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quinta-feira, 26 de março de 2015

IN MEMORIAM DE HERBERTO HELDER [1930-2015] – PARTE III


“No texto de abertura de Ou o poema contínuo (2001) – redução da sua “poesia toda” a uma “súmula”, não a uma antologia – Herberto Helder designa a época como a de um tempo de redundância: “O livro de agora pretende então aceitar a escusa e, em tempos de redundância, estabelecer apenas as notas impreteríveis para que da pauta se erga a música”.

Insinua-se aqui uma atitude radical que o poeta seguiu rigorosamente, ao fazer com que a sua obra existisse apenas por si mesma, impermeável a interferências mundanas, erguendo-se fora – e contra – o ruído do mundo. Isto significou uma enorme severidade: de Herberto Helder, não conhecemos senão uma auto-entrevista, umas raras fotografias e muito pouco da pessoa do autor e da sua vida civil, muito embora muitos poemas, e sobretudo a prosa de Passos em Volta e Photomaton & Vox, estejam cheios de referências crípticas de ordem autobiográfica.

Mas de certo modo Herberto Helder tudo fez para erradicar a pessoa do autor, ou melhor, para evitar que ele surgisse como mediação entre a sua obra e os leitores. Retirou-se para deixar a obra fazer o seu percurso e resplandecer em total autonomia. Atravessou incólume um tempo em que se impuseram as determinações da “vida literária” e em que as regras do campo literário ditaram aos autores a necessidade de se mostrarem e aparecerem para além dos livros, de entrarem no jogo que faz da literatura um pretexto para outra coisa. Isto significou a afirmação de uma autonomia incondicional da obra, segundo um preceito que o modernismo tinha reivindicado e seguido como um dos seus princípios estético-poéticos fundamentais.

Ao retirar-se e subtrair-se a todos os procedimentos que interferem nessa autonomia, Herberto Helder ganhou a imagem do poeta que recusa apresentar-se e representar-se nos palcos público e mediáticos. E assim se foi forjando algo a que poderíamos chamar o “mito Herberto Helder”, o mito do “poeta obscuro” que, com o seu gesto de retirada, desafia algumas regras da legitimação e consagração. De certo modo, ele foi um elemento escandaloso (não o único, acrescente-se) da grande família literária, aquele que não contribuía para os momentos festivos nem respondia aos apelos do culto, renunciando sistematicamente a todos os prémios, segundo aquele princípio flaubertiano de que “as honras desonram”. Por essa distância, ele acabou por ganhar uma aura - aquela “coisa” que desde Baudelaire os poetas tinham perdido e não se tinham dignado a recuperar - que não encontramos em nenhum outro poeta seu contemporâneo.

Mas o mito Herberto Helder jamais se construiria por exclusiva força destas circunstâncias. Fundamental, neste processo, é a própria poesia, que tem uma tonalidade órfica e, sem deixar de ser profundamente do nosso tempo, parece recuperar uma voz antiga, fazendo entrar nela uma dimensão que não só não pertence ao nosso tempo, não é de aqui e de agora, mas nem sequer pertence ao tempo da História. Vem de um tempo mítico, como os poemas das civilizações antigas ou governadas pela ordem do ritual e do tempo cíclico que ele traduziu. Muitas vezes, ela reenvia para o imemorial que fala através da voz do mito e está fora da nossa cronologia.

De certo modo, a poesia de Herberto Helder, nas suas anacronias, no encontro que nela se dá entre o mais contemporâneo e o mais antigo (uma antiguidade sem datas) obriga a colocar esta questão: será que ainda é possível a poesia num mundo completamente secularizado? A sua poesia restitui algo que nós, ainda que não o saibamos formular com exactidão, sabemos que foi perdido ou só já tem uma existência secreta e remota. E disso se alimentaram também as projecções e imagens públicas a que se prestou a figura de Herberto Helder enquanto poeta”.
 
