terça-feira, 9 de março de 2004



30 anos da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra

Exposição "Livros Raros de Economia na Universidade de Coimbra", na Biblioteca Geral da UC e lançamento da edição facsimilada do Essai Statistique Sur le Royaume de Portugal, de Adrien Balbi com comentário crítico de Romero de Magalhães.
Exercício de paciência

A história será contada em todos os pormenores. O prof. Cavaco existe, não é uma ilusão de óptica. José Manuel Fernandes, referência obrigatória sempre que se fala no afago do poder, surpreenderá em artigalho matutino, em tom sério e pouco gazeteiro. O sempre prudente escriba, Bettencourt Resende, medirá as alturas da queda, revelando as técnicas posicionais. Dado o tipo de sugestão profetizada, Luís Delgado não entra em debates estéticos, avançando com uma resma de ordens de argumentos, todos bem santanizados, que é lícita a agitação. A acrobacia discursiva destes senhores dará brilho e admiração a toda a semana politica. Neste exercício de paciência que é as presidenciais, e até que o engenheiro Guterres clame por nós, despedimo-nos que somos mais pelos "heróis todo o ano", porque "das coisas boas da Terra todos sem excepção têm a máxima culpa" [MCV]


Que é feito deste senhor? Alguém nos diz? Ah! Não!? Que não há registos, dizem. "Old times are dead times", assegura aqueloutro. Que acabou a afinidade com os deuses, suspira aquele. Quanto ao homem, declaro que nunca deparei com ele em toda a minha ida, confirma um outro. Mas não é certo que só a vulgaridade sucede às orações nocturnas? Que é impossível continuar no teatro doméstico da vida, porventura mal acompanhado? Que a originalidade é um segredo bem guardado? Os deuses retiraram-se e depois ... como é que isto tudo acaba? Quem nos ilumina o tabuleiro? Alguém nos diz?

Até lá ... Feliz aniversário, Mr. Bobby Fischer.

segunda-feira, 8 de março de 2004



"Desde o princípio tiveram os homens de se julgar semideuses caídos de sua graça por obra da mulher; e logo depois tiveram que se inventar redimidos através do ventre de nova mãe, essa santa, essa capaz de conhecer Deus no seu ventre e de no seu ventre incarnar o deus salvador, depois chamado o filho do homem – que ironia rebuscada – na sua vida e nos seus actos exemplares. Porque o homem vai fazendo o mundo e cavando o seu tumulo, e vai chamando a mulher, então dizendo-lhe «mãe», para que esta lhe nomeie o mal e o bem, e lho signifique, e tome em si o absurdo insuportável da ordem das coisas, e vai o homem fazendo o mundo sobre o ventre acolhedor e produtor da mulher, então dizendo-lhe «coisa de mim», e posto na mulher o mal e o bem e o absurdo insuportável da ordem das coisas é então justo que seja ela a primeira vítima, ela a culpada até ao momento em que finalmente o homem chama a mulher, dizendo-lhe «mulher», e repara que está vazio o lugar a seu lado"

[Novas Cartas Portuguesas, Futura, 1974]

domingo, 7 de março de 2004

LEILÃO DE LIVROS - Dias 15, 16 e 17 de Março de 2004 [CONTINUAÇÃO]

