 Bahia de Todos os Santos"- Você já foi à Bahia, nêga?
Bahia de Todos os Santos"- Você já foi à Bahia, nêga?
- Não!
- Então vá ... " [
Dorival Caymmi]
 ... O baiano que faz da amabilidade uma verdadeira 
arte, que é arguto até não mais poder, que é cordial e compreensivo, descansado e confiante. Que desmorona com uma piada agressiva todo um edifício de retórica. Escondendo sob o fraque solene um coração jovem. Gostando de rir, de conversar, de contar casos.
Eis uma cidade onde se conversa muito. Onde o tempo ainda não adquiriu a velocidade alucinante das cidades do Sul. Ninguém sabe conversar como o 
baiano. Uma prosa calma, de frases redondas, de longas pausas esclarecedoras, de gestos comedidos e precisos, de sorrisos mansos e de gargalhadas largas. Quando um desses 
baianos gordos e mestiços, um pouco solene e um pouco moleque, a face jovial, começa a conversar, se fechardes os olhos e fizerdes um pequeno esforço de imaginação, podereis distinguir perfeitamente distinguidos o seu remoto ascendente 
português e o seu remoto ascendente 
negro, recém-chegado outro das florestas da África. De quem é esta gargalhada clara e solta se não de negro? De quem é esta solene consideração para com o doutor, que é salafrário personagem da historia que ele conta, se não do 
português imigrante, rude admirador dos mais sábios? Essa 
mulataria baiana, essa mestiçagem onde o sangue negro entrou com uma boa parte, não produziu o clássico mulato espevitado, pernóstico, egoísta, adulador e violento com os inferiores (...)  
Iemanjá tem cinco nomes e muitos títulos. É a rainha e princesa do mar, é a mãe-d'água, é 
Nosso Senhor dos Navegantes e é a 
Nossa Senhora da Boa Viagem. Tem cinco nomes e por todos eles atende aos seus filhos bem-amados, os marítimos dos grandes navios, os mestres dos pequenos saveiros, os canoeiros que renovam diariamente a aventura da travessia da 
Barra em busca dos portos do rio 
Paraguaçu. Sua festa no 
Rio Vermelho, no mês de Fevereiro, não é a única que lhe dedicam os homens do cais da 
Bahia. Ela é festa também na 
Gameleira, na ilha de 
Itaparica, na 
Ribeira em 
Plataforma. Porque ela possui diversas moradas no mar que banha a cidade. Vive em sua pedra no 
Dique, vive na 
Ribeira, mora no 
Rio Vermelho. É múltipla como os seus nomes. É a lenda mais bela dos negros da 
Bahia (...)"
[
Jorge Amado, 
in Bahia de Todos os Santos. Guia das ruas e dos mistérios da cidade do Salvador, 
Livraria Martins Editora, Setembro 1945 (aliás, 8ª ed., 1961) - sublinhados nossos]