quarta-feira, 24 de março de 2004


Exercício necessariamente obrigatário

"A Alma é um tique" [Alfred Jarry]

O primeiro olhar sobre os vários textos sobre o assassinato de Yassin convoca alguma suspeição, mal-estar e ambiguidades várias. A filosofia doméstica de alguns roça a náusea. A rigidez dogmática de outros é inquietante. O discurso oficioso, uma hipocrisia. Seja como for, nada de bom se poderá esperar dessa caricatural autodestruição que fascina estes homens profundamente reprimidos, devastados numa irracionalidade doentia, sem memória nem utopia no olhar. Para eles "o mundo está divido em duas classes, uma é a nossa, outra é a vossa", como diria qualquer radical estalinista ou fascista. Os dias de hoje são uma imensa perturbação.

O que nesta leitura da morte (seja a de Yassin, de judeus, árabes, americanos ou espanhóis) mais impressiona é que pode-se estar com os "teocratas da morte" na mais racional das emoções, em elogio deslumbrado, sobranceiramente chocante, num grau zero de humanismo insinuantemente amoral. A dimensão da tragédia, a obsessão da "É a guerra! É a guerra!" não é mais que "fascismo rastejante" (Chomsky), um maniqueísmo inassumido (por pudor?) e onde a violência do dia-a-dia - o terrorismo - é um sintoma da doença que grassa nas sociedades actuais, quando o Estado-espectáculo normalizou a violência, institucionalizando-a. Reaccionários ou nostálgicos de antanho cedem à violência do(s) poder(es), consoante as "estações dos sentimentos", e ao fazê-lo legitimam o terrorismo. E, aqui, é bom também não esquecer que "o terrorismo mais eficaz é sempre o do Estado: os grupos matam simbolicamente, o Estado estatisticamente" (Alberto Morávia).

Sobre a questão do assassinato de Yassin, e da onda de assombração que varreu a blogosfera, destaque para os textos que respiram liberdade do Aviz e do Mar Salgado, que não seguem a vulgata dos lugares-comuns e que são um estimulo ao debate. Mesmo que possamos discordar, como acontece, sobretudo nalguma argumentação do FJV.

Cândido Augusto Nazaré

"Cândido Augusto Nazaré, falecido em Coimbra no dia 28 de Fevereiro de 1948, realizou a completa personalidade de bibliófilo. Desde o profundo amor aos livros, inteligente conhecimento das suas páginas, apreço do mérito dos autores, valor das espécies no mercado, até à figura singular no aspecto físico e no trajar, tudo nele denunciava a perfeita e característica individualidade do amador de velhos e novos livros. Toda a sua vida, fora da família, andou à volta de dois grandes enlevos espirituais - os livros e as arreigadas convicções políticas.
Cândido Nazaré, como era geralmente referenciado, alcançou autoridade em assuntos bibliográficos. Consegui-a, à própria custa de um trabalho de largos anos, sempre carreando exemplares para a sua famosa biblioteca. Viveu absorvido das muitas obras que continuamente colocava nas estantes da sua famosa livraria, naquela modesta casa, à rua Direita, da cidade de Coimbra (...)

Cândido Nazaré, está inteiramente na definição do professor Dr. Vitorino Nemésio, na sua apreciada secção no Diário Popular - 'Leitura Semanal' de 21-4-1948 - 'Ele além de ter sido durante anos e anos, o claviculário dos prelos da antiga Real Imprensa, e assim o cérebro dos tratados e dissertações da Alma Mater, era o detentor, por excelência, de um dos maiores saberes bio-bibliográficos do Portugal de oitocentos-novecentos. Porque este bibliófilo e bibliógrafo não era um trapeiro de livros, mas exactamente um coleccionador consciente e entusiasta da produção literária sob o signo da qual o seu espírito desabrochou, e das coisas respeitantes aos homens espirituais que se acostumou a admirar desde moço'. Recorria-se á biblioteca deste bibliófilo e bibliógrafo, tantas vezes aberta a estudiosos, como se procurava, na sua memória felicíssima, a informação de certos factos ligados com a vida literária. Cândido Nazaré era um livro aberto, para todas as consultas a tal respeito. Pode dizer-se que não passou por Coimbra, investigador ou literato, que não se tivesse socorrido das suas magníficas estantes pejadas de livros. E havia razão para isso. Desfolhando-se as páginas dos Catálogos referentes a essa magnífica biblioteca, encontra-se justificação bastante para o interesse dos eruditos ou curiosos de assuntos livrescos ..." [in, Bibliomanias]

