sexta-feira, 29 de agosto de 2008
Jogos Olímpicos: "o ouro da vingança"
"Amigo torcedor, que Michael Phelps que nada, o grande personagem destes de Pequim é o gajo e valente Pedro Dias, a quem no trágico e inevitável tatame da existência coube o papel de um confesso chifrudo olímpico (...)
Ai, Mouraria, ai Tejo que carrega todas as dores do mundo, coube ao judoca português, numa estupenda sinceridade d'alma, dizer de onde vinha a sua fúria de indomável touro: "Questão de saias". Havia sido traído, confessou, pelo oponente e favoritíssimo brasileiro João Derly, na categoria meio-leve - se é que pode existir leveza em tais circunstâncias.
Quis o destino, esse mascarado trocista, que o gajo encontrasse justo o Derly pela frente. Não em um beco escuro, não em uma taberna esquecida do Alentejo, não no largo dos Aflitos, bastante estreito a essa altura, caro amigo Antônio José, esse gênio de Irará e derredores, bastante estreito para caber tanta aflição e orgulho de macho ferido.
Quis o destino, essa mão que manipula as assombrações internas de um homem como quem balança mamulengos e fantoches, que Pedro e João tirassem as suas diferenças no maior espetáculo da terra. O que poderia ser uma meia dúzia de tabefes e sopapos, sob as vistas de inflamados bebuns da rua Augusta, virou uma contenda olímpica.
O certo é que o ressentido gajo derrotou impiedosamente o bicampeão mundial, o favoritíssimo "canalha" brasileiro, no maldizer do judoca português. Coube, então, ao jornal "A Bola", um matutino lisboeta, cravar a melhor e imbatível manchete destes Jogos até agora: "Matar o traidor e depois morrer" ...” [ler tudo, aqui]
[Xico Sá, O brilhante ouro da vingança, in Folha de S. Paulo, 15 de Agosto 2008, sublinhados nossos]
In-Libris – livros em Agosto
A In-Libris (Porto) apresenta um novo Catálogo de livros. A referir alguns números da esgotada e muito procurada revista Oceanos, a 2ª ed. das Novas Cartas Portuguesas, o drama histórico Os Portuguezes em 1640 de Miguel Osório Cabral, obras de E.M. de Melo e Castro, estimadas e raras peças da saudosa Natália Correia, o curioso tratado de Jerónimo Cortez Fysionomia e Vários Segredos da Natureza (1792), livros de Mia Couto, obras poéticas de Gastão Cruz, livros de Culinária e Gastronomia (vidé os de Alfredo Saramago), o excelente A Memória das Palavras de José Gomes Ferreira, o estimado trabalho Jornalistas do Porto e a sua Associação (1925) de Luiz F. Gomes, obras estimadas de Alberto Pimenta, livros de poesias de Al Berto, Egito Gonçalves, Vasco Graça Moura, António Ramos Rosa, Fernando Guimarães, Carlos de Oliveira, António Pedro, Herberto Helder e António Maria Lisboa, as obras completas (via FCG) de Paulo Quintela e o raro Vocabulário Taurino de António Rudovalho Duro (1915).
A consultar on line.
quinta-feira, 28 de agosto de 2008
Atrevimento ... muito atrevimento!
"A onda de assaltos e crimes violentos é uma coisa muito séria" [Cavaco Silva]
1. Com o maior dos despautérios, muito bem alapado no sofá de Belém, o dr. Cavaco, decerto ainda a refulgir da doce cooperação institucional com o medíocre governo de Sócrates, comunicou ao país a sua preocupação com a onda de assaltos e crimes que acontece por todo o lado, o que, de facto, qualquer cidadão já tinha entendido. Imediatamente um curioso grupo de jornalistas e analistas da paróquia se curvou no espectáculo presidencial e professou as apreciações elogiosas do costume. Com as orelhas a arder pelos ditames dessas criaturas inteligentes, o eng. Sócrates, esta madrugada, utilizando a poeira do costume, respondeu e mandou de imediato e com grande aparato a polícia cercar a Quinta da Fonte e a Quinta do Mocho. Decerto os "assaltos e crimes violentos" que percorrem todo o país, segundo a douta opinião do nobre primeiro-ministro e do sr. Rui Pereira, têm lá os seus mentores e a sua sede, o que não deixa de ser espantoso pelo atrevimento.