Conjunto de jornais, salientando-se A Pátria (Lx. 25/08/1900) c/ artigo de Gomes Leal s/ Eça / Revista A Revolução Social nº 17 de Agosto de 1888 (comunista-anarquista, Porto) com artigo s/ Eça e os Maias / Bosch ou o Visionário Integral, de José Augusto França, Lisboa, 1944 / Cartas de Gilberto Freyre / Gente Lusa, Arquivo de Letras e Arte, nº1 a 5, 1915-16 (revista onde escreveram Leonardo Coimbra, Camilo, Manuel Laranjeira) / Poesias autografas de D. C. Warnest [Ernesto Guerra da Cal] (1911-1994), sendo uma intitulada "Homage to Frederico Garcia Lorca on the 30º anniversary of his death", Lisboa, 1984 (é-nos dito que há uma refª a lápis onde se regista uma "confidência do poeta", na qual E. G. da Cal , "que tendo sido na juventude intimo de Lorca", teria escrito 6/7 poemas que constavam nas Obras Completas de Lorca) / Cartas de Leitão de Barros, algumas sobre à sua secção "Os Corvos" / Carta(s) de Álvaro Lins, onde é referido que "se for eleito Juscelino Kubitschek" então seria embaixador em Lisboa / Obras Completas de Gregório de Matos, Bahia, 1968, VI vols / Giestas de Memória, de Nelson de Matos, Lisboa, 1966 (junto c/ uma carta manuscrita) / Carta, Fotografia de Somerset Maugham, e um manuscrito de LFT descrevendo os assuntos "conversados" nesse "memorável almoço" (28 de Setembro de 1947) / Subsídios para a Historia de uma Geração (Bosquejo histórico de uma série de revistas que falharam), de José de Melo, 3 pgs dact. de Fev. 1959, onde se refere as revistas Vómito (1950), Cadernos do Centro (1954), Paralelo 25 (1956-57) e Sincerismo (1957-58) / Respiração Mental (Manuscrito e Livro). O Problema da Censura, de Alberto de Monsaraz, 1946, com uma carta man. com comentários sobre o tema / Carta manuscrita de Vianna Moog (7/6/1977) comentando a morte de Carlos Lacerda / Vida e Literatura de Pedro Moura e Sá, Lx, 1960 / Conjunto de 31 Cartas de figuras do Nacional-Sindicalismo, datadas de Junho de 1933 a Dezembro de 1934 (destaque para José de Campos e Sousa, Dutra Faria, José Garcia Domingues, Visconde de Porto Cruz, António Tinoco) / Manuscrito de um parecer da Academia das Ciências sobre o significado da palavra "escritor", original mas pelo punho de Vitorino Nemésio (Junho 1972) / Cartas dact. de João Palma-Ferreira (Julho 1967 a Dez. 1988) com refª a Mourão-Ferreira, Cesariny, Sena, Eduardo Pardo Coelho / Folhetos (31) raros da Polémica do Bom Senso e do Bom Gosto / O Terrível Engano, de LFT, sep. do artigo do DP de 2 de Nov. 1949 sobre a morte de Carlos Queiroz em Paris / Manuscrito Inédito de Arnaldo Saraiva, dactilografado e corrigido à mão de 1961 (refª a Ruy Belo, Cesariny, Herberto Helder, O'Neill) / Cartas manuscritas e um original dactilografado de Agostinho da Silva / Cartas (8) de Philippe Soupault .

sábado, 6 de março de 2004

LEILÃO DE LIVROS – Dias 15, 16 e 17 de Março de 2004

Resenha Bibliográfica da Biblioteca que Pertenceu ao Escritor, Crítico Literário e Académico Luiz Forjaz Trigueiros - 2ª Parte

Literatura Portuguesa, Brasileira, Francesa / Espanhola, História e Arte, Filosofia, Poesia / e ensaios, incluindo um Invulgar e Valioso / conjunto de Manuscritos Autógrafos / (Cartas, Postais, Originais e Cartões de Visita) / dos mais Consagrados Escritores, Poetas, / Artistas e Políticos do Século XX / Segunda Parte / ... / sob Direcção de José Manuel Rodrigues (Livraria Antiquária do Calhariz, Lisboa)

Local do Leilão: Casa da Imprensa, Rua da Horta Seca, nº 20 – Lisboa

Trata-se da segunda parte do leilão da Biblioteca de Luiz Forjaz Trigueiros, após o leilão de Setembro de 2003. Apresenta 975 peças, sendo de referir um conjunto importante de manuscritos autógrafos de inúmeros escritores portugueses e brasileiros. Apresenta, ainda, na introdução ao catálogo, um excerto dum texto de LFT, "Presença da Literatura Brasileira em Portugal", bem como reproduções de algumas fotografias a leilão (ex: Jorge Amado, Paul Valery ou Vitorino Nemésio).