terça-feira, 23 de março de 2004


Alberto Ghiraldo [1875-1946]

m. em Santiago de Chile a 23 de Março de 1946

Alberto Ghiraldo foi poeta, dramaturgo, militante de linhagem anarquista, jornalista. Fabulosa figura romântica argentina, sonhador libertário, foi director de El Año Literario (num. único, 1891), La Protesta (1904), Ideas y Figuras Revista Semanal de Crítica y Arte, El Obrero, El Sol (1904), Martín Fierroy (1924-27, inclui escritos de Borges e no seu manifesto inicial, de autoria de Oliverio Girondo dizia-se: "Martín Fierro" sabe que "todo es nuevo bajo el sol" si todo se mira con unas pupilas actuales y se expresa con un acento contemporâneo)]. Em 1943 publicou O Arquivo de Rubén Darío, de quem foi amigo pessoal.

"El drama por el drama? No. El drama por la vida, entonces, es decir, el drama por la idea. Lo demás será sólo asunto de feria, espectáculo de circo, negocio, nada más que negocio. A lo sumo, goce infecundo, placer de solitarios... Hay que echarse en la vida, bracear en el oleaje, con alma enérgica y músculo férreo, sin adular a minorías privilegiadas o mayorías sin criterio, para poder realizar obra de verdadero arte y de verdadera ciencia... Así pues, para ser adeptos de la ciencia y del arte, hay que interesarse por el bien de la humanidad." [AG, in Revista "Estudios" nº 68, Abril de 1929]

"Valencia, tierra en que vive
la raza amiga del sol.
No vengo a daros la luz:
os traigo mi corazón.
Bardo errante, voy cruzando
del mundo por la extensión.
Y tengo por patria el mundo
porque es muy grande mi amor ...
" [Salutación a Valencia]

Locais: Las ideas y la figura de Alberto Ghiraldo / La dimensión verbal en el teatro anarquista: la columna de fuego de Alberto Ghiraldo / Poesia / El nombre de "Los Inmortales" / Homenagem a Rubén Darío / Las peñas literarias de Buenos Aires

segunda-feira, 22 de março de 2004

Tua ...

Tua vagina ouço é um vagido
cheira à lenha que um corte tacteou
sabe a chuva ao queixo humedecido
olhos que mais altas coxas sobrevoou


[Dórdio Guimarães, Canto Psicadélico, 1968]
... mais le bateau s'en va

Lá no alto contempla-se a planície sem fim e tudo são pedras cinzas e nada. A espingarda queima-nos, as costas ardem e o sol está a pique, aqui no barrento sem umbigo ventre deste rio. Esquisito gotejar. Leve corres pela água. O homem veio do mistério, dizes, que não se pode ir contra a natureza. Cantas Bernardim:

Dizem que havia um pastor
antre Tejo e Guadiana,
que era perdido de amor
per ua moça Joana


e há em cada instante teu essa animalidade que sempre nos desconcerta e o pudor na ilusão dum olhar prometido. Que faz sonhar. À cautela, entre dentes, dizemos:

"Conhecem-me os cavalos e a noite e os desertos
traiçoeiros e a guerra e as feridas e o papel e a pena
" [Herberto, com certeza]

domingo, 21 de março de 2004


Textos & Pretextos

"A felicidade é um desporto violento" [VGM]