2. As palavras de Cavaco Silva sobre a "onda de assaltos", logo seguidas pelo pedido de "estratégias adequadas para combater a criminalidade violenta", são de enorme hipocrisia. São grotescas e de mau gosto. Não será preciso recuar aos tempos de inefável Laborinho Lúcio e do pitoresco descalabro das medidas então tomadas. Basta saber que a esfíngica figura que hoje brama por tais medidas de combate à criminalidade foi a mesma que assinou de cruz, braço no braço com o eng. Sócrates, as alterações ao novo Código de Processo Penal, o mesmíssimo que recomendou o Código Penal como feliz conquista conta o crime e aquele que considera que a nova Lei de Segurança Interna é um instrumento importante e, por isso, não encontra "razões para [a] não promulgar". E é o mesmo senhor que não nada diz sobre o estado comatoso da polícia e da GNR, sem meios humanos, materiais e jurídicos e perante a total degradação e paralisia da sua autoridade. Eis o nosso homem! Maior atrevimento não é possível.
3. Com a lista de mazelas denunciadas pelo dr. Cavaco, na mão e no ouvido, acorrem sempre à acção mediática os rapazes do costume. Os despeitados do PSD e a garotagem do CDS desataram num alarido artificial e cómico, sem que nunca se ouvisse uma única palavra de crítica ou simples lamentação sobre a posição do senhor presidente da República no apoio dado ao construído jurídico arquitectado pelo governo e que, fora outras razões substanciais, são importantes em toda esta questão. E mesmo que, por puro exercício que fosse, se aceite estar presente uma sustentada estratégia política de desgaste e cerco ao governo, levado a cabo pelo dr. Cavaco e seus anões - enquanto a D. Ferreira Leite espera em silêncio no recesso do lar - tal experimentalismo insano e provocador, com evidentes reflexos na vida dos portugueses e no país, não o permite aceitar. Não estamos num vale tudo. Haja decoro!
Colheitas de bom veraneio (II)
"Do Viril* Hora crepuscular de melancolia ... Há nas coisas e na alma uma lassidão dominante. O sonho! O sonho! Mas … Junto ao Amazonas só se pode sonhar com gigantes. E …com montanhas. Porque ... Para se viver o Amazonas é preciso ter uma alma tão grande como o próprio Amazonas (...)
... Havia um silêncio fictício (...) O índio avança, dobrando muito as pernas nos joelhos. A fêmea extasiava-se também no crepúsculo suave de nuvens vestido-de-bailarin: - cortadas agora por uma grande mutum, que veio poisar sobre o assahyzeiro, apequenado pela altura. Com um golpe só, passando-lhe a mão pela cabeça, o macho fel-a tombar: - de cara para cima. Ela, defendendo-se, suspendeu as pernas: - encolhendo-as, formando um ângulo: - mostrando então a vagina aberta dum arroxeado-escuro. Ele, mordeu-lhe o pescoço, os peitos, torcendo-lhe os braços, arrepanhou-lhe a pele da barriga com a sua mão larga e felpuda: - como se a quizesse suspender pelo ventre encolhido. E a fêmea estremecia: - como se um rolo de veludo a acariciasse. Um mundo de sensualismo invadia a tarde ..."
