segunda-feira, 30 de maio de 2005


New Order

"I've been waiting for a guide to come and take me by the hand"

A desordem do corpo. O fechar os olhos à memória. Na voragem da noite, um andar açaimado, um estranho gotejar. Seduzir o outro, bem o sabemos, "é toda uma aventura". Porém, queda-se o sorriso nos lábios, a memória das mãos que constroem teu rosto ... mesmo que breve o tempo arda. "Unknown pleasures". A música assim como suporte quando o afecto é sombra perdida na lembrança. Depois ... depois um enorme comício para dar vida aos teus olhos tristes. "Body that curls in and hides". Nós docemente na espera.

"When routine bites hard, and ambitions are low
And resentment rides high, but emotions won?t grow
...
Then love, love will tear us apart again
O amor, o amor vai dilacerar-nos de novo
"
[Amor]

"Amor, que te dizer,
quando honesto relógio
junto à cama
é laranja de que restam
só dois gomos?
Amor, que te dizer,
Quando o gosto azedo desta pressa
Mancha os lençóis usados
Da pensão? Amor?"

[Eduardo Guerra Carneiro, in Isto anda tudo ligado, 1970]

sexta-feira, 27 de maio de 2005


Louis-Ferdinand Céline [n. 27 Maio 1894-1961]

"... Ah! Camarada! Este mundo, asseguro-lhe, não é mais que um imenso negócio que se está marimbando para todos nós! Você é jovem. Que estes minutos lúcidos valham para si como se fossem anos. Escute-me com atenção, camarada, e não deixe passar nada sem lhe avaliar bem a importância, esse factor capital sob o qual resplandecem todas as mortíferas hipocrisias da nossa Sociedade:«O compadecimento pela sorte, pela condição dos pobres diabos...» Digo-vos, homens de bem, vencidos da vida, escorraçados, explorados, eternamente transpirados, previno-vos: quando os grandes deste mundo se resolvem a amar-vos é porque decidiram transformar-vos em carne para canhão ... É o sinal ... infalível. É por amizade que a coisa começa ..." [Céline, in Viagem ao fim da noite, Ulisseia, 1966]

"... Depois da Viagem ao Fim da Noite e de Mort á credit, antes de trocar a vocação de romancista pelo furor panfletário anti-semita, Céline tinha começado aquilo que iria ser seu terceiro romance, de nome Casse-pipe (...)
As primeiras cem páginas desse projecto abandonado perderam-se em 1944, ficaram em Paris enquanto o seu autor procurava refugio na Alemanha e depois na Dinamarca. E em 1948 - já a «maldição célineana» se preparava para atingir o ponto alto (recorde-se o artigo de Jean-Paul Sartre em Les Temps Modernes, com um dos ataques mais violentos que lhe forma feitos; recorde-se que já tinha sido pedido a sua extradição para França) - os Cahiers de la Plêiade, e Jean Paulhan com eles, assumiram-se num altíssimo rasgo de coragem cuja amplitude é hoje difícil de avaliar: a publicação desse fragmento, com o título Casse-pipe (...)
É assim que as cem páginas de Casse-pipe ficaram como um primeiro sinal de interdição.
Ver-se-á que abrangem toda uma noite chuvosa passada num quartel, e que ainda pertencem à primeira «maneira» de Céline, aos dias do seu insaciável furor antimilitarista. Com um tom e uma escatologia digna de Rabelais, envolvem sargentos e cabos nas violências exigidas pela iniciação de um magala. São páginas que cheiram a cavalo, a suor, a urina e a bosta, que pintam magistralmente uma realidade através da alucinação provocada por essa mesma realidade ..." [Aníbal Fernandes, in De Três em Pipa, Assírio & Alvim, 1985]

Locais: Louis-Ferdinand Céline (1894-1961) - pseudonym of Louis-Ferdinand Destouches / Louis-Ferdinand Céline (1894-1961) / Louis-Ferdinand Céline / Louis-Ferdinand Céline (1894-1961) / Dictionnaire Céline / Céline: Sobre o Estilo

quinta-feira, 26 de maio de 2005


Joaquim António de Aguiar [1792-m. 26 Maio 1884]

