quinta-feira, 1 de novembro de 2007


Temos andado ... assim!

... a cavalgar o mundo, perdidos nas distâncias e nas almas. Parecemos lobos em deserto puro. Mas não muito! Fugimos à nova noite negra política que se instalou definitivamente entre nós. Não temos nada a dizer, não temos nada a contar. Não adormecemos ainda mas também não vemos o sol. Estamos cansados de estar cansados. De nós, todo "o destino é insuportável". A canalha já pouco nos importa e as manobras de todos vós não deixam de ser um raminho de dia de defuntos. Podem ser assunto civilizador mas o relógio da vida está parado. Sempre, e continuadamente, parado. Quisemos descansar de tanto palavreado inútil, de tanta propaganda pífia, de tanta soberba. Por isso só nos ocorre esse lugar-comum quanto exacto: temos a vida e os governantes que merecemos.

Mas estamos de volta. Para o que der e vier.

Bom dia!

sexta-feira, 19 de outubro de 2007


João Camossa [1926-2007]

"João Carlos Camossa de Saldanha era advogado e uma figura pública de grande encantamento. De raiz "anarco-comunalista" porque gostava de ser "senhor de si mesmo", professava a dissidência espiritual ou não fosse possuído de vasta e copiosa memória cultural. Era monárquico mas dos que prezam a liberdade e a vida. Repudiou sempre aqueles que, comprometidos com o salazarismo e o fascismo, eram (são) situacionistas. E, por isso, ficou cada dia mais só, esquecido, incompreendido, maltratado ..."

[ler mais no Almanaque Republicano]

domingo, 14 de outubro de 2007


Fausto Correia

O saudoso café Trianon, sitiado à esquina da Nicolau Chanterenne na bela Coimbra, lugar consumido pelas insónias por tantos de nós, onde as impressões, as (in)confidências, os arrufos políticos ou literários, o gozo daqueles olhares que tudo prometiam antes da partida para as festividades noctívagas, a noite de Coimbra que tremula no tempo mas que teima em resistir na nossa memória, perdeu um dos seus (dos nossos) melhores amigos: Fausto Correia. Quem por lá passou nesses tempos de oiro, jamais esquecerá a figura serena, tolerante, de rara generosidade e desmedida bondade, como sempre será lembrado Fausto Correia.

O tributo e o preito de homenagem que a sua cidade, ontem, lhe prestou, dizem isso mesmo. Porque esta Coimbra estima sempre quem lhe quer bem. E o Fausto é exemplo iluminado dos melhores que a exaltaram.

Até sempre, Fausto!

sexta-feira, 5 de outubro de 2007


5 de Outubro de 1910 – uma evocação

"A Pátria é um princípio de solidariedade colectiva. A Pátria é uma religião" [Sampaio Bruno]

Sob o tempo dos 97 anos passados, o dia 5 de Outubro, como outros tantos que testemunham a nossa história, converteu-se em mera jornada de lazer e esquecimento, da qual muitos, ironicamente, desconhecem a causa próxima ou o seu fausto. Percorridos os anos à "sombra das almas", de melancolia em melancolia, e consumidos os dias sem qualquer devir nacional (material, cultural ou espiritual), o dia em que os "arautos da nova ideia" saíram à rua repousa silenciosamente em antigos, quanto iluminados, estandartes que a Saudade consagrou. Um mundo, assim, não findou, mesmo que se aceite, com F. Pessoa, que "portugueses, deixaram de haver". Um mundo, assim, é intemporal. A Demanda, sabe-se, é por vezes "sombra e nevoeiro".

O Almanaque Republicano, como é mister, associa-se a esse retorno à alta glória, de sonho tão puro, onde a nossa gente levantou "o esplendor de Portugal". E muitos foram.

Nos próximos dias daremos aqui, e como temos vindo a fazer, fé disso mesmo. A narrativa republicana, paixão antiga e sacra, será sempre entre nós uma "cantiga de amigo". Que não acaba nem começa. Vive, apenas!

