terça-feira, 1 de novembro de 2005
Alfred Jarry
"Alumiai, irmãos, o caminho de vosso senhor, grande peregrino. Seguimo-lo alegres sem dúvida: fechados em grandes caixas de lata durante toda a semana, só ao domingo podemos respirar o ar livre. Palafreneiros das Serpentes de Bronze, nós somos os Pa, nós somos os Pa, nós somos os Palotins.
Orelhas ao vento, em fileiras apressadas, marchamos num passo guerreiro, e as pessoas que nos vêem passar tomam-nos por militares.
Nós somos os Palotins! Vivemos dependentes de uma dobradiça, mijamos por uma torneira, e o ar chega-nos por um tubo em U! Nós somos os Palotins!" [A. Jarry, in &ETC, nº16, 31/10/1973]
"... Sim meus senhores, espevitem bem as orelhas e não façam muito chinfrim ... nós massacramos uma infinidade de gente ... o nosso sonho é fazer sangrar, esfolar, assassinar; arrancamos os miolos, publicamente, todos os domingos, algures nos arredores, em cima de um estrado com cavalinhos de madeira e vendedores de coco à volta ... peripécias antigas, que se aqui estão arquivadas é porque nós somos muito ordenados ... e por isso mesmo ordenamos agora aos senhores Juízes que nos condenem à maior pena que lhes passe pela cabeça, para que ela seja proporcional connosco; mas não à morte, isso não ... Estamos já a ver-nos como forçados, com um belo boné verde, todos repimpados à custa do Estado, e ocupando os nossos ócios com qualquer trabalhinhos leves" [A. Jarry, in Antologia do Humor Negro, Afrodite, 1973]
Alfred Jarry [1873 - m. 1 Novembro 1907]
"Como ele próprio disse: «Redon - o que misteria» ou «Lautrec ? o que cartaz», há que dizer: Jarry, o que pistola. «E - escreveu ele no ano em que morreu, a Mme Rachild ? é grande a felicidade de ... proprietário poder dar tiros de pistola no nosso quarto de dormir»" [pref. a Alfred Jarry, in Antologia do Humor Negro, Afrodite, 1973]
"Esse pão com fome de polacos e de bicicleta com a poesia com as tripas de fora atravessando incólume etra de Ubus, o amoroso voador de diamante em visita ao absoluto, Alfred Jarry de seu nome incandescente, que eu conheci estava no meu primeiro solo de ranger de dentes e ele atirava ao alvo - ó cabecinhas - , esse Pão que todos os dias nos rebenta na boca logo de manhã, e depois na mesa, e na cama à noite, e sempre, enquanto este tempo de Ubus não for empurarrado para o alçapão, Alfred Jarry de seu nome de letras crepitando no sonho e escrito no espelho de perigos de cada um.
Este poeta e a vida, paixão e morte da sua vida não devem sofrer homenagens para além do palito, que é, supõe-se, o que todos aqui vêm trazer, cada um à sua maneira, e visto que desviar as balas que continuam a passar alegremente em direcção ao inimigo ainda vivo seria o mesmo que desarmar o franco-atirador que foi Alfred Jarry - e ficarmos desarmados (...)
