terça-feira, 17 de junho de 2003

BLOGS, "CLOSER" E MEC


«Se eu vos disser que não me lembro de andar tão excitado desde o meu contrabando da matriz do "Closer" dos Joy Division, escondido numa fita que dizia "Grupo Folclórico de Monção" na caixa, talvez fiquem com uma ideia de como ando entusiasmado com os blogues portugueses».

Começa, assim, o texto de Miguel Esteves Cardoso no DNA último e que está disponível no Pastilhas. Lembrei-me logo do Padre António Vieira, quando dizia que «a maior saudade é a da vida». Tinha razão. E estou a ver o Miguel com «as fitas matrizes de ‘Closer’ num saco de plástico da Sapataria Lisbonense» (Escrítica Pop, Miguel Esteves Cardoso, Querco, 1982), para imaginar o gozo que sentiu. Com um sorriso, cúmplice, de Vieira. E nosso, já agora!

«’Closer’ é limpidamente belo – tem a transparência silenciosa da solidão, sem nunca se transformar em auto-compaixão ou sentimentalismo. É o momento em que nos damos fé duma tristeza insolúvel, e da futilidade de a conhecer. Não há revolta – apenas um lento despertar, corajosamente assumido e aceitado. O encanto principal dos Joy Division não é o virtuosismo, ou sequer a criatividade da música – é, sobretudo, uma inesquecível sinceridade (…)» (op.cit.)

Não há qualquer «messianismo» ou nostalgia, olhando para trás. Apenas o gozo que a libido ainda nos permite. E o blogar não é mais que isso mesmo. O prazer de encantamentos mil, livre e liberto. Ou modo de estarmos vivos. Ainda.
Mas, se nenhuma leitura é inocente, e algumas são mesmo perversas, a decifração ou desconstrução das linguagens e discursos presentes no «território» da blogosfera, exije meios de inscrição conceptuais, que permita aceder à «provocação» que o movimento da blogosfera faz aos velhos medias e a todos nós, intervenientes e leitores. Porém não é, ainda, o tempo de os blogs serem «objecto cientificamente analisável», embora se comece já a notar algumas fissuras na rede de interdependências que o discurso deste novo medium configura e que aos media institucionais (des)legitima. Alguns blogs deixaram argumentação - Abrupto, Pastilhas, Mar Salgado, Blog de Esquerda, Montanha Mágica, Gato Fedorento - sobre a matéria. Temos alguma dúvidas, mas o que nos interessa salientar são os seguintes pontos nodais, a saber:

- as novas tecnologias de informação contaminam toda a cultura, nivelam o imaginário de todos e conduzem a novas formas de sociabilidade, no sentido das «tribos» em Maffesoli. As redes de «unidades sociais afectivas» contra a desconstruções dos afectos, só podem decorrer a partir das condições materiais de existência (Marx ou Bourdieu).

- o dizer de Maffesoli, quando refere «uma cultura de sentimento» num «presente vivido colectivamente» e que a Internet transporta, muito bem, dado que o simulacro se cola ao real, habita essa «comunidade emocional». E, aí está a União dos Blogs Livres, ou a listagem classificada nalguns blogs, todos diferentes, porém todos iguais.

- poderá esta «socialidade» moderna ('presenteísta, tribal e estética') provocar uma guerrilha com os media? Que reencantamento encontrar num veículo comunicacional que destabilizaria (como alguns assumem) a organização e os conteúdos jornalísticos?

- a «estetização da vida quotidiana» (Featherstone) invade todos os saberes, tornando-os tecnicamente utilizáveis (circulação de imagens, textos, signos, …). Este jogo tecnológico – de sedução plena – presente nos intervenientes da blogosfera conduzirá a um novo mercado de «signos-mercadoria», a outro negócio? E se sim, então o saber cairia (sempre assim foi ou será?) ou existiria, apenas, como valor de troca, ou mercantilização do saber através das competências ou performances operacionais.

- o jogo comunicacional (destinatário/ destinador) é uma relação desigual, dado que na falta de regras não haverá «jogo». Outros jogam pelo prémio do «jogo» e não mais pelos simples «jogo», gozo ou fruição. A chegada à blogosfera de militantes partidários, é disso prova.

- um controlo disciplinar exercido por alguns (simbolicamente, sò que o seja) permite estratégias de sobrevivência, numa lógica de cuidado curiosa nalgum discurso bloguista. Afinal o putativo «umbiguismo» e a lucidez dessa praxis discursiva, é isso mesmo. Ritos de passagem? Rituais perdidos?

Enquanto a problemática ganha o fedback necessário para uma «gramática» blogosferiana, fiquemos recostados nos maples,em auto-serviço, fazendo espaço conversável. Se nos permitirem