"... 0 nome de Joaquim António de Aguiar era já repetido com verdadeiro aplauso por todos os homens importantes do país, e aquela injustiça não foi desconhecida nem indiferente às cortes gerais e extraordinárias da nação (...) 0 restabelecimento do governo miguelista, em 1823, afervorou-lhe os brios, ao mesmo tempo que estimulou e deu vantagem aos seus inimigos. Aguiar publicara em Setembro de 1822 um folheto, que era o protesto do homem altamente; liberal. Sendo mandado sair do colégio de S. Pedro, por decreto de 8 de Novembro de 1823, teve de abandonar o magistério e refugiar-se no Porto, como aconteceu a muitos homens do seu tempo. Com as suas ideias liberais tão publicamente manifestadas, só lhe restava emigrar, ou deixar-se matar ingloriamente. Começaram então os grandes sofrimentos políticos do distinto doutor. Em 1826, sendo proclamado o governo de D. Pedro IV, voltou a Coimbra, e em Abril foi nomeado lente substituto da faculdade de Leis com exercício na cadeira analítica de Direito pátrio; nesse mesmo ano foi eleito deputado às cortes pela província da Beira, tomando assento na câmara até 13 de Março de 1823, adquirindo logo créditos de parlamentar de primeira ordem, concorrendo com as suas doutrinas para a frutificação dos princípios liberais mais avançados, da monarquia constitucional e representativa, assegurando o estabelecimento da Carta Constitucional ..." [ler aqui]

Locais: Joaquim António de Aguiar (1792-1884) / Joaquim António de Aguiar / Unificação e Apogeu [da Maçonaria]

quarta-feira, 25 de maio de 2005


Ecos do défice ou a moléstia da "coisa"

O sr. Governador do Banco de Portugal aka Vítor Constâncio apareceu-nos, dias atrás, a agraciar os indígenas lusos, ao som de pandeiros e rufar de tambores, com a chibatada do défice público. A fragrância com que exala "a coisa" torna o sr. Governador um putativo sacerdote do templo do equilíbrio orçamental, a par de vultos não menos talentosos como os pregadores Miguéis (o Beleza e o Frasquilho), os jubilosos Bagão Félix & César das Neves, o Martim liberal ou essa inenarrável Dulce Franco.

Depois de um santo domingo de repouso pátrio (S.L.B. gratia plena) eis que as luminárias da política económica em geral e os negociantes do retalho orçamental em particular, regressam em força a todos os telejornais, repartições de think tank por atacado, quiosques de equilíbrio cíclico ou lupanares de politicas orçamentais de estabilização. Há mais de vinte anos que o orçamento reformado nos é contado, em historietas encantadoras. O debate pragmático torna-se um delírio da razão e a superstição em torno dos coveiros do défice um talento de retórica que está bem num qualquer liceu ou associação de estudantes, mas que não comove qualquer um. Só quem quer ir nesse preparo e em espumoso divertimento partidário.

O discurso sobre "a coisa", sua origem infecta e meios de a combater adultera o espírito dessa gloriosa plêiade de fiscalistas, orçamentalistas e economistas, abnegados trabalhadores da coisa pública. A ordem de argumentos da espantosa rincharia acaba invariavelmente na velha comédia dos malefícios do estado "gordo", na infâmia arremessada sobre os malandros dos funcionário públicos (uns gastadores compulsivos), no uso e abuso da teoria do utilizador-pagador (o novo brinde dos modernos liberais), na cientifada contra os limites do Estado-Providência (não leram Daniel Cohen, mas pouco importa) e por aí adiante. A doutrina veio para ficar.

Como se percebe do douto exercício economês os erros de criação e amamentação do "monstro" são sempre de outros. A dúvida pavorosa nunca existe. Uma tal Dulce, nomeada porta-voz da equipa de Marques Mendes, Barroso & Lopes, demonstra, com aquele ar sério que lhe faz arcar o peito, que a dita "coisa" brotou do desastre Guterrista. O bom do Ribeiro e Castro, agora sem a garotada pululante desses álgidos tempos, confessa que também sim, evidentemente. Os socialistas extasiados, em parceria Pina Moura, juram que o pai do "monstro" foi o prof. Cavaco nos tempos idos de 90.

