Mostrar mensagens com a etiqueta Ensino. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Ensino. Mostrar todas as mensagens

segunda-feira, 14 de abril de 2008


O Tribunal Constitucional ou o limite do elogio

"Não é sisudo o juiz que tem jeito no que diz e não acerta no que faz" [popular]

O espírito de cobrança política que, em curiosos Plenários, os ilustres conselheiros do Tribunal Constitucional [T.C.] coligem, via apreciação de pedidos de inconstitucionalidade requeridos por grupos de indígenas, não granjeia boa estimação. Que o dr. Cavaco, ou o cérebro do dr. Vitorino, entendam, seguindo com os olhos a beca e o colar dos ilustríssimos conselheiros, que o Palácio Ratton não se deixa "envolver na espuma conjuntural da conflitualidade político-partidária", não só não é boa doutrina como carece de fundamento.

Conhecendo-se o Acórdão nº184/2008 do T.C., onde surge fundamentada a improcedência do pedido de inconstitucionalidade do artigo 46.º, nº3 do ECD, assim como as normas contidas nos artigos 10.º, nº8 e 15.º, do DL nº15/2007, e atendendo, em tese, que o chorado dos conselheiros do Palácio Ratton pode, se devidamente confrontado, estar conforme os preceitos que o direito autoriza, fica sempre a dúvida, por força da redacção dada e face aos vícios materiais aí existentes e não considerados, que a garantia de constitucionalidade observa o "jogo político" ou "direito de estratégias" do receituário constitucional. As curiosas, excessivas e disparatadas (re)interpretações dos doutos conselheiros sobre "meritocracia" ou "cultura de excelência e qualidade", como constam no Acórdão, parecem sair directamente da boca do sr. Sócrates, tal o meticuloso ânimo aí revelado pelos dignos pares.

Não está em causa a legitimidade (por indirecta que seja), nem (talvez) o "modus de escolha" dos conselheiros, mas tão só a ideia que o sentido normativo da Constituição está (como no caso acima referido) ausente, havendo lugar apenas às estratégias políticas dos diversos clientes.

De facto, são tão evidentes as violações dos princípios constitucionais da proporcionalidade (porque excessiva e desproporcionada face aos resultados assumidos) no que o caso diz respeito ao artigo 46º., n.º3 do ECD; é de tal forma visível a arbitrariedade de diferenciações de situações (tomadas) iguais; é tão escandaloso a omissão de averiguações (ex officio) conducentes a entender o que os doutos conselheiros ex abundanti referem como a "avaliação externa das escolas" (sem nunca compreenderem do que se trata e como será feita) , tão só único e putativo referencial para a atribuição da percentagem máxima (de Muito Bom e Excelente) a atribuir aos docentes (que curiosamente os doutos conselheiros consideram de igual formatação aquela que ocorre à avaliação de desempenho dos demais trabalhadores da Função Pública, o que não sendo verdadeiro é demasiado grave para um Tribunal); que ilustra bem a insensatez de tão ilustrados juízes.

Com tudo isto, o precioso trabalho do Tribunal Constitucional embaraça, definitivamente, a jurisprudência nativa, por muitos que sejam os encómios e os discursos ataviados do dr. Cavaco e do sábio Vitorino. Vós o sabeis!

segunda-feira, 24 de março de 2008


Almanaque Republicano – Actualização

"... a instrução pública é um arroteamento" [Alexandre Herculano]

Saber ler, escrever e contar, uma instrução pública popular – como direito e obrigação do Estado – e uma educação cívica de homens livres, estiveram sempre na alma socializante e romântica do republicanismo. Mesmo se o "saber ler, escrever e contar" fosse condição de uma técnica de aquisição, a doutrina republicana era entendida como "a entrada da vida" ou o "pão de espírito" que a educação portuguesa necessitaria e a administração republicana assim o exigia.

Na luta contra o analfabetismo, com a "instrução pública" função e domínio do Estado e, ao mesmo tempo, garantia do cidadão, em tal tarefa generosa e educativa, estão sempre presentes os princípios estimados do republicanismo: municipalismo, federalismo e associativismo. Para os republicanos "abrir uma escola, era fechar uma prisão", por isso a educação, no sentido de formar vontades, mentalidades ou "integração na civilização" [Bernardino Machado], era uma tarefa prioritária do ideário republicano (...)

Num momento particularmente difícil - como o de hoje - em que o ensino público e a educação são objecto da mais subversiva e assustadora contra-reforma, num estranho conúbio entre um economicismo doentio & as trapalhadas e os negócios da educação com interesses corporativos, o Almanaque Republicano - feito por dois professores devotos da instrução - irá publicar um conjunto de textos, documentos e memórias, acompanhadas de notas bio-bibliográficas, de pedagogos e professores que, com entusiasmo, participaram na causa comum da instrução pública republicana.

Saúde e fraternidade

in Almanaque Republicano - Dossier A Instrução Pública e a República

A Ministra e o Código da Estrada

Como responso à "insolência" de uma herege jornalista - a propósito da real eficácia desse seu "estimado" código (o Estatuto do Aluno) no caso particular do deplorável acontecimento passado numa escola do Porto -, a senhora ministra da educação retorquiu-lhe com a sábia interpelação:"O Código da Estrada impede os acidentes?".

Entende Maria de Lurdes Rodrigues, via sua "alma falante", que o ensino e a instrução se comparam, na sua natureza psico-pedagógica, com um serviço de estradas, a carecer de formalidades, licenças e "passes" válidos. E que mesmo assim sendo, tendo as licenças de trânsito passadas, a DGV, perdão, o Ministério da Educação não se responsabiliza com a duvidosa conduta dos seus utentes.

Há, lamentavelmente, um equívoco em tudo isto. É que não consta que a dra. Maria Lurdes Rodrigues conduza ou tenha licença de condução. Ao que se diz, foi viajante, com despacho e transporte de bagagens, desse inefável anarquista aposentado, João Freire. E não se lhe conhece, até a carreira parar na 5 de Outubro, nada de substantivo no campo teórico & prático em "condução" pedagógica, "radares" curriculares ou em "acidentes" educacionais. Quanto muito estudou o regulamento temporário dos engenheiros e outros residentes da profissionalização. Mas foi tudo!

Mas ficará, na sua gloriosa biografia & para o murmurar de futuras retóricas governamentais, o seu contributo para a lexicologia política. Decerto a estudar em qualquer escola de sociologia, que se preze e onde se estude.

sábado, 8 de março de 2008


Respeito & Solidariedade com os Professores

"Num deserto sem água
Numa noite sem lua
Num país sem nome
Ou numa terra nua

Por maior que seja o desespero
Nenhuma ausência é mais funda do que a tua
"

[Sophia de Mello Breyner]

Hoje - Manifestação de Professores (14.30) na Pr. Marquês de Pombal, Lisboa

quinta-feira, 6 de março de 2008


O insulto do dr. Vital Moreira!

