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domingo, 21 de dezembro de 2003
"DAS PETAS O ALMOCREVE ..."
"Das Petas o Almocreve é obra tua.
Bem se vê, Daniel, na frase e gosto:
Adiça três de Abril ou seis de Agosto,
É de quem vende rimas pela rua..."
[Bocage, numa "farpa" a José Daniel Rodrigues da Costa, autor do Almocreve das Petas]
BARBOSA DU BOCAGE (MANUEL MARIA) [1765-1805]
Morre a 21 de Dezembro de 1805
"Quando completamos atentamente o retrato de Bocage (...) em que as feições estão vigorosamente acusadas: quando reparamos na testa espaçosa, em que a luz do estro parece circular ainda, e nos olhos azuis e rasgados, que tanto deviam cintilar quando a inspiração baixava, revela-se-nos o carácter do poeta e a índole do seu engenho, pelo exame de reflexão (...) Pela pálida tristeza das faces percebemos que o homem foi pouco ditoso: que o vate estremeceu com as sensações do orgulho e dos triunfos, e que, não se embriagando com as seduções das honras e da opulência, pagou o tributo que em todos os tempos tornou cruel ao génio a sua glória, embora o console depois a crença na justiça da posteridade (...)
Magro e trigueiro, de estatura mediana e curva, o corpo parecia pesado de mais para as extremidades: mas nesta constituição defeituosa havia contudo o que quer que fosse que o não deixava confundir. Os cabelos compridos desalinhados e o movimento maquinal dos dedos, aumentando-lhe a miúdo a desordem, eram outra feição natural dele. O sorriso pouco acudia a animar-lhe as faces macilentas. Melancólico até no meio das cenas de maior alegria, ainda conservava a tristeza no rosto e já o delírio tripudiava em torrentes de versos picantes e maliciosos."
[Luís A. Rebelo da Silva, in Memoria Biográfica e Literária acerca de Manuel Maria Barbosa du Bocage e ...]
"Magro, de olhos azues, carão moreno,
Bem servido de pés, meão na altura,
Triste da facha, o mesmo de figura,
Nariz alto no meio, e não pequeno.
Incapaz de assistir n'um só terreno,
Mais propenso ao furor do que à ternura;
Bebendo em níveas mãos por taça escura,
De zelos infernaes lethal veneno;
Devoto incensador de mil deidades
(Digo, de moças mil) n'um só momento,
E sómente no altar amando os frades,
Eis Bocage, em quem luz algum talento;
Sahiram d'ele mesmo estas verdades
N'um dia em que se achou mais pachorrento.
[Bocage, Retrato Próprio, In Sonetos, 1915]
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