segunda-feira, 30 de junho de 2003

LIVROS DE CULINÁRIA

Tinha prometido ao Fumaças uma resma bibliográfica sobre livros de culinária. Desconhecia que o mestre José Quitério tinha prefaciado os "Livros Portugueses de Cozinha", com organização de Manuela Rêgo, edição Biblioteca Nacional, onde vem (suponho) um vasto conjunto bibliográfico sobre o tema. Como não o tenho, tomei nota de alguns livros que julgo importantes, nas minhas deambulações ...

- ARTE DE COSINHA [pref. Alberto Pimentel]
Matta (João da), Parceria A. M. Pereira, Lisboa, 1909, 416 p.

- ARTE DE COSINHA DIVIDIDA EM DUAS PARTES, ... [Primeiro tratado de cozinha portuguesa, escrito pelo chefe da cozinha de D. Pedro II, com oferta ao Conde de Vimioso. Inocêncio F. Silva considera que a melhor edição é a de 1765 (7ª ed., dividido em três partes, sendo a última o "preparar mesas em todo o ano"]. Saiu, ainda, mais edições sendo que a partir de 1836 trás mais uma quarta parte (fazer "pudinz, e preparar massas"]
Rodrigues (Domingos), Lisboa, 1693

- ARTE DO SALCHICHEIRO, OU METHODO DE PREPARAR E CONSERVAR AS DIFFERENTES PEÇAS DE PORCO, SEGUNDO ... .[obra traduzida do francês]
Typ. De G. M. Martins, Lisboa, 1856, 309 p.

- ARTE NOVA, E CURIOSA, PARA CONSERVEIROS, CONFEITEIROS, E COPEIROS, E MAIS PESSOAS QUE SE OCCUPAM EM FAZER DOCES , E ?
Off. de Jose Aquino Bulhoens, Lisboa, 1788, 203 p.

- COZINHEIRO MODERNO, OU A NOVA ARTE DE COZINHA, onde se ... [3ª ed.]
Rigaud (Lucas), Off.de Simão Thaddeo Ferreira, Lisboa, 1798, 461 p.

- GUIA DA DONA DE CASA [Pref. Curioso do prof. Eduardo Pimenta]
Lopes (F.), Typ. da Empresa Litteraria, porto, s/d [1895], 240 p.

- ... O DOCE NUNCA AMARGOU ... Alguns motivos ornamentais de doçaria portugueza
Ribeiro (Emanuel), Tip. Sequeira, Porto, 1923, 51 p.

- O ESPÊTO. Sociedade conhecida, de responsabilidade limitada a ... ceias e piqueniques [peripécias culinárias de Beja]
Carvalho (Ernesto), Tip. Universal, Lisboa, 1914, 222 p.

- TRATADO COMPLETO DE COZINHA E DE COPA
Maia (Carlos Bento) (pseud. de Carlos Bandeira de Melo], Ed. Guimarães, Lisboa, 1904, 748 p.

... e já agora este curioso folheto com a participação de Fernando Pessoa:

- QUAKER OATS. Receitas [famoso folheto sobre os flocos de aveia Quaker Oats, em versão de Fernando Pessoa, saindo sobre anonimato]
[Pesoa (Fernando)], Lisboa, s/d [1930], 32 p.

[a continuar]

À VOLTA DOS BLOGS

- Memória Inventada é assim: abriu as portas do seu blog a "desenhos, vinhetas, pequenas animações e aguarelas” dos leitores. Boa malha! Ficamos à espera de revelações.

- Rui Knopfli em Obra Completa. Leio no Aviz que leu no Desejo Casar que ouviu no Acontece. Nestas coisas é bom passar palavra. Les bons esprits …
On line: "O tema da escrita em Memória Consentida de Rui Knopfli", por José Maria Aguiar Carreiro; Bibliografia na "À Esquina do Mundo", page de António Cardoso Pinto, onde pode ouvir poesia dita por A.C.P. do livro de R.K. , “O Monhé das Cobras”.

- José Mário diz-nos:"quem esperava sangue a correr pelas ruas, rasgar de vestes ou gritaria" na resposta, publicada no DNA a Pedro Rolo Duarte pode ficar desiludido. Homessa! Quem esperava tal? Nós sempre pensámos, como Karl Marx, que a "humanidade não põe questões que não pode resolver". Pode-se é ficar a pensar que, e afinal, os nossos revolucionários revelam que "já não há senhores, apenas escravos comandam outros escravos". Bem nos dizia Deleuze & Guattari.

- O esteta da Contra a Corrente, título assombroso e excelente paradoxo da pós-modernidade dado os interstícios ideológicos onde navega, anda cada vez menos Berlin e criativamente mais pela poesis. O problema é que entre as politicamente correctas reflexões sobre toiros e tourada e a arte poética avassaladora que posta, fica o vazio liberal. Estamos a ficar preocupados.