O artigalho – em tom arrogante, grosseiro, sem brilho, nem substância – do impudentíssimo dr. Vital Moreira no jornal Público [4/03/08], intitulado “Os Professores”, é uma desafronta e um evidente insulto aos docentes (de todos os graus de ensino), aos cidadãos contribuintes e suas famílias, à classe governativa e, curiosamente, é injurioso face à obra intelectual do saudoso professor Vital Moreira. A propósito da atitude & crítica fundamentada, persuasiva, de vigilância necessária e séria dos (diversos) docentes à desastrosa e infeliz política (des)educativa do governo, o dr. Vital Moreira insiste num panfleto que é mais uma sensaboria em torno das virtudes governamentais. O discurso (inqualificável) revela, entre uma curiosa e zelante psicose conspirativa, uma angústia pouco esclarecida e não resolvida sobre o problema (e importância) da educação, do ensino público, da Escola e da classe docente, do mesmo modo que está sempre oculto o "encargo da prova" feito pelos docentes (desde o início), em toda esta questão.

O expediente insidioso do dr. Vital Moreira [VM], ao considerar que a putativa "luta" [VM dixit] dos docentes se centra "na defesa de interesses profissionais", ou não fossem para VM as pouco cariciosas corporações um caso nefando pátrio, é um costumeiro e intratável pregão, com "boa" escola mas de muito atrevimento. Picarescamente, o sábio VM deixa de fora dessa arrazoada funesta, e sem a mínima reserva, a confraria dos empregados da política, as luminárias dos partidos e sua indiscreta clientela.

O piedoso VM, nesse presuntivo enxurro corporativo (em que o "arrumo" ou o critério de leitura está ausente), estabelece uma curiosa "dissidência" entre as ditas corporações (docentes, médicos, juízes, funcionários públicos em geral) e a população ou canalha. Esta, ajoelhada e vergada às "corporações" - "forças de conservação e de reacção [mais] do que mudança" (tese afinal "que não é em geral verdadeira", como se estuda em qualquer manual de história ou direito) -, veria espantada "passar" as tradicionais "reformas" (pelo que se presume, nunca consumadas), das quais eram directamente (e unicamente) "beneficiárias". Esta pouco meticulosa quanto desaprumada (o contexto field-dependent da medida argumentativa, não aparece nunca) especialidade na argumentação de VM terá os seus encantamentos entre a boçal classe política, em especial a juventude partidária, ou em algum raminho de comentadores até, mas não colhe o génio entre aqueles que estudam, conhecem e vivem a realidade do ensino e da educação em Portugal.

A composição do dr. VM, portanto, não identifica os problemas presentes da educação; não define os objectivos educacionais do governo e as metas a alcançar com a putativa "reforma"; não compreende o que é a escola, o seu espaço escolar e a comunidade envolvente; não distingue a especificidade da profissão docente entre as suas congéneres; não reconhece a importância dos muitos estudos sobre a autonomia e gestão das escolas, a avaliação de professores e alunos ou o estatuto da carreira docente; não avalia a justeza da argumentação técnico-pedagógica usada pelos professores para explicar o seu mal-estar; não é sensível à humilhação pública da classe docente; não justifica os métodos e procedimentos autistas, arrogantes e anti-democráticos praticados pelo ME; não relaciona essas práticas autoritárias e humilhantes com a ignorância existente sobre todas essas supracitadas matérias, por parte do grupo residente no ME; nem aceita a responsabilidade do seu comportamento em toda esta questão.

O dr. Vital Moreira esforça-se por saber admirar a lide da governação. Mas não basta. Tem de estudar mais, ser mais convincente, mais verdadeiro e menos injurioso. E exibir mais respeito pelos docentes deste país, alguns dos quais foram seus alunos. Para que seja ouvido e lido, com estima e consideração. Se então o merecer!

[Foto retirada do blog do meu caro amigo Ademar Santos, com a devida vénia]

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008


A Manifestação

Os senhores professores acudiram à chamada da honra e da dignidade do seu trabalho e manifestaram-se em plena rua, às claras, sem ocultação. Não houve lugar a manobras ou tempos de substituição. Eram eles próprios.

Os senhores professores desafiaram sua excelência o eng. Sócrates, a cabeça intelectiva de Maria de Lurdes, a "ordem" estabelecida e a sabatina pretensiosa do sr. M. Sousa Tavares. Não foi demais!

Os senhores professores conhecem bem, porque conhecem, todos essas autorizadas figuras que (agora) tão sabiamente falam em educação e ensino. Na altura havia rigor, esforço e trabalho, existiam faltas e, pasme-se, até alunos e professores. Conhecem-nos, por isso - a todos esses antigos estudantes -, muito bem.

Os senhores professores e, presume-se, os cidadãos de Portugal, estão proibidos de se reunirem na via pública sem a devida autorização para tal. Muito bem! Mais de 3 (três) indígenas – a lembrar outros tempos – será, certamente, uma curiosa e honrada manifestação de indignação que não acolherá decerto o bom humor policial e a gramática do sr. Sócrates, mas dará certamente valor ao empenho e à dignidade de quem trabalha. Podem estar certos disso.

quinta-feira, 19 de outubro de 2006


Solidários com os professores - parte II

Noutro registo, menos paciente ou virtuoso (se quiserem) e sem inocência, porque cansados estamos de alguns escribas do eduquês, que tão chorosos andam aos pés da senhora ministra da educação e da política socrática para o ensino, continuamos, porque "há pessoas que são como aviões no ar: / precisam de muita gente a apoiá-los de terra" [O'Neill]

Considerando a originalidade do pensamento dos respeitáveis amigos da ministra, que aplaudem freneticamente o charco de contradições presente na proposta de alteração do ECD, há que confessar que o registo conceptual que expandem não é o mesmo. O saco ministeriável colhe, desde os despeitados da escola que culpam qualquer professor (a "sintomatologia do abandónico" é bem real), os empastados da política (caso do vendedor televisivo Miguel Sousa Tavares), maviosos ex-responsáveis governativos (o malfadado Grilo está em todas), o cacho de uvas liberal (assombrados pela provisão da coisa pública), uns tantos aliterantes da prosápia anti funcionário-público, a nauseabunda cáfila partidária (atenção! genuflexão e gorjeio ao dr. Sócrates!) & outros vaidosos figurinos do funcionalismo público universitário. A divertida opinião de tantos seria ternurenta, se tivesse substância argumentativa. Ou, mesmo, se tivessem estudado, conceitos e práticas educativas, entre o folguedo das suas putativas afirmações. Mas nada disso, em geral, se verifica. Simples perfídia.

