[Dona Política)
"... Todos falam de política, muitos compõem livros dela e no cabo nenhum a viu, nem sabe de que cor é. Atrevo-me a afirmar isto assim, porque, com eu ter poucos conhecimentos dela, sei que é uma má peça e que não fariam bons entendimentos se a conheceram de pais e avós, tais que querem lhos souber mal poderá ter por bom o fruto que nasceu de tão más plantas (...) é de saber que no tempo em que Herodes matou os inocentes, deu um catarro tão grande no diabo que o fez vomitar peçonha e desta se gerou um monstro, assim como nascem ratos ex matéria putridi, ao qual chamaram os críticos «Razão de Estado», e esta Senhora saiu tão presumida que tratou de casar, e seu pai a desposou com um mancebo robusto e de más manhas, que havia por nome «Amor Próprio», filho bastardo da primeira desobediência. De ambos nasceu uma filha a que chamaram Dona Política. Dotaram-na de sagacidade hereditária e modéstia postiça (...) E eis quem é a Dona Política ..."
[in Arte de Furtar, atribuída ao Padre António Vieira ou a João Pinto Ribeiro ou Tomé Vieira da Veiga ou António de Sousa de Macedo ou António da Silva e Sousa, ou Padre Manuel da Costa, Amesterdão, 1652 ou Lisboa, 1743 (aliás 1937, Livraria Peninsular Editora)]