quarta-feira, 7 de janeiro de 2004

O PAINEL D'O PÚBLICO E A ELITE À LA ROSADO DE CARVALHO



O jornal O Público brinda-nos, cada segunda-feira, com um suplemento absolutamente extraordinário sobre economia. Esta semana, sob direcção desse inefável Rosado de Carvalho, estabeleceu um ranking das luminárias da governação com base num espantoso painel de inquiridos, aliás bem costumeiro.

Tais exegetas da coisa económica classificaram, com a proverbial certeza que guia sempre os que frequentam a quintarola do poder, positivamente (sem necessidade de ida à oral, é bom de ver) Ferreira Leite, Sevinate Pinto, Luís Filipe Pereira, Carmona Rodrigues e Bagão Félix, reprovando Celeste Cardona e Carlos Tavares. Registe-se que um inquirido do painel, em comovido esforço de amestração, atribuiu a nota máxima à senhora Ministra do défice, um brilhante 20 valores.

Outro, com menos segurança, pouco social, mas decerto com mais trabalho intelectual, classificou Bagão Félix com 19 valores. E até o desaparecido Carlos Tavares, obteve de um intelectual do painel um luminoso 17. Encantador. Curiosamente, só depois de percorrermos a listagem dos examinadores do douto painel, entendemos bem a sua capacidade avaliativa. Enfim, como diria o saudoso brasileiro Joãozinho 30, aqui se testemunha que "pobre gosta de luxo, quem gosta de miséria é intelectual".

INÊS DE CASTRO






















Morre em Coimbra, a 7 de Janeiro de 1355

"Estavas, linda Inês, posta em sossego,
De teus anos colhendo o doce fruto,
Naquele engano da alma, ledo e cego,
Que a Fortuna não deixa durar muito;
Nos saudosos campos do Mondego,
De teus fermosos olhos nunca enxuto,
Aos montes ensinando e às ervinhas
O nome que no peito escrito tinhas.
..........
As filhas do Mondego a morte escura
Longo tempo chorando memoraram,
E, por memória eterna, em fonte pura
As lágrimas choradas transformaram;
O nome lhe puseram, que inda dura,
"Dos Amores de Inês", que ali passaram.
Vede que fresca fonte rega as flores,
Que lágrimas são a água , e o nome Amores!"

[Camões, Os Lusíadas]

segunda-feira, 5 de janeiro de 2004

UM ÁRBITRO À ESPERA



"Não compreendo as leis; não tenho sentido moral, sou um bruto ..." [Rimbaud]

Aos 7 minutos de jogo tudo estava decidido no Estádio da Luz.

Pedro Proença, o árbitro dito de sensibilidade encarnada, determinou não atormentar o senhor Dias da Cunha e, num gesto avisado e pouco servil, contrariou as afirmações pífias do jornal Record, ao marcar um penalty inexistente a pedido de várias famílias do Horto de Alvalade. Nem interessa debater as assombrosas peripécias do jogo da Luz, que isso fica para os paroquianos dos jornais, mas tão só registar que o Record, mão dada com esse pródigo Dias da Cunha, venceu copiosamente o sempre glorioso Benfica. Isso é que ficará para a história. Parabéns Record. Avé Proença cheio de graça.

A RODA DOS ECONOMISTAS



"Quando se está metido até à garganta com crocodilos, é difícil reter na memória que o objectivo, no princípio, era secar o pântano" [anónimo]

Numa carta a sua mulher, Lydia Lopokova, Lord Keynes dizia: "o economista não é rei; é verdade. Mas devia de ser! É um governante melhor e mais avisado do que o general ou o diplomata ou o advogado notarial".

Dito deste modo, ficamos até com pena dos economistas de antanho, assim tão susceptíveis à paixão do jogo do poder. O mesmo não ocorre com os extraordinários economistas portugueses, a quem cedemos à força da sua infalível argumentação. Estes saltimbancos da economia politica dão invariavelmente no início de cada ano, fabulosas lições de gramática económica, sempre atestadas de adocicadas estatísticas, sempre deliciosos nas piedosas intenções de explicar os cenários macroeconómicos. A sensibilidade económica dos nossos putativos comentaristas é um padre-nosso que todos os anos se renova. E nem ofende que nunca acertem nas previsões, tão solenemente reveladas. Ou sequer lhes incomoda, que o que possam dizer hoje, poder ser negado amanhã. Afinal a ciência económica é um simples metanarrativa, um sermão gratulatório aos crentes indígenas. E estes bem sabem que "temos de trabalhar, senão por gosto, ao menos por desespero, pois, no fim de contas, trabalhar é ainda menos aborrecido do que divertirmo-nos" [Baudelaire].

