quarta-feira, 14 de julho de 2004


Partido Socialista: um imenso vazio (I)

"A piedade é cruel. A piedade destrói. Não há amor seguro quando a piedade espreita" [Graham Greene]

Estes últimos anos, com a incapacidade desconcertante de regenerar a classe política que as corporações de interesses que habitam em cada partido não permitem, têm sido uma lista de mazelas amargurada, uma fatigada e corrosiva tortura, uma desastrada cacofonia de disparates que dramatizam a vida social e política portuguesa. E na verdade pouco há, ainda, a esperar quando somos suspeitosos de quedarmos "ser sem desejo, sem despeito, sem revolta" [G. Pérec].

Varridos pelo presumido imprevisto que a indecorosa decisão de Jorge Sampaio fez tombar no espectro político-partidário, aturdidos pela obscenidade de ter um primeiro-ministro estouvado politicamente e obsequiante partidariamente, indiferentes ao "assassinato" político de Ferro Rodrigues (que muito a jeito se colocou, diga-se) por acofiados analistas e pela "tralha" socialista, descobrimos, de repente, que estamos manietados em "jogos de poder" que lamentamos, mas que somos impotentes para ultrapassar. Porém, a emotividade da putativa indignação que nos assalta faz-nos desprezar as origens desta agonia que a crise política comporta. Fala-se, evidentemente, do clientelismo e do monopólio dos interesses que nas estruturas partidárias substituem o carácter, a coragem e a verdade de servir os cidadãos e o país. Essa estranha maldição, resultante da conflitualidade entre "tradição" e "modernidade", não pode interferir no nosso labirinto dos afectos sob pena de cairmos no dizer de Cesariny de Vasconcelos: "aquele que se mete a autorizar a autoridade de quem desautoriza não sabe no que se mete".

[a continuar]


no dia do nascimento de Ingmar Bergman
[Não me venham dizer]

"Não me venham dizer
que os choupos despidos lembram mágoas
se o sol os veste, solitários e altivos,
erguidos sobre as águas

Longe vem vindo os barqueiros,
metidos no rio até às virilhas.

Nas ínsuas correm em liberdade os potros,
embora mais tarde vão pelas estradas,
seus flancos cingidos pelas cilhas"

[João José Cochofel, in Canção monótona para adormecer o poeta]

terça-feira, 13 de julho de 2004


[Sótãos]

"... quando era muito pequenina, também eu tive o meu sótão forrado de jornais velhos, assim com uma janela luminosa

(Os jornais rasgavam-se a toda a hora pois até no chão havia. Inspecção maternal impôs paredes brancas. Revolta filial impôs paredes pintadas com palavras de revolta. Tabefe maternal repôs a ordem)...

nos vários sótãos que fui tendo havia clubes de malfeitores, redacções de jornais que não passavam do primeiro número e cuja equipa era composta apenas por Miss Josephine Marsh, gargalhadas, brigas de vida ou morte, confidências, o funeral de um pássaro morto, reis, rainhas, pobres esfarrapados, aventureiros, o Tom Sawyer, o Huck e gatos com pulgas, um "single" dos Beatles que tocava Love Me Do e outras que não me lembro, livros aos montes, caixas de bolachas, festivais da canção e concursos de dança. E, na maior parte das vezes, só lá estava eu e uma seita de criaturas inventadas ...

Hoje (...) falta-me o sótão e a solidão". [de R. Maltez, enquanto vela o mar, as gaivotas e o pinhal del Rey. Afinal "canto nosso até ser fado"]


Papus (1865-1916)

n. na Coruña a 13 de Julho de 1865


Locais: Papus (1865-1916) / Papus / Biografia (pt) / Papus (idem) / Docteur Gérard (Anaclet Vincent) Encausse / Dr Gérard Encausse, dit "Papus" (1865-1916) / Papus and L'Ordre Martiniste / Notas sobre el ocultismo en la poesia hispanoamericana moderna / O Mago, Metáfora do Poeta / Parte Iniciática: o Ocultismo (Papus)
Livros & Arrumações

- importante publicação do manuscrito «Despertador da Agricultura de Portugal» de autoria do intendente D. Luís Ferrari Mordau, valioso para a história da economia portuguesa do século XVIII, sob direcção de Moses Bensabat Amzalak, Lisboa 1951. Inocêncio Francisco da Silva e, posteriormente, Brito Aranha (Bibliografia da Exposição Agrícola de 1884) referem-se a Luiz Ferrari Mordau e ao seu livro manuscrito, ao que parece adquirido "por Brito Aranha à família do falecido juiz Almeida do Amaral que o comprou entre os anos de 1830 e 1840 a uma ferro velho". Diz-se mais: "Por estas indicações sabe-se que pelo menos existem dois exemplares deste manuscrito um na Biblioteca Pública Eborense, e outro que pertenceu a Brito Aranha e cujo paradeiro actual ignoro". Amzalak na sua introdução refere que o «Despertador da Agricultura de Portugal», "reflecte as ideias da época sobre a agricultura [e] revela a influência do fisiocratismo".