FOTO de Alfredo Cunha

[António Guerreiro, in jornal Público, 25 de Março 2015, p. 4]

IN MEMORIAM DE HERBERTO HELDER [1930-2015] – PARTE II


“Nascido em 1930 no Funchal, Herberto Helder publicou os seus primeiros poemas em antologias madeirenses – Arquipélago (1952) e Poemas Bestiais (1954) –, e ainda na revista Búzio, editada por António Aragão. A sua obra de estreia, O Amor em Visita, um pequeno folheto editado pela Contraponto, saiu em 1958, quando frequentava, em Lisboa, o grupo surrealista que se reunia no Café Gelo, convivendo com Mário Cesariny, António José Forte ou Luiz Pacheco.

Por esta altura, abandonada a frequência universitária em Coimbra (primeiro de Direito e depois de Filologia Românica), o poeta tivera já vários empregos precários – passou pela Caixa Geral de Depósitos, angariou publicidade, trabalhou no Serviço Meteorológico e foi delegado de propaganda médica.

Em 1961, publicou o livro que desde logo o consagraria como uma das vozes fundamentais da poesia portuguesa: A Colher na Boca, editado pela Ática, a chancela que então publicava as obras de Fernando Pessoa. Ruy Belo, que também publicou na Ática, e no mesmo ano, o seu primeiro livro, Aquele Grande Rio Eufrates, contou a Joaquim Manuel Magalhães, segundo este narra em Os Dois Crepúsculos (1981), que “ao ver em provas na editora o livro de Herberto Helder, teria sentido ser esse o livro e não o seu”.

Entre a publicação, em 1958, do longo poema O Amor em Visita, cujos versos iniciais todos os jovens leitores de poesia portuguesa contemporânea sabiam de cor nos anos 60 e 70 – “Dai-me uma jovem mulher com sua harpa de sombra/ e seu arbusto de sangue. Com ela/ encantarei a noite (…)” – e o lançamento de A Colher na Boca, o poeta viajou pela Europa.

Tornou-se mítico o ecléctico e pitoresco inventário de ofícios que foi desempenhando para sobreviver enquanto deambulava pela França, Holanda e Bélgica. Foi operário metalúrgico, empregado numa cervejaria, cortador de legumes numa casa de sopas, guia de marinheiros em Amsterdão e empacotador de aparas de papel, curiosa ocupação para alguém que irá demonstrar uma permanente pulsão para se transformar, ele próprio, em papel, desaparecendo no interior da obra.

Regressado a Lisboa, trabalha nas Bibliotecas Itinerantes da Gulbenkian. Depois passa pela Emissora Nacional e pela RTP, trabalha em publicidade e torna-se, em 1969, director literário da Estampa, onde dá início à edição das obras de Almada Negreiros, que sempre admirará.

Em 1963, publicara um livro que basta para lhe assegurar também um altíssimo lugar entre os prosadores portugueses contemporâneos, Os Passos em Volta. Ainda nos anos 60, saem Poemacto (1961), Lugar (1962), Electronicolírica (1964), depois reintitulado A Máquina Lírica, Húmus (1967), o seu fascinante diálogo com Raul Brandão, e Retrato em Movimento (1967). Em 1968 publica O Bebedor Nocturno, o primeiro de vários volumes de traduções de poesia, e Apresentação do Rosto, título que mais tarde rejeitará, ainda que vários dos textos que o compõem ressurjam depois noutros livros.

No início dos anos 70, volta a viajar pela Europa e, em 1971, trabalha em Angola para a revista Notícia, de Luanda. Numa das suas reportagens, ao viajar com o seu colega Eduardo Guimarães, que ia ao volante, sofre um grave acidente de viação que quase lhe custa a vida.

Novamente em Lisboa, trabalha na editora Arcádia, e também na RDP, e colabora em várias publicações, sendo um dos organizadores da revista Nova (1976).

Em 1968 afirmara ir deixar de escrever – voltará a fazê-lo mais vezes –, e, de facto, descontado Vocação Animal (1971), não publica nenhum novo livro até Cobra (1977), se exceptuarmos também os dois volumes da Poesia Toda, publicados na Plátano em 1973, ano em que viaja para os Estados Unidos.

Mas Cobra assinala o início de um período muito criativo, que inclui O Corpo o Luxo a Obra (1978), Flash (1980), ou A Cabeça Entre as Mãos (1982). E ainda o volume de prosa e poesia Photomaton & Vox (1979), o primeiro lançado com a chancela da Assírio & Alvim, de Hermínio Monteiro e Manuel Rosa, que será durante décadas a sua editora.