Seja como for, o que os dignos eruditos da coisa económica desvelam é uma provinciana maneira de comunicar que a douta classe não tem autonomia científica, politica e ética no seu ofício. Senão que dizer da entrevista dada por Eduardo Catroga ou os artigos de Sérgio Rebelo, Miguel Frasquilho ou do inestimável João César das Neves? Ou será que os economistas são sempre mais belos que os nossos annus horribilis?

ASSOCIAÇÕES DE COIMBRA (XVII)


* Sociedade Secreta S. Miguel da Ala (1851) - O Conimbricense refere que foi Joaquim Martins de Carvalho que "deu notícia desta sociedade, de que era Grão-Mestre El-Rei o Sr. D. Miguel, publicando os Estatutos, muitas noticias e vários documentos, o que na altura causou extraordinária sensação, quer na opinião pública quer no seio dos iniciados no segredo, ao serem assim publicamente denunciados".

A Sociedade S. Miguel da Ala propunha "promover por todos os modos a restauração do governo de El-rei o Senhor D. Miguel I". Rodrigo de Sousa Tudella (G.C. Fagilde), foi o encarregado de organizar os elementos revolucionários nos distritos de Coimbra, Aveiro, Viseu, Guarda e Castelo Branco, e "fazer a divisão territorial, para o Governo oculto da sociedade, composta de Governos Civis, Capítulos, nos quais posteriormente se organizaram Colégios". Do Governo Civil de Coimbra faziam parte os Capítulos 1º (comarcas da Figueira e Cantanhede), Capítulo 2º (comarcas de Soure e Lousã) e Capítulo 3º (comarca de Coimbra). Diga-se que em Coimbra havia dois Colégios sendo um exclusivamente académico. Quando acabavam a sua formatura, os seus elementos passavam para outro colégio que não aceitava estudantes.

Rezava assim os seus estatutos: art 1º - A ordem é essencialmente secreta, militante e politica; art. 2º - Tem por fim defender a religião católica apostólica romana; restaurar a legitimidade portuguesa; manter ilesa a integridade do território da nação; promover a união de todos os portugueses numa só família; ... O Colégio académico citado, era o do Bairro Alto, instalado no dia 22 de Fevereiro de 1851, assistindo à reunião Luís de Vasconcelos Azevedo e Silva Carvajal (Mem Rodrigues), António Tavares da Cunha Soares de Abreu (Afonso de Albuquerque), António Bernardino de Menezes (Massillon), João de Albuquerque Amaral Cardoso (Martim de Freitas), Luís Ribeiro de Souto Maior e Vasconcelos (Egas Moniz), Luiz Cândido de Figueiredo Oudinot e Gouveia (D. Nuno Alvares Pereira), José d'Araújo Cabral Montez de Champalimaud (D. Diniz), entre os mais. Além desse Colégio, existia outro, o Colégio do Bairro Baixo de Coimbra, organizado só em 1852, onde foram iniciados Dr. Francisco Raymundo da Silva Pereira (advogado e Chefe do Colégio, em casa do qual se fazia as reuniões), João Marques Perdigão, Francisco de Sousa Pinto, etc. [in, Conimbricense, 1905]

* Sociedade Philantropica de Coimbra (1851) [ibidem]

* Sociedade Philarmonica de João Alves (1851) [ibidem]

domingo, 4 de janeiro de 2004

MARIA ARCHER [1899-1982]



Nasce a 4 de Janeiro de 1899

Maria Archer, hoje injustamente esquecida, fez crónicas para jornais e revistas (Seara Nova) foi romancista e ensaísta, escreveu contos e peças de teatro, mas foi principalmente uma escritora que desvela a situação da mulher, pela interrogação da condição feminina do seu tempo, quer através da problemática social quer registando a irrupção do desejo sexual feminino. Adolfo Casais Monteiro (1944) diz-nos:«pode afirmar-se que escritora portuguesa alguma conseguiu, como ela, exprimir certas das mais fundas determinantes da psicologia feminina e da relação homem-mulher». Maria Archer teve, por isso, problemas vários com a censura e com a sociedade de antanho, sendo conhecido o episódio em torno do seu livro "Ida e Volta Duma Caixa de Cigarros" (Editorial Século, 1938) que foi retirado da circulação por ser considerado amoral e, mesmo, "pornográfico", o que era evidentemente falso. Saiu em sua defesa Mário Dionísio, n'O Diabo. Maria Archer viveu parte da sua vida em Africa, tendo escrito contos e ensaios de características antropológicas, e participou nos populares Cadernos Coloniais, de forte conteúdo documental e etnográfico.

