segunda-feira, 3 de maio de 2004



"É certo que o velho mundo pertence aos filisteus. Mas não devemos, quanto a nós, tratá-lo como um papão, arrepiando caminho. Devemos, pelo contrário, encara-lo de muito perto. Vale a pena estudar-se este senhor do mundo.
É verdade que só o é, senhor do mundo, atulhando o mundo com a sua sociedade, tal como os vermes ocupam um cadáver. A sociedade destes cavalheiros só precisa por isso de um certo número de escravos, e os proprietários dos escravos não precisam de ser livres" [Karl Marx]

sexta-feira, 30 de abril de 2004


Oliveira Martins [1845-1894]

n. em Lisboa, 30 de Abril de 1845

"… O trabalho dividido, parcellario, é a causa do embrutecimento e da miséria moral e material do trabalhador, a Economia Politica responde: fatalidade! como se na natureza podesse encontrar-se uma lei de anniquilação. As forças naturaes trazem a morte sim quando não comprehendidas; assimiladas são necessária, absolutamente a vida. O facto do embrutecimento do trabalhador pela divisão de trabalho é reconhecido por todos; Say escrevera: «Em resumo pode dizer-se que a separação dos trabalhos é um emprego hábil das forças do homem, que augmenta prodigiosamente a produção da sociedade, mas que diminue a capacidade da cada homem individualmente considerado». Tocqueville precida ainda: «Á medida que o principio da divisão do trabalho recebe uma apllicação mais completa, torna-se o operário mais fraco, mais dependente; progride a arte e o artista retrógrada». Ora se esse progresso da arte está na natureza, encontrar-se-há n'ella a diminuição do homem? Os economistas, preoccupados com a politica, calam-se, e offerecem como correctivo as escholas e a caridade. De modo que a organização do trabalho constaria de dois pólos anthiteticos: a instrução creando, o trabalho destruindo…"

[J. P. Oliveira Martins, in Theoria do Socialismo. Evolução politica e económica das sociedades na Europa, Lisboa, 1872]

Ecco dos Operarios [nº 1, 28 de Abril de 1850]

"O grande surto de Associações e Sociedades Operárias de diverso tipo inicia-se a partir da Regeneração, isto é quando começa a segunda metade do século dezanove. A Regeneração (…) procurava construir os meios que concretizassem o apelo da colaboração activa de todos os portugueses na edificação de Portugal moderno. O Centro Promotor dos Melhoramentos das Classes Laboriosas exprime (…) o que se acabou de afirmar; Rodrigues Sampaio, Casal Ribeiro e o próprio Fontes Pereira de Melo estiveram associados, por formas diversas à actividade do Centro Promotor (…)
Mas o Centro Promotor não surge por acaso. Na verdade, em 1850, havia-se fundado o primeiro órgão de imprensa escrita claramente apostado na defesa dos interesses dos trabalhadores e no fomento do associativismo operário. Foi o «Ecco dos Operários», órgão da Associação dos Operário de Lisboa, fundado por Sousa Brandão e Vieira da Silva Júnior. O primeiro, general oriundo, como muitos dos grandes vultos da Regeneração, da Engenharia Militar e que, tendo assistido à revolução de 1848 em Paris, foi sempre um assíduo e interessado colaborador da imprensa e das Associações operárias. O segundo, operário tipógrafo, foi destacado dirigente do Centro Promotor e, íntimo colaborador de Henriques Nogueira e foi, como este seu grande amigo, um dos primeiros paladinos do republicanismo social federalista (…) Este órgão de imprensa (…) insere-se num projecto de sociedade cujo principal eixo era a colaboração ente classes para «regenerar e modernizar Portugal». Tratava-se (…) de promover a colaboração entre capital e trabalho sem que o primeiro «escravizasse o segundo».
Esta posição de fundo, facilmente detectável em o «Ecco dos Operários», vai presidir ao conteúdo de quase toda a imprensa operária até 1872 …" [César de Oliveira, in Antologia da Imprensa Operária Portuguesa, P & R, 1984]

quinta-feira, 29 de abril de 2004


Pedro Oom [1926-1974]

m. a 26 de Abril de 1974

"O Escritor Pedro Oom Morreu de Comoção – O irreverente e talentoso poeta surrealista Pedro Oom, figura muito assídua do café Gelo ao tempo em que ali se reunia o grupo em que pontificavam Mário Cesariny de Vasconcelos, Luís Pacheco e outras personalidades daquela corrente estética, morreu ontem de comoção provocada pela queda do fascismo em Portugal.
O insólito autor de tão belos poemas fantásticos e escatológicos como os que publicou em «Grifo» e em «Pirâmide» não resistiu à alegria da vitória. (…)" [in, DL, 28/04/74]

"Poesia não é uma medalha para por no peito dos tiranos mas uma imensa solidão feita de pedras, onde o despotismo pode encomendar o ataúde. Cada um de nós odeia o que ama. Por isso o poeta não ama a poesia que é só desespero e solidão mas acalenta ao peito as formigas da revolta e da rebeldia, que todos os déspotas querem submissas e procriadoras. Só os voluntários da miséria e da submissão patriarcal querem a poesia na arca da aliança com a tradição pacóvia e regionalista dos pretéritos dias, glórias patrioteiras, heroicidades frustes, pirataria ignara. Todo o verdadeiro poeta despreza o pequeno monte de esterco onde o dejectaram no planeta e a que os outros chamam pátria, e só ama os grandes continentes mares e oceanos da liberdade e do amor. Só nos vastos espaços incriados a poesia serve o seu destino – catapultar o homem nos abismos do desejo incontrolado onde o próprio assassinato é um acto de poesia e de amor.
Este assassinato de que falo é o grande amplexo de homem para homem a solidariedade e a ternura, não a caridade hipócrita ou a cama de família, com todo o seu pequeno cortejo de horrores, onde a exploração do filho pelo pai dita a sua lei."

[Pedro Oom, Poema, in Grifo 1968 (?)]