* ... Foi no Amazonas que nasceu o meu primeiro desejo (…) O Amazonas é um poema de sensualismo vegetal. Na sensualidade potente-e-morbida da selva ao crepúsculo eu fui homem (...) Hoje o Amazonas é a minha pátria: - o museu das minhas imagens: - a silenciosa biblioteca onde se acumulam todas as variantes da Belesa. Po isso … As ultimas paginas deste livro alcançam a primitividade: -na sua violência de verdadeiro. Às pessoas de pudor elas serão contundentes. Para que as expatriem da obra mandei perfurar. Quanto a mim ... O pudor é a túnica da Verdade: - Eu já rasguei há muito essa túnica” (p.98)
Ferreira de Castro, in "Mas ...", (p. 97-99) Tip. Boente & Silva, R. do Século, 2-C, Lisboa, Portugal, 1921, 100 pgs
Raro livro, nunca reeditado, de Ferreira de Castro. Trata-se do seu quarto livro, o primeiro que publicou em Portugal [Criminoso por ambição, 1916; Alma Lusitana, 1916; O Rapto, 1918; foram todos publicados no Brasil (Pará)] e que tem como curiosidade apresentar as duas ultimas folhas picotadas, pelas razões atrás referidas pelo autor. Muitos exemplares não apresentam essas folhas. Registe-se que se trata se ensaios de teor sociológico, sendo de realçar "Junqueiro hoje é o cadáver vivo do seu Génio morto" e, em especial o curioso:"A anarquia é a fronteira sociológica contemporânea".
Sebo na Estação da Lapa - Salvador da Bahia
Simples e curioso sebo, perto da estação da Lapa, em Salvador da Bahia. Apesar de ter poucas peças de interesse, apresenta obras literárias de edição popular e, se esquecermos o mau estado físico dos seus livros (que aliás é uma constante na Bahia, ou melhor por todo o Brasil), muito baratas. De muita simpatia.
Colheitas de bom veraneio (I)
Raríssimo primeiro livro de Ferreira de Castro. A novela "Criminoso por ambição", saída em fascículos sob edição de F. Lopes (Pará, Brasil) e vendida à mão pelo autor, foi publicada em 1916, mas foi anteriormente escrita (1912-13). Ferreira de Castro (que nasceu em 1898, pelo que tinha então mais ou menos 15 anos) era então empregado num armazém no Seringal Paraíso, no rio Madeira, coração do Amazonas - para onde foi enviado por um "engajador", por sinal seu conterrâneo. Trabalho duro e miséria terrível. Decerto é a partir daí e dos contactos com outros portugueses que começa a esboçar o seu importante livro, "Emigrantes".
Ferreira de Castro, "Criminoso por ambição" (novela). Edição F. Lopes, Pará, 1916
terça-feira, 26 de agosto de 2008
Home
Arribámos! Com muita soidade, algumas rimas e poucas profecias. O nosso veraneio, por natureza sóbrio & casto, foi como "uma gaiola [que] ia à procura de um pássaro". Deixámos, por isso, os nossos folgados indígenas lusos e seus ilustrados conselheiros dos jornais & blogs a caprichar na lição dos assuntos caseiros. Desde que, enfadados, assistimos ao curioso serão do dr. Cavaco que dizemos (como Machado de Assis), "felizes os que podem conhecer a origem das coisas ... e explicá-las entre o almoço e o jantar". Por isso não prevaricamos. Por cortesia e piedade!
Assim, não lemos em todos estes dias, em rigor e extensão, os boletins paroquiais do governo do eng. Sócrates ou as notícias de pesar sobre o adormecimento político da sra. Ferreira Leite; nem acompanhámos os rabichos intelectuais do imortal Alberto João, as rogativas do sr. Aguiar-Branco contra o inefável ministro Pereira ou as composições espinoteadas do dr. Lello; e deixámos de comungar, exaustos de tanta angústia, os escritos humorísticos lavrados pelo jovem João Miranda, a intensidade liberal e a esperteza ruminante dos artigalhos de Sir Carlos Espada e o movimento editorial do portentoso Henrique Monteiro. Não temos perdão! Mas – helás - sobrevivemos (como se vê), o que não deixa de ser um exercício curioso.