"Duas novelas deste livro foram escritas sob deliberado propósito de contribuir para a revelação da mulher.
- Vão-te acusar de autobiografia, disse-me quem as leu no original.
- Que bom! Pensei eu, lembrando-me da razão porque Arnold Bennet fora acusado de fazer autobiografia quando descreveu a execução duma pena de morte (…)
A todos aqueles que, ao lerem as minhas novelas, se sentirem pris aux entrailles e me acusarem de ter feito autobiografia, eu confesso o meu lisongeado reconhecimento"

[Maria Archer, Introdução à "Ida e Volta duma Caixa de Cigarros", 1938]

Algumas Obras: Africa Selvagem / Sertanejos (Cadernos Coloniais) / Singularidades de um País Distante (idem) / Ninho de Bárbaros (idem) / Angola Filme (idem) / Colónias Piscatórias em Angola (idem) / Caleidoscópio Africano, 1938 / Três Mulheres (novelas) / Ida e Volta duma Caixa de Cigarros (idem) / Há Dois Ladrões sem Cadastro (idem) / Fauno Sovina (idem) / Ela é Apenas Uma Mulher (romance) / Aristocratas (idem) / Casa Sem Pão (idem) / Viagem à Roda de Africa (lit. infantil) / Roteiro do Mundo Português, 1940 / Memórias da Linha de Cascais (col. De Branca Colaço), 1943 / Filosofia duma Mulher Moderna (1939) / Eu e Elas (1945) / Herança Lusíada / Brasil, Fronteira de África (1963)

ASSOCIAÇÕES DE COIMBRA (XVI)


* Sociedade do Teatro da Graça (1849) [in, Conimbricense, 1905]

* Sociedade Agrícola (1849) [ibidem]

* Companhia Agrícola e Comercial (1849) [ibidem]

* Sociedade de Beneficência da Typographia da Universidade (1849) - O Conimbricense refere que "só podiam fazer parte os operários e empregados da Imprensa da Universidade, sendo o iniciador o sr. José Pereira Júnior, antigo typographo" [ibidem]

* Sociedade Consoladora dos Aflitos (1849) [ibidem]

* Sociedade Philantropica Académica (1850) [ibidem]

* Monte-Pio Conimbricense (1851) - A 1 de Janeiro de 1851, por diligência de Joaquim Martins de Carvalho [ibidem]

sábado, 3 de janeiro de 2004

IN MEMORIAM EDUARDO GUERRA CARNEIRO [1942-2003]




[Via Aviz] "ADEUS. Morreu Eduardo Guerra Carneiro. Era um bom poeta, esquecido por todos nós, e um jornalista esquecido pelos jornais. Morava no mesmo prédio onde viveu Agostinho da Silva, ao Bairro Alto. Escrevia em caderninhos lisos e tinha canetas de tinta permanente. Gostou muito. Foi muito amado. Tinha um brilho nos olhos que se foi perdendo à medida que ia envelhecendo, mas nunca foi um ressentido. Bebeu muito. Leu bastante. Escreveu o suficiente. Alguns livros: Isto Anda Tudo Ligado, Como Quem Não Quer a Coisa, É Assim que se Faz a História, Contra a Corrente, Lixo ou Dama de Copas. Era boémio, mas não era da boémia. Sentava-se ao fundo dos bares caboverdianos. Gostava de mornas, da sua terra do Norte (Chaves), dos salgueiros ao longo da estrada nacional n.º 2, dos choupos do Douro e de poetas que sabiam calar-se. Uma pessoa escreve «era um bom poeta» e sente que alguém desconfia, como se fossem bons todos os poetas que desaparecem. Não. Ele era um bom poeta que raramente ficava contente com os seus livros. Não se dava muita importância. Brigou muito. Tinha bom feitio. Tinha mau feitio. Tennyson repetiria: «O selfless man and stainless gentleman.» Bebia cerveja. Acho que bebia tudo. Tinha uma bela voz. Eduardo." [Francisco José Viegas, in Aviz]

"O Eduardo nasceu em Chaves, em 42. Depois foi à vida: perdeu-se um vossa excelência (4º ano incompletíssimo de história), ganhou-se um poeta (...) Livros, amores, deambulações, vagabundagens, cervejolas, empregos vários, carolices (o & etc agradece, no que lhe toca): uma generosidade (arrebatada, lírica, desmedida) que lhe alimenta a poesia (dor mais funda, alegria em sol maior) e lhe dá cabo da gravata. Assim o Eduardo é um poeta visceral. Talvez que já não saiba (nem possa) ser outra coisa) ..." [in & etc, nº 9, 15/05/1973]

"O desafio, afinal tão simples!, de prosseguir um texto, vendo bem perseguir, conseguir mesmo despir-me das pequenas e grandes vaidades, como já foi dito. Dizias: o texto. Eu pensava na intriga a construir, nos antigos manuscritos onde se falava de música, sinfonia, órgão, retábulos de igreja, o que se liga à então recente leitura de qualquer clássico. Órgãos do prazer: funções vitais em totalidade. Procuro a linha enredada na complicada teia de aranha que em volta de mim próprio enlacei: aqui está a razão do desafio; os nós a desfazer; a pontuação a assinalar um modo de avançar «todo» sem receio mais que o discurso baço, vago, maricas afinal (...)