[Libertos os Presos Políticos]

"Ás nove e trinta de hoje [26 de Abril de 1974] um oficial dos Fuzileiros Navais comunicou aos jornalistas, na Antónia Maria Cardoso, que a PIDE-DGS acabava de render-se ao fim de uma noite inteira de resistência ao cerco (…) Foram presos sem resistência os quarenta elementos daquela odiada Polícia secreta, que durante a noite tinham resistido no interior do cerco e que, apesar de ontem terem ameaçado matar os prisioneiros, se apresentaram aos pára-quedistas já desarmados e atitude colaborante (…) [Diário de Lisboa, 26 de Abril de 1974]


[27 de Abril de 1974 – Os três últimos presos políticos]

"A liberdade definitiva só chegou às 20 e 45 de ontem [27/04/74] para três dos presos políticos da Cadeia do Forte de Peniche. A essa hora, o major Azevedo, mandatário da Junta de Salvação Nacional, comunicou a Francisco Martins Rodrigues, Rui Pires de Carvalho d’Espinay e Filipe Viegas Aleixo que podiam abandonar livremente a casa onde lhes fora fixada residência (…)

Francisco Martins Rodrigues e Rui d’Espinay, de 46 e 31 anos, respectivamente, forma condenados a 19 anos e a 17 anos de prisão maior por serem dirigentes do Comité Marxista-Leninista Português e da Frente de Acção Popular, as primeiras organizações clandestinas que em Portugal seguiram uma linha política de tendência maoista. Exercendo a sua actividade política na clandestinidade, no interior do País, Francisco Martins Rodrigues e D’Espinay identificaram como agente provocador um elemento da PIDE, Mário Mateus, que procurava infiltrar-se naquelas organizações, e executaram-no a tiro, em Outubro de 1965. Foi o então chamado «crime de Belas». Mário Mateus, que trabalhava em ligação com o agente da PIDE de nome Cleto, lograra dar à polícia secreta pista para a prisão de João Pulido Valente, também dirigente daquelas organizações políticas revolucionárias, e libertado ontem (…)

Condenado à revelia num tribunal comum por ter participado com o capitão Henrique Galvão no assalto ao «Santa Maria», em Fevereiro de 1961, Filipe Viegas Aleixo exilou-se em França, donde partiu com Hermínio da Palma Inácio, no grupo da Liga de União e Acção Revolucionária que pretendia, em Agosto de 1968, tomar a cidade da Covilhã. Este grupo foi interceptado na zona de Moncorvo, pouco de pois de entrar em território nacional, e os seus componentes entregues à Direcção-Geral de Segurança. Torturado na Rua António Maria Cardoso, Filipe Aleixo foi condenado pelo Plenário do Porto a 19 anos de prisão maior, recolhendo depois ao Forte de Peniche donde, devido à sua idade, já não esperava sair com vida: saiu com 59 anos (…) [in, Diário de Lisboa, 28 de Abril de 1974]

quarta-feira, 28 de abril de 2004


XLV Catálogo da Livraria Moreira da Costa

Saiu o novo Catálogo de "livros seleccionados raros esgotados curiosos" da Livraria Moreira da Costa (Rua de Avis, 30, Porto) que pode ser consultado on line.

Algumas referências: Escriptos Humorísticos. Em Prosa e Verso do faleccido José de Sousa Bandeira …, 1874 (trata-se da transcrição de alguns artigos publicados na “Atalaia”, “Periódico dos Pobres” e no “Braz Tisana”. Era Sousa Bandeira "o decano dos jornalistas portugueses, por ser ele o que em 1826 começou a redigir em Guimarães o periódico Azemel, segundo afiança Inocêncio) / Entre Duas Reações, por Sebastião de Sousa Dantas Baracho, 1917, III vols / Poesias, de Olavo Bilac, 1945 / O Conde e o Passarinho. Morro do Isolamento, por Rubem Braga / Em Plena República, por António Cabral, 1932 / Vieira-Pregador, de P.L.G. do V. Coelho Pereira Cabral, 1901, II vols (muito apreciada) / Tradições, Princípios e Métodos da Colonização Portuguesa, por Marcello Caetano, 1951 / Colónias, pelo antigo deputado José Cardoso Vieira de Castro, 1871 (com pref. de Camilo) / Anticolonialismo e Descolonização. Ensaios, por Luís Filipe de Oliveira e Castro, 1963 (com pref. de Marcello Caetano) / Diário Ilustrado, nº 1 (1 de Junho 1872) a nº 138 (31 Dezembro 1872) / Ecce-Homo. Poemas de Américo Durão, 1953 / Elementos de Euclides …, de Euclides, 1768 (1ª ed. port.) / In Memoriam de Ferreira de Castro, Braga, 1976 / Institutiones Júris Civilis Lusitani …, por Pascoal José de Mello Freire, 1791, VII vols / A Mulher no Mundo, por Maria Lamas, 1952, II vols / Tarrafal. O Pântano da Morte, de Cândido de Oliveira, 1974 / Promptuarium Juridicum …, de P. Bento Pereira, 1664 / Pharmacopeia Geral para o Reino, e Dominios de Portugal …, 1824, II vols / Obras de António Sardinha (Chuva da Tarde. Sonetos, 1923; Na Corte da Saudade, 1922; Purgatório das Ideias. Ensaios de Critica, 1929: Ao Ritmo da Ampulheta. Critica & Doutrina, 1925) / Urbino de Freitas (4 peças "para a história de um dos mais célebres processos jurídicos portugueses")

terça-feira, 27 de abril de 2004

O Inquieto Blasfémias

Alguns dos nossos bloguistas asseveram, ao longo dos seus posts, curiosos argumentos e interpretações, alguns bem delirantes, em torno do 25 de Abril e do seu posterior desenvolvimento. Parece que de repente todo o mundo deu em “historinhador” tal o uso virtuoso desse antiquíssimo modo de ser português: imaginação excessiva ou simples provincianismo, para citar Pessoa.
Partir daí para ladrilhar teorias com fundamentações mais ou menos mecanicistas, verbosas e maniqueístas, reconstruindo os acontecimentos, ainda bem recentes, a seu belo prazer, é um passo que não sabem resistir e teimam em exibir. O passado histórico é visto, quase sempre, como motivo teatral, dado que o “teatro” histórico é um simples desfile de figurinos sem que as estruturas socio-económicas e as suas correspondentes relações estejam presentes. Curiosamente, a uma vulgata marxista reaparece, agora, uma nova gramática pós-moderna assente numa interpretação da história com base numa “lógica dum poder pessoal” (exemplo disso mesmo é o olhar de VPV), sem que as relações sociais e económicas existam, as ideologias elucidem, o direito configure ou os jogos geoestratégicos e políticos determinem. A probidade desta enunciação será muito excitante para alguns, mas jamais permitirá que se diga que o 25 de Abril não foi essa “exemplaridade democrática” que nos conciliou connosco e com as nações civilizadas, nem que seja este “país habitável de todos” (EL).

O Rui d'O Blasfémias é um indivíduo investido de uma missão: deixar sair a acidez e o azedume que lhe vai na alma. O mal do Rui, já se vê, é estomacal. O seu post tem a acção que tem, pois ao que alvitra o 25A nasceu morto. Pax à sua alma, portanto.

No entanto, a novela reescrita do 25A pelo Rui – apesar de ser uma alvoroçada historieta pouco sublime – levanta um conjunto de questões, a saber: poderia uma "nova geração de políticos", saídos do regaço Marcellista, ter contribuído, com a sua chamada ao poder, para que a história do país fosse outra? Mas de que "nova geração de políticos" se fala? Que "história" seria essa, assim tão grave e empolgante, que se reconstruiria a partir do poder fascista, supostamente desarticulado, sem rupturas ou radicalidades evidentes? Ou de outro modo, como se faria essa transição sem as conflitualidades que o 25A revelou?