Não comentamos, por pudor e tédio, os negócios ideológicos privados do dr. Cavaco e os seus vetos amestrados, mesmo que venha daí, e em particular na Lei do Divórcio, alguma e sábia ponderação no meio da mais trôpega argumentação presidencial jamais publicada ou, como no caso da aprovação cavaquista da Lei de Segurança Interna, se possa declarar a falta de ousadia e aprumo em defesa do Estado de direito democrático. Conhecendo-se o dr. Cavaco e as suas retrincadas evocações ideológicas, não são de estranhar a trivialidade política, o estilo e os detalhes nisso tudo. Um pesadelo!
Deste modo, não fazemos relatórios! Até porque, se a situação nativa é de uma garotice enfastiante, já o mesmo se não pode dizer da actual situação internacional, em particular desse perigoso e pouco humorado jogo de xadrez que se trava entre uma Rússia travestida de potência política e uns EUA que se julgam a única superpotência mundial. Eis, realmente, o que nos preocupa. O resto é a indiferença cheia, como diria o poeta.
E, agora, para ledores originais e de pensamento largo, frequentadores da casa, os que escusam a fadiga e não sucumbem à crítica do tempo – essa poesia primeira –, certos que Everything That Happens Will Happen Today, aqui vos deixamos este clarão primeiro de
David Byrne & Brian Eno – Home
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terça-feira, 5 de agosto de 2008
Em mistérios de Veraneio
Por ser Agosto, mês de reencontros e de exílios vários, estamos ausentes da V. companhia. Admiravelmente inspirados, longe dos curas e indígenas lusitanos, consumimos os dias-ligados-a-dias pela doce e carinhosa espiritualidade brasileira. Em humana paixão. E ainda só agora começamos. O eterno Rio ficou in su situ. Caminhamos, neste momento e uma vez mais, para a Bahia de Todos os Santos. O chamamento é depois mais para o Norte, onde os triângulos se fecham. Iluminados.
Voltaremos assim que pudermos. Não temos pressa. Temos os pés bem ferrados no chão. Só para chatear!
Paulinho da Viola - Só Pra Chatear
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Saúde e Fraternidade
quinta-feira, 31 de julho de 2008
O serão do Presidente
O dr. Cavaco Silva fez hoje, via T.V., uma desastrada comunicação aos indígenas sobre a questão do Estatuto Político-Administrativo dos Açores e que ninguém, em esforço e minimamente instruído, entendeu. Apologista do tabu e do silêncio tortuoso como estratégia política, o Presidente da República caiu, definitivamente, nas profundezas da silly season nativa e no anedotário paroquial ao interromper as (merecidas) férias dos portugueses com avisos avulsos ao governo e à Assembleia da República, depois de en passant ter atestado a incompetência jurídica dos sábios do Tribunal Constitucional. Convenhamos que, para quem ao longo do santo dia esperou algum serviço ou dito sentencioso vindo do Palácio de Belém, a espera, além de aborrecida e pouco divertida, foi inútil e afrontosa.
Mesmo se a récita presidencial fosse por alguma vez estimulante - o que nunca se verificou -, o tom grave e carrancudo do sr. Cavaco Silva, a par da sua eterna dificuldade de dicção, torná-la-ia enfadonha e incompreensível.
Mas afinal que pretendeu dizer o sr. Presidente da Republica e que os conselheiros do Tribunal Constitucional e todos os deputados, regionais e da República, não souberam ver? Que o sistema de equilíbrios institucionais e os poderes presidenciais, tal como estão consagrados no novo Estatuto Político-Administrativo dos Açores, era beliscado existindo mesmo uma putativa diminuição de poderes presidenciais. Para tão sentencioso letreiro político-institucional o dr. Cavaco avançou, passando por cima do sentido político que se quis imprimir às autonomias desde a revisão constitucional de 2004, com uma bateria curiosa de exemplos no que considera ser uma moléstia sobre os deveres/direitos de audição e consulta no acto de dissolução da Assembleia Legislativa dos Açores.