[via Almanaque Republicano]

terça-feira, 2 de outubro de 2007


Biblioteca do Dr. Alfredo Ribeiro dos Santos

Conforme, aqui e aqui, dissemos a preciosa Biblioteca do Dr. Alfredo Ribeiro dos Santos, organizada com o cuidado extremo de Manuel Ferreira, vai a leilão na Junta de Freguesia do Bonfim (Campo 24 de Agosto, Porto) amanhã (dia 3) e segue até ao dia 11, do corrente mês, sempre pelas 21 horas.

Alguns periódicos e outros órgãos de informação deram a devida atenção à riqueza bibliográfica da biblioteca do Dr. Alfredo Ribeiro dos Santos. E, ao que nos sugerem, mais que um mero produto de luxo era, de facto, uma fonte e ferramenta de trabalho para o seu possuidor e outros estudiosos. O que marca, também, uma evidente diferença entre alguns dos nossos mais conhecidos bibliófilos.

Algumas referências na imprensa: Livros, jornais e revistas raríssimas de Alfredo Ribeiro dos Santos em leilão no Porto [RTP] / Louco por revistas [Luís Miguel Queirós, Público, P2, dia 2/10/2007] / Memórias inéditas. Leonardo Coimbra, um caso de arrebatamento [Ana Sofia Rosado, O Primeiro de Janeiro - notas de uma entevista ao dr. Alfredo Ribeiro dos Santos / Durante a reviravolta: uma família [continuação]

Foto: retirada do jornal Público, com a devida vénia

[em actualização]

quinta-feira, 27 de setembro de 2007


"A Revista História com fim perto" - Petição on line

"A revista 'História' está a ver o seu fim anunciado. Acaba de editar agora o seu número 100 e corre o risco de não sair mais nenhum. Este encerramento da revista "História" deve-se a um corte orçamental que apesar de mínimo para quem apoiava a revista é extramente importante para assegurar a sua existência. A revista 'História' é já uma revista de referência no panorama cultural e editorial português e um caso único qualitativo. É importante não deixar acabar mais esta revista no nosso país com um já tão pobre mercado editorial de qualidade"

Petição:"A Revista História com fim perto" - aqui on line.

[ler mais no Almanaque Republicano]

Fermosa Estrivaria

"... pelos pinotes, as absurdas e ridículas loucuras em que eles passam o seu tempo" [Cavaleiro de Oliveira, aliás Francisco Xavier de Oliveira]

O inefável editor Ricardo Costa, expert em mixordices políticas, convidou o sr. Santana Lopes ao púlpito da SIC-Notícias, ontem à noite, para falar nas eleições no PSD. Para surpresa dos espectadores, ainda a entrevista de Ana Lourenço nem ia a meio, já o emproado Ricardo Costa interrompia o seu convidado, a pretexto do rebate de José Mourinho no aeroporto de Lisboa. O insulto feito a Santana Lopes pelo editor da SIC, nem perfeito foi. Embora haja gostos para tudo, nada nos autoriza a pensar que olhar o sr. Mourinho entrar num automóvel pela calada da noite seja tão excitante quanto Ricardo Costa presume. Mas a afronta e a canalhice, por uma vez, não ficaram sem resposta. Santana Lopes – sim ele, mesmo – levantou-se e saiu. Que faça escola, é o que se deseja.

Festividades de Fátima

A Irmandade do Centro Desportivo de Fátima teve, ontem em Fátima e para a Taça de Portugal, esse milagre de inteligência de levar a equipa de futebol do sr. Pinto da Costa à marcação de grandes penalidades. E, depois, caridosamente enviou-os para o recesso das Antas, onde faz carreira escolar Jesualdo Ferreira, conhecido por "O Professor".

Ao mesmo tempo, com espírito elevado e civilizador, a Irmandade em Fátima teve ensejo de conceder luz ao sr. Duarte Gomes e fê-lo marcar um penalty (lindo) para o nosso Glorioso, ali para os lados da Reboleira. Não expulsou o prevaricador, para não estragar as festividades.