Ninguém saberá. Regista-se, apenas, que se caminhou, com o esgotamento do modelo salazarista em 58, para uma maior radicalização de grupos sociais, políticos e de reflexão. Que não foi por mero capricho que surgiram as crises estudantis de 62 e 69, as greves da Carris, Lisnave, Bancários, TAP, etc…, ou as movimentações de alguma parte do clero, aqui e nas colónias. E que frente à impossibilidade de qualquer abertura politica e eleitoral, os sectores católicos (O Tempo e o Modo, sectores Sergianos, a JUC e a JOC, são disso exemplo), os economistas liberais, os da tertúlia em torno da filosofia portuguesa (perseguidos e expulsos do país), o Movimento Republicano Português, os movimentos oposicionistas de tendência socialista e comunista, os dissidentes do PC, a ala liberal sempre perseguida e vilipendiada, a SEDES, etc., todos eles sentiram, subitamente, a necessidade de mudar a sua praxis politica e radicalizarem o discurso e modos de actuação. Assim sendo, de quem se fala quando se fala em "nova geração de políticos" durante o Marcellismo?

domingo, 25 de abril de 2004



Esta é a madrugada que eu esperava
0 dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo

[Sophia Mello Breyner]

sábado, 24 de abril de 2004


Ditos & Alusões piedosas de "boa-fé"

"As tragédias dos outros são sempre de uma banalidade desesperante" [O. Wilde]

A vida está feia, dizem. O mundo perigoso. Uma desordem triste, evidentemente. E tudo é gratuito neste horror: a admirável crise económica, a ladainha da retoma, a banalização da guerra e da violência, a legitimação do poder pela fatalidade e corrupção, a arrogância dos totalitarismos, o espanto e o medo. Será abusivo lembrar a náusea retórica desses "homens pequenos" (J.M.B.) teóricos da guerra, do "bem" contra o "mal", muçulmanos ou ocidentais?
Não é o claro-escuro do messianismo imperial uma mixagem de fundamentalismo cristão, um "choque e pavor" das estratégias do complexo militar-industrial e, via EUA, uma combinação entre unilateralismo externo e autoritarismo interno, numa narrativa neoliberal a cair de tédio que tudo invade em acolhimento lisonjeiro? Ou do mesmo modo, não é o terrorismo e fundamentalismo integrista islâmico a desordem civilizacional, a intolerância demente contra a pluralidade de opiniões e modos de estar no mundo, o miserabilismo obsoleto e fanático que transmite uma filosofia politica hedionda e uma irracionalidade doentia?

É nesta reserva ou eco de dor, que alguns questionam, como pecado da audácia de serem livres num mundo embriagadamente perigoso, o penoso trabalho de outros em dissimular os seus compromissos totalitários - bem costurados, diga-se - em desafinadas e imprudentes charangas argumentativas em defesa da ocupação e da barbárie no Iraque, num desfiar de mentiras sucessivas sobre factos e argumentos que engendram em carpidas prosas jornalísticas. A tais falsificação grosseiras e de "má-fé" (Sartre oblige) que numa rajada nos arremessam, fervorosamente, os pregadores azougados do novo império ou "exército do bem" - José Manuel Fernandes, Luís Delgado, Fernando Gil, Pacheco Pereira e outros - é de bom tom retribuir com um penhor de gratidão, uma voz harmoniosa e civilizada, uma altaneira e nobre saudade dos tempos em que a alegria de viver se confundia com uma ética, qualquer que ela fosse. Porque nessa "mentira sem mentirosos", a imprudente e vaidosa actividade de estamparia levada a cabo pode ser um mero espectáculo enternecedor de assombrosa "má-fé", mas nunca nos poderá impedir de preencher essa condição de estarmos condenados a sermos livres, mesmo que o homem "seja apenas o seu projecto".


Jornal do Centro [nº 1, 1970 – ?] – Jornal mensal "por um homem novo numa sociedade nova", com apartado na Pampilhosa (perto da Mealhada), director Ângelo J. A. Campos e redactores Rui Carvalho, Augusto Oliveira e Carlos Cabral. Colaboração de António J. Fonseca, Carlos Marinheiro, Cipriano Pires, Joaquim A. Leal, Jorge Cardoso, L. H. Afonso Manta, Manuela Neves, … Esteve ligado a grupos de tendência maoista, tendo apoiado a FEC-ML nas primeiras eleições a seguir ao 25 de Abril.

"Memórias de Américo Tomás" (II)

[Despacho número Cem] "Na comemoração de um dos aniversários do Despacho número Cem, tive ocasião de proferir o seguinte discurso:
«Comemora-se hoje em todo o País a promulgação do Despacho número Cem, um texto de grande importância para a Marinha Mercante de Portugal, e a que foi dado esse número, não por acaso mas porque ele vem na sequencia de outros noventa e nove anteriormente promulgados" [in, revista Opção, Ano II, nº 30]

[O Cinema] "Eu gosto muito de cinema. Quando era novo gostava de ir ao cinema. Embora quando eu era novo, houvesse pouco cinema. Havia um piano, e atrás havia um comboio que chegava a uma estação e havia um filme muito celebre que se chamava «O arrozador arrozado».
Depois disso, o António Lopes Ribeiro, que eu tive o gosto de condecorar, fez «O 28 de Maio», em que havia um russo vestido de branco que vendia tapetes, e havia um português que vinha da Rússia para derrubar o Prof. Oliveira Salazar, à bomba.
Também gostei muito do «Ben-Hur», que via sempre que ia inaugurar a árvore de Natal do cinema S. Jorge, que era dirigido pelo sr. Cecil B. de Mille.
Prefiro cinema a cores, porque é o único cinema que dá as verdadeiras cores do mar que são, como se sabe, o azul ferrete e o branco das velas dos barcos à vela" [ibidem]

[O 25 de Abril] "Só soube do 25 de Abril em 26 de Abril. Isto é, escapou-me a data. No dia 24 de Abril tive, por instantes, a percepção de que no dia seguinte seria o 25 de Abril, embora na altura, não lhe emprestasse nenhum significado especial. Significado especial emprestei-lho a 26 de Abril, embora, nesse dia, já fosse tarde." [ibidem]

A Cantiga é uma Arma!

"As cantigas de teor politizante tiveram um papel de relevância politica na formação de toda uma consciência anti-fascista ao longo de, pelo menos, os últimos treze anos (1961-74) da ditadura terrorista de Salazar-Marcelo.
O cantor era – é! – acima de tudo, um militante, um agitador. As situações em que ele podia cantar nada tinham a ver com a segurança e a amenidade de uma sala de espectáculos. Em definitivo, a concepção de «show», de recital, é totalmente estranha à realidade da actuação do cantor de intervenção neste país.
Poder-se-á situar o aparecimento da canção de contestação nos anos 1961-62, revestindo uma forma de ruptura com as tradicionais cantigas dos estudantes de Coimbra, os fados. Os textos reflectiam a revolta contra a guerra fraticida que o povo português era obrigado a praticar em África (…). José Afonso é o iniciador do movimento, logo seguido por Adriano Correia de Oliveira e Manuel Freire. Mais tarde viriam, da emigração, os testemunhos de José Mário Branco, Luís Cília, Sérgio Godinho, Tino Flores, e, dentro do país, Vitorino, José Jorge Letria, Pedro Barroso, Francisco Fanhais, José Barata Moura, Aristides, o Grupo de Acção Cultural, Fausto. (…)" ["O papel do cantor de intervenção em Portugal", opúsculo s/d, n/l, 1974 (?)]