Algumas referências: Cartas de Francisco Luís Amaro (da Revista Colóquio/Letras) salientando o centenário de Mário Beirão e c/ muita informação literária / Carta de José Carlos Ary dos Santos, c/ papel timbrado dos «Studios Zeiger», Março de 1964 / 4 Cartas de Henrique Barrilaro Ruas, c/ destaque para a última (1991) sobre o Partido Popular Monárquico: «Por mim, penso que, feita que foi esta última experiência, importa acabar. Acabar como partido. Não resultou, paciência» / Cartas (18) e postais (3) de Pierre Benoit para Forjaz Trigueiros, de 1948-1958. Refira-se à informação trocada sobre o romance «Prête Jean» (Fev. 1952), "dedicado a Portugal, ao sebastianismo e a Sidónio Pais" / Carta(s) de Augustina Bessa-Luís, c/ especial refª a uma, datada de Agosto de 1989, sobre a admissão de ABL à Academia Brasileira, tendo o apoio de LFT, onde o agradecimento de ABL é "simplesmente admirável" / Conjunto importante de livros sobre o Brasil, desde Arte, Critica Literária, Festas Populares, Poesia, ... / Carta(s) de Marcello Caetano, salientando-se um cartão onde é feito "um comentário crítico à selecção" de LFT para uma "antologia sobre Angola", que teria deixado desgostoso MC, dado não terem sido incluídos "Vicente Ferreira, Couceiro, Hipólito Raposo, Maria da Graça Azambuja e Reis Ventura" / Valioso conjunto de centenas de cartões de visita de alguns escritores e intelectuais portugueses / Original de Fernanda de Castro, poema ms. "A Mestra de Lavores", 1940-50 / Cartas de António Celestino, enviadas de S. Salvador da Bahia, C/ inúmeras refª a Jorge Amado e amigos bahianos (Carybé, Genaro) / Original dactilografado e assinado de 7 poemas de Ruy Cinatti e um outro original com 6 poemas (nov. 1976-Jan. 1977) / Fotografia de T. S. Elliot, tirada "em Évora", Maio de 1938, identificando-se, "Fernanda de Castro, D. Maria Eça de Queiroz, T. S. Elliot (de calças à golf),..., Alberto Cutileiro, Forjaz Trigueiros" [Continua]

sexta-feira, 5 de março de 2004

Que Portugal ...?

"... Que Portugal se espera em Portugal?
Que gente ainda há-de erguer-se desta gente?
Pagam-se impérios como o bem e o mal
- mas com que há-de pagar-se quem se agacha e mente?
..."

[Jorge de Sena, L'été au Portugal, in Exorcismos, 1972]

Todos Loucos

Não estamos bem. Diremos mais, estamos perfeitamente esquizofrénicos. A bagunça é total. Quem acompanhar as manchetes dos jornais e da rádio julgará, certamente, que é assombração astral. A vida pública portuguesa atingiu o grau zero da estultícia. Quem é que anda aí? Vejamos: dizem, aqui, que das 127 fotos do álbum fotográfico do processo Casa Pia, mostradas às testemunhas, 126 são de indivíduos famosos. E logo, como peixeirada, o jornal publica-os na primeira página. Extraordinário. O segredo de justiça é um engano de olhos. A realidade, afinal, é a súplica do Ministério Público (santa incompetência) do levantamento da imunidade parlamentar a estes deputados, por violação do segredo de justiça. Encantador. Parece aquele "descer lentamente com o vagar de quem sobe". O Presidente da Câmara de Lisboa, putativo candidato a candidato presidencial, desenvolve um excelente exercício de cidadania: convidar, via McDonald's (só podia), alunos do primeiro ciclo de escolaridade para assistir ao Euro 2004. A condição é que não possuam "deficiência física ou mental em virtude da necessidade de acompanhamento especial". Pois, assim dito à maneira americana, é magnífico e prenhe de cidadania. Ao clarim da McDonald's o candidato Santana Lopes certifica primeiro, volta atrás depois. Ainda não é desta que vemos a luz ao fundo do túnel. É natural. Afinal, temos de ter a prudência da serpente, é que "com a chegada das andorinhas, nunca se deve modificar o andar”". Evidentemente.

quinta-feira, 4 de março de 2004


Converta-se!

Este rapaz, aqui ao lado, é de muita estimação. Não se troca contra reclamação. Se o procurarem nos jornais, desistam, não está à venda. É um poeta da baliza. Um encantador da arte de bem jogar. Um trovador encarnado. Um devir da juventude. O rei da baliza. Não está à venda, juramos. A sua arte é a nossa vaidade. O seu aprumo a nossa glória. A sua qualidade a nossa emoção. Vede como a felicidade lhe está no rosto. Exacto, sublime, insolúvel. Restos de um passado ou um passo de esperança? Um dia todos descobriremos que tudo não passou de um mau sonho. Converta-se!