Se descontarmos as compilações e traduções, e a sua muito pessoal antologia da poesia moderna portuguesa, Edoi Lelia Doura (1985), segue-se mais um período de silêncio até A Última Ciência (1988), e outros seis anos até Do Mundo, publicado em 1994, o mesmo ano em que lhe é atribuído o Prémio Pessoa, que Herberto Helder recusa, pedindo ao júri que não o anunciassem como vencedor e dessem o prémio a outro.

Embora continue a reescrever a obra, Herberto eclipsa-se depois durante quase uma década e meia. Mas o seu regresso com A Faca Não Corta o Fogo, possivelmente o melhor livro de poesia portuguesa do século XXI, é avassalador. Em 2013 publicou Servidões, e em 2014 saiu A Morte Sem Mestre, que assinalou a sua passagem para a Porto Editora e recebeu críticas desiguais, quebrando pela primeira vez o consenso quase absoluto que se gerara em torno da sua obra ..."

[Luís Miguel Queirós, in jornal Público, 25 Março 2015, pp 2-4]

[EM CONTINUAÇÃO]

IN MEMORIAM DE HERBERTO HELDER [1930-2015] – PARTE I


Herberto Helder de Oliveira [n. 23 Novembro 1930 - m. 23 Março de 2015]

(…) a morte faz do teu corpo um nó que bruxuleia e se apaga,/ e tu olhas para as coisas pequenas/ e para onde olhas é essa parte alumiada toda”.

“Como Pedro Mexia refere na sua reacção à morte do poeta, não tardará a tornar-se pacífico que Herberto Helder é o poeta central da segunda metade do século XX, como Pessoa o foi da primeira. Mas é uma centralidade que é ao mesmo tempo uma anomalia, porque a mágica e bárbara linguagem de Herberto, mesmo na sua versão atenuada dos últimos livros, parece vir do fundo dos tempos e ter nascido por engano nesta modernidade.

Não há na poesia portuguesa pós-Pessoa nenhum poeta que tenha exercido um tal poder de atracção e gerado tantos epígonos. E nenhum mais absolutamente impossível de imitar com proveito.

Quem leu desprevenidamente esses primeiros livros de Herberto, nos anos 60 e 70, há-de ter experimentado essa sensação de que a poesia só podia ser aquilo. Foi sempre esse o maior e mais estranho dom de Herberto Helder: convencer-nos (ainda que injustamente) de que escreve directamente em poesia, como se a poesia fosse a sua língua materna, e todos os outros poetas se limitassem a traduções mais ou menos conseguidas de um idioma perdido de que só ele detinha a chave (…)

Gastão Cruz lembra que conviveu muito com o poeta mais velho nos anos 60 e 70. “Primeiro, no restaurante Toni dos Bifes, ao lado do prédio onde vivia Carlos de Oliveira, e depois da morte de Carlos de Oliveira no café Monte Carlo.

Herberto era muito amigo do poeta de Sobre o Lado Esquerdo e “sentiu muito a sua morte”, diz Gastão Cruz: “A morte afectava-o, ele manifesta uma grande dificuldade em enfrentar o envelhecimento e a morte, e isso é muito visível em Servidões e em A Morte sem Mestre”.

Num e no outro livro, diz ainda, “vai por caminhos de linguagem diferentes dos anteriores, mais metafóricos, mas continua a ter uma linguagem fulgurante, só que com mais referências ao concreto”. A última poesia de Herberto “era de uma grande força verbal”, diz, e “mantinha uma ligação profunda com o que sempre foi a poesia dele, uma poesia de um poema único” (…)

A ensaísta Rosa Maria Martelo afirma dever a  Herberto Helder “horas sem conta de pura alegria de ler, de vislumbre, de paixão das coisas do mundo”. E ao saber que o poeta “morreu de morte súbita”, diz que “ter sido assim de repente” lhe parece “de uma grande justiça”. Nos últimos livros, recorda, “tinha antecipado muitas vezes a morte própria, vivendo-a em poemas exasperados, sem querer fugir à violência, ao pânico, mas em certos textos desejava isto mesmo: morrer depressa e sem dor”. E acrescenta: “Ele que nos últimos livros morreu tantas vezes, com evidente sofrimento”.