- um artigo de A. De Magalhães Basto, publicado no Terceiro Congresso (p. 461 a 491) intitulado "Notícia dos manuscritos pertencentes à história do reinado de D. Sebastião que existem na Biblioteca Pública Municipal do Porto". Curioso.

- invulgar "mensário de critica livre" denominado "Pró Musica", propriedade e edição de Ruy Coelho. No nº 1 (1 de Novembro de 1916) existe uma polémica interessante com Freitas Branco, Humperdinck, Moreira de Sá e o próprio Ruy Coelho.

segunda-feira, 12 de julho de 2004


Santana: o primeiro coelho da cartola

"Quem espera por sapatos de defunto morre descalço" [J. César Monteiro]

Há no discurso de Santana Lopes, ao fim de contas, um aliciamento que faz vibrar a alma de uma qualquer mulher-a-dias ou de cavalheiros aborrecidos pelo tédio dos botequins. O rebanho chocalhante, assim respigado do anonimato, crepita de paixão ao ritmo de cada frase do Lopes, silva em alarido durante qualquer exposição do sagaz Santana, harpeja conspicuamente em defesa do admirável Pedro. O que se ouviu, neste dia, pelas rádios e TV's é esclarecedor. Eis, de facto, PSL no seu melhor.

A choramingada lamúria que hoje ressurgiu, com o enlevo emotivo do grandioso lançamento do cenário PSL na SIC e contra a "inaudita" trovoada de argumentos do enxame oposicionista, como se esperava conseguiu os seus intentos. Os indígenas, nos quais devotamente nos filiamos, num tropel de desatino delicioso, prestaram-se a analisar, debater e improvisar o primeiro coelho que o Pedro Santana Lopes tirou da cartola, a saber: a deslocalização ministerial.

Foi isto, de facto, que o fulgurante Lopes, depois de muito matutar, deixou cair para entreter os analistas e embalar a opinião pública. No tempo que dura o queimar de um fósforo, o novo primeiro-ministro conseguiu por toda a gente a discutir a "obrinha" populista saída da sua imaginativa actividade intelectual, deixando cair o pouco sério (já se vê) esclarecimento sobre o programa económico e social da nova governação.

Muitos mais coelhos serão rigorosa e oportunamente lançados à multidão. O espectáculo aí está. Pobres daqueles que pensavam em grandes magias e erudições políticas. Basta um coelho de cada vez, para não desenganar a grandeza do génio. Podem crer.

Pablo Neruda (1904-1973)

n. no Parral (Chile) a 12 de Julho de 1904

"... As pessoas atravessam o mundo na actualidade
quase sem recordando que possuem um corpo e dentro dele a vida,
e há medo, há medo no mundo das palavras que designam o corpo,...
"
[P.N., in Ritual da Minhas Pernas]

"... licenciado, ingressa na carreira consular e a folha oficial nomeia-o par a Birmânia. Aí escreverá grande parte da famosa Residência en la tierra, experiência maior que se oferece à discussão - ainda hoje - dos pesquisadores de ressonâncias surrealistas (...) Será em Buenos Aires que ele conhece pessoalmente Lorca.
Esta vivência espanhola, coincidente grosso modo com a guerra civil, aprofunda a viragem de Pablo Neruda em direcção à temática social, viragem para a qual já arrancara, mas que é sedimentada agora pela proximidade da luta. Leia-se como exemplo a Tercera residencia (1942), e principalmente os poemas de España en el corazón, ali incluídos depois duma publicação autónoma em 1937. Dessa época há a recordar ainda a co-organização, com Aragon e outros, do Congresso dos Escritores (Madrid, 1937), e a direcção duma revista, Caballo verde para la poesia, onde colaboram os principais nomes engagés da época ..." [Fernando Assis Pacheco, in Prefácio à Antologia Breve de Pablo Neruda, Cadernos de Poesia, D. Quixote, 1969]