- José Pacheco Pereira é hoje um homem em frangalhos. O processo de catarse dos tempos idos de fervorosa militância maoista, presume-se, deixa-o, ainda, fora de qualquer lucidez, tal a baralhada em que hoje se encontra. O estrépito das suas afirmações sobre o eterno guerrear (é guerra ... é guerra), é um delírio que desperta a curiosidade de alguns leitores confusos e agressivos (adolescência revisitada, evidentemente), mas não deixa de ser uma despeitada cruzada apocalíptica, incoerente politicamente, intolerante humanamente. Ainda não refeito das mazelas do engodo da administração de Bush & Blair, e num suave engano de alma, lança nova orquestração a favor da barbárie da guerra, com vigor emotivo e laborioso, caindo nas suas próprias armadilhas (vidé o que nos diz sobre a queda do governo de Aznar, a lamúria sobre a guerra civilizacional aqui à porta, ou a intimação de fazer campanha política lado a lado com a extrema-direita portuguesa). Mesmo que não comova ninguém, a enorme fadiga na leitura dos seus escritos e prelecções, na rádio e TV, deixa-nos com alguma amargura. Afinal sempre há pessoas que se julgam deus. E, como dizia Mercúrio no Anfitrião de António José da Silva, depois de se falar em tragédia, se "quiserem, transformo-a de tragédia em comédia, sem mudar um único verso". O que é uma enorme maçada. Convenhamos.

- E lá vai a tripla rodrigueana em alquebrada teatralização. Contra um texto de Baptista-Bastos, os adeptos arquejantes de Nelson Rodrigues - Ivan Nunes, Pedro Lomba e Pedro Mexia - entendem, na sua desvairada idolatria, que quando se trata de "génios" tudo o que toldar a atmosfera dos prosadores, reveste o aspecto caricatural. Motivo suficiente para não permitirem que as ideias políticas de Nelson Rodrigues (ou de outros mais) sejam tão importantes como o "estilo". E é claro que no magistral desmascaramento rodrigueano da sociedade carioca, num azedume de rajada, cínico e desbragado, se deverá esquecer a vileza das suas acções contra companheiros e de apoio à ditadura. Tudo bem. Mas uma coisa é certa: duvido que Nelson Rodrigues aceitasse essa altívola objectividade na argumentação, agora utilizada. Logo ele, que não tinha paciência para os «idiotas da objectividade». Não é verdade?
Arrumos & Notas

- no "Catálogo do Museu Nacional de Arte Antiga / 22ª Exposição Temporária/ Peças oferecidas ao Museu pela Exma Senhora D. Arnilda da Cruz Roque Penim Kamenezky, que faziam parte da colecção de seu marido o antiquário Eliezer Kamenezky, Lisboa Julho de 1959" (11p. policopiadas), pode-se ler:
"A Senhora ..., dando satisfação a um desejo de seu falecido marido, o antiquário Eliezer Kamenezky, entregou ao Museu Nacional de Arte Antiga um grupo de valiosas obras de arte que faziam parte do espolio daquele apreciado coleccionador.
Eliezer Kamenezky, de origem russa, mas há longos anos estabelecido em Portugal, país ao qual se dedicava, era um espírito curioso, que se desdobrava em mil facetas, qual delas a mais estimável. A sua principal ocupação foi sem duvida o comércio de antiguidades que bem conhecia, apreciando sobretudo os marfins e as miniaturas, modalidades das quais reuniu um valioso agrupamento..." [João Couto, in Catálogo ...]

- curioso opúsculo de Pedro Veiga (Petrus) intitulado "Um Juiz no banco dos réus. Homenagem ao Juiz sr. Antero Cardoso ...", Porto, 1936, na qual Pedro Veiga apresenta uma quaixa ao Conselho Superior Judiciário, sobre a sua prisão pelo dito Juiz.