Entretanto a inefável Ferreira Leite, judiciosamente, confessa não ter queda para números e convicção pela matemática. Oliveira Martins prepara discursata. Frasquilho sobe à estátua do Marquês e ameaça atirar-se para o túnel do Lopes se não se baixar os impostos. Miguel Beleza, o tal do défice especial, descobre que um aumento das taxas de IVA não permite falar em qualquer efeito recessivo. Silva Lopes, insondável, fica perplexo pelo estado de alma-económica do seu ex-aluno. António Nogueira Leite, entre notas de jazz e pautas orçamentais, revolve-se no sofá exigindo que se ataque a maleita do défice pelo lado da despesa, sepultando de vez o recurso das receitas fiscais. O Sérgio Figueiredo, injustamente esquecido, está a fazer a tradução de alguns estimulantes abstract da produção teórica americana e virá ... já a seguir. O dr. Medina Carreira, isolado em casa, trabalha inspirado em dezenas de tabelas e quadros analíticos e voltará para dar a etiologia da doença. O José Manuel Fernandes publicará. E nós, por aqui, nos fechamos.

Leilão de Livros - Dias 30 e 31 de Maio no Hotel Roma

Nos próximos dias, 30 e 31 de Maio, sob direcção de Luís P. Burnay (Calçada do Combro, 43-47), realiza-se no Hotel Roma, pelas 21 horas, mais um Leilão de Livros.

Algumas referências: Adolf Hitler bilder dem leben des Fuhrers, Bilderdienst, 1936 / Portugal Artístico e Monumental, de A. Pereira d'Almeida / Santos Portugueses, por João Ameal, 1957 / Garrett: memórias biographicas, de F. Gomes de Amorim, 1881-84, III vols / Memoria sobre chafarizes, bicas, fontes e poços públicos de Lisboa ?, de José Sérgio Veloso de Andrade, 1851 / As Cidades e Villas da Monarchia Portugueza que teem brasão d'armas, por Inácio de Vilhena Barbosa, 1860-1863, III vols / Arte Portuguesa, de João Barreira / Caça [obra anónima, aliás publicada por Eduardo Montufar Barreiros], 1900, rara / Herpetologie d'Angola et du Congo, de J. V. Barboza du Bocage, 1895 [peça de colecção] / Boletim da Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, 1935-1977, 127+2 nums / Historia das Ordens Monasticas em Portugal, de Manuel Bernardes Branco, 1888, III vols / Ribatejo lendário e pitoresco: edição comemorativa do Oitavo Centenário da Conquista da Região Ribatejana, por Francisco Câncio, 1946-47 / Historia do descobrimento & conquista da Índia pelos portugueses, por Fernão Lopes de Castanheda, 1924-1933, IV vols / Catalogue de la Bibliotheque de M. Fernando Palha, Lisbonne, 1896, IV vols [imp. catalogo da livraria de Fernando Palha que foi vendida em conjunto para a Univ. de Harvard] / Contemporânea: grande revista mensal, dir. de José Pacheco, nº1 a nº10 (Maio 1992 a 1923), rara revista literária / Historia da Cartografia Portuguesa, de Armando Cortesão, 1969-1970, II vols / Diccionario chorográfico de Portugal Continental e Insular ..., dir. Américo Costa, 1929-1949, XII vols (imp. e valioso) / Dicionário Hípico ..., de Salvador José da Costa, 1923 (raro) / Os Judeus e os Protocolos dos Sábios de Sião, por João Paulo (Mário) Freire, 1937, IV vols / Ronda de África, de Henrique Galvão, II vols / In Memoriam de José Régio, 1970 / Inventário Artístico de Portugal [vol. VII Aveiro, vol. VII, VIII e IX, Évora] / Portugal Antigo e Moderno: Dicionário ..., por Augusto B. S. A. De Pinho Leal, 1873-1890, XII vols / Maria da Fonte: romance histórico, por Rocha Martins, II vols / A Engomadeira, por Almada Negreiros, 1917 / K4 o quadrado azul, de Almada Negreiros, 1920 (muito rara) / A Extremadura Portugueza, por Alberto Pimentel, 1908, II vols / Álbum de Caricaturas, por Raphael Bordallo Pinheiro, 1876 (raro) / O Pinhal do Rei, de Arala Pinto, 1938-1939, II vols (raro) / Portvgaliae Monvmenta Cartographica, por Armando Cortesão e Avelino Teixeira da Mota, 1960, VI vols / As Encruzilhadas de Deus, de José Régio, 1935 (raro) / Revista dos Centenários, nº1 a nº24 (1939-1940) / As Grandes Vias da lusitânia: o itinerário de Antonino Pio, por Mário Saa, 1956-1967, Vi vols / Principio, de Mário Sá-Carneiro, 1912 (raro) / Ninhos e Ovos, de Eduardo Sequeira, 1888 / Rampa, de Adolpho Rocha (aliás Miguel Torga), 1930 (raro)