"Eu rio-me,
sorrio
dos velhos poetas,
eu adoro toda
a poesia escrita,
todo o orvalho,
lua, diamante, gota
de prata submergida
que foi o meu irmão de outros tempos
acrescentando à rosa,
mas
sorrio,
dizem sempre «eu»,
a cada passo
sucede-lhes qualquer coisa
e é sempre «eu»,
pela rua
só eles andam
ou a doce amada,
mais ninguém,..." [P.N., in O Homem Invisível]

[Portugalidade]

"Menina e moça me levaram de casa de meu pai para longes terras. Qual fosse então a causa daquela minha levada - era pequena - não na soube" [Bernardim Ribeiro]

"... não temos que criar um mito, senão que renová-lo. Comecemos por nos embebedar desse sonho, por o integrar em nós, por o incarnar. Feito isso, cada um de nós independentemente e a sós consigo, o sonho se derramará sem esforço em tudo que dissermos ou escrevermos e a atmosfera estará criada, em que todos os outros, como nós o respirem. Então se dará na alma da nação o fenómeno imprevisível de onde nascerão as Novas Descobertas, a Criação do Mundo Novo, o Quinto Império"
[Fernando Pessoa]

"A verdade não pode ser transmitida à humanidade porque a humanidade não a compreenderia. Só por símbolo, portanto, pode a verdade ser-lhe dada; de sorte que vendo o símbolo sinta a verdade sem a compreender" [Fernando Pessoa]

[Bibliomanias & Almocreve]

domingo, 11 de julho de 2004

[Ainda Sophia]

"Neste país, paraíso triste, de séculos em séculos acontecem milagres.
A Sophia foi um dos milagres acontecidos à nossa alma. Visionária do visível, reinventou uma sonoridade límpida para os nomes que damos às coisas, o mar, a luz, o fogo, a cal dos quartos onde se cresceu só, a justiça, a liberdade. Durante anos levantou a cabeça das nossas crianças para o assombro.
Fê-lo por uma conjunção muito difícil de encontrar no ser português: a paixão da claridade e a capacidade de confronto com o caos. Acho que foi essa a essência da sua vida e da sua obra: usar o gume da palavra clara e justa contra o horror e a espessura opaca do mundo que não cessaram nunca de a acossar. Perdemos também isso e a sua incitação a uma alegria por vezes feroz; indomável como a das grandes crianças. Perdemos a menina do mar alto ..."

[Maria Velho da Costa, Visionária do Visível, texto lido na missa para Sophia de Mello Breyner Andresen, na Igreja da Graça, em Lisboa, a 4 de Julho de 2004]

Maria Lurdes Pintassilgo - uma Missão Cumprida

O que nos resta, ainda, do mundo? A paixão que deixamos, sem vestígios, sobre as coisas, a mansidão da grande saudade, a memória que não amordaça a boca. O vazio que nos deixa a partida de Maria Lurdes Pintassilgo representa isso tudo. E ainda mais, porque demasiado nos deu. A generosidade da sua missão entre nós fazem-nos permanecer de olhos enxutos pela força de a guardar na memória.
Que descanse em paz.

sábado, 10 de julho de 2004


Irresponsabilidade

"... encontrou o ponto arquimediano, mas utilizou-o contra si mesmo; ao que parece, esta era a condição para o encontrar" [Franz Kafka]

Não temos nenhuma promessa com o senhor Presidente da República. Não lhe devemos por isso nada, senão a consideração que um cidadão deve ter, diante do Presidente do seu país. No invés, na mais amáveis das suposições, seria de presumir que o Presidente eleito pelos portugueses, em circunstâncias singulares, não faria a desafronta de nos presentear com uma inaudita decisão, constitucionalmente restritiva, politicamente imprudente e pessoalmente irresponsável.

A decisão de não convocar eleições é um monumental erro de apreciação política e, contrariamente ao desejado, não permite afirmar que se defendeu a "estabilidade política", o "regular funcionamento das instituições", nem se prova que se garanta "as condições de regularidade, legitimidade e autenticidade democráticas". A "visão mandatária" da democracia do senhor Presidente, além de nos desfeitear politicamente, comporta conflitos insanáveis e perplexidades várias, sendo que parte da sua argumentação, direccionada a quem o elegeu, era completamente dispensável.