- "Popular - E agora que acabeis de reconquistar para Portugal o nome glorioso que havia perdido, jamais deveremos esquecer os heroes, que desappareceram na lucta. Mas cidadãos; a primeira consagração á nascente republica, a primeira homenagem de Portugal, libertado pela revolução dirige-se a dois finados. Miguel Bombarda e Cândido dos Reis (Descobrem-se todos) medi a grandeza d’essas figuras collosaes, pela grandeza do triumpho que conquistamos, ..." . Da peça dramática "A Republica Portugueza. Quadros allegoricos à proclamação da Republica" original de Feliciano d'Oliveira (s/d)

- conto curioso do escritor Vieirense (Vieira de Leiria) Virgílio Guerra Pedrosa, "O Pinhal do Rei", 1935.

- a partir da notícia do Diário de Lisboa (30/01/1950) onde se lê: “"O retrato do sr. Dr. Alfredo Pimenta, pintado por Preto Pacheco, em exposição nas Belas Artes, sofreu um desacato. Alguém raspou (coisa de vis sentimentos), umas das aspas da cruz gamada, que se vê a um dos lados da tela", Alfredo Pimenta (Na Sociedade Nacional das Belas Artes. A Navalha em Acção) desanca em tudo e todos. Curioso.

Johann Sebastian Bach [1685-1750]

n. em Eisenach a 21 de Março de 1685

"... Bach viveu a Europa como um todo (...) A amplidão de vistas, que permitiu a assimilação de tanta ciência e de tantas culturas diferentes, é a grande maravilha do génio de Bach.
E de cada ideia estrangeira de que ele se apropriava fazia uma bra-prima. Para muitos amadores de musica do nosso tempo ele será o «velho Bach», que viveu antes dos «Grandes Mestres», antes de Mozart, Beethoven e Schubert. Eles, os amadores contemporâneos, pensarão que Bach está na origem da música, que ele lançou os alicerces sobre os quais os outros edificaram. Na verdade Bach foi um concentrador. Tudo em que ele tocava trabalhava-o tão poderosamente, todas as tarefas musicais que se impunham eram por ele realizadas com tal perfeição, que os que vieram depois nunca mais se deviam atrever a fazer o mesmo..." [Friedrich Herzfeld, in Nós e a Música]

Locais: J. S. Bach Home Page / Johann Sebastian Bach (1685-1750) / J. S. Bach / Biografia / J. S. Bach Archive and Bibliography / Bach Central Station

sábado, 20 de março de 2004

Arrumos & Notas

- a peça nº 216 do Catálogo do Leilão da Biblioteca que pertenceu ao Dr. João Eduardo Nogueira e Mello, realizada pela Soares & Mendonça (s/d) , refere um conjunto de 25 volumes manuscritos do poeta Francisco Joaquim Bingre (1763-1856), juntamente com cartas do "aveirense José Corrêa de Miranda, em que o mesmo diz ter compulsado os manuscritos e aos quais faz interessantes referencias". Diga-se que Bingre, nasceu na Freguesia de S. Tomé de Canelas, perto de Estarreja, tendo pertencido à "Nova Árcadia" com o nome "Francelio Vougense" (ou Cisne do Vouga). Existe no mercado as Obras de Joaquim Bingre, Vanda Anastácio, V vols. Porto, Lello, 2000-2002.