Daí, daqui: os textos que perseguem e rasgam o próprio ventre para nascerem pelas suas próprias mãozinhas: impressão digital marcada a sangue. Direi. Um corpo em movimento; a infância da invenção; o salto mortal da literatura; a destruição (corrosão) dos vocábulos ..." [E.G.C., Uma Teoria (da) Prática, in & etc, nº 9, 15/05/1973]

"Algumas palavras são mais que o som.
Soltam-se delas lâmpadas, por vezes gritos.
Palavras que demoram na boca
com o sabor da manhã de Outubro, o claro gosto
da terra húmida, castanha até doer
...
" [E.G.C., Zero, O Perfil da Estatua, 1961]

"Estamos no extremo ocidental de uma Europa gangrenada que teima ainda em conservar limpos os punhos e o colarinho, embora tenha podres nas meias e as cuecas estejam borradas de medo antigo, caca seca, agarrada aos Pirinéus, a montecarlos, montecassinos, urais ou andorras do báltico.
Estamos e continuaremos a estar até que a bomba rebente nos nossos tomates inchados, na goteira do sexo, nas moscas que teimam em disputar-nos a cerveja, nas putas que envolvem em dança os cromados dos bares de hotéis de gare. Poârto ou Parises; Tomar ou Bruxelas; Leiria ou Malmo: a mesma merda.
Estamos quase a rebentar as costuras deste maldito soutien com que nos apertam as mamas da invenção; quase a rebentar as cuecas com que nos espartilham os caralhos da revolta. De pé, ó vítimas da Europa decadente! Nuzinhos até Trancoso! Com pezinhos de lã até Almeida!.
Avançar assim, descobrindo novo discurso, importante porque me importa, também me faz bem, talvez te ajude, vos ajude, ajude afinal a acender o rastilho que vai fazer rebentar a bomba ..." [E.G.C., À Luz de Novembro, in Como Quem Não Quer a Coisa, & etc, 1978]

Algumas Obras: O Perfil da Estátua, Silex, 1961 / Corpo Terra, Ed. Autor, 1965 / Alguma Palavras, Nova Realidade, 1969 / Isto Anda Tudo Ligado, Cadernos Pensinsulares, 1970 / É Assim Que se Faz a História, Assírio & Alvim, 1973 / Como Não Quer a Coisa, & Etc, 1978 / Dama de Copas, & Etc, 1981 / Profissão de Fé, Quetzal, 1990 / Lixo, & Etc, 1993 / O Revólver do Repórter, Teorema, 1994 / Outras Fitas, Teorema, 1999 / A Noiva das Astúrias, & Etc, 2001

quarta-feira, 31 de dezembro de 2003

OES MELHORES BLOGS PORTUGUESES | ESTRANGEIROS DE 2003


"As únicas coisas belas são as que a loucura dita e que a razão escreve" [Gide]

Temos este fado: registar, apreciar, catalogar, ordenar. Aprendemos os (per)cursos das coisas perenes, a doçura desta morada, factos, caminhos e rostos ... que são os da vida. Estamos decididamente prendados. É verdade. O nosso olhar sobre o fenómeno da blogosfera passa, naturalmente, pela sua avaliação. Somos, de facto, prudentes. Nesta apatia cultural que é a vida portuguesa a cair de sono, sabe bem o refúgio em leituras mil, orgulhosamente tempestuosas, delicadamente suaves. A blogosfera permite perseguir a palavra, inscrever a vertigem. Tudo nos encanta neste jardim celestial. A listagem da coluna da esquerda (sempre!) aí está para a douta prova. Aqui chegados, partimos para uma outra ordenação. A nossa proposta tem em conta critérios vários, a saber: o espaço temporal da participação do blog; o conteúdo que nos estimulou a "libido"; o construído estético, enquanto lugar de corporalidade textual; a "moral de prazer" do(s) diferente(s) sujeito(s); a interacção com os leitores e outros "criadores de circunstâncias"; a procura de uma (possível) especialização temática; linkagens e outros interstícios; cumplicidade afectiva e relacional. Não apreciámos, com pesar nosso, os blogs Coluna Infame, A Carta Roubada e a Formiga de Langton, dado terem terminado. De outro modo, ensaiámos agrupar blogs com os critérios considerados, por nós, do mesmo teor performativo. Registe-se na posição décima, um conjunto (pequeno) de blogs de características locais, que antecedem a próxima "explosão" da blogosfera lusitana. Não apresentamos qualquer fundamentação para a ordenação feita. Seria fastidioso tal, sendo conveniente referir, porém, que não seguimos altares iluminados ou iluminantes, mas tão só percorremos os critérios estabelecidos e ponderámos os blogs que conhecíamos. Mesmo sabendo que era muitíssimo pouco.

