quarta-feira, 16 de novembro de 2005


Poverty of Student Life, University of Strasbourg [Novembro 1966]

"Podemos afirmar, sem grande risco de erro, que o estudante em França é - depois do polícia e do padre - o ser mais universalmente desprezado. (...)

O estudante é um ser partilhado entre um estatuto presente e um estatuto futuro claramente distintos, e cuja fronteira vai ser mecanicamente transposta. A sua consciência esquizofrénica permite-lhe isolar-se numa «sociedade de iniciação», desconhecendo o seu futuro e encantando-se com a unidade mística que lhe oferece um presente ao abrigo da história (...)

Escravo estóico, o estudante julga-se tanto mais livre quanto o tolhem todas as grilhetas da autoridade. Tal como a sua nova família, a Universidade, ele supõe-se o mais «autónomo» dos seres sociais, quando, pelo contrário, depende directa e conjuntamente dos dois mais poderosos sistemas de autoridade social: a família e o Estado. O estudante é deles o filho bem comportado e reconhecido (...)

Por virtude da sua situação económica de extrema pobreza, o estudante é condenado a um certo modo de sobrevivência bem pouco invejável. Mas, sempre satisfeito por ser aquilo que é, eleva a sua miséria trivial à categoria de um «estilo de vida»: o miserabilismo e a boémia. (...)

Mas a miséria real da vida quotidiana estudantil encontra a sua compensação imediata e fantástica naquilo que é o seu ópio principal: a mercadoria cultural. No espectáculo cultural, o estudante encontra naturalmente o seu lugar de discípulo respeitador. Próximo do lugar de produção sem nunca a ele aceder - o Santuário mantém-se-lhe inacessível - o estudante descobre a «cultura moderna» na sua qualidade de espectador admirativo. Numa época em que a arte morreu, ele continua a ser o principal fiel dos teatros e dos cine-clubes, e o mais ávido consumidor do seu congelado cadáver, agora difundido, embrulhado em celofane, nos supermercados feitos para as donas-de-casa de abundância (...)"

[in Da miséria no meio estudantil & de alguns meios para a prevenir, edição portuguesa da Poverty of Student Life, escrito por membros da Internacional Situacionista, estudantes de Estrasburgo em 1966, publicado pela Fenda, Coimbra, 1983]

Locais: Da miséria no meio estudantil & de alguns meios para a prevenir [texto] / [Pamphlet] On the Poverty of Student Life: considered in its economic, political, psychological, sexual, and particularly intellectual aspects, and a modest proposal for its remedy / On the poverty of student life (...) [by Mustapha Khayati] / from Guy Debord To Mustapha Khayati Friday [9 September 1966] / idem [29 Setembro 1966] / idem [13 Outubro 1966] / idem [19 Outubro 1966]