Infelizmente, não teve a nossa estimada Irmandade lisonja suficiente para fazer sair do meio das sombras o sr. Bruno Paixão, conhecido árbitro formado pelo Papa Pinto da Costa. E tal a cegueira estava possuído Bruno Paixão que o não fez ver um penalty luzente e inequívoco, do guarda-redes dos lagartos contra um jogador do grande Vitória de Guimarães. Não se deu provimento, decerto na penhorada benevolência da Irmandade, à qualidade dos três Fés: Fátima, Futebol e Fado. Mas fica adiado para o próximo sábado. Pois já dizia Horácio: bis repetita placent.

terça-feira, 25 de setembro de 2007


André Gorz: um longo diálogo

André Gorz, tal como foi referido aqui, é principalmente (re)conhecido pela atenção dada às questões relacionadas com "o trabalho", a "produtividade", "relações de trabalho" e "exclusão social", "industrialização" e "acumulação", "capitalismo”" e "novas tecnologias". Retoma, por isso mesmo, o "velho" debate sobre a "produção/reprodução de trabalho", "a teoria do valor trabalho", a questão da sua "apropriação" e a problemática dos "modelos de crescimento económico". A partir daí, é evidente na sua obra a critica à doxa marxista ["O marxismo está em crise porque há uma crise do movimento operário. Rompeu-se, ao longo dos últimos vinte anos, o fio entre desenvolvimento das forças produtivas e desenvolvimento das contradições de classe”, in “Adeus ao Proletariado", Gorz, 1987]. Nesse sentido, polemizou à esquerda, quer por entender que o "trabalho imaterial" era crucial para a análise do capitalismo moderno, quer por pensar que "o proletariado" não era já uma "classe revolucionária", nem tinha o "valor profético", que invariavelmente está presente em toda a literatura marxiana. Tal preceito, então ousado, fez virar contra si os sindicatos e toda a "esquerda clássica".

Alguns conceitos com que trabalhou versando a problemática da "economia do saber" ou "do conhecimento", resultante do mundo tecnológico e das suas "estruturas", têm hoje um lugar central no debate sobre a globalização e a "sociedade do futuro" (pelo menos nos países mais desenvolvidos). O construído das redes de comunicação e os efeitos das novas tecnologias, pelo impacto que têm no sistema económico, na organização do trabalho e no próprio trabalho, convergem necessariamente para a urgência de um outro olhar da/para a ciência económica (que Gorz referia sempre).

A putativa ilusão de perda da "centralidade do trabalho" e o "fetichismo tecnológico" e cultural nas sociedades actuais, aliado à ideia de derrota da "luta" anticapitalista, levaram a que o filósofo convergisse para o campo da ecologia política e conceptualizasse o "socialismo pós-industrial", bem à maneira da utopia marcusiana. O legado de Gorz permanece intacto. Resta esperar pelas suas profecias.

Locais: A Humanidade, a natureza e o trabalho [Carlos Lucena] / André Gorz, le philosophe et sa femme [Le Monde] / Aux noms de l'amour / Entrevista com André Gorz / La disparition d'André Gorz

André Gorz [1923-2007]

"Nous nous sommes dit que si, par impossible, nous avions une seconde vie, nous voudrions la passer ensemble" [André Gorz, in Histoire d’un amour, Setembro 2006]

André Gorz [aliás Gerard Horst] nasceu em Fevereiro de 1923, em Viena. Refugia-se na Suiça, com os pais, na II GM. Forma-se em engenharia química, em Lausanne. Parte (1949) para França onde trabalha [assinando textos no "Paris-Presse" com o pseudónimo de Michel Bosquet e mais tarde como jornalista económico no "L'Express"], estuda economia, sociologia, filosofia.

Radicado em França [naturaliza-se francês em 1954], em 1961 aparece como co-director da revista "Les Temps Moderns", de Sartre & Simone de Beauvoir. Data desse tempo a sua ligação à fenomenologia e ao existencialismo. Sai do "L'Express" em 1964 para fundar [com Jean Daniel e outros mais] a importante revista "Le Nouvel Observateur". Torna-se amigo de Herbert Marcuse [da chamada Escola de Frankfurt, de que fizeram parte Horkheimer, Adorno, Habermas], cujo pensamento (e o da Escola de Frankfurt) o influenciou. O Maio de 68 marca-o decisivamente. Nessa altura aproxima-se das teses sobre educação de Ivan Illich [do qual publica alguns livros]. Dissidências com os seus colaboradores na revista "Les Temps Moderns" [em parte pela "linha maoista" então seguida pela revista e em desacordo com o numero saído sobre o grupo radical italiano "Lotta Continua", que curiosamente teve textos e manifestos publicados em Portugal pós-1974, com algum sucesso] levam à sua demissão da direcção e saída após a morte de Sartre (1980).