Eugénio de Castro [1869-1944]

n. em Coimbra a 4 de Março de 1869

"... O amor da beleza não é, mesmo quando parece excluir o amor da vida, uma manifestação de pessimismo. Eugénio de Castro, ensinou, pela alta qualidade e também pela quantidade dos seus livros, a crença na arte, a fé no esforço e na consciência do poeta. Foi o contrário dum portador de desânimo.
Desdenhoso e seguro, ao ver os nossos últimos parnasianos conduzirem a poesia a uma soporífera banalidade, lançou-se com «Oaristos», logo seguido de «Horas», em pleno entusiasmo simbolista. Exageros voluntários, emprego de palavras raras ou arcaicas, uso de imagens estranhas, ressurreição de ritmos antigos, simultãnea à adopção do verso livre - conquista dos simbolistas franceses - audácias verbais, explendor de adjectivação, tudo isso empregou para forçar a atenção de aqueles que não sentiam a decadência do nosso lirismo, ou que se acomodavam com ela (...) «Oaristos» caiu como uma enorme pedra na água estagnada da nossa poesia! Levantou água que a todos salpicou e lavou. Provocou espanto, critica, ironias, troças. Mas exerceu uma acção salutar e rápida! A nossa poesia contemporânea deriva em grande parte da obra de Eugénio de Castro, e o seu livro marcou uma data histórica ..."

[João de Barros, da Hist. de Portugal, vol III, in Obras Po?tica, vol IX, Portucalense, 1944]

"... Amores venaes, concupiscências luciferinas:
Ruth, a fermosa bruna, e Basalisa, a loira,
Theodora, a ruiva como as tangerinas,
Mas, sobre todas: Basalisa, a loira ...
Oh os seus olhos! Sua unhas em amêndoa! E em cálix
O seu collo! E seus dedos digitalis!
E quando, n'uma noite de flagrancias,
(Lembrando isto todo o coração me doe!)
Forte enleei, apoz violentas reluctancias,
Sua ancas de Deusa em meus braços de Heroe! ...
"

[EC, in Horas, 1891]

quarta-feira, 3 de março de 2004

Bêbado

"Bêbado nas tuas mamas me imiscuo
príncipe pária ou só vadio desejado
às mãos livres da viola me jejuo
lábios revoltos de sede mas sem fado
"

[Dórdio Guimarães, in Canto Psicadélico, 1968]

Marguerite Duras [1914-1996]

m. em Paris, a 3 de Março de 1996

"... Noites inteiras ao telefone. A dormir de encontro ao auscultador. A falar ou calados. Fruem um do outro. Orgasmo negro sem contacto nem rosto. Olhos fechados. Só a voz, o texto das vozes diz os olhos fechados.
É ela a primeira a querer vê-lo. Encontrá-lo.
Muitos encontros combinados. À última hora desmarcados. Há sempre circunstâncias imprevistas a impedir o encontro. Ele não se admira com a permanência do impedimento dos encontros. Acredita sempre que são possíveis. Acredita nela.
Todos os que gritam de noite nas catacumbas do telefone parisiense combinam ver-se. Os encontros nunca se dão.
Ela combina duas espécies de encontros. Os que são desmarcados. Os que não têm tempo de desmarcar. Ele vai a todos os encontros.
Em breve, ele torna-se incapaz de mudar o rumo à historia (...)"