segunda-feira, 23 de maio de 2005


Portugal é Vermelho

"Ser Benfiquista
É ter na alma a chama imensa
"

A onda vermelha que varreu todo o Portugal é autêntica, insubmissa, não acaba nem começa. É o espírito de nobreza & glória que se reencontram. É o cadinho do nosso contentamento. È um manto de ternura sincera. Liberta.

O Sport Lisboa e Benfica é um clube do povo, nasceu dele, fraterno & nobre, jardim operário cortês mas sem deixar de ser altivo, que a saudade se quer respeitosa, aristocrática. O S.L.B. é a outra família, o nosso regaço afoito, o berço português eterno e puro. Admirável de felicidade quando triunfa, recatada quando vencida. Uma história de encantar. Uma vida maior.

Manuel Goularde, farmacêutico ... presente! Alfaiate Nunes ... aqui! José Rosa Rodrigues ... presente! Major Cruz Viegas ... pronto! Felix Bermudes ... sempre nos nossos corações! Daniel Brito ... aqui! Cosme Damião ... presente! Cândido de Oliveira ... prontos companheiros! António Ribeiro dos Reis ... presente! Borges Coutinho ... a nossa honra! A fidelidade é o melhor dos amigos. A esperança uma chama imensa.

Grato do coração Sport Lisboa e Benfica. Obrigado Trapattoni!

sexta-feira, 20 de maio de 2005


Agradecimentos

"Estou a ficar velho... Estou a ficar velho...
Hei-de andar com a dobra da calça revirada
" [T.S.Eliot]

Agradecemos, com a maior gratidão, a referência e os enfeites de alma que a passagem de aniversário comemorado por este estabelecimento - que imprime letras, decora opiniões e cuida de cativos instruídos - esculpiu em rasgada felicidade. Que não se apague o vosso coração.

Ao Abrupto, Aqui há Rato, Arcádia, Avatares de um Desejo, Blasfémias, Bloguítica, Bomba Inteligente, Bombyx Mori, Contra a Corrente, Crítico Musical, Da Escola, Diotima, Fórum Comunitário, Esmaltes e Jóias, Fumaças, Ideias Soltas, Impensavel, La Force des Choses, La Pipe, Legendas & Etcaetera, Local & Blogal, Ma-Schamba, Mar Salgado, Memória Virtual, Miniscente, Montanha Mágica, Muito Cá de Casa, Musas Esqueléticas, Nova Floresta, O Vilacondense, Olho do Girino, Pantalassa, Quartzo-Feldspato-Mica, Retórica e Persuasão, Rua da Judiaria, Terras do Nunca, Tugir, Um Blog Sobre Kleist, Universos Desfeitos, Welcome to Elsinore; àqueles outros bloguistas que em privado nos enviaram testemunhos carinhosos & a leitores ou amigos que se lembraram de nós, um muito obrigado.