Dos oradores assinalados, de onde partem os mimos com que escorcham os docentes e as suas revindicações? Ponto de parte a bondade de alguma análise romântica de graciosos comentaristas, deixando de vez excitantes caricaturas vindas de néscios, resta a frescura arrancoada pelo grupo, perfumada de intriga caseira, dos amigos da senhora ministra. Um ajuntamento curioso, cujo lindismo teorético acampa aqui, alardeia ali ou segrega acolá. De comum, a carícia de serem todos socialistas e terem, ainda, os primeiros o enlevo de pertenceram à notável ourivesaria do regime, o ISCTE, onde pontifica a senhora ministra. Diga-se, desde já, que esse registo nunca foi escondido. Muito bem.

Dir-se-ia que a estes últimos mancebos se exigiria uma argumentação conceptual e trabalho teórico, sociologicamente falando, mais robusto e estruturado no campo e problemática da sociologia da educação, identificando o papel da Escola, a sua dimensão comunicacional (relação pedagógica, organização do espaço e relações de mando e poder), traçando as necessárias competências do acto educativo e sua interdependência em contexto escolar, a representatividade, legitimação e poder dos seus clientes, bem como os recursos exigidos para uma gestão e administração mais dinâmica e autónoma da Escola. E depois, evidentemente, sem jogos de linguagens (à maneira de Wittgenstein) partir para "tricotar" a relação funcional da Escola e o processo "produtivo", na lógica modernizadora da reorganização e reestruturação do sistema educativo. Depois disso, um possível e aceitável conceito de profissionalização para os docentes, poderia ser esculpido, bem como o seu estatuto.

Tais enquadramentos, absolutamente necessários para qualquer conversação séria sobre a análise em causa (reformulação do ECD), esbatem-se sempre por estes exaltados sociólogos, em aplicações recheadas de automatismos neotayloristas, privilegiando-se a máxima racionalidade economicista, decalcada de processos e técnicas de "management", e onde a Escola é tomada como uma qualquer "organização formal" sem "construído cultural". A performance assim proposta configura, sem brilho algum, uma ilusória decomposição do político no domínio do tecnocientífico, o que remete, em último lugar para o fim das ideologias. Mas isso é outra história.

Daí que a colorida argumentação resida, apenas, no fulminar dos incautos leitores com uma barragem de dados estatísticos (aqui, tais escolásticos, simulam um Medina Carreira vergastando números infindáveis, esquecendo qual é a questão em debate) que acabam por escancarar a faccis do indígena. Eles são vencimentos luxuosos que auferem os docentes, acompanhados por mapas, tão vigorosos como irreais, da putativa desbunda financeira do ensino educativo não-universitário, necessariamente a encolher. Pouco mais dizem, a não ser, por certo, acompanhar a hilariante teorização do eng. Sócrates, à rapaziada acofiada dos jornais e em resposta à pretensão dos professores de não aceitarem as cotas para efeitos de mérito avaliativo, quando declara: "Nem todos os jornalistas chegam a editores". Fulminante! Ao que parece a escola argumentativa do dr. Pinho está a tornar-se uma praga. E um desastre! Enfim ... é a vida!

Solidários com os professores

Já, aqui e aqui, prescrevemos o que vai resultar a movida iniciada pelo trio virtuoso & exuberante do Mi(ni)stério da Educação. A saber: a destruição total do ensino e da educação no país. A implementação do renovado ECD, que daí resulta, irá conduzir (mais do que já está) ao caos educativo.

Alguns exemplos mais: aumento da conflitualidade entre os diversos corpos escolares (a avaliação sendo feita por todos, não é por ninguém); persistência de graves insuficiências científicas e pedagógicas na Escola, quer pela via da nova estrutura hierarquizada pretendida (docentes de diferentes disciplinas, em sede de área curricular/departamento, a darem putativo apoio científico e pedagógico uns aos outros, é de um total nonsense e puro disparate) quer pela inexistência de acções de formação de profs com características científicas (não há dinheiro para acordos com as faculdades respectivas, nessa matéria, nem o eduquês ministeriável permitiria tais aventuras, decerto bem "perigosas"); a presença de constantes litígios entre os docentes, sendo que os professores (os não-titulares) terão todo o trabalho e os titulares farão exercer a autoridade (que em muitos casos, quer cientifica quer pedagógica, é nenhuma), o que contraria a linha orientadora esboçada pela ministra para o aparecimento de dois tipos de docentes (na altura, obrou a senhora ministra que os profs mais antigos deviam trabalhar mais, daí a proposta avançada); impedimento, real e objectivo, de docentes excelentes atingirem o topo (e a chefia da gestão pedagógica escolar) dado que o mérito anunciado pela ministra se sagrar em 1/3 do corpo docente, fazendo com que a Escola seja entendida (aliás como seria de esperar vindo de quem tal pensou) como a tropa, onde a velhice é um posto, independentemente da real valia científica e pedagógica de cada um. E haveria muito mais a registar. Fiquemos por aqui.

Estará tudo bem? Evidentemente que não, aliás nunca esteve. Mas as pretensões da ministra tornarão tudo ainda pior. É difícil construir, sabe-se bem, mas para destruir é bem mais fácil. E, certo é, que alguns se afadigam muito bem. Mesmo que seja a coberto da paranóia do défice.

Resulta desta inquietação, muito nossa, que a educação e o ensino, pela demagogia dos vários e alucinados ministros (alguns ex, com audácia, dão entrevistas a jornais, como nada se tivesse passado), pela indiferença dos pais e educandos (que querem mais, é que lhes guardem os filhos), apoiados pelo oportunismo partidário (em todos os governos foi sempre assim) e formatado pelo amigueiro corporativo mais demagógico, dizíamos nós que a educação, restará um espectáculo medonho, onde a interdependência entre o ensino, a aprendizagem e a avaliação estarão a saque. Onde, o prodígio instrutivo destes anos tantos de eduquês e os objectivos educacionais que lhe correspondem, incidirão, doravante, no exercício da mera "passagem administrativa" (para efeitos estatísticos da UE) e onde o rigor, o esforço, o trabalho e a avaliação não serão encarados, como deviam. Triste maldição, a nossa.

[continua]

segunda-feira, 2 de outubro de 2006


O osso & o livro

"Quando ouço ou leio a srª. ministra da Educação lembro-me, contra-vontade, da história do estudante de Medicina que, para estudar Anatomia, arranjou um osso, e lia no livro observava no osso, observava no osso encontrava no livro, e assim seguia todo contente até que, de repente, leu no livro e não viu no osso, releu no livro e não viu no osso. Intrigado, parou, pensou e concluiu: o osso está errado!"

[José Paulo Morgado, in Cartas ao Director, Público, 27/09/2006]

sexta-feira, 30 de junho de 2006


Inês Pedrosa: a menina que rouba gargalhadas

Inês Pedrosa, derradeiro génio do Alegrismo indígena e escriba da "Crónica Feminina", foi atormentada por um jornal com uma exuberante questão escolástica: "Os professores são culpados do insucesso escolar?". Atrevida e ingrata interrogação do jornalista, mas que não intimidou a redactora deliciada de "nas tuas mãos".