Assim: a actual coligação (que não foi a voto popular) não sufragou nas urnas eleitorais o actual programa do governo, conforme é sabido (tenha-se em conta o programa publicitado pelo PSD e o PP, e o que foi reescrito depois); os eleitores "no termo da legislatura" (quatro anos) não podem julgar a actividade do governo, porque ele deixou de existir, não havendo garantias (ninguém o pode assegurar) que o próximo seja do mesmo teor do anterior; ao afirmar que "não compete ao presidente governar" e ao mesmo tempo estabelecer condições para o seu funcionamento (terá feito o mesmo com o governo de Durão Barroso?) e controlo, não só está a co-responsabilizar-se politicamente (o que é curioso) como introduz um indisfarçado presidencialismo déjà-vue; portanto não se compreende as declarações que proferiu em defesa da sua posição.

E - noutro registo - se o senhor Presidente, num momento de desmando insensato, considera provável que a dupla Lopes & Portas lhe conceda a amabilidade de lhe dar argumentos para uma subsequente dissolução da AR, então estará a descuidar que uma chamada a eleições nesse cenário (e a vitimização que o caso estabelece) torna mais acessível qualquer vitória eleitoral para a coligação. O que não deixa de ser espantoso.

sexta-feira, 9 de julho de 2004


[Como devo lutar?]

"Tu vem procurar Me-ti e diz: quero tomar parte da luta de classes; ensina-me. Me-ti diz: senta-te. Tu senta-se e pergunta: como devo lutar? Me-ti ri-se e diz: estas bem sentado? Não sei, diz Tu admirado, de que outra maneira me sentar? Me-ti explicou-lho. Mas, diz Tu com impaciência, não vim para aprender a sentar-me. Eu sei, queres aprender a lutar, diz pacientemente Me-ti, mas para isso é preciso estares bem sentado, porque de momento estamos sentados e é sentados que queremos aprender. Tu diz: se se procura sempre tomar a posição mais cómoda e tirar o melhor partido do que existe, ou seja se se procura o seu prazer, como lutar? Me-ti respondeu: se se não procura o seu prazer, se se não quer tirar o melhor partido do que existe e se não se quer tomar a melhor posição, para quê lutar?" [Bertolt Brecht]

Vinicius de Moraes (1913-1980)

m. no Rio de Janeiro a 9 de Julho de 1980

"... Vinicius é um poeta muito complexo (...) e arriscaríamos, até, a afirmação de que na moderna poesia brasileira não conhecemos outro poeta em que a tessitura seja tão variada.
Muitas dessas linhas são facilmente discerníveis: há uma linha William Blake, uma linha Rimbaud-Apollinaire, uma linha Camões, uma linha romanceiros, etc., linhas essas que o Poeta toma, abandona, retoma, e que, mais do que influências, são linhas de parentesco. (...) Escolher Vinicius foi, finalmente, questão de prazer. Razoável conhecedor da sua obra, só agora tive a oportunidade de me dar conta de quanto ela é importante para a formação duma coisa que se chama gosto, esse gosto que pomos em comer, em amar, em conviver..." [Alexandre O'Neill, in Vinicius de Moraes, O Poeta Apresenta o Poeta, Cadernos de Poesia, D. Quixote, 1969]

"... Tende piedade dos homens públicos e em particular dos políticos
Pela sua fala fácil, olhar brilhante e segurança dos gestos de mão
Mas tende mais piedade ainda dos seus criados, próximos e parentes
Fazei, Senhor, com que deles não saiam políticos também
..."
[VM, in O Desespero da Piedade]

"... Preliminarmente telegrafar-te-ei uma dúzia de rosas
Depois te levarei a comer um shop-suey
Se a tarde também for loura abriremos a capota
Teus cabelos ao vento marcarão oitenta milhas.
..........
Mascaremos cada um uma caixa de goma
E iremos no Chinese cheirando a hortelã-pimenta
A cabeça no meu ombro sonharás duas horas
Enquanto eu me divirto no teu seio de arame ..."
[V.M., in História Passional, Hollywood, Califórnia]

Locais: Vinicius de Moraes (Biografia) / Biografia / Biografia & Discografia / Vinicius de Moraes Auto-retrato / Vinicius de Moraes (1913-1980) / Poesia / Letras de canções [Valsinha / Garota de Ipanema / ...] / Canções / Sonetos [Soneto da Separação, ...] / Discografia
Arrumos & Papéis

- curioso periódico (quinzenal) com redacção em Viana do Castelo, de nome "Lusa" (1918, Ano II), cujo editor e director era Cláudio Basto. No seu segundo ano diz-nos: "... revista de intuitos honestos, somente norteada pelo propósito de ser útil, alheia às nacionais charlatanices de chafaricas e mediocridades improdutivas ...". Com várias alusões à etnografia local (ex. O Chafaris de Viana ...) , arqueologia, bibliografia,...