Mundo da Canção [nº 1, Dezembro 1969 – Julho 1985] – Revista mensal de "música popular" editada na cidade do Porto, teve como directores Avelino Tavares, José Viale Moutinho, A. Vieira da Silva, António José Fonseca. Colaboração, entre outras, de Teresa Horta, Jorge Cordeiro, Michel Brunet, Arnaldo Jorge Silva, Fernando Silva Cordeiro, Tito Lívio, César Príncipe, Jorge Lima Barreto, Octávio Fonseca Silva, Viriato Teles, Fernando Sylvan. [Ver aqui]


Jornal Opinião [nº 1, Junho 1973 – Junho 1976] – Semanário com redacção na cidade do Porto, teve como director João Huet Viana Jorge e director-adjunto, António Macedo Varela.

Jornal Notícias da Amadora [nº 1, 1958] – Semanário com redacção e administração na Amadora, teve como directores António de Jesus (1958-1959), A. Conceição e Silva (1960-1961), Domiciano P. Valente (1961) e Domingos Janeiro (1961-1963), e a partir dessa data, com a direcção de Orlando Gonçalves, Sérgio Ribeiro e Carlos Carvalhas, chefe da redacção João Paulo Guerra, converte-se um jornal de culto para alguns sectores de oposição à ditadura. Registe-se a colaboração de Oliveira Marques, Adelino Gomes, Afonso Cautela, Afonso Praça, Alexandre Cabral, Alfredo de Sousa, Artur Bual, Ary dos Santos, Abelaira, Baptista Bastos, Bento Vintém, Borges Coelho, Carlos Marinheiro, Cipriano Dourado, Correia da Fonseca, Eduardo Gajeiro, Emídio Santana, Ernesto Sampaio, Assis Pacheco, Fernando Belo, Lopes Graça, Piteira Santos, Salgado Zenha, Helena Marques, João Carreira Bom, Joaquim Leal, José A. Salvador, Cardoso Pires, José Gomes Ferreira, José Saramago, Luiz Pacheco, Maria Velho da Costa, Mário Castrim, Mário Dionísio, Miller Guerra, Nelson de Matos, Nuno Bragança, Óscar Lopes, Pedro Alvim, Raul Rego, Rui D’ Espiney, Sá Carneiro, Sidónio Muralha, Tito Lívio, Vergílio Ferreira, … [Ver aqui]. Ainda se encontra em actividade.

quarta-feira, 21 de abril de 2004


"Memórias de Américo Tomás" (I)

"Eu por mim próprio, não me decidi a escrever as «Minhas Memórias». Decidiram-me. É que, estando quase toda a gente, ex-chefes de gabinete, ex-subsecretários de Estado, ex-secretários de Estado, ex-ministros, ex-chefes de Governo, escrevendo as suas memórias, a minha família começou a insistir comigo para que escrevesse as minhas «Memórias», na medida em que, disseram-me, mal me ficaria não escrever, também eu próprio, as minhas «Memórias».
Habituado a falar e não a escrever, contando, segundo as minhas contas, nove mil trezentos e sessenta e quatro alocuções por sobre o território nacional, isto é, continente, ilhas adjacentes e províncias ultramarinas, não minto!, nove mil trezentos e sessenta e cinco alocuções por sobre o território nacional e internacional, ligadas ao meu cargo de Presidente da República, - eu nunca me afeitei a usar a caneta, coisa que disse repetidamente a minha família.
Não tive sucesso, como é obvio, dado que me compraram uma caneta e ma deixaram fechada na mão.
Foi então que, pegando na caneta, carreguei no botão do gravador e comecei: "Senhor bispo da diocese, senhor ministro das Obras Públicas, senhor governador civil, senhor presidente da câmara municipal, senhor presidente da junta de freguesia, minhas senhoras e meus senhores" [in, revista Opção, Ano II, nº 30]

"É esta, portanto, a ultima cerimónia que se passa na cidade da Guarda e eu não quero deixar passar esta oportunidade sem agradecer ao bom povo desta terra o seu entusiasmo, o carinho com que recebeu o Chefe do Estado. A chuva não teve qualquer influência no entusiasmo das populações. Elas vivem numa terra de granito, e a chuva não as apoquenta (…) A Guarda é um distrito de bons portugueses, de portugueses de uma só face, portugueses, portanto, sempre prontos a defender a terra que os viu nascer. E a Guarda tem uma particularidade: é a cidade mais alta da Metrópole" [ididem, discurso na Guarda, in Século]

"… É uma terra [Gouveia] bem interessante, porque estando numa cova, está a mais de 700 metros de altitude. Pois o que desejo, sr. Presidente, para poder pagar, de qualquer forma a dívida que contraí, é que esta gente tenha um futuro feliz, abençoado por Deus. Que assim seja, para contentamento vosso e para contentamento meu …" [ibidem, em Gouveia, segundo O Século, 1/6/1964]

Jornal República [nº 1, 15 de Janeiro 1911- 1976]

Dirigido por António José de Almeida (vidé alguns artigos seus em «Quarenta Anos de Vida Literária de Política»), de forte tradição republicana e maçónica, teve uma importância politica grande durante a 1ª Republica e marcou ao longo do Estado Novo um lugar à parte na oposição à ditadura, apesar da atenção que lhe movia a censura. A partir de 1971, com a entrada e o controle de pessoas ligadas à ASP ("percursora do Partido Socialista") sofre alterações significativas, ganha maior "fôlego" e importância. Teve como directores, Carvalhão Duarte, Raul Rego e, por fim, durante o chamado «Caso República» (1975) Belo Marques. Participaram além de António José de Almeida, Alfredo Pimenta, Rocha Martins, Dias Amado, Costa e Melo, Gustavo Soromenho, Álvaro Guerra, Mário Mesquita, Carlos Correia, José Augusto Seabra, Armando do Vale Sereno, …

"… Desde 1926 até hoje [1969] não houve um só dia em que a imprensa portuguesa fosse livre. Tem sido realmente a base da sobrevivência do regime totalitário entre nós (…) podemos dizer que ela [censura] se exerce com dureza sobre o noticiário politico, económico, social e educativo, assim como sobre toda a colaboração literária ou outra. Quase inteiramente livres de Censura só o noticiário do desporto, os jornais desportivos, de modas e quejandos …" [Raul Rego, in Horizontes Fechados, 1969]