Aproxima-se, entretanto, da noviciada corrente da ecologia radical [sai em Portugal, em 1978, pela Editora Vega, o seu livro "Ecologia e Liberdade" (publicado inicialmente em 1975), repositório de textos saídos 25 anos atrás, com o seu pseudónimo Michel Bosquet] e, em 1973, ingressa na revista "Le Sauvage", onde a “problemática ecológica” tem lugar central. Em 1980, após a publicação do seu livro "Adieux au prolétariat" [ver, "Adeus ao Proletariado: para além do socialismo", Rio de Janeiro, 1987], onde a reflexão sobre a perda do "valor profético" do proletariado e a crítica ao marxismo tradicional está presente, a polémica irrompe (de novo) e a CFDT, onde de algum modo estava ligado, repudia-o. Em 1983, sai também do “Le Nouvel Observateur”. E retira-se para a sua casa em Vosnon.

Nesta segunda-feira soube-se que André Gorz e sua mulher Dorine [com quem casou em 1949] se suicidaram, consumando o que Gorz no seu último livro, “Lettre à D., Histoire d´un amour”, deixava escrito:"Nous aimerions chacun ne pas survivre à la mort de l’autre. Nous nous sommes dit que si, par impossible, nous avions une seconde vie, nous voudrions la passer ensemble". O pacto ficou, para todo o sempre, selado.

domingo, 23 de setembro de 2007


Almanaque Republicano – Actualização

"A Direcção Geral de Arquivos colocou on line, via Torre do Tombo, três pastas do processo da PIDE relativo ao escritor e cidadão Aquilino Ribeiro. Curiosamente, ao fim de poucos dias deixou de estar acessível. Como agora, no momento em que se escreve. O "choque tecnológico", delicado e piedoso, afoitamente recolhe-se à noite. Os indígenas – sabe-se – comemoram as letras na virtude e encanto do leito. Aqui e por todo o Mundo. A Torre do Tombo on line, também ela, emudece. O "documento do mês" afinal era de parcos dias. E lá ficou o homenageado Aquilino Ribeiro, fechado outra vez." [ler mais aqui]

O Almanaque Republicano recebe a lux e a claridade do tempo & alma republicana. Continua prendado como na primeira vez. Celebra festas e pregações para fugir à modéstia dos dias. No vale de lágrimas e delírios desta semana, a coberto do mau-senso e mau-gosto de alguns, fervorosamente exibido na homenagem a Aquilino Ribeiro, o Almanaque Republicano, imprudente de vaidade, continua a anunciação e a dedicação ao quadro e pedra republicana. Dado à lux por dois cavalleiros livres e devotos da Saudade & sob protecção do Arcanjo de Portugal, o Almanaque Republicano conversou desde Julho, sobre

a Imprensa Republicana no Distrito de Coimbra, lembrou Bulhão Pato no Largo das Cortes, apresentou as Efemérides Mensais, evocou Miguel Bombarda e Cândido dos Reis, chamou a bio-bibliografia de Norton de Mattos em III notas breves, o mesmo de Trindade Coelho (ainda em III partes), idem para José Carrilho Vieira (jornalista, editor, livreiro e fundador da Internacional Operária), do mesmo modo apresentou notas bio-bibliográficas de Fernão Botto Machado (IV partes), lembrou a Tertúlia da Revista História, fez homenagem a Aquilino Ribeiro apresentando algumas sugestões bibliográficas sobre o cidadão e militante republicano.

A ler e consultar o Almanaque Republicano. Sempre ao V. dispor!

Saúde e fraternidade.