A vibrante canção de recusa e de degolação que é a vida e a obra de Alfred Jarry colocam a poesia, e ele, na primeira linha dos grandes atiradores da passagem do século. Cabe aos poetas não esquecê-lo e passar a palavra" [António José Forte, in &ETC, número especial dedicado a Alfred Jarry, nº16, 31/10/1973 ]
Locais: Alfred Jarry / Alfred Jarry (1873-1907) / Alfred Jarry / Alfred Jarry (Francia, 1873-1907) / Alfred Jarry 1873-1907 / Alfred Jarry et la littérature de son temps / Ubu Roi ou les Polonais / Alfred Jarry Corbeil, Paris / alfred jarry: absinthe, bicycles and merdre / 5 poemas / Un precursor desconocido de heidegger: Alfred Jarry (Gilles Deleuze) / Ubu vous salue bien
O Terramoto de Lisboa de 1755
"Perto das 8 horas, um leve tremor. Às 9 e 3 quartos, quando as ruas e as igrejas estavam cheias de gente, sentiu-se no ar um fragor como um desfilar de um carro, seguido levíssimo tremor de terra que a pouco e pouco foi aumentando durante seis a sete minutos com força horrível e agitação espantosa de todos os edifícios sagrados e profanos. A terra tremia debaixo dos pés, depois subia e descia, ondeava, oscilava e as casas bailavam como navios no meio das ondas, perdendo o centro da gravidade, enfraquecendo-se nos alicerces, desconjuntando-se, desarticulando-se e caindo fragorosamente. Depois outro som, à guisa de trovão, com outro tremor de terra mais violento que antes, agitando com mais ímpeto os edifícios que tinham ficado de pé, e pelo espaço de três minutos. Seguiu-se outros: a 8 e 11 de Novembro, na noite de Natal, Quinta-Feira Santa e 'Ordinariamente depois de cada quarto de Lua'
O terramoto chegou menino a Lisboa e ficou gigante em poucos momentos; sacudiu com tal força e duração que parece não ter havido outro igual depois da morte de Cristo. Abatidos estátuas e arcos, pórticos e baluartes, torres e igrejas, casas e palácios; e a terra abriu-se, rasgou-se em vários lugares. O cais da Rocha foi engolido, o mar ficou mais profundo. Os prédios, caindo sobre outros, derrubaram também estes. Era a derruba da floresta onde umas arvores arrastam na queda as outras arvores. E tudo de surpresa numa cidade de casas altas, de ruas estreitas, desprovidas de praças, numa hora tardia, num dia solene, com as igrejas repletas. O povo ficou gelado e estúpido de espanto. Julgaram uns que o castigo fosse particular da sua pessoa ou da sua família, e quedaram-se de joelhos, mãos cruzadas no peito, cabeça inclinada como réus no patíbulo. Onde o terramoto os apanhou, aí se mantiveram, ou no alto das paredes ou traves, que, agitadas espantosamente, estalavam, ou debaixo dos pavimentos, ou ao lado das paredes a inclinar-se violentamente, esperando da divina justiça o golpe final (...)
E o mar, o manso e lindo mar de Lisboa? Embraveceu, esbravejou e rugiu pela foz do Tejo. Roncava mais e mais à medida que subia; subia para lamber primeiro, abocanhar depois e arrebatar em seguida arvores, mesas, traves, dando em troca à terra apavorada as barcas que as ondas lá deitaram (?)
Primeiro a terra com os abalos, depois com o mar com a fúria das ondas e ainda depois o céu com o fogo, que não deu prejuízo inferior ao terramoto (...) Oito dias durou o grande incêndio e durante semanas e meses não deixou de arder e fumegar, calcinando, incinerando Lisboa ..." [in O Cardeal Nacional, pp.212-215 (aliás, in nota 4. no capitulo XXIV, de Portugal A Corte e o País nos anos de 1765 a 1767, de Giuseppe Gorani, trad. e notas de Castelo-Branco Chaves, 1989]
Locais: 1755 Terramoto no Algarve / A Gazeta de Lisboa e o terramoto de 1755: a margem do não escrito (André Belo) / Colóquio Internacional. O Terramoto de 1755 / Inquisition (Edward Peters) / Lisbon in the Renaissance: A New Translation of the Urbis Olisiponis Description (Damiao de Gois) / O sismo de 1755 / O Terramoto de Lisboa, os judeus e a Inquisição (Rua da Judiaria) / Pequeno Blogue do Grande Terramoto (Rui Tavares) / Poèm sur le désastre de Lisbonne (Voltaire) / Terramoto de Lisboa
segunda-feira, 31 de outubro de 2005
Arrumações - Vynil, CD's e Cassetes Piratas
"Desenvolvi um método segundo a qual não faço as pazes com as coisas que me perturbam, apenas vou-me embora" [David Berman, in O Morto está vivo, de João Bonifácio, Publico 21 /10/2005]
Exactamente. E, assim, David Berman rouba-nos o destino com este trabalho de erudição e purgação que é "Tanglewood Numbers". Respeitavelmente sem escrúpulos. A evocar desalentos. Decerto "não é uma obra de arte" mas é seguramente "o disco mais denso, orquestrado e acabado dos Silver Jews" [João Bonifácio, ibidem].
"You might as well say fuck me / cause I'll keep on loving you" [D. Berman]
Para ouvidores de linguagem murmurosa, para aqueles que se aposentam das fantasias e destes nefandos dias do pré-cavaquistão, a frescura de espírito & o meneio "belo e comovente" dos
Silver Jews - I'm Getting Back Into Getting Back Into You,
ali, do lado esquerdo da pedra. Boa semana. Ite missa est.
