segunda-feira, 3 de maio de 2004
"Faxina" da Primavera
Empanturrada de originalidade lusitana, a classe política anda perturbada por tresmalhadas intenções malévolas. Os ditos perfumados que berram os jornais - a lista de mazelas é um choradinho de vendas nos jornais e televisões – sobre as mais variadas formas de corruptelas, são um murmúrio entre os incautos indígenas, ao mesmo tempo que exigem uma faina comovente, uma vidinha de trabalho para a classe política, jornalistas e analistas.
Os artistas da coisa pública declaram a sua estranheza pelo singular fenómeno que atingiu Portugal. Os presidentes de câmara manifestam apreciações poéticas sobre empreiteiros e professam inocência em glória do desporto e dos clubes. Recebem, com uma espiritualidade romântica, em roupão sem monograma. O público, malicioso, fica verde de inveja e aplaude. O emproado Santana dá cambalhotas em cima dos acólitos laranjas. Marques Mendes põe-se em bicos de pés. O talento insólito de Alberto João defuma o continente. Marcelo, em improviso deslumbrante, pontifica a absolvição. Os socialistas sorriem. E Sampaio sai da preguiça para fazer rascunho presidencial.
Enquanto isso, a malta da província e do futebol, alucinada, faz cimeiras à porta dos tribunais. Depois de Felgueiras, sem outro arranjo cénico, eis Gondomar. A mesma casta, o mesmo poder, a mesma cegueira. Na poltrona da governação, Barroso, desnorteado e cansado, faz de arreliado. Pires de Lima, confessa que ainda não se esfarelou contra uma TV, por caridade cristã, evidentemente. Marcelo, muito embuchado, debita Códigos e faz reprimendas. Vasco Pulido Valente lê histórias aos quadradinhos. O País ressurgiu. A "faxina" doméstica está aí. As trapalhadas, também.