Nota Póstuma [24/09/07]: Hoje, semana de trabalho e, presuntivamente, de leitura e estudo, a Direcção Geral de Arquivos disponibilizou on line, de novo, parte do Arquivo Aquilino Ribeiro. Ninguém deve estranhar tal expediente. A generosidade da Torre do Tombo, como de outras instituições indígenas [a Biblioteca Nacional e a Hemeroteca de Lisboa são casos raros em eficiência tecnológica], não lhes permitem o exercício de actividades ao fim-de-semana, ou, se quisermos, de corrigir o que está (supostamente) a correr mal. Fim-de-semana é para descanso pátrio. E para recolhimento. Temos de ter paciência. E esperar pela longa jornada da semana. Aplausos!

sexta-feira, 21 de setembro de 2007


Biblioteca do Dr. Alfredo Ribeiro dos Santos

"Tenho muito gosto - e honra - em prefaciar o catálogo da importante Biblioteca de Alfredo Ribeiro dos Santos, ilustre médico portuense, cidadão impoluto, lutador anti-fascista, homem de cultura e grande bibliófilo. Por três razões, essencialmente: pela personalidade ímpar de Alfredo Ribeiro dos Santos, que conheço desde os tempos do Movimento de Unidade Democrática (MUD), há mais de sessenta anos e cujo percurso segui, sempre com muito apreço, afecto e admiração; porque conheço a sua valiosíssima Biblioteca, rica em revistas e obras literárias e histórico-políticas; e ainda porque tenho seguido a qualidade do trabalho do antiquário livreiro Manuel Ferreira - e de seus filhos - de quem tenho sido, algumas vezes, mais espaçadamente do que gostaria, cliente e cuja competência profissional posso testemunhar.

Alfredo Ribeiro dos Santos, com uma vida já longa e uma magnífica lucidez, deixou sempre, por onde passou, um rasto de simpatia, de humanidade, de aprumo pessoal e cívico e de respeito, verdadeiramente invulgares.

Vivendo no Porto, onde nasceu, em 1917, tirou o liceu e fez estudos de Medicina, em que se formou, em 1943, sempre conviveu, desde muito novo, com intelectuais e artistas, como Sant'Anna Dionísio, José Marinho, Agostinho da Silva, entre outros, tendo como mestres e referências Leonardo Coimbra, Abel Salazar, Jaime Cortesão e Teixeira de Pascoais, os homens da "Renascença Portuguesa" (e da Revista "A Aguia ") que, muitas décadas depois, haveria de reeditar (numa nova série) com o saudoso José Augusto Seabra.

Frequentador de tertúlias literário-políticas, colega, amigo e camarada, do incansável conspirador anti-fascista do Porto, do Dr. Veiga Pires, com o qual estagiou no Hospital de Santo António, foi ele que também o introduziu no Movimento de Unidade Anti-Fascista (clandestino 1942-49) e no MUD (paralegal), criado no post-segunda guerra mundial. Desde então, encontrei-o em todos os grandes momentos da Oposição Democrática, nas candidaturas dos generais Norton de Matos e Humberto Delgado, nas manifestações de protesto, como no funeral de Abel Salazar, onde foram presos o velho e prestigiado médico Eduardo Santos Silva e Ruy Luís Gomes, em reclamações e abaixo-assinados contra a Ditadura, nas denúncias contra as pseudo eleições, nos períodos chamados de "liberdade suficiente", que se realizaram entre 1945 e o 25 de Abril de 1974. Igual a si próprio, Ribeiro dos Santos continuou, numa linha de coerência cívica exemplar, durante toda esta nossa conturbada II República, que, apesar de tudo,já conta o dobro dos anos da I República (1910-1926), até hoje.

Além de médico de grande proficiência, na sua especialidade, e humanidade, Alfredo Ribeiro dos Santos teve sempre uma actividade de intelectual interveniente na vida da grei - organizador de iniciativas culturais, de exposições e tertúlias, tendo publicado vários livros, de interesse histórico-político inegável, e proferido inúmeras conferências sobre diferentes temáticas. Assinalo, entre muitas outras, as que proferiu sobre Jaime Cortesão, Abel Salazar, Leonardo Coimbra, Teixeira de Pascoais e a tertúlia em que participou do engenheiro José Praça, um ilustre portuense e grande resistente contra a Ditadura, que esteve, no começo dos anos trinta, deportado no forte de Angra do Heroísmo, nos Açores, onde foi companheiro de cárcere do meu Pai.

A biblioteca de Ribeiro dos Santos constitui um verdadeiro retrato de um homem culturalmente orientado, meticuloso e de vasta erudição e cultura. Constitui um raro e precioso acervo de livros, jornais e revistas, altamente representativos do século XX português, obviamente orientado numa perspectiva republicana, socialista e laica.

