domingo, 21 de março de 2004


Textos & Pretextos

"A felicidade é um desporto violento" [VGM]

- José Pacheco Pereira é hoje um homem em frangalhos. O processo de catarse dos tempos idos de fervorosa militância maoista, presume-se, deixa-o, ainda, fora de qualquer lucidez, tal a baralhada em que hoje se encontra. O estrépito das suas afirmações sobre o eterno guerrear (é guerra ... é guerra), é um delírio que desperta a curiosidade de alguns leitores confusos e agressivos (adolescência revisitada, evidentemente), mas não deixa de ser uma despeitada cruzada apocalíptica, incoerente politicamente, intolerante humanamente. Ainda não refeito das mazelas do engodo da administração de Bush & Blair, e num suave engano de alma, lança nova orquestração a favor da barbárie da guerra, com vigor emotivo e laborioso, caindo nas suas próprias armadilhas (vidé o que nos diz sobre a queda do governo de Aznar, a lamúria sobre a guerra civilizacional aqui à porta, ou a intimação de fazer campanha política lado a lado com a extrema-direita portuguesa). Mesmo que não comova ninguém, a enorme fadiga na leitura dos seus escritos e prelecções, na rádio e TV, deixa-nos com alguma amargura. Afinal sempre há pessoas que se julgam deus. E, como dizia Mercúrio no Anfitrião de António José da Silva, depois de se falar em tragédia, se "quiserem, transformo-a de tragédia em comédia, sem mudar um único verso". O que é uma enorme maçada. Convenhamos.

- E lá vai a tripla rodrigueana em alquebrada teatralização. Contra um texto de Baptista-Bastos, os adeptos arquejantes de Nelson Rodrigues - Ivan Nunes, Pedro Lomba e Pedro Mexia - entendem, na sua desvairada idolatria, que quando se trata de "génios" tudo o que toldar a atmosfera dos prosadores, reveste o aspecto caricatural. Motivo suficiente para não permitirem que as ideias políticas de Nelson Rodrigues (ou de outros mais) sejam tão importantes como o "estilo". E é claro que no magistral desmascaramento rodrigueano da sociedade carioca, num azedume de rajada, cínico e desbragado, se deverá esquecer a vileza das suas acções contra companheiros e de apoio à ditadura. Tudo bem. Mas uma coisa é certa: duvido que Nelson Rodrigues aceitasse essa altívola objectividade na argumentação, agora utilizada. Logo ele, que não tinha paciência para os «idiotas da objectividade». Não é verdade?