A inspiração da versada Inês, envolta em educação literária e deslumbrante na sua pública anemia política, deu-lhe para dizer: "Sim. Se metade dos alunos chumbam não é porque são mais burros que os outros. A culpa é dos professores e de quem os educou. A ministra está a ser corajosa". A arborização deste argumento pedrosiano abate qualquer um. Assim transida de pedagogês escorreito, a tesourada que a formidável Inês deu, honrou-a para todo o sempre.

Pode, de algum modo, estar Inês num noante laudatório à mulher-ministra, ou mesmo em exercícios de venadoria rosa, mas lembramo-nos sempre do que judiciosamente afirmou, alhures: "há sempre gente pronta a aplaudir os que fritam os outros, para não se queimar".

Ora não consta que Pedrosa mexa em questões de exorcismo pedagógico, à cause da angústia literária. E sabe-se, também, que a única banalidade de base sobre o ensino que tricotou recentemente foi preconizar que "uma criança de 3 anos" deva ler Manuel António Pina ou Sophia (prudentemente não refere as histórias para crianças dos autores, para não arreliar os papás). Ora, como a ministra da educação expurgou do exame de eduquês ao 9º ano o vate Camões e o ourives Gil Vicente, à revelia dos programas & à sorrelfa da contemplação de Inês Pedrosa, estamos decididamente confundidos. Será que é desta que a serviçal do eduquês ministerial escrevinha um folheto sobre as "Instruções aos amantes" da educação? Agradecia-se dedicatória. Obrigado!

quinta-feira, 15 de junho de 2006


Ensino: a destruição final (conclusão)

Interessa não esquecer, para que a arrogância de uns e a vã glória de outros não sejam recompensados, um ponto crucial em toda esta questão da análise da nova proposta de alteração do ECD, a saber: o lugar que toma a autoridade da competência do docente (e da sua legitimação), baseada em conhecimentos técnicos ou "poder do especialista" - aquilo que uns denominam por poder cognoscitivo [Simões, 1980] - e o modo como este poder, lido através da nova proposta em marcha pela ministra, é diluído, pela partilha na estrutura escolar e pela avaliação da prática profissional dos professores, através do chamado poder normativo, autoritativo e remunerativo, topos da legitimação de todo o poder. E antever de que modo isso tudo se conjuga para que se possa alguma vez pronunciar, com a maior das bondades, que se está presente uma mudança educacional visando uma Escola de qualidade, de rigor e moderna.

Estamos a falar, evidentemente, das bases do poder do professor, aqui tomadas de diferentes formas (do pessoal ao cognoscitivo, do normativo ao autoritativo) e que Formosinho Simões em tempos interpretou. Diga-se que existe uma vasta bibliografia sobre a matéria e que parece esquecida pela turbulência das decisões governativas. Faz tempo que o famoso "Relatório Braga da Cruz" (Análise Social, 1988, vol. XXIV), poderoso e exaustivo levantamento da situação do professor em Portugal, mandado fazer por Roberto Carneiro, assegurava que "os professores são agentes privilegiados da reforma que, por isso mesmo, deve começar por eles e deve ser levada a cabo com eles". De lá para cá instalou-se o vazio no comprometimento, motivação e colaboração dos professores na reforma educativa. O ministério da educação adoptou o autismo como prática existencial e qualquer regulamentação exarada nunca teve em conta o debate e a participação dos docentes em sede de escolas. Percebe-se, assim, a necessidade que têm a ministra Maria de Lurdes Rodrigues de insultar professores, sindicatos e de estes últimos zurzirem na ministra. Não podem existir uns sem os outros, porque são a face da mesma moeda. Por isso, a diversão comunicativa da senhora ministra é não só lamentável, como desnecessária.

Dissemos que se deveria questionar o modo como as "bases do poder do professor" são entendidas na nova proposta. Acontece que o discurso da Ministra, inebriado no estudo da organização escolar a partir da sociologia das organizações e das profissões, tem em conta somente a racionalidade e eficácia (esse conceito extraordinário) da organização escolar, desconhecendo que o que toma teoricamente é uma parte do saber das organizações e não a própria ciência em si. Não admira que nessa tentativa (organizacional) de determinar o tipo de cooperação entre os intervenientes escolares, em que forçosamente estará presente a autonomia de decisões e onde deve ser assumido divergências de interesses, esteja sempre ausente a análise das estruturas e das relações de poder. E quando é assim, subsiste a tentação de começar do zero, fazendo-se "tábua rasa" dos conhecimentos e competências, laboriosamente adquiridos pelos profissionais [José Matias Alves, 2006]. E que é bem evidente na proposta.

Assim, quer seja pelo fim da carreira única (sem fundamentação teórica pertinente que se notasse) e a instituição de diferenciações profissionais, sem um mecanismo credível de avaliação do mérito (até porque a este está reservado um sistema de cotas de matriz economicista); quer pela assumpção de uma avaliação anual do desempenho, baseado na mais burocrática das modalidades e na mais doce confusão dos interesses; quer pelo aumento da componente lectiva (coisa inacreditável em educação) e da não-lectiva, transformando o docente num proletário do eduquês, pelo que deixará de estudar e investigar conteúdos científicos (coisa maldita em eduquês) ou pedagógicos; quer pela desvalorização remunerativa agora proposta (tudo é considerado horas não-lectivas e, como tal, não pagas) que imobilizará definitivamente os docentes nas funções a desempenhar; quer pela introdução na avaliação do desempenho dos docentes da figura dos pais, tornando-a de ordem meramente normativa (aqui entendida na avaliação da função de socialização. Coisa que "guru" da politica educativa José Manuel Fernandes, por ignorância, desconhece) e não de teor cognoscitivo; por tudo isso em conjunto estão definitivamente alteradas as bases do poder do professor, desvalorizando-se a profissão pela natureza omnipotente do poder normativo, autoritativo e remunerativo sobre critérios de natureza científica e técnica. Se pensarmos, como nos diz J. F. Simões, que "a profissão docente é das raras que tem por objectivo transmitir a própria base do seu poder", isto é conhecimentos que outro não tem, então é evidente que o ensino bateu no fundo. E a inquietação, por parte de gente séria, ganha todo o sentido. Sem surpresas!

Ensino: a destruição final

Nos últimos dias, a actividade opinativa ou escavação predicatória sobre as medidas propostas pelo Ministério da Educação para alteração do ECD, arrastou uma turba de "inteligentes" da educação e do ensino para a praça pública, desde o mais dócil dos caceteiros jornalísticos ao mais obscuro do cidadão indígena. Pela verborreia a que se assistiu, todos pareciam ser professores: titulares, diga-se. Na hora, enquanto a ruína ainda só se pressentia, a senhora Ministra da Educação vai de desprofissionalizar, desqualificar e caluniar docentes, sem nenhum pudor intelectual ou tacto pedagógico. Arrebatada, presumivelmente por um qualquer génio da sociologia das profissões, a Ministra deu conferências em série, despachou decretos e outros receituários em massa, quase que sorriu aos devotos admiradores do seu eduquês, apareceu televisiva, encontrou-se com os pais, estava feliz. Não houve, por hora, festanças para os lados das ESE's e Politécnicos e só no Largo do Rato pertinentes analfabetos comiciaram socraticamente. O eduquês é polido, mas não valente.