Ainda, daqui, se envia as maiores felicitações ao mano Critico Musical, que comemorou o seu II aniversário de merecida estimação.

terça-feira, 17 de maio de 2005


Boa Tarde

"Eis como uma coisa como que nos interessa: destruir os textos.
Passa-se que:
o caçador vai à procura de cabeças. Que é como quem diz.
Traz cabeças faz um monte.
Um monte de cabeças intempestivas, vociferantes, cabeças
rebarbativas.
Arruma tudo, limpa o ar só para elas, um monte grande
luzindo, sibilando assim (...)
...
Não se pode acreditar na beleza concentrada
da gramática
...
Destruir diz ela diz
Duras digo
dizemos quero dizer
dizemos ..." [Herberto Helder, in Cobra]

II Aniversário

Por obra e graça do nosso padroeiro e Altíssimo Protector, celebramos o nosso segundo aniversário em estilo mavioso, segundo as postumeiras querenças da mana blogosfera e gratos por continuar a fazer mandas a profanos pouco prudentes. Apaixonados pelo lazer, a nossa cantada paixão, o Almocreve das Petas é um panfleto desafogado em saudades, uma escritura licenciosa, uma pública proposta que não cansa. Somos a perfeição insolente. Oferecemos sermões aos nossos liberais assinantes. Fazemos encomendas adornadas de luxo, obra & afectos. Doutrinamos os virtuosos em glória de ardentes e antiquíssimos escribas. Somos misericordiosos. Não estamos cansados de estar cansados. Estamos soberbos. Bem hajam todos. Vale!

Como sempre o Almocreve é oferecido aos cavalleiros amantes da liberdade, igualdade e fraternidade e à Grande Alma Portuguesa. Hoje, por infinita ventura, para enfeitar este dia-ligado-a-dia sem dormir nocturno, queremos que os vossos lábios acompanhem o belíssimo poema da deusa Natália Correia - Queixa das almas jovens censuradas - para que haja um tumulto em todos vós. Ali ao lado esquerdo da pedra, pelo canto divino de José Mário Branco. Graças!

[Bom Dia]

I can't take my eyes off of you
I can't take my mind off of you
'Til I find somebody new


"é com visões possíveis que o sonho se erotiza
e com flores invisíveis que a carne se harmoniza" [Dórdio Guimarães]

segunda-feira, 16 de maio de 2005



"... Estou-me nas tintas
para a pesca à linha das ideias
para a fila de chapéus alentejanos
em coro desafinando a esperança
...
Estou farto de fazer tricot com as próprias tripas
de beber e escrever nos intervalos
de ter por destino fumar cigarros para divertir os pulmões
até que deles saiam serpentinas e pronto
e não é isso o que quero ...
" [Ant. José Forte]

EDITAL

17 de Maio - Aniversário do Almocreve

Faz-se saber ao estimado público que o Almocreve das Petas desfralda as velas do seu 2º Aniversário já amanhã, tendo tido o cuidado de encomendar remoques e chalaças, para cuidar do corpo e da alma. Está munido de água benta do rio Mondego, mandou rezar missas em blogs diferentes, cruzou a perna esquerda sobre a direita. Já pronunciou a Restauração de Portugal em forma de serpente e fez encantamentos para afastar aumento de impostos. Está mais velho e mais sábio. Está determinado em assim continuar, livre de toda a autoridade. Como Voltaire, dizemos:"a arte de chatear é contra tudo o que se sabe". Pontualmente... todas as manhãs. Com os melhores cumprimentos. Saúde e fraternidade.

Três Tristes Tigres

"uma cousa são razões, outra coisa regateiradas" [Pe. J. Agostinho Macedo]

O prof. Marcelo, absorto no espírito de comentador dos crentes, disserta inquieto sobre tudo o que é impresso no reino. E sem qualquer sensatez, bom critério ou precisão analítica, destrói tudo aquilo onde se mete. Na verdade o professor é o seu próprio coveiro. O comentador, em sucessivos pinotes de análise política, é de uma delicadeza sem limites, de uma ternura instruída, de uma provocante graciosidade, porém, o aconchego da vaidade de se ver criador de factos políticos impede-o de melhor resguardo previsional ou visão estratégica.

