luciano Cordeiro, 1935-36, III vols / O Homúnculo, de Natália Correia, S/d, Ed. Contraponto (raro) / Cancioneiro chamado de D. Maria Henriques, por D. Francisco da Costa, 1956 [imp. para hist. descob., c/ bibliografia náutica port. até 1700] / Notas da Minha Vida e do meu Tempo, por Homem Christo, Lisboa, VII vols [notas do grande polemista aveirense] / Chronica de El-Rei D. Sebastião por Fr. Bernardo da Cruz, 1837 / O Diário de Notícias, a sua fundação e os seus fundadores - Alguns factos para a historia do jornalismo português, por Alfredo da Cunha, 1914 [expl. Nº 1, pertença de Maria Adelaide Coelho da Cunha, da edição especial comemorativa dos 50 anos do DN / Diálogos de Dom Frey Amador Arraiz, Bispo de Portalegre, 1846, nov. ed. / Discursos Parlamentares proferidos pelo Duque de Palmela nas Câmaras Legislatias desde 1834 até hoje, 1844, III vols / Documentos para a Historia das Cortes Geraes da Nação Portuguesa, Lisboa, 1883-89, VIII vols / Moçambique: relatório apresentado ao governo (1ª publ. 1893), 1946 (3ª ed.) / Memorias de Vila Viçosa, por Joaquim José da Rocha Espanca, 1983-86, 36 nums / O Espectro, de António Rodrigues Sampaio, nº 1 (16 de Dez 1846) a nº 63 (3 Jul 1847) [colec. completa, junto c/ "O Estado da Questão" e c/ 8 supl., deste celebre jornal clandestino português, panfletário e subversivo, de distribuição gratuita] / Pratica Criminal expendida na forma da praxe observada neste nosso Reyno de Portugal ..., por Manoel Lopes Ferreira, 1742, IV vols [considerada, na época, esta obra como "ídolo dos nossos forenses"] / As visões de um telhudo ou O Judeu Cosmopolita ..., de António José de Figueiredo, 1876 [obra polem. Anti-clerical] / Os costumes dos Israelitas, onde se vê o modelo de huma politica simples e ..., de Mons. Fleury, 1807 [trad. de Villalobos e Vasconcelos, raro] / A Folha: microcosmos literário, dir. de Faustino Sarmento, 5 séries (1868-1873), Coimbra, 54 nums [rara revista literária] / O Mistério dos Painéis, de António Belard da Fonseca, 1957-67, V vols (estimada)/ Outras Terras Outras Gentes (II vols) e Ronda de Africa (II vols), de Henrique Galvão / Império Ultramarino Português (monografia do império), por Carlos Selvagem e Henrique Galvão, 1950, IV vols / Catalogo Razonado biográfico e bibliográfico de los Autores portuguezes que escribieron en castellano, por D. Domingo Garcia Peres, Madrid, 1890 (raro) / Viagem na Minha Terra, de Almeida Garrett, 1846, II vols (1ª ed. em livro, raro)

[continua]

segunda-feira, 10 de maio de 2004

"Autoridade e liberdade são uma e a mesma coisa"

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Pode prender-se um homem e pô-lo a pão e água. Pode tirar-se-lhe o pão e não se lhe dar a água. Pode-se pô-lo a morrer, pendurado no ar, ou à dentada, com cães. Mas é impossível tirar-lhe seja que parte for da liberdade que ele é.
Ser-se livre é possuir-se a capacidade de lutar contra o que nos oprime. Quanto mais perseguido mais perigoso. Quanto mais livre mais capaz.
Do cadáver dum homem que morre livre pode sair acentuado mau cheiro - nunca sairá um escravo.
Autoridade e liberdade são uma e a mesma coisa.

[Mário Cesariny, in As Mãos na Água a Cabeça no Mar, 1972]


Rumsfeld, torturas e absolvições

Alguns não estranham as sevícias feitas a prisioneiros iraquianos. Consideram que são genuínos acidentes de guerra. Que a violência sobre prisioneiros, as humilhações sexuais infringidas, a tortura repugnante como método de inquirição, a infâmia, sempre existiram e bastará um simples pedido de desculpa para que tudo regresse à normalidade. Não surpreende, por isso, que alguns desses próceros "democratas" observem com enfado a divulgação pública de tais desmandos, contestando a sua relevância. Não seria mais justificado apontar baterias a Cuba, China, Africa toda, Rússia, deixando de lado esse episódio, decerto deplorável e pouco patriótico, com os paladinos do "sol" do Mundo, berço e regaço da civilização, exclamam outros? O caso dá que pensar.