Não iremos falar da Escola em geral, porque esta, piedosamente, se desvaneceu. Fernando Gil explicou isso bem (ver Enciclopédia Einaudi, vol. VII). Outros, para citar os mais próximos, como Lopes Carrilho, Stephen Stoer, Ferreira Patrício, António Magalhães, Bártolo Paiva Campos, João Formosinho Sanches Simões, António Nóvoa, Albano Estrela, João José Boavida ou Ana Paula Caetano, fazem-no ainda e muito bem. Por isso, não falaremos, especialmente, de objectivos educacionais ou da sua taxionomia, do currículo, da estruturação do ensino ou da aprendizagem, da didáctica, dos tipos e técnicas de avaliação escolar, do espaço físico-social e pedagógico, da comunicação educacional, do meio escolar e extra-escolar, da formação de professores, da disciplina/indisciplina, de sucesso/insucesso escolar. Matérias essas que os colunistas domésticos e os bons espíritos indígenas, aqueles que saem em defesa da obra da ministra, parece que dominam e pisam inteiramente. Estamos gastos por tanta erudição avulsa. E não é este o espaço ideal para isso e bem penoso o seria. Somos recatados.

Apenas se pretende ao analisar este espectáculo indecoroso da retórica ministerial & dos seus apaniguados, registar algumas contradições presentes na proposta de alteração do "Regime Legal da Carreira do Pessoal Docente". Dito de outro modo, consideramos não existir qualquer princípio de correspondência entre a nova proposta de regulação da profissão docente e a filosofia da educação ou politica educativa que é publicamente alardeada pela ministra.

Assim, dizemos que nem o novo ECD tem características meritocráticas, nem faz aumentar a eficácia, a competitividade e a rentabilidade das escolas e, por isso, não melhora o sistema educativo. Que na "histeria política" sobre a avaliação do desempenho nunca se assume o porquê de assim se proceder, não se expõe os objectivos pedagógicos a atingir, nem se questiona o seu putativo resultado final. Que no invés de conceder autonomia, responsabilidade e liberdade organizacional a docentes e outros intervenientes escolares e depois os avaliar, se tem a intenção de limitar direitos profissionais e coarctar os diferentes poderes pessoais e cognoscitivos dos professores. Que a visão romântica da organização escolar, criada por esta nova burocracia que tudo uniformiza e ritualiza, tem efeitos perversos na liderança e na necessária colaboração individual/de grupo nas tarefas de aprendizagem. E assim sendo, porque não desenvolve a "aprendizagem de grupo colaborativa" e skills individuais, não se torna a escola uma importante "unidade de mudança", que todos exigem. Que a visão (partilhada) da Escola, que é sempre de ordem individual, interactiva e contextual, fica completamente à mercê da tutela, não deixando margem de decisão aos vários clientes escolares e aos docentes, em particular, o que questiona imediatamente a natureza e os objectivos pedagógicos ou ideológicos que lhe estão associados. Que, por fim, o caos organizacional consequente que promove, irá resultar em conflitos de autoridade, existência de diversos poderes formais e informais em disputas insanas, exacerbação do mal-estar docente e fuga profissional dos melhores, forçando conflitos agitados entre alunos-pais-professores e, deste modo, conduz a uma degradação completa do ensino e educação. E que o Ministério teima em não querer ver, tal é a obsessão doentia.

[continuação]

terça-feira, 30 de maio de 2006


Ensino, Ministério de Educação & Professores

"O sentido não se decreta, não existe em nenhuma parte se não estiver em todo o lado" [Lévy-Strauss]

A animosidade intelectual do Ministério da Educação contra os professores e a quixotesca reorganização do sistema educativo a que se assiste (misturando teorias de management duvidosas, de enorme frivolidade, com mudanças de características pedagógica desajustadas, pouco rigorosas, ineficazes e de má fé) deixa as famílias, os pais, os encarregados de educação e os docentes à beira de um ataque de nervos. O economicismo pacóvio revelado pela tutela governamental não só põe em causa, definitivamente, todo o sistema educativo (já de si quebrado pelo recheio pedagógico do eduquês, curiosamente apadrinhado por esses mesmíssimos intervenientes e por quem os apoia cegamente) mas, pela afronta à civilidade e à inteligência de todos nós, compromete qualquer passo em frente no desenvolvimento económico do país.

A não ser que se tenha, exclusivamente, a intenção malévola de proporcionar passagens administrativas para inclusão nas estatísticas, não se consegue alcançar a bondade das medidas presentes na proposta de alteração do "Regime Legal da Carreira do Pessoal Docente" e o que consta do documento da "Política Educativa e Organização do Ano Lectivo 2006/07". São tantas as contradições e tão evidente a má fé, que julgamos que só razões do foro psicanalítico explicarão as inenarráveis reformas tomadas. O eduquês é só por si um mistério e, deste modo, o discurso oficial deixa de ter qualquer lucidez.

Incapaz, pela natureza própria do eduquês, de mudar a matriz curricular inadequada ao perfil dos alunos em diferentes Cursos (que o inefável David Justino instituiu), desistindo de reformar métodos e procedimentos curriculares e psico-pedagógicos, mostrando (e de que maneira infausta) que não está disposta a alterar o facilitismo educativo e o pouco rigor avaliativo (e que os professores, pela sua condição de funcionários, não controlam), introduzindo com requintes de malvadez o confronto entre docentes e entre estes e os pais, a equipa da senhora Ministra da Educação fomenta a agonia na Instituição Escola e presta um mau serviço ao país. A fuga à prática escolar lectiva e a desvalorização da componente pedagógica-curricular em troca de um economicismo inebriante, determinaram a necessidade da tutela configurar um maior controlo disciplinar e punitivo sobre os docentes, que estão assim reféns de si próprios e da perversidade das medidas ministeriais.