- interessante trabalho dactilografado que servia de apoio às aulas na Escola de Hotelaria de Lisboa, ano 1960/61. Exemplo disso é a disciplina "Mesa" dada pelo mestre José Augusto Ferreira que é uma delícia de se ler, nomeadamente na parte da decoração e arranjo das mesas, regras a cumprir em serviço, ...

quinta-feira, 8 de julho de 2004

[Cielo y Tierra]

"En dos alas solamente
Consiste toda la Obra, (...)
Toma un cuerpo permanente,
Y aun que te custe disuelo,
Abate el Aguila as suelo,
Y no la dexes bolar,
Porque el intenso es hallar,
Modo de unir Cielo y Tierra"

[Anselmo C. M. Castelo Branco, in Ennoea ou a Aplicação do Entendimento sobre a Pedra Filosofal, reed. 1987]


Livros & Papeladas

- separata da Revista A Medicina Contemporânea, nº 5, 1950, com um belo texto de Egas Moniz, "Coimbra, Nobre Cidade", onde é referido: "... é facto averiguado que os estudantes do principio do século XVI eram denominados capigorros. A gente mal-humorada da cidade e arredores chamava-lhes capigorrões, talvez por menos simpatia devida à sua conduta nem sempre exemplar. A moda irrompeu no século XVII vestindo-os à fidalga: chapéu de feltro com plumas, gibão de veludo, colarinho gomado a Velásquez e a capa traçada, deixando aflorar, à esquerda, os copos da espada. Mas o estilo não se generalizou. Era caro para a bolsa de escolares ..."

- no Almanaque do Algarve de 1943, existe um prosa de Mestre Aquilino Ribeiro, "Olhão, Vila Cubista", referências a escritores algarvios (Julião Quintinha, Assis Esperança, Visconde da Lagoa, Roberto Nobre) e imagens dos célebres bancos artísticos de Olhão (Jardim João Serra) de autoria do pintor Jorge Colaço

- da Dhâranâ de Março/Abril de 1954, que foi Órgão Oficial da Sociedade Teosófica Brasileira, dirigida pelo Prof. Henrique José de Souza (H.J.S.), num texto sobre os "Valiosos documentos que atestam a Missão da Sociedade Teosófica Brasileira", escrito por Clóvis Bradaschia, é referido a "sibilina profecia da Serra de Cintra (Portugal)", cuja tradução é a seguinte:

«Patente me farei aos do Ocidente
Quando a porta se abrir lá no Oriente.
Será cousa pasmosa quando o Indo,
Quando o Ganges trocar, segundo vejo
Seus espirituais efeitos com o Tejo»

Como comentário, depois de declarar que H.J.S. ao realizar a sua "Misteriosa Viagem ao Norte da Índia", passou por Lisboa, depois foi a Goa, seguindo para a Índia, apresenta o seguinte comentário do próprio H.J.S.: «o Oriente faz entrega ao Ocidente - por ter concluído seu ciclo espiritual a favor da Evolução Humana, e a este (Ocidente) competir, agora, semelhante Incumbência, perante a Lei, perante a Divindade». E muito mais nos diz ... referindo-se, até, ao poeta e jornalista Augusto Ferreira Gomes, transcrevendo uns versos do seu livro "O Quinto Império".

quarta-feira, 7 de julho de 2004


Eleições, pontos nos iiii

"Com as baionetas, Senhor, pode fazer-se tudo, excepto uma coisa: sentarmo-nos em cima delas. Ora mandar não é o gesto de arrebatar o poder, mas sim o seu tranquilo exercício. Em suma, Senhor, mandar é sentarmo-nos. E Estado, em definitivo, é estado da opinião pública" [Talleyrand]

Vivemos num tempo de agitação. Na sua expressão mais simples, a realidade destas semanas tem sido uma extenuante reinvenção de práticas conflituais entre os vários clientes do poder do Estado, num melting-pot argumentativo assombroso, quase sempre impulsionado pela fantasia. Os vários intervenientes, escarranchados nas páginas dos jornais e alapados nas cadeiras das TV's, agitam a "constituição ideal" que deixa por golpe de mágica de ser uma matriz puramente ideológica, para tornar-se o receituário onde o direito conduz à decisão, com a luta política ausente. Eis, pois, a constituição para todo-o-serviço que o ditoso cidadão deve perfilhar.