- Na primeira direcção do Jardim Zoológico de Lisboa, que foi inaugurado a 22 de Maio de 1884, constava além do Rei D. Fernando como Presidente de Honra, o Visconde de S. Januário (Presidente), o Dr. António Augusto Carvalho Monteiro (Monteiro dos Milhões ou o edificador da actual Quinta da Regaleira, em Sintra), além do Barão de Almeida Santos, Barão de Kessler, Dr. Carlos May Figueira, Conde de Ficalho, Dr. Eduardo Burnay, Eduardo Coelho, Francisco Isidoro de Viana, Francisco Rebelo de Andrade, Dr. Sousa Martins, Eng. Miguel Carlos Correia Pais, Dr. Fernando Matoso Santos, Dr. Adriano Van Der Laan, Dr. Vicente Rodrigues Monteiro. [in, Para que a cidade tivesse o seu Jardim ..., de Emygdio da Silva, desenhos de Raul Lino, 1945]

- em edição policopiada aos sócios, a Pragma (sociedade cooperativa fundada em 1964, por católicos, desenvolvia trabalho de difusão cultural, uma nova "acção comunitária" de aproximação entre "diferentes grupos sociais”") explica o processo pelo qual a PIDE "selou a sede da Pragma", apresentando o rol de actividades desenvolvidas até então (realce às conferências, circulo de cinema, exposições) e a documentação sobre o caso citado. Refira-se os nomes de Nuno Teotónio Pereira, João Joaquim Gomes, António Macieira Costa, Nuno Silva Miguel, da direcção, sendo os advogados da Pragma, António Borges Coutinho e José Manuel Galvão Teles.

quinta-feira, 18 de março de 2004

[A Múmia]

"... Na sombra Cleópatra jaz morta
Chove

Embandeiram o barco de uma maneira errada
Chove sempre

Para que olhas tu a cidade longínqua?
Tua alma é a cidade longínqua.
Chove friamente ...
" [F.P.]

Jacques de Molay [1244-1314]

m. em Paris a 18 de Março de 1314

"Ter sempre em memoria o mártir Jacques de Molay, Grão-Mestre dos Templários, e combater sempre em toda a parte, os seus três assassinos - a ignorância, o fanatismo e a tirania" [Fernando Pessoa]

"... Por circunstâncias que, ou são desconhecidas e por isso se não podem narrar, ou são conhecidas mas por sua natureza se não podem narrar também, veio a formar-se, com certos fins místicos e secretos, a dentro do seio visível da Igreja de Roma, uma ordem que foi designada de Ordem Militar do Templo de Salomão. Os seus servos, iniciados ou não, são os que designamos pela abreviação de Templários. A esta Ordem Mística foram confiados os segredos e a tradição da Igreja Gnóstica. Só a Noite sabe de que maneira foram transmitidos..." [F.P. 54-A-18]

"Há três tipos distintos de iniciação - simbólica ou externa, intelectual (exterior à interna), e vital (interna). Nas iniciações simbólicas, que reforçam a vontade e em consequência conduzem à Magia como realização, o candidato não passa por estádios de compreensão, mas, por assim dizer, por estádios de intuição; está continuamente na superfície e na aparência das coisas e, muito embora atinja o mais alto grau seja em que ordem ou ordens se inicie, esse alto grau não precisa de corresponder (geralmente não corresponde) a qualquer coisa como um grau paralelo em qualquer das iniciações internas ..." [F.P., in A Procura da Verdade Oculta, 1986]

"Em todas as ordens definidas, mas com fundamento oculto, há a ordem externa e a ordem interna. Assim nos Templários, na data da sua extinção violenta, era Chefe Externo (Grão-Mestre) o cavaleiro francês Jacques e Molay, e era Mestre Interno (Mestre do Templo) o cavaleiro escocês Robert de Heredom ..." [F.P., Subsolo, ibidem]