Não se pense que a voragem ministeriável iliba os vários e insanos discursos dos sindicatos sobre a Escola, a sua actividade lectiva e não-lectiva ou a avaliação do desempenho dos seus associados. Os sindicatos (evidentemente que não se refere, aqui, à FNE, dado ser um grupo de vassalos da quadrilha rotativa governamental ao longo de todos estes anos) contribuíram para a situação a que se chegou. Tantos anos sem qualquer preocupação de rigor pelo trabalho e avaliação dos professores teriam que levar a todo este desastre educativo, que se aproxima em grande exaltação. E quando se tem governos autoritários e incompetentes dum lado e sindicatos autistas de outro, nada se pode fazer. Infelizmente.

quarta-feira, 23 de novembro de 2005


Ensino: o desastre final

O espectáculo da degradação do ensino em Portugal (e no mundo) torna-se uma felicidade para pedagogos, uma glória aparente para funcionários da politica em trânsito ministeriável, ao mesmo tempo que um quebranto ternurento e admirável trespassa jornalistas & seus irmãos colunistas. A sua ruína, despertando discursos insensatos e quase sempre pouco substantivos, um fenómeno apetecido. Dedicado. Correio de saudade da vida (Vieira dixit). A ilusória disponibilidade de todos esses "actores" em paixão "educativa" é uma maldade pendente, respeitável é certo, mas de pouca sustentação. Por isso, não espanta que os dizeres relativos à Escola e à sua "gramática" tenham, pela tranquilidade da memória e pelo prazer da sua saudade, estado presentes no programa Prós & Contras de ontem, unicamente, pelo rosto e voz da nossa querida amiga Amélia Pais e na suavidade do discurso de António Nóvoa. Porque, de facto, a prédica noutros, é de uma banalização e de uma fadiga intelectual inconfessável. Abusada. De excessos impiedosos.

O discurso sobre o ensino (aqui tomado nos seus aspectos cognitivos) - que não sobre educação (não-cognitivo), se seguirmos os dizeres presentes num notável texto de Fernando Gil na Raiz & Utopia, 9/10 - sendo de difícil apuro e de extrema complexidade no mundo actual, não deixa porém de traduzir-se em saudosas recordações que mil programas, espargidos via TV, dificilmente podem fazer esquecer. Sabemos, bem, que a instituição Escola, lugar dos saberes ou "horta" de aprendizagem para a eficácia e reorganização do sistema pós-industrial - agora bem coberta que está pela bênção da gestão empresarial em tempos de globalização - é um marcante espaço comunicacional de socialização, um território de iniciações conflituosas, um locus de transmissão de valores. Não temos dúvidas.

Mas não é esse o nosso mister, por ora. Apenas queremos registar que quando se fala de ensino (ou educação) as virtudes ou martírios dos currículos, da didáctica ou das metodologias específicas são meras demandas sob custódia do grémio do "eduquês", que habita na paz do ministério da tutela. Nunca estão presentes. Jamais o espectro de tal debate excita as magnas reuniões de esclarecimento fornecidas aos ignaros indígenas lusos, a quem, obviamente estão vedadas. Por isso não espanta, que os comícios despudorados e anedóticos, quase sempre arrogantemente assumidos pela actual Ministra da Educação e pelo secretário Valter Lemos, com a cumplicidade inimaginável dos militantes socialistas (que, presume-se, ainda existam), tenham como única e proverbial missão afrontar os docentes do ensino básico e secundário, culpando-os, hipocritamente, do desaire do sistema educativo.

Apadrinhando certos putativos pais, ditos modernos (os que há muito deixaram de educar quem quer que seja e para quem os filhos são um fardo lastimoso); afagando o costado de alguns prodigiosos doutores que habitam nas cátedras universitárias (note-se: aqueles que leccionam uma vez por semana, três meses por ano, sem justificar procedimentos ou metodologias educativas, sem avaliação, cada vez mais ignorantes cientificamente ou folgados culturalmente e sempre lastimosamente incompetentes pedagogicamente); sob o aplauso dos habitués comentadores de jornais (curiosamente, hoje, piedosamente mudos, enquanto o rigor, o esforço e o trabalho sério na sala de aula são devassados) e sob o regozijo guloso da populaça (para quem a frivolidade de uma disputa conduz ao êxtase de cidadania); o Ministério de Educação dá provas de uma incompreensão total sobre o sistema educativo. E de como o pode e deve corrigir. Não é estranho a essa incapacidade, o peso e os laços políticos, que os "mestres" formados no "eduquês" - em tempos de 1982, em Boston - e que configuraram e representam o actual sistema de ensino, têm nos principais centros de decisão nesta área. A isso voltaremos um dia, se a paciência o permitir e a situação o reclamar.

"O Ministério da Educação"

"O Ministério da Educação é um lugar sufocante onde desabam profissionais que preferem gabinetes e planificações pouco edificantes à tarefa de ensinar em salas de aula. (...)

No seu topo há uma entidade chamada ministro. Toda essa máquina parece destilar demagógico veneno educativo, servindo-se duma abstracção violenta a que chamam 'pais'. Têm como inimigo principal a forma do trabalho diário dos professores nas Escolas.
Há uma engrenagem vassala destas gentes em cada lugar de ensino: os Conselhos Directivos. A qual se manifesta em sádicas actividades redutoras: excessos de reuniões, tarefas grotescas, sobrecarga de actividades inúteis. Conjugam-se para destruir qualquer saber mais feliz. Acossado por todos os lados, quem pode levar a mal aos professores que resistam e até que desistam?
Para ser professor, um professor começa por inteiramente precisar de um horário semanal pouco pesado (no ensino dito superior já se compreendeu isso muito bem). De outro modo, não pode aguentar uma actividade de fala e de vigilância e de partilha intensíssima, hora a hora, com dezenas e dezenas de alunos.

Além disso, um professor precisa de poder faltar, dentro dos limites bem precisos: calculando determinados momentos de repouso, pode sempre voltar com a necessária boa-disposição para acompanhar o crescimento sadiamente conflituoso de tantos adolescentes e jovens. É pura desfaçatez dizer o contrário.
Porém, tudo se passa assim ao contrário. Os horários pretendem aumenta-los em vez de reduzi-los. A necessidade de faltar num momento de maior tensão ou cansaço é totalmente sabotada. O trabalho de um professor não pode ser encarado como uma rotina sujeita a obrigatoriedades burocratas. É um trabalho em grande parte anímico, e suponho que até os engenheiros deveriam saber disso.

A luta dos professores cada vez mais tem de ser contra os pavorosos fiscais que enchem os gabinetes do ministério com planos disformes. E contra os conselhos directivos que se queiram tornar os cães-de-guarda dessa infâmia.

Duas faltas mensais sem desconto nas férias nem no ordenado era algo que a fase final do sistema educativo fascista já compreendia perfeitamente. Parece agora, visto à distância, ter havido menos gente repugnante, apesar de tudo, nesse tempo de ministeriais estrangulamentos ideológicos do que hoje em dia, em que todos fingem liberalizações educativas sem conseguirem deixar de representar a mera figura de Pilatos.

Horas e horas sabotadoras são passadas em reuniões, onde o desgaste se transforma, a princípio, em conflito, depois em cansaço, por fim em desprezo sem saída.
Com professores esgotados, mal pagos, explorados por decretos e portarias e regulamentos despromovedores, a sua melhor vontade em acompanhar seres no momento crucial do seu desenvolvimento e da sua captação cultural não se pode plenamente manifestar. Querem ter um povo educado? Um país desenvolvido? Uma colectividade capaz da múltipla imaginação do seu próprio futuro? É claro que não. Estes fulanos que nos governam querem é o vazio. E que depois o vazio vote neles."