Quer isto dizer, que o construído das alegações político-jurídicas nada teve de encantamento e de sedutor. Pelo contrário. Ocultando-se que é a luta política que determina o direito e não o inverso; exaltando-se a "legitimidade eleitoral" sem referências aos limites sociológicos do direito e como tal, caindo-se na armadilha da submissão ao poder político (supostamente) dominante; confundindo-se, deliberadamente, legalidade e legitimidade, excepção e norma, democracia representativa e democracia directa; escondendo-se que é "ao soberano quem decide do estado de excepção" (C. Schmitt) e não eles que configuram o "soberano" - o alarido de tais especiosas luminárias reveste-se, afinal, de simplórias obsequiosidades a amigos e companheiros, aliás como manda a tradição. Na verdade "é uma grande loucura querer ser sábio sozinho" [La Rochefoucauld].

No entanto existe o óbvio, o incontornável: de que forma os cidadãos podem avaliar o desempenho destes dois anos de governação, da equipa que irá cessar funções, a não ser por eleições? Há outra maneira? Não! E o Senhor Presidente da República irá demonstrá-lo. E os cidadãos, evidentemente.

"Protesto"

"Quereis simular civilização? Destrói a noite! - escrevi eu, já não sei quando, no álbum duma caçadora de autógrafos. Ou talvez não escrevesse e apenas inventasse agora a forma de iniciar este meu protesto brando ...
Sim. A melhor maneira de aparentar civilização é este aniquilamento brutal da noite, a «noite dos magros crapulosos» de Antero, a «noite antiquíssima e idêntica» de Fernando Pessoa, à força de arcos voltaicos, lâmpadas de mercúrio, riscos de néons, casinos, anúncios luminosos, candeeiros, centenas de candeeiros de todos os feitios e pesadelos, uns cabeçudos, estes esgalgados de dedos a apontar, aqueles, autênticos forcas de onde pendem cabeças cortadas, outros de chapéus de palha, milhares de candeeiros - ora bolas para esta civilização de automóveis!
(...) Aqui proclamo, pois, solenemente o meu horror à iluminação exagerada das ruas. Para depois ousar pedir (...) - ousar pedir, repito, a quem de direito e em nome dos poetas sonâmbulos, que não cedam à tendência espectacular de fingir civilização, com mais luzes por fora, na nossa linda cidade com tão forte vocação para aldeia inicial ..." [José Gomes Ferreira, in Seara Nova, nº 1423, Maio de 1964]
Livros & Arrumações

- No Arquivo de Viana-do-Castelo Repositório de Estudos & Curiosidades Regionais, Vol. I, nº 7, 1934, há um texto do Coronel Pereira Viana sobre "A Estação do Caminho de Ferro de Viana-do-Castelo" onde nos diz que, "quem projectou o edifício da estação" foi o engenheiro que "dirigiu a sua construção", de nome Alfredo Soares, confirmado pelo dizer de várias personalidades, entre elas António Arroio. E em nota de roda-pé informa que além desse edifício, também se ocupou da Estação de Campanhã.

- Curioso livro de Muhammad Rashid, que tinha antes publicado o "Portugal é a Kundâlini" (1974) e "Aos Pés do Mestre" (1974), intitulado "Única Grande Ode" (1978), com dedicatória impressa "ao meu Irmão Jorge Godinho o Actor dos Pés em Sangue a declamar a Única Grande Ode aos Pés do Mestre" .

"... As três coisas que eu amo mais na vida são as mulheres, o haxixe e as orações. A mulher em primeiro lugar e as orações em último porque o homem deve conhecer a sua própria alma antes de se voltar para Deus" / "tenho horror às palavras em préstito, escorrendo um líquido mole e pegajoso. O que eu procuro nos livros é outra coisa viva que se pega ao papel e à tinta"

- Separata da Revista Gil Vicente, vol XXV, 1949 (Guimarães) de Luís de Almeida Braga, "Loa do Vinho Verde".

"... Guerra Junqueiro, senhor de largos vinhedos entre fragas assustadas, assegurava a Eça de Queirós que para acompanhar o melhor manjar do mundo não hesitaria em escolher o vinho verde de Monsão. Gil Vicente já tivera por certo que à beira dele tudo era água-pé desenxabida. Na esbraseada gândara alentejana o chilreador Fialho amansava o génio recordando a satisfação que tivera em achar no vinho verde a meiguice dos beijos e o travo inocente das amoras ..."