Eis, pois, os Melhores Blogs Portugueses de 2003 ou de companhia; assim se dizem coisas importantes, apaixonadas umas, ardilosas outras, deslumbrantes todas. De vós este é o fruto. Dos ausentes que a palidez os não atraiçoem. Amem!

1. Abrupto
2. Aviz
3. Janela Indiscreta / A Montanha Mágica / Um Blog Sobre Kleist
4. Blog de Esquerda / Homem a Dias / Dicionário do Diabo / Flor de Obsessão
5. Terras do Nunca / Barnabé / Mar Salgado / Mata Mouros / Grande Loja
6. Ângela Berlinde / There's Only Alice / Absurdo / Silêncio Digital
7. A Natureza do Mal / Klepsydra / A Memória Inventada / Rua da Judiaria
8. Reflexos de Azul Eléctrico / Latinista Ilustre / Miniscente
9. Avatares de um Desejo / Epiderme / Bomba Inteligente / Fumaças
10. Amicus Ficaria / Estarreja Efervescente / Poiares On Line / Estarreja Light

Os Melhores Blogs de Autores Estrangeiros de 2003

1. Letteri Café
2. Kafka em Belo Horizonte / Hotel Céline
3. Alexandre Soares Filho / Andrew Sullivan / The Agonist
4. The Cartoonist / Bibi Fonfon / Desnudas / Grafolalia
5. Prosa Caótica / Sub Rosa / Surrealismo dos Atos/ Mysterium
6. Esporas / Asakhira / DeFocused
7. Vigna-Marú /Giornale Nuovo / Un Que Passava
8. Beat Box/ Iconomy / Simon V / Disquiet
9. Marketing Hacker / Arts & Letters Daily
10. EconoBlog /Eschaton

terça-feira, 30 de dezembro de 2003

10 LIVROS PORTUGUESES DE 2003



1. Caderno de Caligraphia e Outros Poemas a Marga (Vitorino Nemésio, IN)
2. Respiração Assistida (Fernando Assis Pacheco, Assírio & Alvim)
3. A Boca na Cinza (Rui Nunes, Relógio d'Água)
4. Boa Tarde às Coisas Aqui em Baixo (António Lobo Antunes, Dom Quixote)
5. Escritos Autobiográficos, Automáticos e de Reflexão Pessoal (Fernando Pessoa, Assírio & Alvim)
6. Poesia / Dia do Mar / Coral / No Tempo Dividido / Mar Novo / O Cristo Cigano / Livro Sexto (Sophia Mello Breyner Andresen, Editorial Caminho)
7. Obra Completa de José Marmelo e Silva. Não Aceitei a Ortodoxia (Campo de Letras)
8. Conflito e Unidade no Neo-Realismo Português (António Pedro Pita, Campo de Letras)
9. Poesia da Presença (Adolfo Casais Monteiro, Cotovia)
10. Dicionário do Milénio Lusíada, vol. I (Manuel Gandra, Hugin)
  

10 Livros de Autores Estrangeiros de 2003 [colab. Bibliomanias]

1. Odisseia (Homero, trad. Frederico Lourenço, Cotovia)
2. Em Busca do Tempo Perdido (Marcel Proust, Relógio d'Água/ Círculo de Leitores)
3. Diário de Um Fescenino (Ruben Fonseca, Campo de Letras)
4. Pentesileia (Heinrich Von Kleist, Porto Editora)
5. Antologia da Poesia Anglo-Americana - De Chaucer a Dylan Thoma (Campo de Letras)
6. A Rainha do Sul (Arturo Pérez-Reverte, Asa)
7. A Douta Ignorância (Nicolau de Cusa, FCG)
8. Espinosa - Vida e Obra (Steven Nadler, Europa-América)
9. Winston Churchill - Uma Vida (Martin Gilbert, Bertrand)
10. Antologia Poética (Miguel de Unamuno, Assírio & Alvim)

segunda-feira, 29 de dezembro de 2003

10 ÁLBUNS DE 2003

  