Este domingo, a propósito do défice orçamental, resolve zurzir em Santana Lopes e no inefável ministro Bagão Félix. De caminho aponta baterias para a (não)governação Socrática. Curiosamente, em todo este cenário de crise orçamental, a faca governativa da sra. Ferreira Leite não se vislumbra no atoleiro luso. O que nos é sugerido (e não só pelo professor, entenda-se) é uma picaresca retirada, no cenário de crise, das políticas recessiva da santa senhora. A teoria das influências marcelistas tem sempre este arrojo diletante.

Ora, em fase de pronunciamento presidencial de Cavaco Silva, a estafa alucinante do comentador é cega e grotesca. O problema do prof. Cavaco é como lidar com o desaconchego das péssimas políticas do governo de Barroso. Não nos parece que a presença de Ferreira Leite na comissão de honra do sr. Silva seja algo de bom. À sua simples enunciação a caridade do portuga vacila, o auditório range os dentes. Só o prof. Marcelo aplaude frenético. Eis, de novo, o coveiro Marcelo, no seu melhor, a verberar o militante Rebelo de Sousa. Como deve andar febril o candidato Cavaco Silva com o prosista da RTP. Até dá pena.
[Os Gatos]

"Deus fez o homem à sua imagem e semelhança, e fez o crítico à semelhança do gato.

Ao crítico deu ele, a graça ondulosa e o assopro, o ronrom e a garra, a língua espinhosa e a calinerie. Fê-lo nervoso e ágil, reflectido e preguiçoso; artista até ao requinte, sarcasta até à tortura, e para os amigos bom rapaz, desconfiado para os indiferentes, e terrível com agressores e adversários (...)

Amigo de fazer jongleries com a primeira bola de papel que alguém lhe atire, ou seja um poema, ou seja um tratado, ou seja um código. Paciente em aguardar, manso e apagado, com um ar de mistério, horas e horas, a sortida dum rato pelos interstícios dum tapume, e pelando-se, uma vez caçada a presa, por fazer de agonia dela uma distracção; ora enrolando-a como um cigarro, entre as patinhas de veludo; ora fingindo que lhe concede a liberdade, e atirando-a ao ar, recebendo-a entre os dentes, roçando-se por ela e moendo-a, até a deixar num picado ou num frangalho.

Desde que o nosso tempo englobou os homens em três categorias de brutos, o burro, o cão e o gato - isto é o animal de trabalho, o animal de ataque e o animal de humor e fantasia - porque não escolheremos nós o travesti do último? É o que se quadra mais ao nosso tipo, e aquele que melhor nos livrará da escravidão do asno, e das dentadas famintas do cachorro ..."

[Fialho de Almeida, Meus Senhores Aqui Estão «Os Gatos»]

domingo, 15 de maio de 2005


Habemus Campeão

Não sabemos se gostámos mais da infinita paciência com que o tricot encarnado baralhou a indiferença pelo jogo dos lagartos d'Alvalade ou se, por graça divina, devemos fazer afectuosa genuflexão perante o chouriço de Ricardo.
Perante o acampamento leonino no meio do terreno de jogo - sempre essa sedução de querer ver a Catedral, com calma e respeito - só por milagre a lagartagem podia ganhar. Ou por qualquer desígnio de Paulo Paraty.

Ao que parece, alguns fundamentalistas verdes, em observância ao receituário do horto d'Alvalade, juram que o lance do golo do gigante Luisão foi precedido de falta. Quer dizer, assinalam, não a falta de jeito de Ricardo mas sim a presença de uma putativa cavalgada do príncipe das alturas sobre o irreflectido guarda-redes, demasiado verde em saídas aéreas. Ora o espanto e horror dos adeptos do Sporteen é um gemido agonizante. O golo foi nítido de inocência. As regras & a cartilha do futebol não contemplam qualquer socorro ao confundido Ricardo, que num acto curioso implora ao árbitro por mão de Luisão. Oh, dor pungente! Ah, fatalidade! Eia, lagartos!

Dissemos: "Iremos ao Marquês!". E fomos. A sentença estava dada. P'rá semana, queira ou não o sr. do Apito das Antas, generosamente subiremos todos os degraus. Seremos íntegros vencedores. Com a fidalguia. E honradez. Inté!