[sobre o Caso República, Maio de 1975] – "Os trabalhadores do "R" entraram em luta para que o jornal fosse independente e ele acabou por ser encerrado. Iniciam então uma outra luta, os "50 dias", pela defesa dos postos de trabalho e pela reabertura do jornal, coisas indissociáveis (…) Antes, o problema era forçar a direcção de Rego a modificar a orientação do jornal. Agora, queiram ou não, o problema é inventar um jornal (…) O projecto que se elabora é o de um jornal popular e revolucionário (…) o tom fundamental é logo dado pelo Estatuto Editorial. Este aponta para um jornal "de classe", de apoio às lutas, porta-voz de comissões, que dá a palavra a quem os outros negam …” [in, Gazeta do Mês, nº 1, Maio de 1980]

segunda-feira, 19 de abril de 2004


Boletim Bibliográfico nº 19 de Luís Burnay, Abril 2004

O Livreiro-Antiquário Luís Burnay (Calçada do Combro, 43-47, Lisboa) acaba de publicar o seu 19º Boletim de Livros antigos, esgotados e raros, que é excelente. Com uma forte temática literária, encontra-se, ao longo de 625 peças para venda, um expressivo conjunto de poetas e escritores portugueses com obras há muito esgotadas, outras peças de colecção. Com evidente interesse bibliográfico e a preços muito convidativos. Aliás, será curioso fazer o confronto entre o preçário praticado pelos antiquários/alfarrabistas lisboetas e os da cidade do Porto, para avaliar e entender a situação do mercado do livro antigo e dos processos (estranhos) nesta área.

Algumas referências: Fernando Pessoa e a Magia, de Luiz Moitinho de Almeida (raro) / Memórias de Alegria: antologia de verso e prosa sobre a Coimbra, org. de Eugénio de Andrade, 1971 / Poesia: antologia temática e Mário de Andrade, Alger, s/d (policopiado) / Anteu: cadernos de Cultura, nº1 e nº2, Lisboa, 1954 (raro) / Na Senda da Poesia, por Ruy Belo, 1969 / Ternos Guerreiros, de Agustina Bessa Luís, 1960 / Baionetas da Morte, por António Boto, 1936 / Ruy Cinatti [conjunto apreciável de obras: Borda d’Alma … (1973); Conversa de Rotina (1973); Import-Export … (1974); Memória Descritiva … (1971); Novo Salmo (folha volante com poemas de distribuição para amigos (?) / Obra poética de Afonso Duarte, 1949 / Escola Formal: revista mensal (dir. de Afonso Botelho, Orlando Vitorino), 1977-78, VI nums / Balanço das Actividades Surrealistas em Portugal, de José Augusto França, 1948 (opúsculo raro) / Engrenagem, por Soeiro Pereira Gomes, Porto, ed. SEM, 1951 / GRAAL (ver. dir. de António Manuel Couto Viana, 1956-57, IV nums / Anagramático, de Ana Hatherly, 1970 / O Corpo O Luxo A Obra, de Herberto Helder, 1978 (raro) / À Liberdade (no dia 16 de Maio de 1958), de David Mourão-Ferreira (folha volante com ded. Manuscrita) / Mito-Alegria-Simbolo, por Almada Negreiros, Sá da Costa, 1948 / Orpheu, de Almada Negreiros, 1965 / Varandas de Pilatos, por Vitorino Nemésio, 1927 / O Missionário, por Eduardo Noronha, 1927 / Entre a cortina e a vidraça (poemas com 1 disco), de Alexandre O’Neill, 1972 / O Libertino passeia por Braga, a idolátrica, o seu esplendor, de Luiz Pacheco, Contraponto / Apenas uma Narrativa, de António Pedro, 1942 / Clepsydra, por Camilo Pessanha, Ed. Lusitânia, 1920 / Uma carta a Teixeira de Pascoaes: Cadernos de Poesia (separata rara), de Fernando Pessoa / O Dinossauro Excelentíssimo, de Cardoso Pires, 1972 / Odes Modernas, por Antero de Quental, Coimbra, 1865 / Indícios de Oiro, por Mário de Sá-Carneiro, 1937 / Oito Séculos de Arte Portuguesa, por Reinaldo dos Santos, 1970, III vols
Museu do Neo-Realismo:

O nosso amigo do Lugar Efémero regista (e nós agradecemos) que "o espólio da Vértice, assim como a colecção da Seara Nova, e muitas outras publicações ligadas ao período do neo-realismo, mas não só, como o Sol Nascente, o Diabo, Horizonte, o Tempo e o Modo, o Via Latina, inúmeras páginas literárias e culturais de outros periódicos (quer em colecção completa, quer em números avulsos) podem ser consultados por investigadores no Museu do Neo-Realismo, em Vila Franca de Xira. Além de possuir espólios e outros materiais literários, de artes plásticas, gráficos, áudios, vídeos respeitantes a personalidades e acontecimentos desta época”. Obrigado.

Links: Museu do Neo-Realismo / In Câmara Municipal Vila Franca de Xira /

quinta-feira, 15 de abril de 2004


[Para o Luís da Natureza do Mal … para que não pense que o dedico a outro]

Passa por mim na Livraria

"Par délicatesse / j’ai perdu ma vie"

Não há paixão maior que deambular, com carinho e ternura, entre estantes de papéis novos ou velhos, poeirentos ou não, salvo a alegria e a paciência de encontros d'amores furtivos. Que o livro, como diria Joaquim Pessoa, é como uma mulher e no qual o amante-leitor "observa com os olhos apaixonados, mexe com um frémito de emoção, palpa com gozo, cheira, luta por ele e, quando o conquista, uma alegria enorme, uma alegria de posse lhe invade as quatro assoalhadas do coração". Eu sei que este "brincar da criança" (chez Freud), este sobressalto na alma de ver, ali, apertados em tão doce desordem tamanhos fólios, é uma maviosidade sem qualquer perdão. Compreendo como somos prisioneiros de um qualquer opúsculo, manuscrito, novela ou romance, seja pela impressão, papel, corte das folhas, corpo do livro, margens, pelos ferros a ouro nas lombadas, pelas gravuras em separado, simplesmente brochado ou mesmo encadernado. Mas também, confesso, que o local dessa inesperada declaração de amor não é indiferente. E as livrarias são esse lugar do "corpo revoltado", "moral de prazer" ou simples locus de cumplicidade.