A leitura do catálogo, organizado pelo antiquário-livreiro Manuel Ferreira, é disso a demonstração. O destino das grandes bibliotecas é dispersarem-se, mais tarde ou mais cedo. Algumas vezes, mesmo, quando se integram em instituições públicas. O catálogo, quando é cientificamente organizado, como é o caso, é um marco que permanece, ajudando a perpetuar a memória do seu amoroso fundador. Por isso, eu, como modesto bibliófilo, há anos que ganhei o hábito de coleccionar também os catálogos dos leilões das grandes bibliotecas. Dizem muito sobre os coleccionadores originários e sobre os alfarrabistas que com tanto profissionalismo organizam os catálogos”

[Mário Soares, Vau, 16 de Agosto de 2007 – pref. Catálogo da Biblioteca do Dr. Alfredo Ribeiro dos Santos. Organizada para Leilão por Manuel Ferreira, vol I, Outubro 2007 - sublinhados nossos]

Leilão - Biblioteca do Dr. Alfredo Ribeiro dos Santos

A importante e valiosa biblioteca, composta por 3561 peças de extraordinário valor, do Dr. Alfredo Ribeiro dos Santos [que referiremos depois], conhecido bibliófilo e "ilustre médico portuense", por seu desejo expresso, vai à praça entre os dias 3 e 11 de Outubro, na Junta de Freguesia do Bonfim (Campo 24 de Agosto, Porto).

A estimada biblioteca do Dr. Alfredo Ribeiro dos Santos apresenta um notável conjunto de obras literárias, uma raríssima e vasta colecção de revistas e jornais do século XX, patenteando um gosto e erudição bibliófila invejável, que fazem desta singular biblioteca uma das mais interessantes e magnificas dos últimos anos.

A descrição bibliográfica desta magnifica biblioteca (que daremos nota depois), elaborada pelo ilustre livreiro Manuel Ferreira, de rara competência profissional, é apresentada em dois volumes magníficos. O catálogo da biblioteca, cujas observações e notas são criteriosas e exigentes, revela o bibliófilo Dr. Alfredo Ribeiro dos Santos e a sua paixão pelos livros mas também, pela sua leitura aprazível, honra o seu catalogador. Apresenta, ainda, um prefácio pelo dr. Mário Soares, na qualidade de amigo do dr. Alfredo Ribeiro dos Santos (que conheceu desde os tempos do MUD) e como se sabe também fervoroso bibliófilo.

[Os pedidos para o leilão podem ser feitos para Manuel Ferreira, Rua Dr. Alves da Veiga, 89, Porto (tel. 225363237)]

terça-feira, 18 de setembro de 2007


Aquilino Ribeiro

"... Olhem sempre em frente, olhem o Sol, não tenham medo de errar, sendo originais, iconoclastas e anti, o mais anti que puderem, e verdadeiros, fugindo aos velhos caminhos trilhados de pé posto e a todas as conjuras dos velhos do Restelo. Cultivem a inquietação como fonte de renovamento"

[Aquilino Ribeiro, palavras que proferiu na homenagem que lhe foi prestada na Sociedade Portuguesa de Escritores – citado por António Valdemar, Expresso-Actual, 15 de Setembro 2007, p. 12 - sublinhados nossos]

segunda-feira, 17 de setembro de 2007


Charivari do bom nativo

Depois de ataviados gorjeios & prosas dos indígenas lusos – esses talentosos “bárbaros”, presentes nas lascivas historietas do dr. Rui Ramos aos genuínos Ingleses –, por ora muito consumidos pelo caso Maddie, mansamente animados pela disputa eleitoral no PSD e exaustos pela divertida propaganda política do governo, eis que lhes cai em cima do ego, para amor e civismo pátrio, o estupendo caso Scolari. Para durar.