[Marguerite Duras, O Navio «Night», in Revista Abril, nº 9, 1978]

"... A pele é duma sumptuosa suavidade. O corpo. O corpo é frágil, sem força, sem músculos, poderia ter estado doente, estar em convalescença, é imberbe, sem outra virilidade que a do sexo, é muito fraco, parece à mercê de um insulto, débil. Ela não o olha no rosto. Não o olha. Toca-o. Toca a doçura do sexo, da pele, acaricia a cor dourada, a desconhecida novidade. Ele geme, chora. Está num estado de amor abominável.
E a chorar fá-lo. Primeiro há a dor. E depois esta dor é por sua vez possuída, transformada, lentamente arrancada, levada até ao gozo, abraçada a ela. O mar, sem forma, simplesmente incomparável (…)

[M. Duras, O Amante, Difel, 1984]

Locais: Marguerite Duras Homepage / Biografia / Outra Biografia / Marguerite Duras / Marguerite Duras (1914-1996) / Bibliographie, Filmographie / Obras / Société Marguerite Duras / Le cinéma de Marguerite Duras / Duras : La Pute de la côte normande / Duras mon amour

terça-feira, 2 de março de 2004

Enlouquece-me

Enlouquece-me esse teu jeito de despir as meias
o desatar morno e usado do negro ligueiro
depois os beijos de êxtase em êxtase
o desarrumar dos lençóis sem ênfase
pofs de cisterna em bolhas de carne
navegar-te vagina a vagina até fixá-la no meio
pecado seria por fim não adormecer no teu seio
num sono que nos dormindo ainda mais arde


[Dórdio Guimarães, in Canto Psicadélico, 1968]

Extravagâncias

- Como se percebe, o todo poderoso senador do PP, Avelino Ferreira Torres, mais uma vez se estribou nos diversos poderes que tutela e que o protegem. O MAI fechará os olhos com a súplica governativa; a Comissão de Disciplina, cujo representante é, ao que foi dito na SIC-Notícias, uma testemunha abonatória desse senhor no julgamento desta semana, irá repreendê-lo por alguns jogos; a Liga de Futebol, excelentemente dirigido pelo lerdo Valentim Loureiro (noutras ocasiões já teria aparecido para lançar a confusão ou vilipendiar alguém), seguirá o receituário processual e aplicará as penas costumeiras, mesmo que o presidente do IND "esteja chocado" e os portugueses perplexos; a gentalha do futebol mostrará enfado, mas irá desculpá-lo; os cidadãos de Marco de Canaveses, que há 20 anos tacteiam a democracia, partirão à desfilada em sua defesa. O fanfarrão e delinquente AFT pode restar em paz. É que nesta adorável promiscuidade entre politica e futebol, nem o senhor Berlusconi nos ensina o que quer que seja. Eis tudo!

- É impossível não ficar arrepiado com as interpretações proferidas sobre o caso da espionagem na ONU, pelo director de um jornal nacional, neste caso José Manuel Fernandes d'O Público. O patriarca da democracia, numa lógica que fulmina qualquer um, considera que as coisas [entenda-se, a violação de privacidade] foram sempre assim e, portanto, nada a obstar. Mais, pondera que a senhora ex-ministra Clare Short foi possuída de vaidade irritante contra o amigo (de JMF, evidentemente) Blair. Que falta de cavalheirismo tem JMF. Seria bem melhor que tivesse destacado a recusa da administração Blair em divulgar o parecer do Procurador-Geral da GB, Peter Goldsmith, sobre a legalidade da guerra contra o Iraque e, claro, a sua legitimação. Ou depois das ADM será este um novo tabu dos novos neocons?

- Sem qualquer extravagância, a não ser pela movida bloguística verificada, o Mata-Mouros aderiu a novos estilos, outros debates, novas solicitações. Fecharam a Loja e deram o salto para as Blasfémias, formigando com outros escribas. A não perder * Parabéns para o umblogsobrekleist que fez 1 ano de talento de bem dizer/escrever e para o regresso da Formiga de Langton nestes dias mais espaçados de Março. Como está linda a blogosfera!