A nossa "indisciplina”" começou por uma pequena drogaria da Avenida Madrid onde se comprava revistas e livros em segunda mão. Não mais lhe perdemos o gozo. Depois, já liceal (Camões, evidentemente) e pela companhia do mestre e amigo Freire de Andrade, frequentámos a Barata na Av. Roma, para a rápida vistoria diária. Quando descobrimos as livrarias da Baixa e do Bairro Alto (ao mesmo tempo que a Capela do Rato) foi uma desaustinada emoção. A Barateira era um mergulho imprevisto, o Castro e Silva um baque retumbante, a Livraria Popular um desafio. Na Bertrand lambuzávamos as prateleiras, na Bucholz professávamos exclamações, na Opinião rimávamos. O tempo era de partida, e em Ovar na Livraria Carvalho abríamos gavetas, bem ocultadas com JPP e livros da Centelha. Havia, também, a "biblioteca" e os LP’s rolante de M. Freire, a Estante em Aveiro e outras mais que o tempo esqueceu. E o Porto ali tão perto. Na Leitura era o alarido, na Lello o olhar ofegante, na Cedofeita esgadanhávamos resmas em perfeito desassossego. Sempre sem trair as palavras. Abençoadas livrarias.

Discretos, nos tempos de Coimbra, desembestávamos (por vezes em bando) na Baixa. Na saudosa Atlântida despejámos o segundo andar; na Bertrand não fazíamos cerimónia, no Machado d'Almedina acumulámos esplendor. Não havia a Finisterra, mas a Unitas e o armazém do Soveral resolvia o mau humor. Depois ... depois ficámos mais inspirados. Até hoje. Com aprumo lá vamos à Ler Devagar, FNAC do Chiado, novamente a Bertrand. Nunca fomos vencidos pela fadiga, mas agora mais refinados, gostamos de ficar a escarafunchar nos alfarrabistas, pescar na Feira da Ladra, depenicar em pequenos armazéns ainda escondidos. É sempre bom voltar à Histórica Ultramarina, ao Nunes de Benfica, ao Artes & Letras (descansando o corpo), ao actual Bobone, à Barateira, ao Arquimedes no Carmo, à prelecção com o Ferreira da Livraria Antiga do Carmo e ... muitas mais. A peregrinação continua. Amanhã lá estaremos. Na boca um sorriso. Sempre!

quarta-feira, 14 de abril de 2004

Queixa das almas jovens censuradas

Dão-nos um lírio e um canivete
E uma alma para ir à escola
E um letreiro que promete
Raízes, hastes e corola
..........
Dão-nos um bolo que é a história
Da nossa história sem enredo
E não nos soa na memória
Outra palavra para o medo
..........
Temos fantasmas tão educados
Que adormecemos no seu ombro
Sonos vazios, despovoados
De personagens do assombro
..........
Dão-nos um nome e um jornal,
Um avião e um violino.
Mas não nos dão o animal
Que espeta os cornos no destino ...

[Natália Correia, in Dimensão Encontrada, 1957]

Seara Nova [nº 1, Outubro 1921- nº 1599 de Janeiro 1979]

"Revista quinzenal de doutrina e crítica", nascida de uma "cisão da revista Águia", de intervenção pedagógica, literária e social, com uma matriz de reflexão cultural forte e polémica, marca toda a oposição ao Estado Novo e à ditadura, envolvendo-se em intensa actividade editorial e de campanha cívica e politica. Foram directores, sucessivamente: Aquilino Ribeiro, António Sérgio, Câmara Reys, Rogério Fernandes, Augusto Abelaira, Rodrigues Lapa, José Garibaldi, Ulpiano de Nascimento.
Da activa colaboração havida saliente-se os seguintes nomes: Abel Salazar, Adolfo Casais Monteiro, Afonso Duarte, Agostinho da Silva, Alberto Ferreira, Alexandre Cabral, Alexandre O’Neill, Alfredo Margarido, Almada Negreiros, Álvaro Cunhal, Alves Redol, Américo Durão, António Aragão, António José Saraiva, António Ramos Rosa, António Sérgio, Aquilino Ribeiro, Assis Esperança, Augusto Abelaira, Augusto da Costa Dias, Bento de Jesus Caraças, Carlos de Oliveira, Carlos Queiroz, Castelo Branco Chaves, Daniel Filipe, David Mourão-Ferreira, Eduardo Lourenço, Emílio Costa, Eugénio de Andrade, Lopes Graça, Fernando Pessoa, Ferreira de Castro, Fialho d’Almeida, Flausino Torres, Henrique de Barros, Irene Lisboa, Jaime Cortesão, João de Barros, Gaspar Simões, João José Cochofel, Joaquim Namorado, Jorge de Sena, José-Augusto França, Cardoso Pires, José Gomes Ferreira, José Régio, Rodrigues Miguéis, José Saramago, Luís Pacheco, Manuel Ferreira, Maria Archer, Mário Sá-Carneiro, Mário Dionísio, Mário Sacramento, Melo e Castro, Miguel Torga, Natália Correia, Nuno Bragança, Óscar Lopes, Pedro Oom, Raul Brandão, Raul Proença, Raul Rego, Reynaldo dos Santos, Rodrigues Lapa, Sant’Anna Dionísio, Sttau Monteiro, Teixeira de Pascoaes, Teixeira-Gomes, Victor de Sá, Vergílio Ferreira, Vitorino Nemésio, …

"Renovar a mentalidade da elite portuguesa tornando-a capaz dum verdadeiro movimento de Salvação; criar uma opinião pública nacional que exija e apoie as reformas necessárias; defender os interesses supremos da nação opondo-se ao espírito de rapina das oligarquias dominantes e ao egoísmo dos grupos, classes e partidos; protestar contra todos os movimentos revolucionários e todavia defender e definir a grande causa da verdadeira revolução; contribuir para formar acima das Pátrias, a união de todas as Pátrias – uma consciência internacional bastante forte para não permitir novas lutas fraticidas" [in Dicionário das Ver. Lit. Portuguesas, de Daniel Pires]

segunda-feira, 12 de abril de 2004

A Senha

Ser na acção em cada instante igual
à outra metade de si à sua imagem
de tal modo que o rigor acerte
o fraterno encontro com os outros

que a palavra
no lugar que lhe cabe
dê à frase a evidente verdade
em que todos se reconheçam


[Joaquim Namorado, in Vértice nº 363, Abril, 1974]

Vértice [nº 1, Maio 1942, …]