De caso em caso, de expedição em expedição, de novidade em novidade, não há pavor algum ou pranto que tire o bom nativo do sério. A vigília do dr. Moita Flores, o génio (very british) de Rui Ramos, o dom educador do sábio Rui Santos, o intelecto de José Miguel Júdice, o cântico redentor do sr. Sócrates ou a aparição da figura indulgente do dr. Cavaco, transforma-os de rudes ignorantes em sábios. De tudo e de nada! Eis uma boa pista a seguir pela dr. Maria Lurdes Rodrigues, agora que está tão volteada para o “choque tecnológico” e o sucesso das criançolas. Colocar aquele raminho de notáveis no aconchego das escolas e universidades, era o sucesso escolar garantido e uma bênção para a União Europeia. Haja inspiração!

Depois, o bom nativo teve ocasião de acompanhar a argumentação lavrada, ad nauseaumcomo é óbvio”, do sr. Luis Amado sobre a visitação do Dalai Lama a Portugal. A ousadia e o disparate dessa formidável figura deleitou tanto os spin doctors que até o dr. João Paulo Gorjão (nos braços da SIC) teve ensejo de registar, ao "piedoso" auditório e para os vindouros, a "espuma" e as "atitudes adolescentes" dos nossos transviados paroquianos, evidentemente pouco dispostos a ver a natural "realidade" de não se "ganhar" nada em receber o Dalai Lama, não vá a democrática China incomodar-se com essa questão (de pormenor) dos direitos humanos. Esses episódios másculos ficam sempre bem quando dirigidos a Cuba ou à Venezuela (leia-se formulário aqui). O bom do erudito português tem sempre, como se sabe, os tomates muito bem escaldados. Não convém abusar. E assim vai esta "fermosa estrivaria". Nada de espantos.

Boletim Bibliográfico 35 da Livraria Luís Burnay

Saiu o Catálogo do mês de Setembro da Livraria Luís Burnay (Calçada do Combro, 43-47, Lisboa). Peças estimadas e raras de Culinária, História, Colónias, Monografias, Caça, Almanaques, Literatura, Revistas e muito mais.

Algumas referências: An Account of several late Voyages and Discoveries ..., London, 1711 / Archivo Pitoresco, 1857-1868, XI vols / Athena. Revista de Arte, 1924-25, V numrs / Culinária Portuguesa, prol. Albino Forjaz de Sampaio, Ed. autor (194?) / Diccionario de Glossologia Botânica ..., de António A. da Fonseca Benevides, 1841 / Da Caça. Palestras Cinegéticas, por António Bomfim, 1946 / Historia da Luzitania e da Ibéria (vol I e único publ.), de João Bonança, 1887 / A Inquisição e os Professores do Colégio das Artes, de Mário Brandão, 1948-1969, II vols / De Benguella às Terras de Iácca, por Capelo & Ivens, 1881, II vols / De Angola à Contra-costa, idem, 1886, II vols / Ou eu, ou Elles, por António Feliciano de Castilho (opusc. raro), 1849 / Historia da Revolta do Porto de 31 de Janeiro de 1891, de João Chagas & ex-Tenente Coelho, 1901 / A Choldra. Semanário republicano de combate e critica à vida social (raro), 1926, XXI numrs / Manual Político do Cidadão Portuguez, de Trindade Coelho, , 1908 (2ª ed.) / Contemporânea. Revista Mensal (rara revista sob. Dir. José Pacheco), 1922-26, XIII numrs+ nº14 / Diana. Revista de caça, Hipismo e Pesca, 1948-1975, 256 numrs / Guesto Ansures, quadros da vida neo-gothica, pelo Visconde de Figanière, Livraria Ferreira, 1883 / Folheto de Ambas Lisboas (periódico olisiponense raro), nº1 (Junho 1730) a nº 26 (Agosto 1731), XXVI numrs / A Caça no Império Português, por Henrique Galvão et al, s.d., II vols / Inventário Artístico Portugal (Aveiro e Santarém) / Peregrino, de Armando Martins Janeira (homenagem a Wenceslau de Moares – peça de colecção), 1962 / Almanach de Caricaturas para 1874 (e 1875) de Rafael Bordalo Pinheiro, II vols / Portugaliae Monvmenta Cartographica, 1960, VI vols / Presença: folha de Arte e Critica, 1927-28, 54 numrs (rara)

domingo, 9 de setembro de 2007


Eliezer Kamenezky - uma biografia

"... Começa a frequentar a escola aos 6 anos. Desde que é expulso do liceu, passa por vários empregos e vicia-se no jogo. Lê romances de aventura que lhe despertam anseios por outras paragens. Grande desgosto com a morte da mãe e, depois, de um irmão mais novo. Foge, acompanhando um grupo italiano de ópera [I - Abrindo asas / The shaping of my mind]