1. HoboSapiens - John Cale
2. North - Elvis Costello
3. Silver of Lead - Ursula Rucker
4. Mototronic - Ryuichi Sakamoto
5. Cuckooland - Robert Wyatt
6. Lead Us Not Into Temptation - David Byrne
7. The Mess We Made - Matt Elliott
8. The Raven - Lou Reed
9. Three Street Worlds - Two Banks of Four
10. Miles Davis In Person: Friday Night at the Blackhawk

ALVES REDOL [1911-1969]




Nasce em Vila Franca de Xira, a 29 de Dezembro de 1911

"Os mortos esquecem. Na nossa lembrança o tempo amarelece os seus retratos, também a nossa lembrança morre. São as obras duráveis, ficam como marcos de um caminho percorrido, como sinais que fluem no correr dos dias: podem apagar-se lentamente ou ganhar amplitude, significado e alcance. Homenagear os mortos é ainda uma forma de existirmos, de sermos vivos, de testemunharmos a vida que afirmamos.
O retrato que temos de Alves Redol, tão presente, desenha-se nítido nos anos de um convívio de ideias, na partilha de entusiasmos, de desgostos, de alegrias, de desesperos e, sempre, de certas e comuns esperanças. Podemos ler uma por uma as rugas do seu rosto, seguir as que a amargura vincou e as que nasceram do seu riso aberto, apontar as que forma cavadas pela preocupação e as que marcam uma firme e dura determinação. Somos capazes de ver nos seus olhos a imensa e humana ternura que os enchia e descobrir no fundo deles, como nos olhos de certos retratos de Gorki, o amargo limo das penas dos homens. Somos capazes de imaginar o gesto da mão que segura o cigarro, suspenso e sempre aceso no cliché, a apagá-lo, só fumado a meio, nervosa, no cinzeiro - essa mão de que sabemos o peso exacto quando fraterna se colocava no nosso ombro para ser amparo ou estimulo. A timidez que vemos no sorriso da sua boca ou o rictus que a fecha deixam-nos adivinhar o que ele disse ou, até, o que está pensando: o que talvez não merecesse a pena ficar gravado, coisas pequenas do dia a dia, triviais, e outras, expressão de um juízo meditado longamente, de uma opinião bem fundada, de uma afirmação categórica - como é na vida. Este retrato está nos nossos olhos, só os nossos olhos mortais podem vê-lo.
Um outro vai ser construído pelo tempo, pelos seus leitores futuros, que o encontrarão as paginas dos livros que escreveu, na imaginação física dos seus heróis, no perfil dos personagens que se vão amar e odiar, modelado nas situações vivas dos romances, temperado nas tragedias, nas alegrias, nas lutas, nas grandezas e misérias que descrevem. Essa será a sua verdadeira imagem, o seu retrato futuro.
Aos que hão-de vir deixou dito: «Vão encontrar belas coisas para fazer nessa altura, se o merecer, lembrem-se de mim»
Que o lembre quem mereça.

[Que o Lembre Quem Mereça, in Número Especial da Revista Vértice de Homenagem a Alves Redol, nº 322-23, 1970]

domingo, 28 de dezembro de 2003

OLAVO BILAC [1865-1918]






















Morre na Rio de Janeiro, a 28 de Dezembro de 1918


Locais: Olavo Bilac / Biografia / Olavo Bilac / Olavo Bilac / Poesias / Bilac em Dois Tempos / Antologia Poética / Poemas


"Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura;
Ouro nativo, que, na ganga impura,
A bruta mina entre os cascalhos vela...

Amo-te assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço e o teu aroma
De virgens selvas e de oceanos largos!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

Em que da voz materna ouvi: "meu filho!"
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!"

[Olavo Bilac, Língua Portuguesa]

ASSOCIAÇÕES DE COIMBRA (XV)




* Choça 16 de Maio (1848) - O Conimbricense refere que "para comemorar a vitoria da revolução popular contra o Cabralismo", na cidade de Coimbra, reuniram-se frente ao Colégio Novo, na subida da Couraça dos Apóstolos, a Choça 16 de Maio. Era presidente, António Marciano de Azevedo (B. P. Sidney); 1º assist. Augusto Pinto Tavares, sendo Orad. Joaquim Martins de Carvalho. Uma reunião memorável foi feita ao cimo da Rua do Cego, com frente para a Calçada (hoje, Ferreira Borges), onde se discutiu, dando cumprimento às instruções da Alta Venda, qual a forma de governo que deveria ser adoptada em Portugal. Após debate intenso, ganhou a proposta de um Governo Republicano. No seguimento da perseguição ao local de reunião, a Polícia assaltou a casa, tendo a Choça se reorganizado sobre o título de Segredo, sendo seu presidente Joaquim Martins de Carvalho. [in, Conimbricense, 1905]