- Simplesmente genial a "INTRIGA NO MUNDO DOS DOURADINHOS".

domingo, 29 de junho de 2003

SEMANA LUSITANA


- "Luís Delgado, eis uma banha-da-cobra com que a direita ignorante gosta de se enganar" [Eduardo Cintra Torres]

- "No seu mais profundo nexo, a invocação sexual em Monteiro [César Monteiro] é também necessariamente um acto blasfematório e sacrílego (é a conversa com a puta numa associação religiosas). Mas talvez que a blasfémia seja ainda temente, e temente da punição; e, afinal, não é um instrumento como o seu, um falo, a causa letal?" [Augusto M. Seabra, sobre o filme "Vai e Vem" de João César Monteiro]

- Futebol: Al Zawraa do Iraque 11 – Militares dos E.U.A 0.
"Os jogadores americanos não são rivais, são inimigos e espero que saiam do nosso país o quanto antes" [comentário de Mohamed Nasrlla, treinador da equipa iraquiana, após a vitória]

- "Estivemos a ver se entrávamos num campeonato a sério. Como aquilo é a III divisão B, nós, pura e simplesmente, não fomos a esse campeonato" [palavras de Belmiro de Azevedo, questionado sobre o processo de privatização da Portucel]

- "A mensagem de Orwell, 50 anos depois, ainda não foi devidamente interiorizada" [José Manuel Fernandes, o direktor do Público, em editorial sobre os 100 anos de Orwell, lembrando-se (dizemos nós) quando há 24 anos atrás andava desvanecido a ler as Obras Completas do camarada Hoxha e do camarada José Estaline. Desde esse ano até hoje, o nosso direktor ainda não conseguiu entender patavina. Os textos hoxhianos eram mais legíveis … decerto.

- "Gestão dos serviços públicos passa a ser feita por objectivos" [Durão Barroso dixit. Lá se vai a educação, a cultura … e o resto, dizemos nós. A não ser que se descubra um liberal neoconservador para traçar objectivos e linhas de orientação para essas áreas. Pode alguém ajudar? Fica candidato ao Nobel … já pensou?

- "Os ideólogos bombistas oriundos da extrema-esquerda que se arrependeram de o ser, excedem-se de zelo a reclamar bom senso, disputam à direita mais reaccionária o privilégio de exigir sacrifícios aos outros e são os mais lestos a proclamar o fim das ideologias" [Alfredo Barrroso]

- "Aos males físicos há ainda que juntar os psíquicos. Estes proliferam por ciclos. Ora é o stress, ora a depressão, ora a depressão gerada pelo stress, ora a solidão a que se junta o stress e a depressão … " [Helena Matos, colunista no Público. Desconhece-se qual o ciclo actual da senhora]

- "Buraco supera perdão" [extraordinário título de um artigo de Joana Mateus, no Expresso, sobre essa tragi-comédia em torno das receitas fiscais e do deficit de Manuela Ferreira Leite]

- "O ministro da defesa, o impoluto de dedo erguido Paulo Portas, tomou à letra o que nenhum ministro tomara nas últimas décadas: que tinha a tutela de uma organização como a Cruz Vermelha. (...) De facto, a intervenção na Cruz Vermelha é própria de um ministro aparolado que desconhece limites ..." [Henrique Monteiro, Expresso. Estás perdoado desta vez Ó Henrique …]

sábado, 28 de junho de 2003

NOITE ORDINÁRIA



"Que bela noite ordinária que eu passei!
.............................
Gritei por calculado amor
por brilhantina
por miséria
gritei até por vitória
(supremo humor!)
dos que se batem contra a Cara - Alegre
gritei p'ra não parar de gritar
gritei «Chapultepec!» e «Oaxaca!»
(nomes por excelência afrodisíacos)
gritei até descobrir
o sítio em que te «escondias»
e então deixei-te gritar ..."

[Alexandre O'Neill + fotografia do filme de Robert Bresson, «Le Diable Probablement»]

sexta-feira, 27 de junho de 2003

OCULTO [POR F.P.]

"A grande regra do Occulto é aquella do Pymandro de Hermes: «o que está em baixo é como o que está em cima». Assim, a organização das Baixas Ordens copia, guardadas as differenças obrigatorias, a organização das Altas Ordens; reproduzem-se os mesmos transes, por vezes as mesmas especies de symbolos; o sentido é outro e menor, mas a regra da similhança tem de ser mantida, pois, de contrario, a ordem menor não vive e abatem, por si, as columnas do seu templo."

[in Fernando Pessoa e a Filosofia Hermética, por Y. K. Centeno, Presença, 1985]

FERNANDO PESSOA PELO REPÓRTER X


FERNANDO PESSOA - in Semanário X (de Reinaldo Ferreira)

Reinaldo Ferreira (1897-1935), ou o famoso Repórter X, nascido em 1897 em Lisboa, foi jornalista, escritor de livros policiais e de peças de teatro, fundador de semanários e jornais, mais ou menos sensacionalistas ou curiosamente extravagantes, argumentista e realizador de filmes, aventureiro e ex-morfinómano (Memórias de um Ex-Morfinómano é um testemunho notável do jornalista).