segunda-feira, 1 de março de 2004


Fantasia para Dois Défices e Uma Perdiz

Ainda inspirados pelo cumprimento da caldeirada à Manel Pinovai - mestre das bandas do Furadouro - e antiquíssima sugestão do confrade Manuel Carvalho, somos aliciados para uma "perdiz desossada", arriscada expectativa vinda da ala Eborense. Nada contra a carne saborida, embora dependendo do recheio que é para isso que se vai, como já me garantia meu avô, na sua bondade de alentejano. Mas o esgotamento da jornada e a vigilância caseira a isso impede. Adiante, que como assegurava Fialho, "não há poesia mais bela do que a fome. Dos outros, é certo ..."
Mas é sobre um outro prato nacional - défice de caldeirada com receitas extraordinárias -, bem fornecido das ditas em alegre conúbio, segundo o contento dos clientes, que há alguma confusão. Por um lado, o liberal de Évora, despeitado ao que se presume, entende que a blogosfera é uma espécie de entronização de emails privativos, uma coreografia curiosa e licenciosa que poucos têm acesso e, assim sendo, passa desabridamente ao murmúrio que reina por aqui presunção e altivez. Tem razão. "Nós somos do século de pregar os caixotes de inventar as palavras" (MCV). Que se há-de fazer? Por outro lado, reconhece que no seu nobilíssimo "divertimento", liberrimamente corrosivo já se vê, propinado à plebe, a governação da nação e do país pode ser entendida enquanto mera gestão empresarial, e que na falta de um "gestor" em carteira qualquer fantástico contabilista pode ser primeiro-ministro. Estamos de acordo, mais uma vez. A ser assim, pode ficar de pé a sugestão para a "perdiz desossada", desde que a factura não seja pedida em nome da Icily Lda, ou do tal amigo Ambrósio. Niguém lhe perdoaria.
Álvaro Ribeiro [1905-1981]

n. a 1 Março de 1905

"Às horas de leitura, nos cafés, durante a manhã, sucediam-se as horas de «conspiração» politica, no final da tarde e princípios do serão. Era então que doutrinava e activava a «Renovação Democrática», em reuniões com outros «conspiradores», todos mais abastados do que ele, alguns até com rendimentos e heranças, como Casais Monteiro e Domingos Monteiro. No intervalo das reuniões, quando cada um ia jantar a casa, Álvaro Ribeiro bebia um «garoto» numa leitaria e sentava-se num banco da Avenida à espera dos outros. Findas as horas da política começavam as da boémia nocturna, o passeio pelos clubes onde se jogava o bingo e pelas casas de fados (...). Assim difícil, pobre, quase miserável, este período da sua vida foi também o mais romanesco, e sobre ele veio mais tarde a escrever um romance que nunca publicou e acabou por destruir (...)
Quando rebentou a guerra de Espanha e a politica se exacerbou, chegou a ser ameaçado por «legionários», perseguido na rua e insultado nos cafés. Acabou por arranjar um emprego em que era uma espécie de «contínuo» para salvaguarda, sendo ele «licenciado», dos prestígios da Universidade. E uma vez terminada a guerra de Espanha e estabelecida a pacatez salazarista, um governante, Castro Fernandes, conseguiu colocá-lo em modesto lugar de um organismo corporativo onde se conservou toda a vida. (...)
A existência de Álvaro Ribeiro passou então a decorrer entre as horas do emprego, que eram apenas as do começo da tarde, e as horas de ler, escrever e conversar nos cafés (...) Como José Marinho viesse também para Lisboa no final dos anos 30, formou-se em torno dos dois uma tertúlia que durou até à morte do Álvaro em 1981. Aí se iniciaram ou exercitaram no convívio intelectual os homens mais representativos se sucessivas gerações, as de Eudoro de Sousa, José Blanc de Portugal, Jorge de Sena, António Quadros, António Telmo ou Braz Teixeira; aí foram buscar inspiração, adequada informação ou vias de desenvolvimento, personalidades como José Régio, Almada Negreiros, Casais Monteiro, Domingos Monteiro, José Osório de Oliveira, Moura e Sá, Carlos Queiroz ou Cunha Leão. A doutrina do número de ouro, que dominou a arte de Almada, foi ali haurida; a «descoberta» de Fernando Pessoa, ali surgiu. O camoneanismo de Jorge de Sena, ali se formou. E bem assim o sebastianismo ou anti-sebastianismo de José Régio, o lusitanismo de José Osório, o filosofismo de Moura e Sá. Ali tiveram origem muitas revistas literárias, desde «Litoral», de Carlos Queirós, e «Atlântico», de José Osório, ao «57» e «Acto», de António Quadros, e aos «Teoremas de Teatro» e «Escola Formal», do autor destas linhas (...)"

