sábado, 14 de maio de 2005
Hay-on-Wye - "a capital do alfarrábio" [conclusão]
[O Rei de Hay] - "... Chama-se Richard Booth. A sua mulher é Hope. Educado, culto, com alguma fortuna, teve, há quase trinta anos, uma inspiração. Comprou o Castelo de Hay e começou a fazer uns trabalhos de restauro. Ao mesmo tempo, fundou a primeira book town: instalou, na Old Fire Station, a primeira loja de livros de segunda mão. Através de mil e uma aventuras, incêndios, intrigas, bebedeiras, lutas contra a burocracia, escândalos de toda a espécie, conseguiu aumentar o seu negócio, comprar o cinema local e transformá-lo em livraria, comprar outras casas, fazer mais obras no castelo e adaptar várias salas às necessidades do negócio. Venceu e deu o exemplo. Lentamente, locais e forasteiros forma seguindo. Hoje, o negócio do livro é a sorte desta aldeia perdida.
O homem é um génio para a publicidade. Coroou-se rei de Hay e declarou, em 1977, a independência do seu reino. Sabe que são os escândalos que contam, em particular as querelas: não perde uma. Dá-se mal com os burocratas locais, odeia as agências de turismo, tenta impedir a chegada dos armazéns nacionais (Marks and Spencer, Debenhams, Sainsbury's, Tesco, McDonald's, etc.), luta pelo afastamento das auto-estradas,é adversário da energia nuclear e opõe-se à instalação de moinhos de energia eólica. Abomina a União Europeia, o que não o impediu de candidatar a sua associação de Book Towns a subsídios europeus. Detesta socialistas, a senhora Thatcher, os conservadores, os jornais nacionais, a publicidade, a autarquia local, as autoridades de planeamento e o governo. E sobretudo Robert Murdoch. Mas vive de quem lá vem comprar livros, dos turistas e da publicidade feita, no mundo inteiro, à aldeia.
A verdade é que não só Hay se transformou na «Capital do Livro em Segunda Mão», como já muitas seguiram o seu exemplo: Flaerland, na Noruega; Redu, na Bélgica; St. Pierre de Clages, na Suiça, Fontenoy-la-Joute, Montolieu e Bécherel, em França; Bredevoort, na Holanda, Stillwater, nos Estados Unidos; Three Pistols e Sidney, no Canadá; Kampunh Buku, na Malásia; e Miyagawa, no Japão. Quase todas pediram a Richar Booth que as ajudassem (...)
["... o Rei de Hay pergunta-se se deve escolher cortinas de nylon a fim de ser socialmente aceite pela câmara local. O seu velho amigo, Taxi Davies, já falecido, sempre pensou que todos os comportamentos eram tolerados em Hay-on-Wye, desde que «o hospede não limpe a pila às cortinas». Espera-se que, dadas as posições de prestigio que ocupam, nenhum dos membros da câmara tenha tão repelente hábito" - Postal editado por Richar Booth]
[António Barreto, in Grande Reportagem, Janeiro 1997]