O Anibalismo
"Cavaco Silva não têm programa ou sequer discurso de ideias" [Proença de Carvalho, Rev. Expresso, 29/04/1989]
"... Nunca li uma biografia de Aníbal [lynk da gerência & fora do texto], pelo que tenho de me cingir ao acervo de intuições populares que definem o anibalismo como doença decorrente de um excessivo apego aos elefantes. Mas, segundo a tradição popular, o anibalismo gera, em doses preocupantes, uma conduta pesada e pouco grácil, mais orientada pelo sentido do vento do que pela vista, que é tosca; incapacidade para o subtil e terror das «nuances», o que costuma minar o sentido do humor; uma memória persistente mas grossista; e uma grande dificuldade em sociabilizar fora do ambiente restrito da manada [lynkagem pela gerência, fora do texto de NBS]..." [Nuno Brederode Santos, Anibalismo, in Revista Expresso, 14/10/1989]
"O Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública (SINTAP) emitiu ontem uma nota de imprensa em que considera "impróprias e injuriosas" as afirmações de Cavaco Silva, ao abordar a necessidade de diminuição de funcionários públicos, numa conferência proferida na passada quarta-feira, na Faculdade de Economia do Porto. "Como nos vamos livrar deles? Reformá-los não resolve, porque deixam de descontar para a Caixa Geral de Aposentações e diminui as receitas de IRS. Só resta esperar que acabem por morrer", afirmou o antigo líder do PSD.
Tal declaração mereceu por parte do SINTAP "contestação e mesmo indignação". O sindicato considera que "este professor de Economia esquece-se das obrigações que tem como antigo primeiro-ministro deste país, esquece-se deliberadamente do que fez enquanto governante com a criação dos 'disponíveis' e esquece-se também da forma como 'resolveu' (?!) os problemas dos trabalhadores da administração pública no seu tempo de governo". Lembrando ainda que "o professor Cavaco Silva" é "ele próprio trabalhador da administração pública"", o sindicato pergunta: "Qual a sua moralidade para dizer hoje o que diz? ..."
[reflexão notável do prof. Cavaco, que em boa hora nos foi lembrado via mail por M. Pires, e publicada no Público, "Sindicato da Administração Pública Contesta Declarações de Cavaco" - no dia 2 de Março de 2002]
Curtas & grossas
Os deploráveis indigentes que assentam extraordinários rabos no cadeiral de S. Bento, animados pelos sublimes discursos da governação & folgados que estão dos trabalhos parlamentares, deliberaram adestrar uma "greve de zelo" e, assim, não despacharam em tempo útil a "nova lei do fim das regalias dos políticos" (curiosamente a lei, que foi aprovada na AR a 28 de Julho último, tem um "trânsito" sinuoso e fatigante, em comparação com a publicação célere de igual pronúncia face ao funcionalismo público). O privilégio que estas criaturas têm, o contentamento íntimo com que ludibriam os indígenas, é absolutamente notável. Quem nos salva desta corja é que ninguém sabe. Umas valentes bengaladas dadas, com infinita graça e furtivo amor pátrio, nos costados emproados dessa gentinha, eram sugestão recomendável. No mínimo exigia-se a requisição civil à moda do Sócrates.
Quando se assiste à corrida vigorosa dos autarcas às tomadas de posse, para usufruir dos infectos privilégios com que se brindam, compreende-se como a ignóbil classe política é tão lesta no reparo e achincalhamento dos funcionários públicos - a seus olhos, os únicos meliantes deste Portugal. Que do inenarrável Carmona de Lisboa ao não menos inefável Rui Rio (Cavaquista de primeira fila), passando pela rapaziada festivaleira da província (rosa, laranja ou vermelha), até arribar ao camarada e vate inspirado Carlos Marques (até tu ... Louçã!), e com esse artista Osvaldo Castro à batuta, o "consenso" seja generalizado não nos espanta. Estivéssemos nós em Espanha, fossemos nós por um dia cidadãos espanhóis, que a munição de manguitos & outros vigorosos "aplausos" seriam notáveis. Mas não estamos nem somos! Infelizmente!
sábado, 29 de outubro de 2005
Rua da Judiaria - II assombrosos anos
A memória encantatória trazida a todos nós pela Rua da Judiaria, o tempo lembrado, nunca descansado, ou a fraternidade, assim tão necessariamente luzente, são um amparo para todos nós. Os lugares, as vozes, os rostos & alma que se reconhecem no mais singular de todos os blogs em língua lusa, é um luxo que devoramos cada dia. Uma imensa soidade que faz parte da nossa portugalidade e desse mysterio de ser português. Um olhar de passos idos, uma viagem muy encoberta. Essa força espiritual é um fado em todos nós. Um chamamento velado. Um reencontro. Obrigado Nuno. Saúde e fraternidade.