"Revista de cultura e arte" editada em Coimbra (1942), sob direcção de Carmo Vaz, Raul Gomes, Joaquim Namorado, e que ainda se publica (a partir de 1988, sob direcção de Francisco Melo), acompanhou o movimento neo-realista (de que foi perfeito porta-voz) e outras tendências, promovendo intensas reflexões, debates culturais, estéticos e políticos que marcaram a época. A par da "doutrinação critica e literária" que cedo revelou, do combate estético-literário comprovado ou da "divulgação ideológica" propagandeada, a sua longevidade e uma activa rede de colaboradores torna a Vértice incontornável na história literária e política portuguesa. Da vasta colaboração havida (pode-se consultar o seu Índice de Autores (para os primeiros 45 anos), recolhido por Carlos Santarém Andrade, 1987) registe-se os seguintes: Cristóvão Aguiar, Luís de Albuquerque, Álvaro Sampaio, Aníbal de Almeida, Eugénio de Andrade, Armando Bacelar, José Oliveira Barata, Baptista Bastos, Mário Braga, , Nuno Bragança, João Freitas Branco, Casimiro de Brito, Alexandre Cabral, Gomes Canotilho, Jesus Caraça, Papiano Carlos, Orlando de Carvalho, Jaime Rodrigues Viana, Ferreira de Castro, Fernando Catroga, João José Cochofel, Eduardo Prado Coelho, António Vale (Álvaro Cunhal), Augusto da Costa Dias, Saul Dias, Mário Dionísio, Afonso Duarte, Rui Feijó, Alberto Ferreira, José Gomes Ferreira, Vergílio Ferreira, Lima de Freitas, Eduardo Geada, Aureliano Lima, Campos Lima, Irene Lisboa, Maria Gabriela Llansol, Eduardo Lourenço, Álvaro Manuel Machado, João Medina, José Manuel Mendes, José Ferreira Monte, Adolfo Casais Monteiro, Vital Moreira, Sidónio Muralha, Fernando Namora, Rebordão Navarro, Vitorino Nemésio, Avelãs Nunes, Carlos de Oliveira, Fernando Assis Pacheco, José Cardoso Pires, António Pedro Pita, Júlio Pomar, Cândido Portinari, Paulo Quintela, Julião Quintinha, Luís Francisco Rebelo, Alves Redol, José Régio, Aquilino Ribeiro, Armindo Rodrigues, Urbano T. Rodrigues, António Ramos Rosa, Vítor de Sá, Mário Sacramento, Abel Salazar, Arquimedes da Silva Santos, Piteira Santos, António José Saraiva, José Saramago, José Sasportes, António Sérgio, Joel Serrão, Antunes da Silva, Gaspar Simões, José Carlos Vasconcelos, Alberto Vilaça, Mário Vilaça,

"Não pode a uma revista de cultura portuguesa ser indiferente a politica nacional e muito menos no momento em que se decide o Futuro, o nosso próprio Destino. Vértice toma posição apoiando as revindicações dos democratas portugueses, enquadrando-se no seu movimento em prol de eleições onde o país possa manifestar livremente a sua vontade..." [nº17/21, in Dicionário das Rev. Lit. Portuguesas, de Daniel Pires]

"…Romeu, tu conheces o Namorado?
- O poeta Joaquim Namorado, o director da revista Vértice, de Coimbra?
- Esse mesmo.
- É claro que conheço. Não te esqueças que eu sou colaborador da Vértice.
- Dizem, não sei se é verdade mas dizem que foi o Namorado quem, para iludir a PIDE e a Censura, camuflou de "neo-realismo" o tão falado "realismo socialista" apregoado pelo Jdanov...
Ri-se, abana afirmativamente a cabeça.
- É capaz de ser verdade, o Namorado sempre gostou de brincar às escondidas com a PIDE e a Censura ... Lembras-te daqueles pensamentos na contracapa de cada número da Vértice?
- Sim, estou a ver.
- Pois o Namorado, durante alguns números, publicou pensamentos do Karl Marx mas assinados com o pseudónimo Carlos Marques. E um dia aparece na redacção um agente da PIDE a intimidar: "Ó Senhor Doutor Joaquim Namorado, avise o Carlos Marques para ter cuidadinho, que nós já estamos de olho nele"... [in Romeu Correia]

quinta-feira, 8 de abril de 2004

"Notícias do Bloqueio" [Nos vinte anos da Intima Fracção. Obrigado Francisco Amaral]

"Aproveito a tua neutralidade,
o teu rosto oval, a tua beleza clara,
para enviar noticias do bloqueio
aos que no continente esperam ansiosos
..........

Dirás como trabalhamos em silêncio
como comemos em silêncio, bebemos
silêncio, nadamos e morremos
feridos de silêncio duro e violento

Vai pois e noticia como um archote
aos que encontrares de fora das muralhas
o mundo em que nos vemos, poesia
massacrada e medos à ilharga
..........

Diz-lhe que se resiste na cidade
desfigurada por feridas de granadas
e enquanto a água e os víveres escasseiam
aumenta a raiva
e a esperança reproduz-se"

[Egito Gonçalves, Arvore nº 4]

O Tempo e o Modo [nº 1, Janeiro 1963 ao nº 126, 1977]

"Revista de pensamento e acção" publicada em Lisboa (1963), dirigida sucessivamente por António Alçada Baptista, João Benard da Costa (a partir do nº 69/70) e Luís Matoso, foi inicialmente um projecto de jovens católicos (JUC) não-conformistas de antanho interessados em "desvincular toda uma geração do laço orgânico da versão salazarista do catolicismo" (Eduardo Lourenço), uma "revolução silenciosa" (idem) face à ditadura, uma "luta contra a desordem estabelecida" (Benard da Costa), de dissidência estética/politica/literária e, de facto, de crucial interesse para toda uma geração que não se revia na corrente dominante da oposição à ditadura. Caminhou, portanto, do "personalismo" à L'Esprit sob a direcção de Alçada Baptista (surgem debates sobre a problemática da função da arte e da crítica, ciência e filosofia, teatro e ensaio literário, no que conta com a participação de Herberto Helder, Sophia Mello Breyner, António Ramos Rosa, Vergílio Ferreira, Jorge de Sena, Cardoso Pires, Nuno Bragança, Abelaira, Murilo Mendes, Nuno Júdice, José Bento, Casais Monteiro, António Pedro, Agostinho da Silva, Agustina Bessa Luís, Alberto Ferreira, Almeida Faria, Angel Crespo, António Franco Alexandre, António José Saraiva, António Osório, Baptista-Bastos, Edgar Morin, Eduardo Lourenço, , Eduardo Prado Coelho, Fiame H. P. Brandão, João Rui de Sousa, José Augusto França, José Blanc Portugal, , José Gomes Ferreira, Rodrigues Miguéis, José Marinho, Palla e Carmo, Francisco Rebelo, Mário Soares, Jorge Sampaio, Michel Foucault, Paulo Quintela, Ruy Belo, Ruy Cinatti, Vasco Pulido Valente, Benard da Costa, Jorge Sampaio; Vítor Matos e Sá, etc.), para a partir do nº 69/70 enveredar, sob a direcção de João Benard da Costa, e principalmente a partir de Luís Matoso para uma maior influência na formação da "nova esquerda portuguesa", assumindo, já perto de 1974, uma posição marxista-leninista, versão EDE/MRPP, sob a direcção de Guerreiro Jorge.

"... Assim, pretendemos lutar, a nosso modo e também, contra a geral «desordem estabelecida», isentos de qualquer confessionalismo ou partidarismo politico concreto, preocupados em localizar e fazer incidir o nosso esforço sobre a análise, clarificação e resolução dos problemas que afectam o nosso tempo particular, propondo-nos especialmente – reflectindo uma concepção libertadora e progressiva da História e da Pessoa Humana, que acentue o primado desta sobre as necessidades materiais e técnicas colectivas em que se baseia o desenvolvimento – estudar com atenção crítica todas as formas de regressão e entrave a esse seu progressivo desenvolvimento..." [Editorial do nº 1, Janeiro de 1973]

quarta-feira, 7 de abril de 2004

A MEMÓRIA DO ELEFANTE




 A Memória do Elefante [Porto, nº 1, 1971- nº 13, 1974 (?)]