Meme de Jour ou exercício devoto à professa Gerência

Respondemos hoje [13 Maio] à encomenda do dr. Chan e sr. Guito, paga adiantadamente em báquica libação p'la calada da noute. O Courvoisier XO Imperial foi bravo no beber. Portanto, attendite et videte na existência deste vosso pecador. E sede piedoso, ó ilustrado auditório!

- Que fazes neste momento?
Tomávamos conhecimento do silêncio meditativo dos bloguistas neoliberais sobre o caso Sobreirogate & como vão lavrando o campo da refundação da direita neste jardim da corrupção. Confeccionar o liberal libérrimo em banho de mercado é um puríssimo costume com que meneiam os neurónios. A ensaboadela económica, amputada desse charivari da livre concorrência, cria uma atmosfera absolutamente modernista. E pensar que a paixão do liberal p'la corruptela é uma magia que crepita nas abóbadas do templo de Adam Smith!? Mas lá no íntimo estávamos era a tentar partilhar a cama da vizinha, como se nota ali em cima. No pior dos cenários íamos urinar.

- Que planos tens para este fim-de-semana?
Preparar a comunhão do peito benfiquista. Vemos tantos lagartos de joelhos pelo chão, qual místicos e em silêncio desportivo, que temos o mester de lhes adubar a eucaristia na Catedral. Domar a fera, pôr as coisas no devido lugar, é coisa que se faz na Luz com simplicidade. Lá estaremos a aliviar a coisa. E Domingo, depois da janta, caminharemos p'la "cidade dos livros", em Taveiro. Em cadência triunfante para emudecer o vício.

- Que coisas te causam stress neste momento?
Além da mortificação de não termos os 70,50 mérreis finais para a entrada da tranche de um terreno na Companhia das Lezírias, nada mais temos a declarar. Só mesmo quando, em vadiagem mundana, nos ecoa a célebre máxima da Bruxa da Areosa - "mulher que sai demasiado, torna-se vadia" - é que o assombro do stress nos torna pouco heróicos. A bem dizer, o ser de prazer cai arremessado para os abismos do infortúnio. É a vida!

- Que fizeste desde o acordar até agora?
Verificámos, com alguma desconfiança (há que dizê-lo!), se os tomates não estavam enlatados, seguindo o dizer do casto Péret. Sem qualquer adversidade de permeio, valha-nos os deuses, seguimos em campo aberto para a pregação diária. Pelo caminho trememos com o "grande susto" apalavrado pelo beato José Manuel Fernandes do Público, salvo erro lá para os confins dos tempos. E, sem saber como, demos por nós a marchar para as Lísbias. Ainda era tempo de nos agasalharmos nos alfarrabistas antes que a bula do demiurgo liberal se elevasse novamente. E assim foi, de facto.

- A quem irás passar este teste fantástico?
Hesitamos entre Telmo Correia e o Tino de Rans. A experiência do trabalho trabalhado do primeiro e paixão musical do segundo é terreno sáfaro. Que fazer? (Lenin dixit). Vamos é passar o teste ao Murcon. Nestas coisas um sexólogo dá sempre muito jeito.
Saúde e fraternidade.

[P.S.: a encomenda, do Bar a Barraca, devia sair para o prelo ontem à tarde. Porém, a funcionária lá de casa, ainda não abraçou totalmente o choque tecnológico do eng. Sócrates, pelo que só agora o responso sai à estampa]

sábado, 14 de maio de 2005


Hay-on-Wye - "a capital do alfarrábio" [conclusão]