Herberto deixa-nos, diz, “uma das obras maiores alguma vez escritas em língua portuguesa, porque na sua poesia a língua extrema-se em subtileza, nitidez, precisão conceptual e plástica”. E sublinha que o poeta “escreveu com paixão absoluta” para notar que, “nestes tristes tempos, em que o significado das palavras flutua constantemente ao sabor de interesses e compromissos”, ele nos deixa “uma escrita que acontece literalmente no reverso disso, do lado da verdade, que é onde as palavras são um corpo vivo, sempre acabado de nascer”

FOTO de Alfredo Cunha

[Luís Miguel Queirós, in jornal Público, 25 Março 2015, pp 2-4]

[EM CONTINUAÇÃO]

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

DR. VALENTE AND MR. PULIDO


e esta? Não era costume
personagem tão nobre entrar assim
quando a peça vai ainda no ensaio
” [M.C.V.]

Vasco Pulido Valente (funcionário público), por caridade ao Estado que o amamenta e em concupiscência bem académica, planta a sua conhecida boa-língua ao dono da paróquia – o varonil Passos Coelho. Que na moita de Mr. Pulido caiba - em absoluto - meio mundo, do híbrido Portas à Führer Merkel, passando pelo paisano Gaspar até ao bardo Álvaro, não incomoda nem é de espantar nesta exótica botica. O funcionário público é um sujeito (à cautela) esquecido, irrepreensível na oratória à voz do dono, esmerado nos confeites e nas ilusões das migalhas do poder e outras minudências. Vasco Pulido Valente (funcionário público) é, assim, juiz em causa própria. E não haverá sobressalto patriótico algum que o tire do seu doce remanso.

Vasco Pulido Valente (ilustre historiador), por decência pessoal e amor às belas letras, afina as sua croniquetas nos jornais por diatribes palavrosas ao naufrágio histórico dos nossos egrégios avós. O conhecido historiador verbera & especula pranchas salvíficas enquanto escavaca (meticulosamente) os nossos sucessos inglórios, a nossa proverbial “vil tristeza” e a colossal “habilidade indígena”. O Dr. Valente (mito vivo da superstição “libaral”), à míngua da farpela universitária destes dies irae, em que pontificam alucinados merceeiros-contabilistas, numa assuada sem nenhuma argumentação credível, adscreve, num perfeito manual de civilidade, a desvirginação do casto Coelho, encomendando a sua viciada alma e o vulgar corpo a santa Merkel, a fim (como diria P. Louys) de o voltar a ser. A torrente “neolibaral” inspira sempre, por chateza pátria, um qualquer historiador.

Temos, assim, na tribunícia anti-Estado, o dr. Valente e mr. Pulido, de olheiras pisadas pela velha República (à atenção do inefável contador de histórias Jorge Morais) e esbugalhado pela turgência do novo império alemão, a defender o pleito de Coelho & Portas, numa notável quanto desastrada facúndia. Nada de bipolar ali é esculpido, porque ao dr. Valente e mr. Pulido – que como se sabe, não é “capado politicamente” - após a sombra vem sempre a luz. O doce eflúvio está a florir. Esperemos, portanto, “sobre os dois seios de Trafalgar Square” [M.C.V.]. Disse!

segunda-feira, 6 de julho de 2009


DR. LAUREANO BARROS

"Ele planeava tudo. Era organizado, previdente e perfeccionista. Inflexível com a verdade, a liberdade, a independência, o rigor e a pontualidade, exigia-os de si e dos outros (...)

