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quinta-feira, 26 de julho de 2007


Vida

"Calados, mudos,
no buraco metidos,
sem coragem de nos mexermos,
de medo transidos,
sempre despertos os cinco sentidos
não cheguem lá fora os ruídos
do mastigar das migalhas
das mesas caídas;
a vida cobarde a toda a hora agradecida,
como esmola recebida ...
isto não, não é vida!"

[Joaquim Namorado, in Incomodidade]

segunda-feira, 10 de novembro de 2003

NOS 90 ANOS DE ÁLVARO CUNHAL



Cunhal é demasiadamente importante para ser esquecido. Goste-se ou não. Não é possível fazer a história politica, social e cultural da última metade do século XX em Portugal, sem encontrar a sua presença no debate das ideias estéticas e literárias que percorreram as principais correntes literárias e políticas portuguesas. Mesmo que, nalguns casos, não esteja aí presente. Mesmo que não tenha feito obra ou corpo maior. Ou até por isso mesmo. Não nos referimos, evidentemente, a Cunhal como teorizador da revolução democrática e nacional ou na luta pelo socialismo, mas das suas posições ideológicas face à arte e à sua universalidade.

Não esteve só nessa luta em torno de uma arte que exprima uma "tendência histórica progressista", numa arte e literatura que coloque o "social" muito antes do "estético", numa arte "útil" que acompanhe a natureza reflexiva dos movimentos sociais progressistas. Com ele, estiveram Mário Dionísio, José Bacelar, Manoel Mendes, Rodrigo Soares, António Ramos de Almeida, Joaquim Namorado, e outros mais, que n'O Diabo, Sol Nascente, Seara Nova ou na Vértice "fustigaram" presencista (vidé a critica ao suposto "umbiguismo" de Régio) e os que lhe seguiram. As denúncias e as polémicas constantes marcaram a partir dos anos 40 toda a matriz do denominado movimento neo-realista e o movimento estético português.

"... a arte está indissolúvel e inevitavelmente ligado à vida social, que a obra de arte é um elemento integrante da sociedade, e que numa obra de arte existem reflexos e significações da vida social explicitados ou não. Esta realidade tem sido sintetizada com a expressão «conteúdo» da obra de arte. Outra realidade objectiva é que na obra de arte a forma é um elemento básico do valor estético.
O mal é que a querela forma/conteúdo, que se trava ao longo dos anos no plano ideológico, na critica e no comportamento, cristalizou as mais das vezes em conflitos irredutíveis que dificultaram e impediram um debate suficientemente esclarecedor..." [AC, in A Arte, o Artista e a Sociedade, Caminho, 1996]

"... Quando alguns poetas presencistas cantavam, louvavam e enalteciam as cogitações, o isolamento individual, a mentalidade da burguesia, atribuindo-lhes o valor de serem «os verdadeiros problemas humanos», a poesia (segundo tais teorizadores e críticos) não estava sendo utilizada para quaisquer fins, era «o fim em si mesma» como «arte pura». Quando os poetas no Novo Cancioneiro transmitiam nos seus poemas aspirações e sentimentos de classes e camadas populares, estavam (segundo os mesmos teorizadores e críticos) a infringir os princípios da «arte pura» e cometiam o pecado de utilizar a poesia para fins políticos..." [ibidem]

Algum roteiro: Álvaro Cunhal ["Depõem Críticos e Artistas acerca da Génese e da Universalidade da Arte", in O Diabo (29/04/1939) / "Numa Encruzilhada dos Homens", in Sol Nascente (1/6/1939) / A Arte, o Artista e a Sociedade, Caminho, 1996] | António Vale (aliás Álvaro Cunhal) ["Cinco notas sobre forma e conteúdo", in Vértice, vol. 14, nº 131/132 (1954)] | Mário Dionísio [Ficha 14, 1944 / Autobiografia, 1987] | Joaquim Namorado ["Da dissidência Presencista ao Neo-Realismo", Vértice, 279, 1966] | Fernando Alvarenga [Afluentes Teóricos-Estéticos do Neo-Realismo Visual Português, Afrontamento, 1989]