terça-feira, 14 de junho de 2005


Álvaro Cunhal [1913-2005]

"A primeira vez que fui preso, como me negasse a prestar declarações, algemaram-me, meteram-me no meio de uma roda de agentes e espancaram-me a murro, pontapés, cavalo-marinho, e com umas grossas tábuas com uns cabos apropriados. Depois de me terem assim espancado longo tempo, deixaram-me cair, imobilizaram-me no solo, descalçaram-me sapatos e meias e deram-me violentas pancadas nas plantas dos pés. Quando cansados, levantaram-me, obrigaram-me a marchar sobre os pés feridos e inchados, ao mesmo tempo que voltavam a espancar-me pelo primeiro processo. Isto repetiu-se numerosas vezes durante largo tempo até que perdi os sentidos, estando cinco dias sem praticamente dar acordo de mim" [palavras de A. Cunhal, em tribunal, in "A resistência em Portugal", de José Dias Coelho, Inova, Agosto 1974]

"... A realidade na arte começou por ser o mais próxima possível da realidade da vida - «imitação da natureza» (Aristóteles) tornada definição da arte e lei do naturalismo através dos séculos.
A criação artística não cabe porém numa representação neutra, igual para todos os artistas, além do mais porque cada artista vê a realidade de forma diferente. Arte é criação e recriação, é imaginação e é sonho. (...)
No retrato, a observação, a marca de traços físicos e de expressão específicos de cada indivíduo, a observação psicológica, a capacidade de discernir o cerne da personalidade, vale mais que o excesso de rigor na reprodução do pormenor ..."

[Álvaro Cunhal, in A arte, o artista e a sociedade, Caminho, 1996]