In Memoriam Joaquim de Carvalho
"Apesar de contestada [a filosofia portuguesa] por uns, indiferente à maior parte, mas aproveitada por estranhos, pensámos sempre que o Génio Nacional, como unidade viva e livre, se deveria reflectir na Filosofia.
Com efeito, se uma nacionalidade é em si um produto espiritual, para nós mais representativo do que a comunidade de interesses, sentimentos, tradições, língua, caracteres étnicos, autonomia do poder politico, etc, com que ordinariamente é definida, se, por outro lado, a filosofia não é estéril e vão exercício da inteligência, mas uma exigência imperiosa do espírito, o que impede teoricamente que um povo livre, na plenitude da sua autonomia, se afirme e reconheça, independentemente doutras manifestações, na Filosofia?..."
"Se sobre todas as coisas reina a dignidade da consciência humana; qualquer ideário político, qualquer arquitectura do Estado que a esqueça, esmague ou remova para o fundo do cenário, é intrinsecamente falsa e moralmente pecaminosa ..."
"Quando um país tem a dita de possuir uma oligarquia de políticos, claros nos propósitos, seleccionados e confirmados pelo voto de opinião, honrados com o adversário quando lhe chega a hora de governar, o povo vive subtraído às oscilações extremistas das leis do pêndulo e podem chover estrelas ou picaretas que não se abalará a paz interna.
Se esta meia-dúzia de homens se desentender, se se deixar atrair pela sereia do mando, tapando os ouvidos à frágil voz do Servir, na bigorna da politica soa o timbre das espadas, com as quais, como advertiu Talleyrand, se podem fazer muitas coisas, salvo sentar-se alguém nas pontas.
Sempre assim foi e será, assim como, pelo contrário, sempre foi e será o diálogo claro e publico entre os dirigentes políticos o bastião inabalável da paz civil. Governe a direita, governe a esquerda, o essencial é que, no círculo dos oligarcas, quem governa saiba demitir-se, e quem quer o poder saiba esperar"
[Joaquim de Carvalho, in Diário Liberal (1933 e 1938), citado por Cruz Malpique, in Perfil intelectual e moral do prof. Joaquim de Carvalho, 1959]
"Junto ao túmulo de Joaquim de Carvalho"
"Meu querido pai, apenas quero dirigir-te a minha última oração de amor bem junto à tua derradeira e já etérea presença física, para que partas e saibas antes da despedida que levarei no meu sangue violado a tua estirpe e que afinal estás enganado: - a tua sepultura não é esta fria cama onde hoje singelamente te trazem a imensa ternura e o imenso respeito duma Nação (duma Nação? Não, querido pai, de todo o mundo culto, dos inúmeros amigos e admiradores teus que a esta hora te choram por terras ultramarinas, brasileiras, espanholas, francesas, italianas, argentinas ? sei lá por onde mais o teu nome era bandeira ao vento da cultura, da justiça e da independência moral!) Não, que a tua ultima morada não são as imutáveis arestas destas pedras, mas a humilde charneca do sangue igual da tua companheira, a nossa mãe. Aí o teu repouso e a tua permanente reaparição. Estaremos eternamente contigo porque não foste apenas o pensador, o escritor e o professor notabilíssimos ? mas o pai santo, no seio da família, e o santo homem, no seio da comunidade. Dignificaste a palavra cristã. Honraste os valores humanos da generosidade e da tolerância. Tudo o mais que criavas era apenas eco da tua bondade e da tua natural inteligência sensível. Jamais poderei deixar de te ver junto aos livros e debruçado sobre a vida, esse livro mestre de livros. Eras indomesticável ou só domesticável às causas supremas da redenção e da valorização do homem cá na terra. Os homens que tu mais amaste forma santos como tu, chamassem-se Spinoza ou Antero. Tu os recreaste através de ti porque nascera contigo o padrão de valores de outros valores. E o teu valor máximo era a humildade à maneira de Spinoza (nunca te seduziu a riqueza material), o coração generoso de Spinoza, o orgulho moral e liberal de santo Antero, e a certeza de que um homem serve a Pátria ao longo dos séculos e que só nessa perspectiva ainda mais apreciarão o teu trabalho. Não tinhas medo à história. E a historia, um dia, há-de julgar-te como um símbolo"
[Oração proferida pelos seus filhos, no cemitério da Figueira da Foz, em 29 de Outubro de 1958]
quarta-feira, 26 de outubro de 2005
Welcome to Elsinore - II Aniversário
O castelo de Elsinore é uma linda história. Todos os preceitos se resgatam naquela casa de todos os dias. Há felicidade em Elsinore. Com ou sem o choque tecnológico. O espírito inquieto da Carla, "entre o metal fundente e as muralhas graníticas", entre o glorioso que apaixona e a poesis que é infinita, o tempo corre de inocência. Fez no dia vinte e quatro, 2 (dois) 2 anos de existência afectuosa. Preciosa. Parabéns. Daqui se envia, em jeito de abraço
Mário Cesariny Vasconcelos (ele mesmo) em You Are Welcome to Elsinore
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Saúde e fraternidade
Já tomou o seu Cavaco hoje!?
