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terça-feira, 25 de setembro de 2007


André Gorz: um longo diálogo

André Gorz, tal como foi referido aqui, é principalmente (re)conhecido pela atenção dada às questões relacionadas com "o trabalho", a "produtividade", "relações de trabalho" e "exclusão social", "industrialização" e "acumulação", "capitalismo”" e "novas tecnologias". Retoma, por isso mesmo, o "velho" debate sobre a "produção/reprodução de trabalho", "a teoria do valor trabalho", a questão da sua "apropriação" e a problemática dos "modelos de crescimento económico". A partir daí, é evidente na sua obra a critica à doxa marxista ["O marxismo está em crise porque há uma crise do movimento operário. Rompeu-se, ao longo dos últimos vinte anos, o fio entre desenvolvimento das forças produtivas e desenvolvimento das contradições de classe”, in “Adeus ao Proletariado", Gorz, 1987]. Nesse sentido, polemizou à esquerda, quer por entender que o "trabalho imaterial" era crucial para a análise do capitalismo moderno, quer por pensar que "o proletariado" não era já uma "classe revolucionária", nem tinha o "valor profético", que invariavelmente está presente em toda a literatura marxiana. Tal preceito, então ousado, fez virar contra si os sindicatos e toda a "esquerda clássica".

Alguns conceitos com que trabalhou versando a problemática da "economia do saber" ou "do conhecimento", resultante do mundo tecnológico e das suas "estruturas", têm hoje um lugar central no debate sobre a globalização e a "sociedade do futuro" (pelo menos nos países mais desenvolvidos). O construído das redes de comunicação e os efeitos das novas tecnologias, pelo impacto que têm no sistema económico, na organização do trabalho e no próprio trabalho, convergem necessariamente para a urgência de um outro olhar da/para a ciência económica (que Gorz referia sempre).

A putativa ilusão de perda da "centralidade do trabalho" e o "fetichismo tecnológico" e cultural nas sociedades actuais, aliado à ideia de derrota da "luta" anticapitalista, levaram a que o filósofo convergisse para o campo da ecologia política e conceptualizasse o "socialismo pós-industrial", bem à maneira da utopia marcusiana. O legado de Gorz permanece intacto. Resta esperar pelas suas profecias.

Locais: A Humanidade, a natureza e o trabalho [Carlos Lucena] / André Gorz, le philosophe et sa femme [Le Monde] / Aux noms de l'amour / Entrevista com André Gorz / La disparition d'André Gorz

André Gorz [1923-2007]

"Nous nous sommes dit que si, par impossible, nous avions une seconde vie, nous voudrions la passer ensemble" [André Gorz, in Histoire d’un amour, Setembro 2006]

André Gorz [aliás Gerard Horst] nasceu em Fevereiro de 1923, em Viena. Refugia-se na Suiça, com os pais, na II GM. Forma-se em engenharia química, em Lausanne. Parte (1949) para França onde trabalha [assinando textos no "Paris-Presse" com o pseudónimo de Michel Bosquet e mais tarde como jornalista económico no "L'Express"], estuda economia, sociologia, filosofia.

Radicado em França [naturaliza-se francês em 1954], em 1961 aparece como co-director da revista "Les Temps Moderns", de Sartre & Simone de Beauvoir. Data desse tempo a sua ligação à fenomenologia e ao existencialismo. Sai do "L'Express" em 1964 para fundar [com Jean Daniel e outros mais] a importante revista "Le Nouvel Observateur". Torna-se amigo de Herbert Marcuse [da chamada Escola de Frankfurt, de que fizeram parte Horkheimer, Adorno, Habermas], cujo pensamento (e o da Escola de Frankfurt) o influenciou. O Maio de 68 marca-o decisivamente. Nessa altura aproxima-se das teses sobre educação de Ivan Illich [do qual publica alguns livros]. Dissidências com os seus colaboradores na revista "Les Temps Moderns" [em parte pela "linha maoista" então seguida pela revista e em desacordo com o numero saído sobre o grupo radical italiano "Lotta Continua", que curiosamente teve textos e manifestos publicados em Portugal pós-1974, com algum sucesso] levam à sua demissão da direcção e saída após a morte de Sartre (1980).

Aproxima-se, entretanto, da noviciada corrente da ecologia radical [sai em Portugal, em 1978, pela Editora Vega, o seu livro "Ecologia e Liberdade" (publicado inicialmente em 1975), repositório de textos saídos 25 anos atrás, com o seu pseudónimo Michel Bosquet] e, em 1973, ingressa na revista "Le Sauvage", onde a “problemática ecológica” tem lugar central. Em 1980, após a publicação do seu livro "Adieux au prolétariat" [ver, "Adeus ao Proletariado: para além do socialismo", Rio de Janeiro, 1987], onde a reflexão sobre a perda do "valor profético" do proletariado e a crítica ao marxismo tradicional está presente, a polémica irrompe (de novo) e a CFDT, onde de algum modo estava ligado, repudia-o. Em 1983, sai também do “Le Nouvel Observateur”. E retira-se para a sua casa em Vosnon.

Nesta segunda-feira soube-se que André Gorz e sua mulher Dorine [com quem casou em 1949] se suicidaram, consumando o que Gorz no seu último livro, “Lettre à D., Histoire d´un amour”, deixava escrito:"Nous aimerions chacun ne pas survivre à la mort de l’autre. Nous nous sommes dit que si, par impossible, nous avions une seconde vie, nous voudrions la passer ensemble". O pacto ficou, para todo o sempre, selado.