quarta-feira, 3 de março de 2004


Marguerite Duras [1914-1996]

m. em Paris, a 3 de Março de 1996

"... Noites inteiras ao telefone. A dormir de encontro ao auscultador. A falar ou calados. Fruem um do outro. Orgasmo negro sem contacto nem rosto. Olhos fechados. Só a voz, o texto das vozes diz os olhos fechados.
É ela a primeira a querer vê-lo. Encontrá-lo.
Muitos encontros combinados. À última hora desmarcados. Há sempre circunstâncias imprevistas a impedir o encontro. Ele não se admira com a permanência do impedimento dos encontros. Acredita sempre que são possíveis. Acredita nela.
Todos os que gritam de noite nas catacumbas do telefone parisiense combinam ver-se. Os encontros nunca se dão.
Ela combina duas espécies de encontros. Os que são desmarcados. Os que não têm tempo de desmarcar. Ele vai a todos os encontros.
Em breve, ele torna-se incapaz de mudar o rumo à historia (...)"

[Marguerite Duras, O Navio «Night», in Revista Abril, nº 9, 1978]

"... A pele é duma sumptuosa suavidade. O corpo. O corpo é frágil, sem força, sem músculos, poderia ter estado doente, estar em convalescença, é imberbe, sem outra virilidade que a do sexo, é muito fraco, parece à mercê de um insulto, débil. Ela não o olha no rosto. Não o olha. Toca-o. Toca a doçura do sexo, da pele, acaricia a cor dourada, a desconhecida novidade. Ele geme, chora. Está num estado de amor abominável.
E a chorar fá-lo. Primeiro há a dor. E depois esta dor é por sua vez possuída, transformada, lentamente arrancada, levada até ao gozo, abraçada a ela. O mar, sem forma, simplesmente incomparável (…)

[M. Duras, O Amante, Difel, 1984]

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