A União Nacional Cavaquista tem assinalado - com a maior das inspirações altaneiras - o "medo", o "muito medo" que os heréticos & ruidosos esconjurados anti Cavaquistas & anti messiânicos observam nestes dias funestos. Várias bocas humedecidas de saliva musculada fornecem ao pagode o altíssimo gozo das virtudes presidenciais do candidato prof. Silva, enquanto vão imolando os putativos hereges em escrita surrada. Os da União Nacional são de poucas brincadeiras. Os linguados com que paternalmente nos brindam, no santuário dos jornais & blogs, são para acreditar. A chibata está à vista.
Portanto, para aqueles que chafurdam em afável camaradagem demoníaca; para aqueles que não conhecem a virtude recompensada do candidato e como tal não praticam o bem constitucional; eis o que se deve dizer, três vezes em voz alta, olhando em volta. Eis as palavras convenientes:
"Tenhamos medo. Sejamos desconfiados, prudentes, reflexivos. Se virmos um gato preto deitemos sal sobre o ombro ou façamos uma figa. Se nos sair pela boca, sem querer, o que realmente pensamos batamos na madeira, diabo seja surdo, cego e mudo, um, dois, três. Entremos com o pé direito em todas as portas (a menos que sejamos canhotos). Máximo cuidado no partir de vidros e entornar azeite" [in Almanaque, Fevereiro de 1960]
terça-feira, 25 de outubro de 2005
Max Stirner [n. em Bayreuth, 25 Outubro 1806-1856]
"Eu sou o inimigo número um do Estado, que se vê sempre perante a alternativa: ele ou eu" [Max Stirner]
Locais: The Ego and Its Own [Stirner] / Max Stirner The Ego and Its Own [Anarchists] / The Individualist Anarchists: An Anthology of Liberty / Dora Marsden and Early Modernism: Gender, Individualism, Science [Stirner & Nietzsche] / The Conquest of Bread and Other Writings [Peter Kropotkin] / The Aesthetic Politics of Modernism [in Anarchy and Culture] / The Age of German Idealism
"All The News Fit To Print" - cabeçalho do New York Times [25 Outubro 1896]
"October 25, 1896- The Times slogan: "All The News That's Fit To Print" makes its first appearance on the editorial page." [ler aqui]
"All the News That's Fit to Print" coined by Ochs himself after a contest finds no stronger candidate for a slogan, first appears on the editorial page. It moves to Page 1 on February 10, 1897"
"When my great grandfather Adolph Ochs created the slogan 'All the News That's Fit to Print' a century ago, it was his way of declaring the newspaper's intention to report the news impartially during a time when yellow journalism prevailed ..." [ler aqui]
Locais: The New York Times / The New York Times: A Chronology 1851-2001 / The New York Times [Art History] / Adolph Ochs / All The News Fit To Print / "The New York Times was established in 1851..." / The ironic and historic dimensions to scandals at New York Times
segunda-feira, 24 de outubro de 2005
Os Equívocos de Cavaco Silva
"Que gente reiterativa. È tão bom!" [A. O'Neill]
Cavaco Silva regressou. Parece repousado, pasmado de 10 anos de espera, pouco abundante em palavras, desatento aos anos da sua longa (des)governação e muito festivo, demasiado talvez. Afastado, prudentemente, da crise penosa em todos estes anos, ambiciona sair das trevas da política indígena repelindo os seus dilectos "filhos" e "enteados". Cavaco jura que não é mais um "Aníbal político". E, de fronte erguida, ar emproado e um tanto pedante, apresenta-se escondido da turba laranja, essa "canalha" que tão bem iluminou no caminho ao assalto da administração pública e aos subsídios da União Europeia.