Fica-se a saber, pelo narrado, que partidos para o dr. Cavaco Silva só existem os de expressão nacional, não havendo lugar a infectos partidos ou grupos regionais fora da bitola dos grandes partidos e que, assim, bastaria consultar aqueles numa putativa dissolução. Mais bizarro foi considerar que a "audição autónoma do Presidente do Governo Regional [é] tanto mais incompreensível quanto ele tem assento no Conselho de Estado". Isto é, para o dr. Cavaco Silva o processo autonómico foi formatado em devido tempo e não há lugar a mais alterações. Do mesmo modo, é de supor que a revisão constitucional de 2004 feita não agrade ao preclaro defensor da actual Constituição.
Mas é evidente que os poderes presidenciais não foram de modo algum diminuídos, aliás conforme entendeu o Tribunal Constitucional, a quem Cavaco Silva agora pretende dar lições. Não há pois razão para o dramatismo do dr. Cavaco. A questão que se colocou no serão presidencial de hoje foi essencialmente política, com estranhas motivações por detrás. Tudo leva a crer que o caminho iniciado a partir deste incidente por Cavaco Silva não augura prudência e ponderação. E é de supor pelo ridículo do teor da comunicação que o seu magistério, esse sim, é que foi mesmo beliscado. Como um dia se verá.
quarta-feira, 30 de julho de 2008
Heitor Villa-Lobos
"É na formação das artes de um país, que existe a cega necessidade imprescindível de colher os principais motivos na sua própria natureza, como fizeram todas as grandes nações que mais se distinguiram pela sua maneira própria de ser, algumas delas chegando mesmo a dominar o espírito artístico universal, implantando sugestivamente um Belo que nada tem de comum com o Belo de outros povos de temperamentos completamente opostos. É verdade que nestes casos resulta sempre num curioso fenômeno de condições e paradoxos. Por exemplo, (sem ironia) no Brasil [...] veneram com eloqüência todos os feitos da Grécia/Roma antiga e ridicularizam as façanhas dos nossos primitivos selvagens. [...] É isso que se chama talvez, modernamente, esnobismo" [A Noite, 9/1/1926 – ler mais aqui]
Leila Guimarães/Heitor Villa-Lobos - Bachianas Brasileiras No. 5-Dança
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Tabuada: "Honorabilidade"
Honorabilidade – E um vocábulo de acepção indefinida e, talvez, indefinível.
Se equivale a benemerência (como ensina Figueiredo), não há precisão de neologia: benemerência escusa honorabilidade.
A meu sentir, honorabilidade, quando o consagrássemos, teria de significar a estimação, com que o juízo público, isso a que hoje em dia chamamos por excelência a opinião, recompensa os homens de bem.
Mas, nesse caso, honorabilidade se confundia com honra, que (leia-se a definição de Morais) também tem essa acepção.
[M. S. Mendes de Morais, "Repertório Réplica de Rui Barbosa", Casa de Rui Barbosa, 1950, p.92]
Edições Livraria José Olympio Editora
Fui advogado da Livraria José Olympio Editora durante muitos anos, de 1935 a 1960, iniciando os trabalhos com o preparo do contrato da locação da sala na Praça XV de Novembro, edifício da Bolsa, no mesmo prédio em que o Valadão [prof.e advogado Haroldo Valadão] e eu tínhamos escritório, pois o José Olympio vinha da Travessa dos Barbeiros. Houve depois uma acção de renovação de contrato da loja da Rua do Ouvidor, esquina de Avenida, onde estava instalada a livraria (...)
