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domingo, 10 de agosto de 2003

QUE FAZER?


[Algures perto de Almodovar] A serra é de uma visibilidade estranha, fantasmagórica, mágica. "Aquilo que se vê não se aloja nunca naquilo que se diz" (Deleuze). Há decerto uma "disjunção" entre o que se vê atrás da serra e o que para além dela se diz. O Algarve nunca é mostrado, mas sabe-se que a sua luminosidade está por detrás daquele monte, que ao longe se vê. Muitos o dizem, velhos e novos, homens e mulheres, que partiram há muito pela estrada fora. Nada os retém no tempo que lhes resta. Eu tenho dúvidas, mas compreendo essa felicidade que lhes foi negada. Lembro-me como as noites serranas eram de uma acalmia arrebatadora, de um silêncio comprometido. Lembro-me ... Mas que valeu isso, se hoje tudo é memórias. Tal como uma personagem de Antonioni, que dizia que "não temos ideias, apenas memórias", também estes homens e mulheres gastaram há muito projectos, esperanças, cuidados. Debandaram todos.

[Portimão] Não fora convite estimável e irrecusável, não iria para estes lados. Não que fosse diferente de outro Algarve qualquer, mas apenas porque seria dolorosa a lembrança de antanho. Lamentavelmente, as coisas estavam, ainda, pior que supunha. A Praia da Rocha não existe, há muito que lhe limparam o corpo e o espirito. Fiquei lá em baixo, na Marina, longe da civilização e da alegria do veraneio. Ao barcos não se abatem, pensei eu. Seria "uma gaiola à procura de um pássaro". É certo que, por uma vez, não fui razoavelmente prudente. Quando dei por mim na piscina do Marina-Hotel, no meio das "tias", acabadas de chegar da festa da Kadoc, já era tarde. Bem sabia eu, que o mar seria de tormenta. Não tive coragem de lhes dizer que a tarde não se previa "estupenda". Acobardei-me. Zarpei imediatamente, com mil e uma desculpas, para o barco, pois sabia que é "no mar que a dor acalma e os alicerces da alma esquecem". Fui sensato.