"Pai" e "mãe" do "monstro" que é o Estado e que inventivamente construiu para os incautos, Cavaco Silva "destruiu-se" no "território da corrupção" com que risonhamente embalou a sua governação. Hoje tresanda de hipocrisia. E mesmo que o seu dissídio seja honesto, não se vê como se deva perdoar o seu diminuto carácter no exercício da coisa pública.
Cuida o dr. Cavaco que o (quase) silêncio com que friamente e pacientemente se remeteu faz desaparecer o fastio destes 20 anos de miserabilismo pátrio e os seus 10 de governação. Aonde depois, Guterres, sem paciência nem capacidade, compreende, e tarde demais, que os "boys" da rosa estimavam esses bons e animados tempos do dr. Cavaco. E, é claro, daí só pode dar em fuga ... envergonhada. Onde assoma Barroso, crescido nesse melífluo redil de antanho e que habilidosamente dá um salto ainda maior, sem qualquer rebuço ou pudor. Depois, por complacência de Sampaio, cai-nos sobre as nossas cabeças a histriónica dupla Lopes & Portas, que de tão incompetentes foram no deslumbramento da governação que deixaram tudo à mostra e o país à beira de um ataque de nervos. E onde, de momento, Sócrates baralha e torna a dar, para ficar tudo como estava. Vinte anos calcetados na mais desvairadas das políticas e com a mais grosseira classe dirigente conhecida. Que tornou Portugal no país mais atrasado da Europa.
Eis o quadro negro de 20 anos de pronunciamento Cavaquista. Onde o trecho inaugural da "obra" portuguesa ou "oásis" trôpego se começa a desenhar, em chacota carnavalesca. Onde a "competência", a "capacidade de decisão", a "honestidade" e a "responsabilidade" (para seguir o madrigal político do sr. Ramalho Eanes, agora muleta pegadiça de Cavaco) nunca existiu. E que só o disparate da fraseologia eleitoral, a demagogia e o populismo tornam banais. Lucidez precisa-se! Que a memória não nos torne irracionais.
[O fim do super-homem]
"O governo [do prof. Cavaco Silva] falhou algumas metas económicas e o homem que nunca se engana, que conhece os «dossiers» e que domina os números, afinal, enganou-se.
(...) falta saber se Cavaco Silva é apenas e fundamentalmente um político de rara habilidade que sabe exactamente o momento de «saltar» para o poder (e, também, o de retirar-se em beleza) e aproveitar com perícia as conjunturas favoráveis; ou se Cavaco Silva é um governante rigoroso e competente que sabe conduzir as situações e transformá-las (...)
Cavaco vai regressar também a tempo de usufruir sozinho os resultados conjugados de um conjunto de factores praticamente «únicos» para a economia portuguesa. Herda uma situação financeira reequilibrada pelo Governo do Bloco central, em 1983 e 1984, graças a uma dolorosa política de austeridade; aproveita de uma conjuntura externa altamente favorável; recebe como brinde os efeitos da integração de Portugal na CEE e o impacto das transferências de verbas que saldam em milhões e milhões de contos. A sua determinação em romper o Bloco Central partia, naturalmente, do conhecimento das magníficas perspectivas enumeradas.
É nessa conjuntura que mais uma vez Cavaco Silva pode governar com o objectivo essencial de ganhar as eleições seguintes e transformar o seu governo minoritário de 1985 num governo dotado de uma maioria inigualável, em 1987.
(...) Face à primeira dificuldade na evolução económica (...) Cavaco começará, porventura, a enfrentar o seu grande teste: vencer também nos momentos difíceis.