José Olympio, o maior editor brasileiro dos últimos anos, foi o editor de Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, José Lins do Rego, Gilberto Freyre, Guimarães Rosa, Graciliano Ramos, Luís Jardim, Herman Lima e muitos outros, e nunca houve qualquer acção para cobrança de direitos autorais, porque a firma cumpria rigorosamente suas obrigações. Lá conheci todos os autores da época, e nos almoços de quarta-feira (depois às sextas) conversávamos muito. Houve até um caso curioso de Guimarães Rosa: ele entregou originais com o título de Terceiras Estórias, quando só tinha publicado as Primeiras Estórias, e alguém, no almoço, perguntou pelas 'segundas'. O Daniel Pereira, director da Casa, declarou: 'O Rosa falou meia hora explicando o porquê das terceiras sem as segundas, e eu não entendi nada'. Em seguida, o Rosa saiu-se com esta explicação: "Vocês conhecem o Plínio Doyle, que não está satisfeito enquanto não tem um papel na mão para a sua colecção. Ele pediu os originais das ‘Segundas Estórias’ para ler e agora não quer devolver porque já estão no seu arquivo”. Com essa resposta todos riram e o Rosa não explicou nada. As “Segundas Estórias” não existem e o Paulo Rónai, ao preparar uma nova edição das Terceiras Estórias, para que não houvesse confusão, deu-lhe o título de Tutaméia ...
[Plínio Doyle, in Uma Vida, Edições Casa Rui Barbosa, 1999]
terça-feira, 29 de julho de 2008
José Olympio: o Editor e Sua Casa
Em breve teremos o prazer de folhear o admirável e curioso livro sobre José Olympio Pereira Filho e a sua "Casa", a estimadíssima Livraria José Olympio Editora. Trata-se da edição feita pela "Sextante" [a cargo de Geraldo Jordão Pereira, filho de José Olympio] e organizada por José Mário Pereira: "José Olympio: o Editor e Sua Casa”. São mais de 400 páginas de imperecível saudade sobre o livreiro e a sua casa editora, que foi uma das mais importantes em língua portuguesa e principal ponto de encontro literário do Rio de Janeiro. A Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro, fará uma exposição sobre o evento.
Do registo estimado da "Casa" (Rua do Ouvidor 110, Rio de Janeiro), como era conhecida a Livraria de José Olympio, em boa hora feito por José Mário Pereira revela-se a exuberância e a riqueza do acervo da sua Livraria, como se poderá ver pela reprodução de mais de 500 capas, quase sempre magnificas, com desenhos de Portinari, Tomás Santa Rosa, Cícero Dias, Oswaldo Goeldi, Luís Jardim e outros tantos mais. A "Casa" que segundo José Mindlin "abriu caminho para escritores que no tempo se tornaram grandes nomes na literatura brasileira" publicou obras de Guimarães Rosa, Rachel de Queiroz, Machado de Assis, Jorge Amado, José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Gilberto Freyre, Rubem Braga, entre muitos. E daí que no livro a sair se possa também entender as relações de amizade e cumplicidade entre o Editor e os seus autores, tais as referências expressas. Coisa rara, nos tempos de hoje.
Nós, que há alguns anos, em vaidade bibliómana, coleccionamos (graças Ricardo! graças Manel!) obras publicadas pela linhagem da Livraria José Olympio Editora - não só pela raridade das suas obras mas também pela riqueza e excelência das suas capas - lá estaremos para lhe prestar a merecida homenagem.
terça-feira, 22 de julho de 2008
Tabuada: "Despedir"
Despedir – A consemelhança, que figura aparentar os verbos expedir, impedir e despedir com o verbo pedir, ocasionou a versão vulgar de impeço, expeço, despeço; mas, não tendo a outra sido proscrita inteiramente da pratica dos mestres, razão é que prevaleça, desde que de sua parte está o significado das palavras e a sua etimologia.
Convém aliás notar que, entre os antigos, o próprio verbo pedir se conjugava por vezes regularmente: pido, pidais, pida.
"Que não sei se remédio ou morte pida" (Camões)
"Não me pidais interesse" (Id.)
"Amor, amor, mas te pido" (Id.)
