sexta-feira, 21 de janeiro de 2005


Flash eleitoral

"O segredo do demagogo é fingir ser tão estúpido quanto a sua plateia, para que ela pense ser tão inteligente quanto ela" [?]

A seriedade desta campanha eleitoral assegura-nos o mesmo de sempre: desânimo. Os pantomineiros do costume, na falta de informação, ideias e trabalho de casa, animam estes dias de sol imprudentemente suaves no tempo e na fortuna. A nova lida eleitoral é um ambicioso trabalho de separação entre o ético e o político, uma manifesta falta de qualquer código moral e uma paixão declarada de manipular o gado eleitoral. O que profundamente está em causa, não é a apresentação de linhas orientadoras governativas e propostas programáticas político-partidárias, mas um matraquear constante de fait-divers, uma retórica em torno de milagres para conversão da plebe, tudo isso envolto num entusiasmo infantil de luta pessoal, contra inimigos internos e externos.

Os motivos estão à vista. As prodigiosas facadas que todos os dias, sem misericórdia, os impetuosos compagnon-de-route Santanistas se aprestam a dar à criatura em chefe, são de uma ambição desmedida. Absorvidos no enlevo de se verem livres do homem, para poder mudar de amo e de negociatas, não se dão conta que foram eles que o levaram aos ombros para o trono e para nossa desdita. Ontem Morais Sarmento, hoje Aguiar Branco. É que todos estiveram no mesmo barco: o da incompetência. Ainda temos memória.

Da parte de Sócrates, a regra é ser palrador-mor. Sem que se saiba o que pretende para o país e para o mundo - e tantos dias foram já passados -, o seu único cântico é tentar contrariar as sondagens e obter a maioria absoluta, no meio de um discurso errático e vulgar. Como clonado de Santana, não possui a virtude de ser líder forte de modo a conter a tralha do seu partido e as diatribes dos seus correligionários. O episódio das miseráveis declarações de Nuno Cardoso aí está para o comprovar. Numa única semana, desbaratou capital eleitoral que dificilmente regressará. O que falta ainda percorrer revelará a dimensão da tragédia.

Olhando para o PP e para os gemidos animados do seu putativo governo, a lição é que a desgraça nunca vem só. Debatendo-se entre a urgência de dar um ar respeitável e civilizado e a tortura de não poder espinotear por aí, mais a garotada que o venera, Paulo Portas pouco tem a dizer. O vazio de ideias que manifesta é total. Encharcado de angustias quando lhe falam no seu parceiro da coligação, debatendo-se na cadeira quando ouve falar dos seus inefáveis ministros, crispado por saber que nada sabe, Paulo Portas tem a tragédia de poder falar no trabalho do seu ministério. O resto do país passa-lhe ao lado, como foi bem visível no debate com Francisco Louçã. E este, inteligente e estudioso, vai capitalizando ideias e votos, numa argumentação irrepreensível. Compreende-se que os novos liberais, mesmo os que habitam a blogosfera, se sintam desconfortáveis. Esquecem que o mundo mudou. Estão velhos, sem ideias e sem bandeiras. O que não deixa de ser um paradoxo.