Durante um ano, ele soube transformar, mais uma vez com grande habilidade política, os efeitos de uma conjuntura externa, favorável como nenhuma outra, no resultado da sua capacidade de gestão interna. As «performances» económicas monopolizaram o discurso governamental. Uma meta desinflacionista verdadeiramente recorde atribui um número - 5,5 - à imagem de marca do governo. Cadilhe chamou a este objectivo uma verdadeira «correcção estrutural». Quebrado agora o fetiche, confrontado agora o Governo com um erro de previsão de quase cinquenta por cento, as tentativas de emendar a mão tornam-se quase patéticas.
É ainda o derradeiro esforço para preservar o mito dos super-homens. O Governo omite a parte da realidade que não lhe convém, dizendo que a derrapagem inflacionista de deve a causas externas e esquecendo-se de ter dito que a sua redução no ano passado [1987] também assentou nas mesmas causas externas; muda rapidamente de campo, erigindo o emprego em grande objectivo sem explicar porquê; procura dar de si próprio uma nova imagem de marca, mais virada para os desafios sociais e culturais do que para a mera quantificação dos êxitos financeiros (...)
[Teresa de Sousa, in "O fim do super-homem", Revista Expresso, 1 de Outubro de 1988]
"O governo [do prof. Cavaco Silva] falhou algumas metas económicas e o homem que nunca se engana, que conhece os «dossiers» e que domina os números, afinal, enganou-se.
(...) falta saber se Cavaco Silva é apenas e fundamentalmente um político de rara habilidade que sabe exactamente o momento de «saltar» para o poder (e, também, o de retirar-se em beleza) e aproveitar com perícia as conjunturas favoráveis; ou se Cavaco Silva é um governante rigoroso e competente que sabe conduzir as situações e transformá-las (...)
Cavaco vai regressar também a tempo de usufruir sozinho os resultados conjugados de um conjunto de factores praticamente «únicos» para a economia portuguesa. Herda uma situação financeira reequilibrada pelo Governo do Bloco central, em 1983 e 1984, graças a uma dolorosa política de austeridade; aproveita de uma conjuntura externa altamente favorável; recebe como brinde os efeitos da integração de Portugal na CEE e o impacto das transferências de verbas que saldam em milhões e milhões de contos. A sua determinação em romper o Bloco Central partia, naturalmente, do conhecimento das magníficas perspectivas enumeradas.
É nessa conjuntura que mais uma vez Cavaco Silva pode governar com o objectivo essencial de ganhar as eleições seguintes e transformar o seu governo minoritário de 1985 num governo dotado de uma maioria inigualável, em 1987.
(...) Face à primeira dificuldade na evolução económica (...) Cavaco começará, porventura, a enfrentar o seu grande teste: vencer também nos momentos difíceis.
Durante um ano, ele soube transformar, mais uma vez com grande habilidade política, os efeitos de uma conjuntura externa, favorável como nenhuma outra, no resultado da sua capacidade de gestão interna. As «performances» económicas monopolizaram o discurso governamental. Uma meta desinflacionista verdadeiramente recorde atribui um número - 5,5 - à imagem de marca do governo. Cadilhe chamou a este objectivo uma verdadeira «correcção estrutural». Quebrado agora o fetiche, confrontado agora o Governo com um erro de previsão de quase cinquenta por cento, as tentativas de emendar a mão tornam-se quase patéticas.
É ainda o derradeiro esforço para preservar o mito dos super-homens. O Governo omite a parte da realidade que não lhe convém, dizendo que a derrapagem inflacionista de deve a causas externas e esquecendo-se de ter dito que a sua redução no ano passado [1987] também assentou nas mesmas causas externas; muda rapidamente de campo, erigindo o emprego em grande objectivo sem explicar porquê; procura dar de si próprio uma nova imagem de marca, mais virada para os desafios sociais e culturais do que para a mera quantificação dos êxitos financeiros (...)
[Teresa de Sousa, in "O fim do super-homem", Revista Expresso, 1 de Outubro de 1988]
domingo, 23 de outubro de 2005
Philip Lamantia [n. 23 Outubro 1927-m. 7 Março 2005]
"The mermaids have come to the desert
they are setting up a boudoir next to the camel
who lies at their feet of roses
A wall of alabaster is drawn over our heads
by four rainbow men
whose naked figures give off a light
that slowly wriggles upon the sands
I am touched by the marvellous ..."
[Philip Lamantia, in Touch of the Marvelous, 1944]
"Recusamos contentarmo-nos em ser meramente os mais odiados homens e mulheres do nosso tempo. Ainda não está esquecida a linguagem das aves. Quem nos acusar de mudar de assunto merece um soco no nariz.