(...) Vende batatas, trabalha em bares; frequenta a Biblioteca Russa, participa em reuniões do Círculo Socialista. Vive ao sabor das circunstâncias, que o fazem cair na tentação do furto. Em Boston, apanha um barco para Liverpool, onde se hospeda na Pensão dos Judeus. Entra na festa do Sukess. Deseja voltar à Rússia [VI - De Nova York a uma fronteira da Rússia / Good and Evil - reprodução da B.N.]"

[in Ivo de Castro et al, "Eliezer ascenção e queda de um romance pessoano", Revista Da Biblioteca Nacional, nº 1, 1992]

Eliezer Kamenezky

No passado 7 de Setembro, 119 anos atrás em Lugansk (Rússia), nascia Eliezer Kamenezky. Esta personagem curiosa, de vida plena, exuberante e voluptuosa, sempre vivida de rebeldia e sarcasmo - qual cidadão do mundo -, com obra e espólio a merecer atenção, foi especialmente conhecida pela sua ligação ao vate Fernando Pessoa.

De tal modo era a (re)criação e a familiaridade entre os dois que até deu lugar a uma viva polémica (que "morreu" logo à nascença), quando em 1991 um artigo de Luciana Stegagno-Picchio publicado no jornal Repubblica anunciava a descoberta de um romance (em inglês) de Fernando Pessoa, e até então desconhecido entre os pessoanos, com o subtil título de "Eliezer". A putativa descoberta de um inédito de Pessoa foi objecto de tratamento e avaliação pelos membros da equipa pessoana (prof. Ivo Castro e outros investigadores), que depois de analisarem os argumentos, e pelo muito que conheciam de F. P., fizeram gorar tal hipótese.

Afinal, tratava-se não de mais um inédito da arca de Pessoa mas da tradução, feita pelo poeta e amigo, da biografia de Eliezer Kamenezky.

[ver sobre o assunto, Ivo de Castro et al, "Eliezer ascenção e queda de um romance pessoano", Revista Da Biblioteca Nacional, nº 1, 1992]

Livraria Olisipo

Ali em Lisboa, bem ancorada no largo Trindade Coelho e entre a Artes & Letras e a Bizantina, fica a Livraria Olisipo. Peregrinação sempre obrigatória. Agora, para encantamento de todos, está mais próximo do amador de livros, de gravuras ou da simples converseta sobre papéis & outras artes. Mestre José Vicente, muitos anos levados na arte e gosto do livro antigo, iniciou-se via net, com invejável vantagem para nós e vós.

O seu estimado estabelecimento está aqui, para nos servir. Graças!

sábado, 1 de setembro de 2007


In-Libris – Catálogo do mês de Setembro 2007

Saiu o catálogo do mês de Setembro da In-Libris (Porto).

Apresenta peças estimadas de Almeida Garrett, António Osório, António Ramos Rosa, Armindo Rodrigues, Bento Carqueja, E. M. de Melo e Castro, Egito Gonçalves, Eugénio de Andrade, Fernando Echevarria, Fernando Pessoa, Ferreira de Castro, Fiama Hasse Pais Brandão, Hélder de Macedo, Herberto Hélder, Maria Teresa Horta, Mariana Alcoforado, Mário Sá-Carneiro, Vitorino Nemésio e outras obras, como: o Centenário de Gil Vicente, Companhia de Jesus, o Porto na Época dos Almadas, o estimado Diccionario Bibliographico Portuguez de mestre Inocêncio F. Silva, a rara revista Unicórnio & Bicórnio, Tricórnio, Tetracórnio, Pentacórnio (5 numrs), livros sobre Arte, Filosofia, História, Poesia, Teatro, Religião, Monografias várias e um curioso (e raro) "Estudo da Localização do Novo Aeroporto de Lisboa" (do Gabinete do Novo Aeroporto de Lisboa, 1972).

A consultar on line.