segunda-feira, 30 de maio de 2005


Tempos difíceis

Quantas saídas tem uma "crise"? Quantos defeitos têm a paixão dos "separados noivos"? Como enterrar este espectro da não-"coisa" europeia, quando o discurso e a geografia eleitoral sobre o Tratado Constitucional Europeu neutralizam o próprio "lugar"?

A vitória do "Não" em França é um rude golpe sobre o "corpo recantado", construído no imaginário de homens e mulheres para quem a solidariedade e a fraternidade não pode ser uma memória perdida. Um "lugar" sem desejo nunca pode edificar sujeitos activos. O perigo da vitória do "Não" é a embriaguez que se lhe segue. A dissidência, assim extremada, pode não redundar em trabalho colectivo, democraticamente participativo e solidário. Como alguns pretendem. E é o reverso disso que atemoriza. Aquilo que qualquer cidadão, assumidamente europeu, mais teme: o enclausuramento de cada um e de cada qual em defesa dos seus próprios interesses nacionais, cedendo de barato à ideia, bem liberal, que o interesse particular dá solidez a qualquer organização social.

A "crise" que se vai desenrolar, mesmo que resulte num diferendo ultrapassável, não pode fazer esquecer a impostura de vários posicionamentos ideológicos, mesmo se a argumentação tenha a ilusão do politicamente pertinente. Mais, o "olhar que respira" não pode estar aliado a essa maldição da extrema-direita, pseudo nacionalista e perversamente xenófoba, que os sobressaltos da história há muito julgaram. Onde a clivagem?

E, que dizer, quando se sucumbe, ali mesmo na praia, à obedecida Ordem Mundial neoliberal, que alguns julgam ingenuamente combater, tomando cegamente o partido do "Não"? Esperam, isoladamente, num qualquer bunker, mudar assim a vida e o seu trajecto normal? Transformar o mundo não será, também, registar experiências anteriores de rupturas, conceber o passado? Acaso o combate contra o modelo neoliberal, necessariamente político, não é mais eficaz e certeiro num colectivo único, mesmo que tenha agora a forma de um texto constitucional uniforme e o nome Tratado Constitucional Europeu? Não sabemos de todo. Mas vocês ... sabem-no?