Foi quando foi viver para o Porto, para frequentar o liceu, que o jovem Laureano Barros começou a comprar livros. Frequentava os alfarrabistas e iniciou uma colecção, tal como fazia com os paliteiros, bengalas, relógios, louças, antiguidades ou alfaias agrícolas. Mas ao contrário de toda a traquitana que sempre gostou de trazer para casa, aos livros ergueu uma fidelidade. Não os vendia, não desistia nem se esquecia deles. Começou a acumulá-los na moradia que o pai lhe comprou para se instalar na cidade, na Foz, continuou a ampliar a colecção enquanto viveu nessa casa com a primeira mulher, Leonor, e depois quando se divorciou dela e das seguintes. De cada vez que se separava da mulher com quem vivia (e foram mais mulheres do que os três casamentos), deixava-lhe tudo: a casa, os móveis, as antiguidades. Mas levava consigo a biblioteca. Eram livros de Matemática, de Filosofia, de Botânica, mas acima de tudo de Literatura Portuguesa, e, cada vez mais, volumes curiosos e raros, obras pouco conhecidas, primeiras edições. Por alguns autores tornou-se obcecado e comprava tudo. Depois estendeu a obsessão a todos os escritores. Comprava e lia, várias vezes, os livros de Camilo, Eça, Pessoa, Torga. Sempre teve insónias, e passava-as a ler. Dono de uma memória prodigiosa, sabia páginas e páginas de cor. Perdia horas a arrumar os livros, a manuseá-los, a acariciá-los (...)"

in Laureano Barros - O Homem que Fugiu com uma Biblioteca, por Paula Moura, P2 (Jornal Público), 5 de Julho 2009, pp. 4-7]

- ler TODO o artigo sobre Laureano Barros (retirado do jornal Público, com a devida vénia), invulgar bibliófilo e que AQUI e AQUI fizemos referência, no nosso site BIBLIOMANIAS.

sexta-feira, 23 de março de 2007


O jornal Público e o Eng. Sócrates

O orgulho de "campeão" desvelado do jornalisticamente correcto, tomado aqui na sua visão romântica de formação da opinião pública, foi abraçado hoje pelo jornal Público na notícia mais artificiosa que nos foi dado ler: o caso da licenciatura do eng. Sócrates. Como "alma falante" do serviço militar dos escribas indígenas, a direcção do jornal Público aproximou-se, sem piedade alguma, da causa fatal de um qualquer panfleto. Pode a sua direcção, ofegante por carência de notícias, publicar os editoriais (duvidosos, como o de hoje) que entender em sua defesa, que o fait-divers é tremendo. Expliquemos.

O caso da licenciatura (ou não) de Sócrates não é festividade para o contraditório e a luta política. Sócrates, licenciado ou não, jamais deixará de ser arrogante, manipulador ou um exímio dissimulado. Não pode haver qualquer equívoco, sobre esta questão. Do mesmo modo que o presuntivo rumor que o senhor José Manuel Fernandes está, generosamente, regougando a soldo do patrão Belmiro é pura especulação, senão palavrório ignóbil. Os boatos não são meros superlativos para a opinião pública. Apenas uma infame comédia, aliás pouco original.

O propósito da direcção do Público ir a reboque da oratória presente na blogosfera doméstica, por muito reveladas que sejam (e geralmente, são) as suas verdades, mostra o estado e a (des)legitimação do serviço público vulgarizado nos jornais, mesmo os de referência. A bondade de policiar a blogosfera não exorciza a falta de trabalho de "casa", a exigência de uma deontologia fora da miséria do espectáculo jornalístico e a missão integral do escriba. Tão só suporta a sua narrativa enquanto "meros executores" de comunicações indirectas. De facto, a "bulimia" da investigação jornalística foi "chão que já deu uvas". Desapareceu, de vez, presumimos sem saudades das direcções de jornais.

Mas se o jornal Público, na insólita nota editorial, entende (como parece que entende) que "não deve ignorar que [os boatos] existem e que a melhor forma de acabar com eles é confirmá-los ou infirmá-los", então terá muito que obrar daqui para a frente. Porque há dezenas e dezenas de anos (a fio) de rumores que correm (alegremente) entre a classe politica, nos albergues de partidos e no cantar de cafés, sobre os inúmeros expedientes de enriquecimento académico, profissional e financeiro da classe politica nacional e local. Vai arregaçar as mangas, definitivamente, o senhor José Manuel Fernandes?