quarta-feira, 17 de março de 2004


Bocas da Blogosfera

* O doutor Filipe Moura declara que Pedro Lomba é “um discípulo involuntário do relativismo”, enquanto a blogosfera corre a alistar-se no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Ora aí está, “quem foge sempre escapa”, assegura um bloguista romântico. Ao que outro responde: “uma ovelha má põe o rebanho a perder”. Deseja-se as melhoras ao doutor da entropia * Após apurado estudo sobre a “higiene das mulheres de esquerda”, o Alberto-a-Dias, ainda a braços com a doença do matrimónio, confessa à volta do arroz de lebre que “quem não se aventurou, não perdeu mas não jantou”. Óptimo, afirma JPC, que para mim, “homem padeiro, não morre de fome” * Pacheco Pereira a postar … todos p'ró bar, defende um leitor do Abrupto * Um almocreve opina que “quando no oásis não está ninguém diz-se que o oásis” é um não-Cavaco. No entanto Filipe Moura considera que, neste caso, se deve dizer, buraco-negro * VLX a escrevinhar é de espreitar e como o moço não é canhoto teremos sorte no totoloto * Diálogo do dia: “Que se faça Luz”, exclama o André Belo. “E Alvalade?”, pergunta Daniel Oliveira * Faz precisamente 31.43 h que este senhor não elogia este senhor. Bravo! * “Não haverá míssil do sétimo dia”, garante Nuno Rogeiro à SIC-Noticias

Luchino Visconti [1906-1976]

m. em Roma a 17 de Março de 1976

Locais: Visconti.com / Luchino Visconti / Luchino Visconti (1906 - 1976) / Biografia di Luchino Visconti / Biographie / Biography / Filmographie / Visconti / L. Visconti / Mestre Visconti / As Contradições do Príncipe
Um terrorismo nos dentes

"Todo o sentimento poderoso provoca em nós a ideia do vazio" [Artaud]

Entrámos num paradoxo infinito, a saber: a vitória do PSOE foi ou não uma vitória da Al Quaeda, como alguns blogs (re)afirmam? Coisa grave? Não parece. O menos que se pode dizer é que se trata de pensamentos pecaminosos. Afinal, não custa muito ignorar o equívoco dessa retórica burlesca. Aventar a hipótese do êxito eleitoral do PSOE ser uma evidência de vitória do terrorismo é assumir o gag verbal da própria estratégia terrorista. Aqui, a escala interrogativa é um mero conceito operatório de matriz político-partidário. E desvela um azedume doentio, macilento e histérico de quem não sabe perder.

A reprimenda dos espanhóis ao governo de Aznar foi demasiado evidente. As razões não se devem, unicamente, à má gestão sobre os autores do atentado, a não ser que não se tenha em conta as diatribes do governo em torno das autonomias, o agastamento da população contra a invasão do Iraque, as manipulações da informação em diferentes casos ocorridos. Nem é justo que se assombre a coragem de uma população na luta que sempre demonstrou contra o terrorismo (ETA, evidentemente) com os factos últimos. No fundo, não é possível pensar que o temperamento e a maturidade política dos espanhóis possam ser comparados aos nossos indígenas lusos. A não ser por distracção ou má fé.

Uma outra questão, é "o que fazer" na luta contra o terrorismo, como se pode combatê-lo, sem qualquer forma de capitulação, mas também sem o uso e abuso da ideia de cruzada (o "estamos em guerra" do Pacheco, Fernandes & Cia), novo messianismo ou maniqueísmo implacável, que configura o terror como norma e tal norma como forma de vida, que muitos abusivamente defendem. E que exige novos meios de inscrição, um outro discurso e, certamente, novos interpretes. Não tenham dúvidas.

terça-feira, 16 de março de 2004


Camilo Castelo Branco [1825-1890]

n. em Lisboa a 16 de Março de 1825

"Dizem que a literatura é o século: esta é uma das poucas verdades que a geração presente adivinhou" [CCB, in O Nacional]

"É uma jolda de infames essa turba de biltres que volteia em redor de mim, contemplando, pasmada, os actos da minha vida. Estúpidos, não ousam perguntar-me por que vivo assim. Devoram-se dum rancor selvagem quando não podem explicar as alegrias de espírito ..." [CCB, in Um Livro]