[Joaquim Manuel Magalhães, "No Ensino Secundário", in Independente-Vida3, 26/05/1989]

terça-feira, 13 de setembro de 2005


O mistério da Educação

O Ministério da Educação anda numa agitação deslumbrante, só comparável à embriaguez mediática da implosão das torres de Tróia. Por toda a parte, sacudindo o pó do cadáver adiado que é o ensino em Portugal, o sentimento do festivo Sócrates anima os foliões do processo educativo.

Visto que os putativos lamentos do inflamado José Manuel Fernandes ou a escrita sensível do Valente da Gradiva ainda não desabaram nas páginas d'O Público, tudo leva a presumir que estamos perante uma virtude educativa socrática. Também é verdade que, o inefável David Justino, ungido noutros tempos pelo senhor director para tarefas educativas, e que não soube (dizem) ou não teve tempo (sussurram outros) de honrar o plano espargido pelo duo redentor citado, rende homenagem aos despachos administrativos da senhora Ministra, decerto em feliz recordação ministerial. Demais, os encarregados de educação, em deleitosa excitação, estremecem de gratidão por tanto inglês assim espalhado à plebe, aplaudem a prescrição de mais cuidados professorais pelo dia fora e respiram, cientificamente falando, pela ilustrada formação em matemática dos docentes saídos das ESE, que ao que parece não dominavam a matéria. Tudo corre no melhor dos mundos.

A reforma educativa socialista foi árdua mas não difícil. A gravidade da missão era apenas dar com o chicote governativo ao corpo docente e não-docente, conduzir os prevaricadores pela arreata, irresponsabilizar pais e encarregados de educação. Afinal - como o trio iluminado manifesta um silêncio de zelo perante tais medidas -, era esse o prodígio no ensino e da sua reforma que tricotavam pelos jornais e com que instruíam os indígenas. Simples, portanto!

Daqui procede que questões como os planos curriculares, laboriosamente selados por David Justino, e absolutamente inacreditáveis num país sério (vidé os do ensino secundário), a carga horária lectiva e não-lectiva, o trabalho/discurso cientifico e pedagógico dos professores, a avaliação de alunos e docentes, o alargamento da escolaridade obrigatória, a reformulação ou encerramento das ESE, são de tal modo obscuros de paradigmas, irrelevantes no discurso da escola, desfasados do campo educativo e da intervenção escolar, que não merecem qualquer resposta ou análise. Intervir administrativa e autoritariamente no corpo docente lançando a confusão, equívocos vários, desabridas intolerâncias inconstitucionais, fragmentando e desvelando as fissuras escolares, eis a panaceia para uma instrução melhor e de qualidade, que nos vai levar (dizem!) ao topo da UE. Compreende-se, deste modo, como os adeptos do "eduquês" que configuraram todos estes anos a praxis educativa lusa, proliferam no pesado aparelho do Ministério da Educação. É só contar os comissários políticos oriundos das ESE e dos Politécnicos para entender a extraordinária reforma do ensino em Portugal. Com o aplauso de muitos. E o silêncio de uns quantos.

quarta-feira, 22 de junho de 2005

A GREVE: A BOA E A OUTRA


As qualidades patenteadas no opinioso protestatório expedito pelos novos pastores do rebanho Socrático, contra a impura greve dos docentes do ensino básico e secundário, são de um espectáculo constrangedor que aniquila qualquer um. O tumulto que vai na alma desses jovens messiânicos de antanho, agora recostados nos maples do politicamente burguês & alapados na academia fleumática da vida, não é mais que um sermão gratulatório recitado aos indígenas que padecem desse insofrível incomodo de abraçar um funcionário público. Estão neste caso, os suspiros exalados pelos meus caros amigos, Vital Moreira e Paulo Pedroso, ou essa desdita da agonia dos docentes anunciada por João Gonçalves.

Tais pronunciamentos, pelas imprecações de teor político referidas e, principalmente, pela descomunal ocultação do procedimento administrativo ou (in)jurídico tricotado pela tutela, de cariz ilegal e politicamente reaccionário, são momentos que imortalizam a história pública lusa. Com a curiosidade de difundir no "rebanho" socialista a ideia que a "boa greve", iluminada e melodiosa, é aquela que for sempre contra a governação do que chamam (com graça admirável) a direita, autoritária ou nem tanto. O embuste de se aceitar manobras dilatórias jurídicas, que qualquer governante do Estado Novo aplaudiria sem rebuço algum, desvela que não só não se vive num Estado de Direito pleno (o poder disciplinar da tutela, sendo óbvio, ainda não lhe permite ser juiz em causa própria), como os seus intervenientes manifestam uma grosseira apetência pelo autoritarismo, que nada tem a ver com o que prosaicamente se chama socialismo.

E não se pense que temos metafísica de míope. Nem por isso! O facto de não acedermos com facilidade ao corpo reivindicativo (e à praxis) que é solicitado pelas organizações sindicais dos docentes para dar inicio à greve, não nos permite seguir aqueles maledicentes críticos para quem os vadios do funcionalismo público são a fonte de todo o mal. Tais alimárias pranteiam a defesa de um "igualitarismo" estulto em toda a administração pública, de baixo a cima, nivelando tudo e todos, a maior parte das vezes sem saber do que falam e, muitas vezes, tentando iludir quem avançou com as reformas que agora pretendem retirar. E se ligarmos a toda esta questão a renovada fúria e obsessão pelo défice, então, muito justamente, teremos de aceitar que as revindicações dos trabalhadores da administração pública são parte integrante das suas estratégias de sobrevivência. E como tal, são justas. Tal como as greves. Porque, para nós, a "boa greve" ... não é, sempre, uma outra qualquer.

sexta-feira, 17 de junho de 2005

O DESPACHO EDUCATIVO CONJUNTO


Pelo que se sabe, o Ministério do Trabalho e Segurança Social, do sempre irrequieto Vieira da Silva e o Ministério da Educação, produziram em parceria no dia 14 de Junho último, um extraordinário Despacho, em resposta à convocação de greve pelas organizações sindicais dos professores, que, quer no seu enquadramento legal quer nos seus pressupostos substantivos, são dignos de se ler e registar. Sabia-se que a fugacidade socialista em território educativo era de reputada versatilidade em matérias pedagógico-curriculares, mas desconhecia-se a sua tentação por delírios jurídicos.

As insignes tutelas, no intuito de contrariar as greves dos docentes do ensino básico e secundário, marcadas para a próxima semana, estabeleceram uma invulgar peça de teor injurídico, expondo uma interpretação de "serviços mínimos" sem sustentação legal aplicável e cuja construção política é retirada, presumivelmente, da quintarola do Botas de Santa Comba. Compreende-se como os incautos simpatizantes da rosa andem embargados pela dor. É a vida.