[O Rei de Hay] - "... Chama-se Richard Booth. A sua mulher é Hope. Educado, culto, com alguma fortuna, teve, há quase trinta anos, uma inspiração. Comprou o Castelo de Hay e começou a fazer uns trabalhos de restauro. Ao mesmo tempo, fundou a primeira book town: instalou, na Old Fire Station, a primeira loja de livros de segunda mão. Através de mil e uma aventuras, incêndios, intrigas, bebedeiras, lutas contra a burocracia, escândalos de toda a espécie, conseguiu aumentar o seu negócio, comprar o cinema local e transformá-lo em livraria, comprar outras casas, fazer mais obras no castelo e adaptar várias salas às necessidades do negócio. Venceu e deu o exemplo. Lentamente, locais e forasteiros forma seguindo. Hoje, o negócio do livro é a sorte desta aldeia perdida.
O homem é um génio para a publicidade. Coroou-se rei de Hay e declarou, em 1977, a independência do seu reino. Sabe que são os escândalos que contam, em particular as querelas: não perde uma. Dá-se mal com os burocratas locais, odeia as agências de turismo, tenta impedir a chegada dos armazéns nacionais (Marks and Spencer, Debenhams, Sainsbury's, Tesco, McDonald's, etc.), luta pelo afastamento das auto-estradas,é adversário da energia nuclear e opõe-se à instalação de moinhos de energia eólica. Abomina a União Europeia, o que não o impediu de candidatar a sua associação de Book Towns a subsídios europeus. Detesta socialistas, a senhora Thatcher, os conservadores, os jornais nacionais, a publicidade, a autarquia local, as autoridades de planeamento e o governo. E sobretudo Robert Murdoch. Mas vive de quem lá vem comprar livros, dos turistas e da publicidade feita, no mundo inteiro, à aldeia.

A verdade é que não só Hay se transformou na «Capital do Livro em Segunda Mão», como já muitas seguiram o seu exemplo: Flaerland, na Noruega; Redu, na Bélgica; St. Pierre de Clages, na Suiça, Fontenoy-la-Joute, Montolieu e Bécherel, em França; Bredevoort, na Holanda, Stillwater, nos Estados Unidos; Three Pistols e Sidney, no Canadá; Kampunh Buku, na Malásia; e Miyagawa, no Japão. Quase todas pediram a Richar Booth que as ajudassem (...)

["... o Rei de Hay pergunta-se se deve escolher cortinas de nylon a fim de ser socialmente aceite pela câmara local. O seu velho amigo, Taxi Davies, já falecido, sempre pensou que todos os comportamentos eram tolerados em Hay-on-Wye, desde que «o hospede não limpe a pila às cortinas». Espera-se que, dadas as posições de prestigio que ocupam, nenhum dos membros da câmara tenha tão repelente hábito" - Postal editado por Richar Booth]

[António Barreto, in Grande Reportagem, Janeiro 1997]

segunda-feira, 9 de maio de 2005


Mar Salgado

"E vós, ó coisas navais, meus velhos brinquedos de sonhos
...
Fornecei-me metáforas, imagens, literatura,
Porque em real verdade, a sério, literalmente,
Minhas sensações são um barco de quilha pró ar,
Minha imaginação uma âncora meio submersa,
Minha ânsia um remo partido,
E a tessitura dos meus versos uma rede a secar na praia
" [Álvaro Campos]

2 anos em areeiro abalançado por cavalleiros soltos "pela brisa embalada do Mondego", o Mar Salgado comemoraram anos de prosa vernaculíssima. Ao luzeiro de marujos da velha Nau gratas felicitações.

Iremos ao Marquês!

Para os incautos diremos que não se trata, aqui, de qualquer manifestação libidinosa ou escrita fálica. Nem se pense em invulgar masturbação desportiva, que a suposta abstinência de títulos é neurastenia para outros, que não nós: os encarnados. Ou um acting out falhado. O espírito é, apenas, o lugar!

Meus amigos, embora sabendo que "a masturbação é uma qualidade militar" (Apollinaire, dixit) a nossa excitação não vem num qualquer manual castrense, mas sim no admirável gozo de futebol que a Catedral acolherá e eternizará, na próxima semana. Em homenagem ao Cosme Damião, ali ao lado em toillete festiva, absolutamente cismados que, passe a sórdida acção da rapaziada do apito, seremos os mais assombrosos dos campeões nacionais, iremos ao Marquês. Ou à sua Rotunda. E em oração espirituosa ao Dias da Cunha, esse génio da arbitragem do horto d'Alvalade, contra a religião do Apito do sr. Costa & cia, celebraremos o mester de campeão de futebol já no próximo domingo. Com aprumo, porque somos gente séria.
A récita será memorável.