No fim, fica apenas o reconhecimento da balbúrdia e do porreirismo que habita nas instituições privadas de educação. Sem qualquer avaliação, este estupendo refúgio dos espoliados da política doméstica, navega com a total permissão do poder. Se nos lembrarmos da exaltação em sua defesa pela liberal direcção do Público, ao longo do tempo, e do silêncio ensurdecedor sobre o assunto, compreende-se o que temos pela frente. A falta de decoro da direcção do Público é, pois, total.

sábado, 9 de dezembro de 2006

ESPECIAL MÁRIO CESARINY


Mil Folhas - Especial Mário Cesariny

"Enquanto a classe merda passeava os cães
e votava por Kim Il-Sócrates
deu o tranglomanglo no poeta
e ele morreu foi desta
para melhor" [Mário Santos]

"Há coisas a fazer, tarefas misteriosas a cumprir, o vento ameaça partir sem um beijo na boca." [Cesariny)

["Hão-de os doutores, em seus saberes, engavetá-lo: não sei quê surrealista (estou a ouvi-lo: 'só à lista'). E pintor, upa pioneiro, do 'informalismo abstracto'. Lupas a cagar caganitas. Palavrões de alto raciocínio e pouca luz. 'Não está morto, está é mal enterrado'. Puna-se de novo, agora com ditirambos, que muitos ilustram quem os profere. Cheira mal, cheira a Lisboa" - Vítor Silva Tavares]

[livrado do passadiço Mil Folhas - 8/12/2006 - e aqui lançado para as vistas de todos vós, ó bem trajados de letras de papel]

quarta-feira, 7 de janeiro de 2004

O PAINEL D'O PÚBLICO E A ELITE À LA ROSADO DE CARVALHO



O jornal O Público brinda-nos, cada segunda-feira, com um suplemento absolutamente extraordinário sobre economia. Esta semana, sob direcção desse inefável Rosado de Carvalho, estabeleceu um ranking das luminárias da governação com base num espantoso painel de inquiridos, aliás bem costumeiro.

Tais exegetas da coisa económica classificaram, com a proverbial certeza que guia sempre os que frequentam a quintarola do poder, positivamente (sem necessidade de ida à oral, é bom de ver) Ferreira Leite, Sevinate Pinto, Luís Filipe Pereira, Carmona Rodrigues e Bagão Félix, reprovando Celeste Cardona e Carlos Tavares. Registe-se que um inquirido do painel, em comovido esforço de amestração, atribuiu a nota máxima à senhora Ministra do défice, um brilhante 20 valores.

Outro, com menos segurança, pouco social, mas decerto com mais trabalho intelectual, classificou Bagão Félix com 19 valores. E até o desaparecido Carlos Tavares, obteve de um intelectual do painel um luminoso 17. Encantador. Curiosamente, só depois de percorrermos a listagem dos examinadores do douto painel, entendemos bem a sua capacidade avaliativa. Enfim, como diria o saudoso brasileiro Joãozinho 30, aqui se testemunha que "pobre gosta de luxo, quem gosta de miséria é intelectual".

sábado, 17 de maio de 2003

A ESPUMA DE UM EX-MAOISTA ENVERGONHADO

O ex- maoista envergonhado José Manuel Fernandes anda numa, como diria o Raul Proença, de "cretinizar inteligências". Não se sabe, ainda, se a sua de mestre-escola assumida, se a dos leitores d'O Público.

O piedoso articulista diz-nos, a dado passo, no "Editorial" de sexta-feira:" (...) um país [nota: Bélgica] que nem é bem país, antes um conjunto de três regiões linguísticas que se esgatanham umas às outras, entendeu ter «jurisdição universal» para crimes de guerra. Assim qualquer general da NATO - que por acaso tem sede em Bruxelas - passa a estar em risco de ser preso inopinadamente ao dirigir-se para uma reunião de rotina". Eis como o Fernandes esgrime o florete jornalístico.

Andou muito desde que saiu da "Voz do Povo" e fazia entrevistas ás operárias. Está mais solto de linguagem, menos adocicado na prosa, mais iconoclasta, se bem que sejam já visíveis os defeitos que tem na curvatura da espinha. Mas está bem, como teremos de o aturar até o Belmiro achar que sim, ou o PSD entender que ainda é cedo, utilizaremos esse extraordinário Fernandómetro que nosso direktor utiliza. Uma sugestão. Não se pode fazer um abaixo assinado e mudar a capital da Europa de Bruxelas para Braga. Assim como assim, tal como o Coutinho recomenda no lote dos «três pês», era um fartar vilanagem. Era só meditar pela calada da noute. Vamos a isso?