[Orlando Vitorino - "Álvaro Ribeiro", in Nova Renascença, Outono de 1982]

sábado, 28 de fevereiro de 2004


Vox Populi

Receitas Extraordinárias – Confirma-se que a blogosfera, fazendo gala de bem medir a crise económica e orçamental, está uma sublime congregação de oradores da coisa económica. Neófitos da economia política, saltando fatigados das sebentas imaculadas do défice, tacteiam o campo da lide esgrimindo aplausos do gentio. A cortês troca de opiniões entre o divino Terras do Nunca e este galhardo liberal eborense fulmina qualquer um. A trovoada de argumentos do verdadeiro crente do défice com receitas extraordinárias, novo menu chic neoliberal ou "conduto enganando a vontade de comer enquanto os sonhos passam", é uma espantosa rincharia que resulta numa promiscuidade interessante entre o que deve ser a politica económica e uma mera operação contabilística. Aliás, para quê tanta aplicação no estudo da economia? Bastava entregar o país a um esplêndido contabilista, que a coisa se desenvencilharia ad nauseam. Como se percebe, o facto das receitas extraordinárias equivalerem a 80% do défice é absolutamente normal. O cego do engenheiro Guterres é que não tinha sensibilidade para a contabilidade, pois se acedesse aos mimos contabilísticos do liberal eborense, não existiria hoje o tão malfadado défice. Nada mais justo.

Várias: Dispensando o branqueamento da situação económica do país, conscientes que a crise económica e orçamental é a pior que há memória, parece que os sindicatos e o patronato estão na mesma luta, a saber: abaixamento de impostos e fim imediato do congelamento salarial. Coisa que não deve incomodar os ultramontanos da Mercearia Barroso & Leite, entretidos que estão a contabilizar o défice * José Manuel Fernandes, combalido no seu affaire de democratizar todo o mundo e ninguém, discorre sobre os caminhos de Bagdad. A copiosa explicação segue dentro de momentos nas bancas perto de si. Sem armas de destruição maciça descobertas, com a opinião pública mundial a morder nas canelas dos fazedores de historietas, resta a JMF lutar, como dantes, pela revolução democrática e popular, procurando implementar a democracia em todos os quintais do planeta. Assim Bush queira e Fernandes & Delgado o aprovem. Observemos, pois.

100 Anos do Sport Lisboa & Benfica – Do fundo do coração

[Convocatória] Ficam, desde já, convocados todos os cavalheiros livres dedicados à causa encarnada, lusitanos doutíssimos, damas distintas ou varões loquazes, a participarem nas comemorações dos 100 Anos do SLB. Com emoção, partimos em 1904 ignorantes e saloios, estamos hoje inteligentes, razoáveis e sensatos. Entrámos em todos as terras e subimos todos os degraus. Vil terror não coube em nós. Dissipado o nevoeiro, retomaremos a ventura. Por obra e graça de José Rosa Rodrigues, Daniel Brito e Manuel Goularde, nossos padroeiros e altíssimos protectores. Somos felizes. Mas mesmo assim, é favor trazer os azeviches para dar figas aos maus-olhados. Nós por cá todos bem. Dada à lux por cavaleiros devotos da saudade encarnada. Aqui, mar da Alma.

Baptista Bastos - 70 Anos - Um Homem Livre

[Ao Júlio Gomes. BB, Torreira, Clepsydra, ..., porque ainda há memória]

"É um jogo de cortesãos e liberais, o brídege. Os seus práticos teriam frequentado os salões da gentil conversa se fossem cidadãos de Setecentos. Reunidos, neste grupo numeroso, não perderam os prestígios conferidos pela Casa, pelo Sangue e pela Razão. Os gestos são delicados, afáveis e eficientes - e não esquecem nunca essas graças e essas virtudes mesmo quando as horas já são longas e podem alvitrar hipóteses de negligência, descuidos no trajar, bocejos distraídos. Isto, os homens. Porque as mulheres, com o correr do tempo, manifestam uma exuberância mais viva, tornam-se mais expeditas na acção, a frase fica-lhes solta e muito bem, a maquilhagem principia a despedaçar-se e a fornecer-lhes uma face nova e outra, terrosa e fatigada. Pontas de cigarros em dezenas de cinzeiros, copos vazios, com cinza, e fumo ainda mais denso e intenso, e há em todos um pudor em espreguiçar-se e as têmporas latejam, as dores nos rins atingiram uma fase tão dolorosa que ninguém as sente, é como o suportar resignado de um fardo pesadíssimo, mas o raciocínio tem de ser frio e veloz – e, de repente, a Maio da sala, um jogador boceja alto e estica o dorso na cadeira. Olham-no. Cento e setenta e seis olhos a olhá-lo, e também de repente trinta dos quarenta e quatro pares bocejam em varias tónicas e esticam os dorsos nas cadeiras.
- Silencio - diz um dos membros do júri."