Jornal de Música Popular, Jazz, Rádio, com origem na cidade do Porto, saiu ente 1971 e 1974, com direcção de Joaquim Lobo, Editor Jorge de Morais, Relações Públicas João Afonso Almeida, Supervisão de Pedro Nunes, colaboração de António José Fonseca, Mário Gonçalves, Octávio da Fonseca e Silva, Jorge Lima Barreto, Pedro Proença, António Barredo Oliveira, Renato Silva, ...

"A Memória do Elefante tem sido e continua a ser por enquanto, um trabalho quase só de amadores não remunerados cuja acção procura concretizar um ideal de crítica. Estamos alheios aos jogos de interesses que orientam, subrepticiamente ou não, muitos representantes da nossa informação profissional (orgulhosamente). Os nossos redactores não têm obrigação de, como último recurso de incapacidade, encher umas quantas folhas de papel com as futilidades mais incríveis da vida mundana de personalidades pseudo-importantes do nosso putrefacto meio artístico, precisamente as personalidades «progressistas» (ah! ah!) que conduzem à recuperação da contra-cultura. A Memória do Elefante não é de, nem para escatófagos (...)" [A Memória do Elefante, nº 11, Janeiro de 1974]

"... A música urbana, na noção ideal, está ligada à vanguarda e à revolução sob todas as formas. Neste sentido pode dizer-se que em Portugal não há música urbana. Está, por aqui, num estado embrionário, simplista e pseudo-artístico. Abortadas que resultaram as experiências bem desenvolvidas mas inacabadas da Filarmónica Fraude e Quarteto 1111, não há para já perspectiva de uma música nova ..." [Octávio Fonseca e Silva, in José Afonso, ibidem]

"Este artigo é uma pequena e despretenciosa homenagem a Guy Debord e à I. S. Funda-se numa aplicação das teses reais do livro «A Sociedade do Espectáculo» e numa relação afectiva que a carta recentemente recebida dum fugitivo em França, Pedro Jofre, reavivou decisivamente ..." [Jorge Lima Barreto, in Jazz In Situ, ME nº 10, Agosto 1973]


Para Uma Música ... quase até 25 de Abril – O que se ouvia em dias escuros ou como roubar o tempo nos encontros … em cada um de nós. Porque o prazer, também, era transmissivel. É que a música podia chegar pelo lado mais distraído de nós. Uma pedrada no charco!

[Leonard Cohen (Live Songs) / Loud Reed & The Velvet Underground / José Mário Branco (Margem de Certa Maneira) / José Afonso (Venham Mais Cinco) / Brian Eno & Robert Fripp (No Pussyfooting)]

Catálogo nº 04 da Livraria D. Pedro V, Março 2004

A Livraria D. Pedro V - Rua D. Pedro V, nº 16 (ao Príncipe Real), Lisboa - lançou o seu Catálogo nº 4, com 263 peças a preços convidativos. Aberto todos os dias, em horário costumeiro, esse pequeno espaço é local de referência.

Algumas referências: O Inferno de Dante Alighieri (versão portuguesa com notas de uma breve noticia preliminar por Xavier da Cunha), Edic. David Corazzi, 1887 / História de Portugal, de João Ameal, 1940 / O Cristo Cigano, por Sophia de Mello Breyner, 1978 / Antologia do Humor Português (pref. de Ernesto Sampaio, selecção e notas de Virgílio Martinho), Ed. Fernando Ribeiro de Mello, 1969 / Monografia do Concelho de Ponte de Lima, pelo Conde d'Aurora, 1946 / História da Policia em Portugal, de Mascarenhas Barreto, 1979 / Memória sobre o Reino do Algarve, por Charles Bonnet, 1990 / Revista Gazeta Musical (Ano I, nº 1 15 de Out. 1950 ao nº 137 de Agosto de 1962, colaboração de Luís Freitas Branco, João José Cachofel, Luís Francisco Rebello, Mário Dionísio, Lopes Graça, Simões Dias, José Régio, José Terra, Virgílio Ferreira, António Sérgio, Adolfo Casais Monteiro, Gaspar Simões, Rodrigues Miguéis, Jorge de Sena, Cardoso Pires, Aquilino Ribeiro, ...) / Cancioneiro Fernandes Tomás, 1971 / Chronicas do Exílio, por Francisco Manso Preto (nº 1, 30 Dez. 1961 a nº 3, 11 Fev. 1963) / As Palavras e as Coisas, de Michel Foucault, Portugália, 1968 / O Salariato, por Pedro Kropotkine, 1976 / Inventário Artístico do Algarve / A Muralha, de Agustina Bessa Luís, 1957 / A Casa e Morgado da Oliveirinha nos Concelhos de Eixo e Aveiro, por Francisco Ferreira Neves, 1968 / Oceanos (nº 1 – nº 20) / Um Ano de Ditadura, de Sidónio Paes, 1924 / Breve Diccionario da Latinidade Pura e Impura com significação de ambas ..., por António Pereira, Lisboa, 1760 / Cristo Não Volta, de Alberto Pimentel, 1873 / Prosas de Antero de Quental, 1923-26, II vols / O Príncipe Real, de Hipólito Raposo, Ed. Gama, 1945 / As Encruzilhadas de Deus, de José Régio, 1935 / Biografia, por José Régio, 2º ed., 1939 / Primeiro Volume de Teatro, de José Régio, 1940 / Fado de José Régio, Coimbra, 1941 / Poemas de Deus e do Diabo, por José Régio, 1943, 2ª ed. / A Morte na Raiz, de Bernardo Santareno (poemas), Coimbra, 1954 / Nobiliário da Ilha Terceira, por Eduardo de Campos de Castro de Azevedo Soares, Porto, 1944, III vols / Notas Vicentinas. Preliminares de uma Edição Crítica das Obras de Gil Vicente, por Carolina Michaelis de Vasconcellos, Coimbra, 1912, IV vols / A Saudade Portuguesa, de Carolina Michaelis de Vasconcellos, 1922

terça-feira, 6 de abril de 2004

Abril

"Ora súbita raiz, ora formiga,
outro ar no tempo, outro lábio,
outro pé nos caules que começam,
mais redondo o nome que nos deram,
outro rim, outra asa, o cotovelo
aliviado no desenho, mais ligeiro,
outro faro, outra busca, outro riso,
hábil fuga da cama, outra mesa

- esta certa secreta impaciência
tem o nome de Abril, e habita sempre
as vírgulas (uma a uma) da surpresa
" [Pedro Alvim, Abril]