Mas, em todo este depurado argumento há um sintoma inquietante: o novo paradigma da interiorização da vulgarização do horror; a hipocrisia de um "exercício de paciência" de exportação da democracia, dita humanista; uma assumida concepção predadora à margem da probidade e firmeza de carácter; uma monstruosa manipulação dos passos em volta da guerra. Tudo à nossa volta vai muito além da "concepção substantiva do bem" (Berlin, evidentemente), pois assenta numa ideia estulta da negação do próprio homem. E essa dramática incapacidade de sermos dignos de nós próprios, paga-se sempre caro. Não há qualquer margem para dúvidas.

Leilão de Importante Biblioteca Particular

Hotel Roma - Dias 17/18/19 e 20 de Maio, pelas 21 horas

O Livreiro Antiquário Luís P. Burnay vai realizar um importante leilão de biblioteca particular, com (1500) obras compreendendo História, Memórias, Viagens, Romances, Monografias, Periódicos, Arte, Poesia, etc., muito estimadas e apreciadas. À atenção dos amantes dos livros.

Algumas referências: Teatro Popular, de Azinhal Abelho, 1968-73, VI vols / Cantigas de Santa Maria (ed. de Walter Mettman, Coimbra), de Afonso X, O Sábio, 1959-72, IV vols / Cartas de Afonso de Albuquerque, seguidas de documentos que a elucidam, ..., Lisboa, 1884-85, VII vols / Almanach para o anno de 1794, Lisboa (raro) / 18 vols de obras de Fialho de Almeida / Historia da Igreja em Portugal, de Fortunato de Almeida, 1967-171, IV vols (nova ed.) / Obras de Nicolau Tolentino, Estúdios Cor, 1968 (pref. de Alexandre O'Neill) / Os Judeus no Distrito de Bragança, pelo Abade de Baçal, 1925 / Garrett: Memorias Biographicas, por Francisco Gomes de Amorim, 1881-84, III vols / Luz da liberal, e nobre arte de cavalaria, offerecida ao Senhor D. João Príncipe do Brazil, por Manuel Carlos de Andrade, Lisboa, 1971 (ed. fac-similada) / Antologia do Humor Português (notas de Ernesto Sampaio e Vergilio Martinho, 1969, Ed. Afrodite / Antologia da Poesia Erótica e Satírica, s/d, Ed. Afrodite (selecção, pref. e notas de Natália Correia, ilustrações de Cruzeiro Seixas) / Livro de Oiro da Nobreza, por Domingos Araújo Afonso, 1932-34, III vols / Archivo Pittoresco: semanário ilustrado, Ano I (Julho de 1857) a Ano XI (1968), 11 vols + (junto c/) anuário do Archivo Pittoresco, 36 nums / Historia da Revolução Portuguesa de 1820, de José de Arriaga, 1886-89, IV vols / Atalaia contra os Pedreiros Livres ..., cujo autor seg. Inocêncio foi Joaquim José Pedro Lopes / Atlas de Fernão Vaz Dourado, c/ direc. do Visconde de Lagoa, 1948 / Inquisição em Goa ..., por António Baião, 1930-49, II vols / Arte Portuguesa, direc. de João Barreira, Ed. Excelsior, IV vols / A Maçonaria Seita Judaica: suas origens, sagacidades e finalidades anticristãs, por I. Bertrand (trad. Gustavo Barroso, c/ um apêndice s/ o Talmude e os Judeus), 1938 / O Jornalismo: esboço histórico da sua origem ..., por Alberto Bessa, 1904 / Poesias de Manuel Maria Barbosa du Bocage, 1853, VI vols / História da Universidade de Coimbra nas suas relações ..., por Teófilo Braga, 1892-1902, IV vols / Historia das Ordens Monásticas em Portugal, de Manuel Bernardes Branco, 1877-88, III vols / Branco e Negro: semanário ilustrado, ano I (5 de Abril de 1896) a ano II (27 Março de 1898), 104 nums em IV vols (colab. de R. Ortigão, Cesário Verde, Antero, Eça, Junqueiro, Fialho d'Almeida, Oliveira Martins, Bulhão Pato, António Nobre, Leite de Vasconcelos, Sousa Viterbo,... / Cadernos Coloniais, nº 1 ao nº 70, Editorial Cosmos (completa) / Cancioneiro da Biblioteca Nacional: antigo Colocci-Brancuti, 1949-64, VIII vols / Importantes Obras de Camilo Castelo Branco / A Morte Redimida, de Ferreira de Castro, 1925 (raro) e A Volta ao Mundo, 1944 / Catalogue de la Bibliotheque de M. Fernando Palha, 1896, IV vols (catalogo de uma das melhores bibliotecas portuguesas, vendida à Univ. de Harvard, com manifesto interesse Camoniano)

[Continua]

O Protesto Operário [nº 1, 5 de Março de 1882]

"Com a fundação do Partido Socialista a 10 de Janeiro de 1875 e desaparecido o «Pensamento Social» (...) dois novos jornais de carácter socialista foram, entretanto, criados: «O Protesto» e «O Operário», os quais mais tarde se haveriam de fundir para dar lugar ao «Protesto Operário», órgão do Partido Socialista e que mantinha uma redacção em Lisboa e outra no Porto.(...)
Algumas colaborações estrangeiras, obtidas por intermédio das relações internacionais mantidas pelo Partido Socialista ou devidas à permuta internacional entre jornais operários e socialistas, artigos e informações da actividade partidária e, destaque para os Documentos e decisões dos Congressos, etc..."