* Choça Fraternidade (1848) - Era seu Pres. Joaquim António de Freitas. As reuniões eram feitas nas casas do Correio Velho, Rua das Fangas (hoje, Fernandes Thomaz). De referir, que se transportou para o local um bilhar para encobrir as entradas dos seus membros. [ibidem]

* Choça Liberdade (1848) - O Pres. era José António dos Santos Neves Dória. Reuniam-se, alternadamente, com a Choça Fraternidade. [ibidem]

* Choça Segredo (1848) - Como se referiu, após a descoberta da Choça 16 de Maio, houve a reorganização da Choça para Segredo, sendo feitas as reuniões no edifício do antigo Convento de Santo Amaro dos Olivais, aproveitando as tardes de Domingo, a pretexto de passeio. Uma vez, reuniram-se no coro da Igreja de Santo António dos Olivais, dado ter a chave o dr. António José Rodrigues Vidal, e quase eram surpreendidos em plena reunião por José Joaquim da Rocha, que ia levar alguns homens a visitar a Igreja. [ibidem]

sábado, 27 de dezembro de 2003

ALFONSO REYES [1889-1959]




Morre na Cidade do México, a 27 de Dezembro de 1959

Alfonso Reyes nasceu em Monterrey (México), formado em Direito, foi ensaísta, tradutor, escritor e poeta, membro da Academia Mexicana, diplomata em França (interessa-se por Proust, Mallarmé, Montaigne), Espanha, Argentina (onde conhece Borges), Brasil (1930 a 1937), colabora no El Imperial e El Sol (Espanha), dirige a sessão de Bibliografia da Revista de Filologia Espanhola, é director do Colégio de México (instituição de apoio aos exilados da Republica espanhola) , obtém o Premio Nacional das Letras.


"—Soy la Muerte— me dijo. No sabía
que tan estrechamente me cercara,
al punto de volcarme por la cara
su turbadora vaharada fría.
Ya no intento eludir su compañía:
mis pasos sigue, transparente y clara,
y desde entonces no me desampara
ni me deja de noche ni de día.
—¡Y pensar —confesé— que de mil modos
quise disimularte con apodos,
entre miedos y errores confundida!
«Más tienes de caricia que de pena.»
Eras alivio y te llamé cadena.
Eras la muerte y te llamé la vida.

[Visitación, in Obra Poética, 1952]

Locais: Alfonso Reyes / Alfonso Reyes / La Cena / Alfonso Reyes - Semblanza y Obra / Alfonso Reyes, anecdótico / Ifigenia cruel (fragmento) / Poemas / Conferencia Inaugural del Ateneo

ASSOCIAÇÕES DE COIMBRA (XIV)


* Alta Venda (1848) - O Conimbricense (18 de Julho de 1905) refere que "o General Joaquim Pereira Marinho, tendo recebido do estrangeiro autorização para poder estabelecer a Carbonária em Portugal, delegou poderes, em relação a Coimbra, no sr. Padre António de Jesus Maria da Costa (B. P. Ganganelli), para poder levantar choças em toda a parte onde julgasse conveniente regularizá-las, dirigi-las, uniformizá-las e relacioná-las entre si". Segundo os Estatutos da Carbonária Lusitana, existia três Câmaras: Alta Venda (Vendicta Coinimbricense), Barracas e Choças. O artgº 1º dos Estatutos rezava assim: «A Sociedade Carbonária é uma Ordem philantrophica, que tem por fim manter a verdadeira liberdade do paiz e o socorro mutuo dos seus consócios».

Em Coimbra, a 29 de Maio de 1848, deu-se inicio à Carbonária Lusitana, sendo eleito Sup. Cons. da Alta Venda, o referido Padre António Maria da Costa. A sua primeira reunião foi na Rua da Ilha. Além da Alta Venda, instalaram-se as Barracas: Egualdade e União; e as Choças, 16 de Maio (depois Segredo) e Fraternidade e Liberdade. Alguns dos carbonários iniciados foram, entre muitos: Abílio de Sá Roque (Robespierre), Adelino António das Neves e Mello (Napoleão), dr. António José Rodrigues Vidal (Odorico), dr. António Luiz de Sousa H. Secco (Cicoso), António Marciano de Azevedo (Sidney), Cassiano Tavares Cabral (Nuno Alvares Pereira), dr. Francisco Fernandes da Costa (Timon 2), João Gaspar Coelho (Archimedes), dr. João Lopes de Moraes (Dupont), José António dos Santos Neves Dória (Huffland), José de Gouveia Lucena Almeida Beltrão (Lamartine), dr. Raymundo Venâncio Rodrigues (Washington), etc. Aconteceu que em Outubro de 1848, reuniu-se a Alta Venda, na Quinta de Coselhas do Padre Maria da Costa, para eleições, tendo sido eleito Sup. Cons. o dr. Francisco Fernandes da Costa. Sucede que ficando "despeitado" o Padre Maria da Costa, entendeu guardar o livro da matricula e todos os documentos relativos à Carbonária, apesar dos esforços feitos para a entrega dos documentos, pelo que foi riscado do quadro da Ordem. Pelo que diz o Conimbricense, chegou a contar a Carbonária à volta de 500 membros, quase todos armados, dado até uma das condições de adesão à Ordem, ser "possuir os carbonários ocultamente uma arma com competente cadastro". [in, Conimbricense, 1905]