"A nossa época é essencialmente analisadora; e o nosso público é zelosamente empenhado em julgar os grandes e pequenos acontecimentos, desde a revoltosa queda de uma dinastia de quinze séculos, até à demissão imprevista dum cabo de polícia. Também julga os grandes e pequenos homens, desde o herói de cem batalhas até ao bagageiro inofensivo; desde César até João Fernandes.
E o caso é que nós - o público - somos uma cousa bem respeitável, como disse um sábio. Cada um de nós é uma página deste grande livro da humanidade, brochado em uma mesma encadernação, chamada «crítica».
E tão entranhada é a consciência, que temos da nossa dignidade medicratiz, que, apenas o corpo social revela sintomas de moléstia, por mais abstracta, ou indefinida, que ela seja, aí nos ajuntamos todos a devassar os segredos patológicos do enfermo. Se toda a nossa ciência de probabilismo não descortina o mistério, conjuramos contra a nossa ignorância, e chegamos a inventar moléstias para lhe aplicarmos forçosamente - custe o que custar - a nossa farmácia da crítica.
É então que o doente corre perigo de morte, e as mais sólidas virtudes se desfiguram tocadas pela nossa critica viciosa. A calúnia é o nosso fórceps, quando o parto da verdade é trabalhoso, e demorado.
Sendo a humanidade um corpo solidário, um parlamento sem acintes nem caprichosos facciosos, devemo-nos reciprocamente o encargo de nos elucidarmos sobre alguns acontecimentos de sintomas equívocos ...” [sublinhados, nossos]

[CCB, Revelações, in O Nacional, nº 269, 1952 (aliás, in Polémicas de Camilo, vol. III, Portugália, 1967]

Locais: Camilo Castelo Branco / Camilo C. Branco / Biografia / Camilo Castelo Branco (1825 - 1890) / Camiliana / Casa Museu de Camilo / Um Olhar Sobre o meu condiscípulo / Carta(s) de Camilo Castelo Branco a José Cardoso Vieira de Castro

domingo, 14 de março de 2004

Obsceno

"O olho que vês não é / um olho porque o vês tu: / é olho porque te vê." [António Machado]

Madrid. No princípio é o horror que nos esmaga. Um silêncio de palavras. Longo, que as palavras voam alto. Os desvairados caminhos do terrorismo empurram-nos de pesadelo em pesadelo. Depois, em espanto cada vez maior, deixamo-nos assaltar pela banalidade do quotidiano. Poderá "o homem explicar o homem"?

Entretanto, nem perante o cansaço do horror assim desnudado os homens foram, por uma vez, dignos e sensatos. Não souberam honrar as vítimas. Não lhes fizeram justiça. Tropeçaram, ruidosamente, nos seus próprios demónios. Inventaram denúncias a seu bel-prazer, de acordo com as suas estratégias político-partidárias, numa cartilha de comportamento ideológico obsceno. Nem mesmo se prestaram a sacudir a lama que lhes fede a alma. Foram infames. Quase sempre maliciosos, cínicos, provocadores, obscenos. Insidiosamente, procuraram manipular a dor de todos nesta viagem. E de mentira em mentira, já não distinguem a verdade. Que dizer desse insano Ministro do Interior espanhol ou do vómito José Manuel Fernandes? Como nos podemos esquivar às tropelias, desde o primeiro post, do Pacheco Pereira e de outros sueltos verbosos que acometeram à blogosfera lusa?

Esquecem-se que "nós precisamos de inteligência", e que se "a vida é um processo de desordem", então o objectivo da política é transformar a desordem em liberdade consciente, generosa, inteligente e sustentada. Nada mais simples.


"Escribir en España es hablar por no callar
lo que ocurre en la calle, es decir a medias palabras
catedrales enteras de sencillas verdades
olvidadas o calladas y sufridas a fondo ..."