- Ex. com expedir:
"Não me fico, e no imo peito espido brado louvor" (Camilo)
- Ex. com impedir:
“Não me impidas o gosto da tomada" (Camões)
“Que nos turbe a paz, e impida a liberdade” (Bernardes)
- Ex. com despedir:
"Com esta ultima advertência vos despido ou me despido de vós, meus peixes" (Vieira)
[M. S. Mendes de Morais, "Repertório Réplica de Rui Barbosa", Casa de Rui Barbosa, 1950, p.56]
In-Libris – livros em Julho
A In-Libris (Porto) apresenta novo Catálogo de livros, outras tantas peças bem curiosas e invulgares, algumas peças de colecção. Refira-se a estimada monografia da Serra da Estrela (de Adelino de Abreu), alguns livros de Eugénio de Andrade (entre os quais o raro "Coração do Dia"), curiosas bengalas antigas, obras de Fiama Hasse Pais Brandão, o raro Diccionario Portuguez das Plantas e Arbustos do sec. XIX (por José Monteiro de Carvalho), um livro já esgotado de Dórdio Guimarães (Ubéria), ainda a peça de colecção de Júlio & Régio "Musica" (edição da Presença), a Poesia completa de Luis Miguel Nava, um conjunto apreciável de obras de António Correia de Oliveira raras com bonitas encadernações e exemplares com dedicatória do autor (ex: a Henrique Trindade Coelho), os Discursos de Oliveira Salazar (VI vols encadernados) assinados pelo próprio, obras estimadas de António Osório, a muito rara obra (1ª do poeta) José Carlos Ary dos Santos "A Liturgia do Sangue", a cobiçada e invulgar colecção "Os Modernistas Portugueses" de Pedro Veiga (muito esquecido hoje e que proximamente daremos pequena nota biográfica no Almanaque Republicano), alguns livros de Couto Viana.
A consultar on line.
segunda-feira, 21 de julho de 2008
Tabuada: "Avir-se"
"Avir-se: Lá se avenham entre si os dois apologistas do projecto. § 202
- Obs. I. Evidentemente por equivoco escreveu Castilho [no Fausto]:
‘E como se havém na emprêsa o desenhador?’
Neste caso é manifestamente o verbo avir-se, correspondente ao adjectivo avindos, que empregou na página anterior; e êsse carece de h.
Salvo êsse caso, de evidente descuido, não se poderá dizer que os mestres da língua confundissem, como alguns têm dito, com o verbo avir-se o verbo haver-se. De um e outro neles se encontram exemplos distintos.
Camões, verbi gratia, poetou:
- ‘Com o meu gado me avenho, e estou contente’
- ‘O rico com seu ouro lá se avenha’
- ‘Houve-se amor comigo
Tão brando ou pouco irado
Quanto agora em meus males se conhece’
- ‘Hajamo-nos, pois, com a nossa língua, como os romanos se houveram com a sua’ (ANT.PER. DE FIGUEIREDO).
- ‘O senso das turbas mal sabia como se houvesse com as trevas e monstros’ (CASTILHO). § 281
Obs. II. Avir na significação transitiva quer dizer ajustar, compor, conciliar, congraçar, concordar:
‘E se alguns Concelhos hão demandas ou contendas entre si, deve trabalhar quanto puder de os concertar e avir’ (Ord. I.39) § 490”
[M. S. Mendes de Morais, "Repertório Réplica de Rui Barbosa", Casa de Rui Barbosa, 1950, p.27]
Livros Livros Livros
No Ipanema, claro! Livraria Livros, Livros e Livros. Na Rua Visconde de Pirajá e ... como ele, estamos convenientemente loucos.
Saúde e fraternidade
Pois sim! Vamos andar ... por aí
"Ah, cidade maliciosa
de olhos de ressaca
que das Índias guardou a vontade de andar nua
e que, apesar do Toque do Aragão,
do Recolhimento do Parto
e do Prefeito Amaro Cavalcanti
- impondo em 1917 a moralidade rigorosa
nos banhos do mar –
despe-se novamente hoje nas areias de Ipanema"
[Ferreira Gullar]
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