Podíamos dizer, dentro do espírito de Pitágoras, que nunca é demasiado cedo para aprender a sonhar com o nunca sonhado.
A imaginação ou é revolucionária ou não é nada.
A revolução será surrealista ou nada será."
[A traição é mais doce que o mel, texto colectivo publicado em "City Lights Anthology", 1974 (aliás in Textos de Afirmação e de Combate do Movimento Surrealista Mundial, P&R, 1977) com participação de Philip Lamantia et al]
Locais: Philip Lamantia / Philip Lamantia (1927-2005) / Philip Lamantia Remembered / Philip Lamantia: Shaman of the Surreal / Philip Lamantia - S.F. Surrealist poet Visionary verse of literary prodigy influenced Beats / Riding the Marvelous / Geração Beat / Ecouter Philip Lamantia (Rest in peace, Al Capone)
quarta-feira, 19 de outubro de 2005
Arrumações - Vynil, CD's e Cassetes Piratas
Ler o corpo como se ele não tivesse sido lido. Não acreditar que a "beleza" possa, desamparada, ser relatada "sob a forma de uma citação" (Barthes). Revisitar prantos generosos, confrontações viciosas, prisões ausentes, paixões inverosímeis. (Des)construir um rosto ou chamar o desejo quando o tempo arde, eis uma possível "insurreição erótica". Nada de mais precioso.
Para aqueles que caem no "logro no tempo de amor", para todos os outros que desaprendem nomes, imploram virtudes & aos que se quedam à margem. Para todos os que rompem a espera & prudentemente rasgam pedaços de si, eis, ali do lado esquerdo da pedra, Regra Três, por Toquinho & Vinicius de Moraes. Que cada um seja para o outro "aquilo que não é em si". Feliz ceia.
"Tantas você fez
Que ela cansou
Porque você, rapaz
Abusou da regra três
Onde menos vale mais
Da primeira vez
Ela chorou
Mas resolveu ficar
É que os momentos felizes
Tinham deixado raízes
No seu penar
Depois perdeu a esperança
Porque o perdão também cansa
De perdoar
Tem sempre o dia em que a casa cai
Pois vai curtir seu deserto, vai
Mas deixa a lâmpada acesa
Se algum dia a tristeza
Quiser entrar
E uma bebida por perto
Porque você pode estar certo
Que vai chorar"
[Toquinho & Vinicius de Moraes, Regra Três]
Vinicius de Moraes [n. 19 Outubro 1913-1980]
"Detesto tudo que oprime o homem, inclusive a gravata" [V. Moraes]
"... Para viver um grande amor perfeito, não basta ser apenas bom sujeito; é preciso também ter muito peito - peito de remador. É preciso olhar sempre a bem-amada como a sua primeira namorada e sua viúva também, amortalhada no seu finado amor.
É muito necessário ter em vista um crédito de rosas no florista - muito mais, muito mais que na modista! - para aprazer ao grande amor. Pois do que o grande amor quer saber mesmo, é de amor, é de amor, de amor a esmo; depois, um tutuzinho com torresmo conta ponto a favor..."
[Vinicius de Moraes, Para Viver um Grande Amor]
Rafael Bordalo Pinheiro
"... A CARICATURA é uma das mais terríveis armas de guerra aplicadas ao ridículo humano. Pior do que o canhão! Porque o canhão mata - a caricatura mutila ..." [Joaquim Leitão]
"... Nunca a caricatura em Portugal ocupou lugar tão importante na história da moda e dos costumes, como o que atingira ultimamente mercê do talento e dos esforços de Rafael Bordalo. A caricatura política ainda teve outrora certa significação, enquanto viveu o Suplemento burlesco: mas as caricaturas morais, as fantasias, as cenas íntimas, e os gracejos aos abusos exigem que o espírito do público colabore por assim dizer com o artista a poder de o apreciar, e não queira cortar-lhe as unhas como ao gato que arranha, ou açaimá-lo por qualquer coisa como ao cão que morde. Há nações onde se poderia escrever a história exacta da liberdade com o escrever a história das caricaturas; nós não temos censura, mas ela existe, senão na forma, no fundo, e é às vezes para tudo em Portugal a pior das tiranias; chama-se-lhe as conveniências; podia chamar-se-lhe a hipocrisia!" [Júlio César Machado]
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