segunda-feira, 8 de maio de 2006


O Velho de Belém

"O Expresso publicou ontem uma notícia inesperada, inconcebível, quase absurda (...) De que se trata? Segundo o Expresso, o dr. Cavaco, Presidente da República, não só pensa que a situação económica portuguesa está 'condenada' até 2010, mas nem sequer tem a certeza de que ela 'melhore' depois disso. Ou seja, pode mesmo acontecer que não 'melhore' nunca (...)

Convém não esquecer que o dr. Cavaco se candidatou a Belém declarando que não se 'resignava' à decadência económica do país, que pretendia restaurar a 'confiança' na sua força e no seu futuro e que a eleição dele era a 'última oportunidade' de parar e de inverter o declínio de uma década e o crescente afastamento da 'Europa'. Quem acreditou nisto, dito e redito com emoção e ênfase, votou nele. Se o dr. Cavaco acha agora que a queda vai continuar e que ele vai assistir de Belém, inerme e calado, a um desastre inevitável, perdeu qualquer legitimidade politica. Se alegar, como de costume, que não conhecia a situação, arruína para sempre a sua velha imagem de seriedade e competência. E se atribuir à sorte e ao mundo as desgraças de Portugal, a desculpa habitual do desespero, não convence ninguém.

Por outras palavras, no fundo, o problema é este: sabia ou não sabia o dr. Cavaco o que esperava e o que esperava o país? Se não sabia, nada o desculpa. Mas se, de facto, sabia, o objectivo da campanha presidencial foi, desde o princípio, o de premeditadamente iludir os portugueses. Nos dois casos, não há explicação que o salve (...)

[Vasco Pulido Valente, in O Velho de Belém, jornal Público, 7/05/2006]