A ironia do Despacho, pelo talento do seu escriba, reside no facto de ser direccionado, sem minúcia alguma, contra o pré-aviso de greve da FENPROF (sic), supondo o leitor que não existam mais organizações sindicais que a subscreveram ou, admitindo mesmo, que tais infectas organizações se tenham evaporado, tout court. Depois, todo o articulado tem em conta a aplicação dos artigos 598º e 599º do Código de Trabalho (Lei nº99/2003), sem que se vislumbre, aí, qualquer pretensão para determinar essa "necessidade social impreterível que é a realização dos Exames Nacionais do Ensino Secundário", e coeteris paribus a exigência de serviços mínimos que, perante a inexistência de actividades lectivas nas Escolas e face à convocação de todos os docentes para a realização dos exames, significa, em linguagem de outros tempos, uma simplória requisição civil, com a bondade de permitir (helás) o direito à greve e a mais uma trapalhada socialista.

Na verdade, este estimulante exercício em prol do serviço público mínimo deveria, no invés, ser administrado para dar às famílias e ao País, um ensino curricular de qualidade, uma avaliação de rigor, maior responsabilidade e autonomia às escolas e aos seus clientes, autoridade aos professores e órgãos de gestão, exigência de participação e responsabilização dos pais e da comunidade escolar no processo educativo, isto é, um "serviço mínimo" de qualidade. Isso sim, é que era uma "necessidade social impreterível".

quinta-feira, 16 de setembro de 2004


Da Educação ou os pecadilhos de David Justino

"A seus pés, sentados, os dois rapazes sorriam perplexos, cépticos, contrariados, irritados por tanta ideia, tanto pensamento, tanta informação, tanta coisa que nada lhes dizia" [Jorge de Sena, in Andanças do Demónio]

O texto, sumário e pretensamente recenseador, de David Justino sobre o "inventário" de fim de exercício da governação à frente do Ministério da Educação, para além da multivariedade de leituras que o debate necessariamente sugere, estabelece confusões, ambiguidades e perplexidades várias, que no invés de serem noviciadas enunciam a repetida pragmática situacionista dos que se movem nas malhas do sistema e do seu discurso. Ao conjunto de problemas que envolvem estruturas, pessoas, práticas e relações, que o território escolar configura e que a cultura de massas há muito desestabilizou, David Justino, deixando de lado tais sequelas porque, presume-se, sociologicamente inúteis, inscreve um exercício intelectual onde é visível a aproximação insuspeita entre objectivos educacionais e a política económica. Daí que o desassossego educativo, as práticas instrutivas ministeriais e a catástrofe das várias luminosas reformas educativas, só sejam explicitadas a partir de um velho/novo economicismo na tutela do Estado, um verdadeiro oásis do economicus, evidentemente sob a domesticação dos burocratas da política.

A situação é esta. Ao estabelecer um paralelismo entre os métodos de reorganização do Sistema Educativo e o sistema industrial pós-moderno, os novos desafios de David Justino assumem uma necessária reestruturação do sistema de ensino de modo a acompanhar a relação funcional entre a Escola e o processo produtivo, e portanto com recurso a modernas teorias de gestão empresarial, aplicação da teoria e prática do management, projecção de critérios de máxima racionalidade, planificação da gestão e avaliação do processo educativo. A performatividade escolar assim entendida caminhará, necessariamente no futuro, para uma separação entre direcção e gestão escolar, ultríssima panaceia para a solução dos problemas educativos.

Ao considerar-se tal paradigma, a Escola é tomada como uma qualquer organização formal sem "construído cultural" e na qual os vários clientes escolares cooperam com inteira liberdade, mantendo-se ao mesmo tempo como agentes livres. E à gestão diária das relações escolares na lógica empresarial menospreza-se competências científicas e pedagógicas, sociais, culturais e afectivas. Suprema ilusão.

Por recato, David Justino, não impõe a figura do reitor (como Bénard da Costa sugere), aparentemente supondo que o órgão não faz a função. Mas nunca fiando. É que, de facto, a organização escolar, sendo uma "realidade que organiza", estrutura-se a partir de regras formais, não formais e informais, possuindo uma cultura e identidade própria, o que sugere a inscrição de práticas e jogos comunicacionais entre os seus clientes, em estruturas democráticas. Assim, o curriculum, os conteúdos programáticos, os métodos de ensino, a avaliação de alunos e docentes, a aceitabilidade de regras impostas à comunidade, o controlo disciplinar de alunos e professores, para além do repensar da linha orientadora em cada ciclo de ensino e da consagração da autonomia escolar, são referências fundamentais ou tópicos de reflexão e acção urgentes. Manifestamente David Justino entende que tais conceitos são meros estereótipos comuns, sem qualquer fundamentação ou linha conceptual credível. É é pena que assim seja.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2003

"LAICIDADE" E "FÁBRICA DE VÉUS"





"O corpo desenha o espaço como a água desenha o vaso" [El-Hakim]

A posta de André Belo, pelos considerandos aí referidos, sobre o comprometimento do Estado na defesa da laicidade da Escola, sugere curtas anotações, a saber:

- é possível que a noção de "laicidade", lugar central no discurso mass-mediático francês, seja objecto cientificamente re-analisável, no seguimento do que Edgar Morin assume pelo aparente contraditório entre "laicidade", "doutrinarismo" e "democracia". É, porém, razoável que no termo "laicidade" se encontre lugar para uma pratica contra o totalitarismo, o dogmatismo ou o monopolitismo da verdade. Como conciliar, tudo isso, no território e cultura escolar, aberto e plural, eis a questão que André Belo questiona.

- o espaço escolar é atravessado, sabe-se, por processos sociais, políticos e simbólicos que se ramificam no campo discursivo do poder. Isto é, a Escola é encruzilhada de diferentes discursos verbais e não verbais, "mercado" alucinante de signos-mercadorias, afloração de saberes, ambiente de aprendizagem activa, lugar de escolha e clarificação de valores e comportamentos, espaço privilegiado da produção e reprodução social. Estamos disso crentes. Assim entendida, sabemos que a Escola se estrutura a partir de regras formais (além de outras), dando lugar a um "locus de reprodução e produção normativa", consubstanciada numa cultura de identidade assente em realidades não homogéneas (evidentemente), mesmo que a dissidência seja esse espaço de cumplicidade ou percurso de todos os afectos e seduções.

- o espírito da "laicidade" pretende, a partir de um conjunto de regras comuns mínimas, estabelecer um espaço "conversável" no tecido escolar, afinal garantia de liberdade, e portanto, um espaço "protegido" pelo Estado, para além do direito à diferença que na esfera privada se reconhece. Não se trata de dar lugar a um qualquer guetto, mas tão só assumir que a "laicidade" contribui para a nossa liberdade, até pelo sentido que, se se permitisse que as regras fossem estabelecidas pelo diversos clientes escolares porquê então a aprendizagem? Que lugar do pedagógico como "trabalho" de compreensão e aceitação da diversidade e do multiculturalismo?