[César de Oliveira, in Antologia da Imprensa Operária Portuguesa, P & R, 1984]

"... Karl Marx acaba de falecer em Londres quase repentinamente em resultado de uma doença de peito, contraída há pouco mais de um ano junto de sua esposa moribunda.
Desapareceu o mais eminente dos socialistas contemporâneos e um dos mais profundos socialistas da nossa época. É a ele principalmente que se deve o carácter histórico e cientifico que assumiu o socialismo utopista e sentimental da primeira metade deste século. (...)
A grande obra deste ilustre pensador «O Capital» ficou por acabar. A primeira parte dela, A Produção das Riquezas produziu uma verdadeira revolução mesmo no sentido ex-cátedra da economia politica em toda a parte onde este ensino não está completamente mumificado. A segunda parte, A Circulação das Riquezas supõe-se ficou bastante adiantada, e a ponto de poder ser publicada por Frederico Engels, o amigo mais íntimo e mais digno intérprete de Marx.
O terceiro volume História da Teoria devia ser uma análise critica de toda a literatura e economia. É para recear que apenas existam fragmentos esboçados, porquanto Marx considerava esta parte como um trabalho ligeiro e fácil ..." [Karl Marx, in Protesto Operário, ano II, nº 3 de 25 de Março de 1883, ibidem]

sexta-feira, 7 de maio de 2004


Fialho de Almeida [1857-1911]

Nasce em Vila de Frades a 7 de Maio de 1857

"... Filho de um mestre escola, fez o curso de medicina com grande dificuldades, que lhe deixaram, ele o confessa, um travo amargo na sua vida. Nunca exerceu clínica, dedicando-se exclusivamente às letras.
Foi um dos nossos maiores prosadores, este estilista magnífico, duma sensibilidade frenética. Panfletário admirável, embora um pouco versátil nas suas opiniões, era de uma ironia faiscante, ora com laivos de humorismo, ora cheia de vibrações e sarcasmo. O seu poder descritivo era assombroso. Páginas deixou, formidáveis de beleza literária, que serão imorredoiras.
Da sua obra – a parte póstuma foi publicada pelo seu livreiro e amigo A. M. Teixera, já falecido, a quem a legou, bem como a outra – constam, entre vários volumes: «Contos», «Pais das Uvas», «Os Gatos», «Vida Irónica», «Lisboa Galante», «Pasquinadas», «À Esquina», «Estâncias de Arte e Saudade» e «Figuras de Destaque»" [in, Jornal O Diabo, 17/07/1938]

Parabéns

Dois blogs, dos mais puros e verdadeiros, comemoram o primeiro aniversário. Dois blogs de liberdades livres, que dizem coisas apaixonantes, deslumbrantes & ardilosas. De muita estimação, mesmo que, daqui do castelo altaneiro do almocreve, carreguemos o fardo de todos vós. Reinventar o prazer do discurso, desnudar o vivido da política & da cultura, eis o que esperamos de todos vós. Assim a vossa libido o permita. Um abraço de felicidades.

Abrupto – Longas vigílias e trabalhos de José Pacheco Pereira. A «perestroika» laranja, em edição estimada, fogosa e subtil, sempre retomada com ventura, mesmo sabendo-se que «a única solidão é aquela que não tem passado». Mas que importa! Dos vários JPP, preferimos quase todos, menos aquela pose de viril "guerreiro do império", jeito e queda para seguir o "bem" e fugir ao "mal", mixagem de contos amargos de guerra. Palavras estranhas, um blog de eleição, uma sensibilidade encantadora. Felicidades!

Mar Salgado – 6 Marinheiros 6, Coimbra ao Luar por obra e graça de D. Dinis, altíssimo padroeiro. Eis como se bolina de encontro à vaga, que a cidade "é uma armadilha" e "nenhum navio te levará onde não podes" (Cavafy). O regime dos ventos não é aconselhável a todos, mas a navegação é, sempre, um trabalho esforçado em mar largo. Um itinerário de habilidade, quebrada as amarras em baixios pouco seguros. Saudações aos marujos, em especial ao comandante NMP e ao Pedro Caeiro.