* Barraca Egualdade (1848) - Tinha por presidente o dr. António Rodrigues Vidal; secretário Joaquim Martins de Carvalho (B. P. Ledru Rollin) e por tesoureiro, o dr. José Gomes Ribeiro. A legenda desta Barraca era: Eripuit coelo fulmen sceptrumque tyrannus. Reuniam-se em diferentes locais e até uma noite se fez a reunião no Jardim Botânico, na casa da aula de Botânica, pegada à Estufa. [ibidem]

* Barraca União (1848) - Subordinada à Alta Venda, era presidida por Abílio Roque de Sá Barreto. [ibidem]

segunda-feira, 22 de dezembro de 2003

DEO GRACIAS



O Almocreve vai de saída. Após salutar descanso e pequenos trabalhos, espera vir mais prendado para fazer mandas aos profanos. Deo Gratias.

Felicidade e Boas Festas

"TEMOS AGORA UMA OUTRA ETERNIDADE..."



















"Nasce um deus. Outros morrem. A Verdade
Nem veio nem se foi: o erro mudou.
Temos agora uma outra Eternidade,
E era sempre melhor o que passou ..."

[Fernando Pessoa]

domingo, 21 de dezembro de 2003

"DAS PETAS O ALMOCREVE ..."





















"Das Petas o Almocreve é obra tua.
Bem se vê, Daniel, na frase e gosto:
Adiça três de Abril ou seis de Agosto,
É de quem vende rimas pela rua..."

[Bocage, numa "farpa" a José Daniel Rodrigues da Costa, autor do Almocreve das Petas]

BARBOSA DU BOCAGE (MANUEL MARIA) [1765-1805]




Morre a 21 de Dezembro de 1805

"Quando completamos atentamente o retrato de Bocage (...) em que as feições estão vigorosamente acusadas: quando reparamos na testa espaçosa, em que a luz do estro parece circular ainda, e nos olhos azuis e rasgados, que tanto deviam cintilar quando a inspiração baixava, revela-se-nos o carácter do poeta e a índole do seu engenho, pelo exame de reflexão (...) Pela pálida tristeza das faces percebemos que o homem foi pouco ditoso: que o vate estremeceu com as sensações do orgulho e dos triunfos, e que, não se embriagando com as seduções das honras e da opulência, pagou o tributo que em todos os tempos tornou cruel ao génio a sua glória, embora o console depois a crença na justiça da posteridade (...)

Magro e trigueiro, de estatura mediana e curva, o corpo parecia pesado de mais para as extremidades: mas nesta constituição defeituosa havia contudo o que quer que fosse que o não deixava confundir. Os cabelos compridos desalinhados e o movimento maquinal dos dedos, aumentando-lhe a miúdo a desordem, eram outra feição natural dele. O sorriso pouco acudia a animar-lhe as faces macilentas. Melancólico até no meio das cenas de maior alegria, ainda conservava a tristeza no rosto e já o delírio tripudiava em torrentes de versos picantes e maliciosos."

[Luís A. Rebelo da Silva, in Memoria Biográfica e Literária acerca de Manuel Maria Barbosa du Bocage e ...]


"Magro, de olhos azues, carão moreno,
Bem servido de pés, meão na altura,
Triste da facha, o mesmo de figura,
Nariz alto no meio, e não pequeno.

Incapaz de assistir n'um só terreno,
Mais propenso ao furor do que à ternura;
Bebendo em níveas mãos por taça escura,
De zelos infernaes lethal veneno;

Devoto incensador de mil deidades
(Digo, de moças mil) n'um só momento,
E sómente no altar amando os frades,

Eis Bocage, em quem luz algum talento;
Sahiram d'ele mesmo estas verdades
N'um dia em que se achou mais pachorrento.

[Bocage, Retrato Próprio, In Sonetos, 1915]