[Baptista Bastos, in As Palavras dos Outros, Eur.- América, 1968]

Catálogo nº 64 da Livraria Bizantina, Fevereiro 2004

A Livraria Bizantina - Rua da Misericórdia, nº 147 (ao cimo da Trindade), Lisboa - lançou o seu catálogo nº 64, com 486 peças a preços excelentes e convidativos. Uma local de frequência obrigatória para bolsas menos abonadas. O amigo Bobone está de parabéns.

Algumas referências: Proscritos. Noticias Circunstanciadas do que passaram os Religiosos da Companhia de Jesus na Revolução de Portugal de 1910, por S. J. L. Gonzaga de Azevedo, Valladolid, 1911 / Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Romântica, de Manuel Bandeira, Rio de Janeiro, 1937 / Les Instruction Secrètes des Jésuites, por Paul Bernard, Paris, 1907 / Subsídios para a História Económica de Portugal, por Fortunato de Almeida, Porto, 1920 / A Cruz de Villa Viçosa, de Rodrigues Vicente d'Almeida, 1908 / Annaes das Sciencias, das Artes e das Letras. Por huma Sociedade de Portuguezes Residentes em Paris, Paris, 1818, II vol / Diabruras, Santidades e Prophecias, de A. C. Teixeira de Aragão, Lisboa, 1894 / O Encoberto, de Sampaio Bruno, Porto, 1904 / Camilo Desconhecido, por António Cabral, Lisboa, 1918 / Memorias de um Estuante de Direito, de Rafael Salinas Calado (1911-1916), Coimbra, 1961 / Carta Constitucional da Monarchia Portugueza, Coimbra, 1863 / Memoria de António Maria de Fontes Pereira de Mello..., Lisboa, 1887 / Colecção Chronologica dos Assentos das Casas da Supplicação e do Cível, Coimbra, 1817 / Arte e Arqueologia, de Vergílio Ferreira, Lisboa, 1920 / Vasco Fernandes. Mestre do Retábulo da Sé de Lamego, por Vergílio Ferreira, Coimbra, 1924 / Correspondência Epistolar entre José Cardoso Vieira de Castro e Camilo Castelo Branco, 1968, II vol / Os Povos e os Reis. Opúsculo Offerecido aos Portuguezes, de Faustino José da Madre de Deos, Lisboa, 1825 / Descrição Minuciosa do Monumento de Mafra. Com uma Noticia de Cintra, ..., por Joaquim da Conceição Gomes, Lisboa, 1876 / Barros de Coimbra, por Afonso Duarte, Lvmen, 1925 / Os Desenhos Animistas de uma Criança de 7 Anos, de Afonso Duarte, Coimbra, 1933 / Compendio dos Escritos e Doutrina do Venerável João Gerson, por António Pereira de Figueiredo, Lisboa, 1769 / Lista de Alguns Catálogos e Bibliothecas Publicas e Particulares, de Livreiros e Alfarrabistas, de Martinho da Fonseca, 1913 / Perfil de Camillo Catello Branco, pelo Padre Senna Freitas, Porto, 1888 / In Memoriam do Professor Dom António Xavier Pereira Coutinho, pelo Conde de São-Paio, 1941 / Livros de Linhagens, Edições Biblion, V vols, 1937 / O Monumento de Mafra. Guia Ilustrado, 1906 / José Estêvão. Esboço Histórico, por Jacinto A. Freitas Oliveira, Lisboa, 1863 / Processos e Julgamento de José Cardoso Vieira de Castro, Lisboa, 1870 / Compendio das Minas. Dedicado ao Sereníssimo Senhor D. João Príncipe do Brazil, por José António da Rosa, Lisboa, 1794 / Jornais e Revistas do Distrito de Coimbra, por A. Carneiro da Silva, 1947