[Blas de Otero, Nadando y Escribiendo en Diagonal]

sexta-feira, 12 de março de 2004


Somos Todos Madrilenos

O sangue, o medo e a morte, abateu-se ontem sobre Madrid. Os assassinos desapareceram, covardemente. A besta passou por ali. Para trás ficou um rasto de desalento, destruição e assombro. O terrorismo é isso: um desespero político, um universo de terror, uma irracionalidade doentia. Morrer em Madrid. Como em Nova Iorque, Bagdad, África ou na América Latina. O mesmo inferno. Nada nos surpreende. Aprendemos a soletrar te-rro-ris-mo, com um azedume no corpo e o espanto na garganta. Uma guerra que nunca mais acaba. E caminhamos de olhar vazio, um enorme cansaço, as palavras "um ouvido tenso de rumor numa flor de pedra". Como recomeçar, nesta confusão caótica da vida? Ou "como posso eu começar alguma coisa de novo, com todo este dia de ontem em cima de mim" ? (Leonard Cohen)

quinta-feira, 11 de março de 2004


Leilão de Pintura Contemporânea - Dia 17 de Março (21 h) no Palácio Correio Velho

Atenção ao leilão do Palácio do Correio Velho (Calçada do Combro, 38 A, 1º- Lisboa) de Pintura Contemporânea. O catálogo está disponível on line. Vai à praça excelentes lotes de Almada Negreiros / Beecroft / Bual / Cargaleiro / Carlos Calvet / Charters de Almeida / Cruzeiro Seixas / Eduardo Malta / Eduardo Viana / Emérico Nunes / Francis Smith / Gil Teixeira Lopes / Hogan / Hollader / Isabel Laginhas / José Guimarães / José Rodrigues / Julião Sarmento / Júlio / Júlio Pomar / Júlio Resende / Lima de Freitas / Mário Cesariny / Mário Henrique Leiria / Max Papart / Menez / Pinto Coelho / Paula Rego / Rocha Pinto / Rogério Amaral / Teixeira Lopes / Vieira da Silva , entre muitos. A não perder.

Catálogo da Exposição Bibliográfica "Clássicos de Economia Política da U. C. "

"Os livros que, nesta ocasião, se mostram, parte dos riquíssimos fundos bibliográficos da nossa Universidade, servem para evidenciar como o interesse pelas questões económicas se manifesta em Coimbra, pelo menos, desde o século XVII. Obviamente, muito antes da instituição da cátedra de Economia Política (e Estatística) na Faculdade de Direito, após a reforma de 1835. Caso se tivesse concretizado, porém, a intenção do Conselho Superior de Instrução Pública de criar, na década de 1840, a Faculdade de Ciências Económicas e Administrativas na nossa Universidade poderia ser outra a celebração que se assinala com esta exposição. Poderíamos estar a relembrar a existência da Faculdade de Economia mais antiga ... do mundo. Não é o caso. Mas a ocasião fausta que é a celebração do trigésimo aniversário da entrada em funcionamento da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, é motivo de acrescido regozijo porque o que com esta exposição bibliográfica se comprova é uma curiosidade e um interesse antigos por um ramo do conhecimento que, com o tempo, assumiria uma centralidade incontrastada.
Dito isto, resta convidar-vos para uma viagem que começa em 1615 e termina em 1915. Três séculos em que as ideias económicas evoluem desde a «invenção» por Antoyne de Montchrestien do neologismo Economia Política - no Traicté de l'oeconomie politique, publicado em Ruão na tipografia de Jean Osmont - até ao livro de Francesco Saverio Nitti - Il capitale straniero in Itália - também aqui exposto (...)
O que há a fazer de melhor, é percorrer, nesta sala de São Pedro da Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, os diferentes expositores que agora guardam, mostrando-os, estes tesouros escondidos. E reflectir sobre o significado, na sua e nossa época. Porque estes objectos expostos, todos ou quase todos contribuíram para uma aventura ou projecto que traduzimos sinteticamente pelo termo - MODERNIDADE (...)"

[Joaquim Feio, Destes Livros, Desta Exposição, in Catálogo ..., 2004]