Do X - Semanário de Grandes Reportagens, cujo director e jornalista era Reinaldo Ferreira, número 13 de 7 de Fevereiro de 1935, nos "Homens da Semana" (pag. 4), vem o seguinte sobre Fernando Pessoa:

"O nome Fernando Pessoa surgiu, bruscamente, ao som de uma imprevista pancada de gongo, como um Mefistófeles de Opera (...) e assim, à la minute, duma noite para o dia (...)
Fernando Pessoa que, há dez dias a esta parte é dos indivíduos mais discutidos, não só nos cafés, nas esquinas, nas tertúlias da capital, como em todo o pais, é também dos nomes mais ignorados, das personagens menos conhecidas. (...)
Fernando Pessoa é uma incógnita. (...) Antes de mais nada, é preciso que se saiba que a especial e sempre admiravelmente estranha actividade mental de Fernando Pessoa dura há vinte e tal anos. Já na aurora desta geração, Fernando ocupou um posto marcante de chefe, de orientador fleumático, oculto, desprezando glórias e troféus (...)

Poeta de ritmos preciosos, os seus versos, como a sua prosa, são forjados num ineditismo de concepções que, para muitos significa ânsia audaciosa de sensacionalismo, mas que é apenas uma disciplinada, premeditada e sábia expressão do seu pensamento e dos seu gosto estético. A literatura, para ele, é a sobremesa, o doce da vida. Não exibe as suas produções; raramente as publica. São para ele só, e para alguns amigos. A sua missão na vida, missão mental, espiritual, parece oculta-la como um segredo, e cumpri-la fervorosamente como um desígnio de Deus. Do mistério da sus intimidade apensa se transparenta o seu ar místico, a sua sede de estudo, a orientação complexa das suas leituras, duma biblioteca, da sua cultura. (...)
O seu contacto com a vida, fora da faina profissional é regateado : uma hora, todas as tardes, no Martinho da Arcada, no Terreiro do Paço, cercado por meia dúzia de jornalistas, poetas, escritores, artistas (...) é o menos palrador; mas quando fala, esgota a crítica ao objecto de discussão com um critério estranho, dir-se-ia que filtrado por um cérebro, uma mentalidade, um espírito doutro planeta. Esse estilo das sua expressões críticas, esse seu sistema de análise aos factos ou de profecias às consequências, criou-lhe a vaga fama de "ocultista", ou pelo menos de um mergulhador de textos misteriosos (...)
Fisicamente Fernando Pessoa é magro, tem os lábios sempre comprimidos, como os de uma criança, e como uma criança esbugalha os olhos, atrás dos óculos, numa expressão de pasmo infantil quando escuta algo que o surpreende ou quando fixa a sua atenção numa conversa (...)"

AINDA ... SOBRE UM POST

O excelente Socio[B]logue de João Nogueira refere-se a nós num texto intitulado "Socioblogosfera: um Retrato Singular". Estamos gratos por isso. E, porque julgamos que não fomos esclarecedores em post anterior, voltamos a replicar para que se não instale entre nós qualquer "cisma na alma" (Tonynbee) e no desejo de se saber do que se fala nestes dizeres por nós enunciados sobre a blogosfera, agora tomada como locus de inscrição de outras cumplicidades e de novas problemáticas.

Trata-se de reflectir, a partir do espaço que a Internet (novo espaço antropológico por excelência) veio preencher, num conjunto de questões que a dita blogosfera (e o seu discurso) enuncia e da contribuição (modesta que seja) para a reinvenção de uma "racionalidade comunicativa" que permita aceder à "desconstrução" do paradigma. De outro modo, diria que é necessário referenciar alguns aspectos que a especificidade da blogosfera transporta e veicula enquanto confluência de uma intensa rede de interdependências (onde a blogosfera é, de facto, uma pequeníssima parte), tomada como novo topos de comunicabilidade, mas onde se entrecruzam, sempre, diferentes discursos (da tecnociência à sociologia, da economia à política) e sujeitos.

Não sendo nosso mister descortinar qualquer linha de água conceptual nesta área, até pela nossa impreparação científica, pode-se no entanto alinhavar duas questões, que julgo pertinentes, a saber:

- seguindo o trabalho de Lídia Silva (citada anteriormente), assume-se que a Internet "veio introduzir a metamorfose do conceito de território", com "mudanças estruturais potenciadas pelos suportes tecnológicos" (duplicação e divulgação de informação; bidireccionalidade; emissão multiponto; dimensão planetária da comunicação;...) que de algum modo "tem conduzido a uma reorganização dos fluxos de informação e dos procedimentos comunicacionais". Ora essa nova territorialidade urge compreender para descodificar, já que se pensa sempre a partir de um território interiorizado e familiarizado (geografia telemática). Como se nota, está já longe a controvérsia entre os apocalípticos e os integrados em U. Eco. E mais perto do corpo, território despótico, lugar do poder e da sua sedução.

- de outro modo, inútil referir o dizer de Lacan quando nos diz que "o sujeito está lá onde não tem consciência de estar", remetendo para que o "sujeito da comunicação" (Beneviste) está envolto num campo de teoria de jogos comunicacionais onde a circulação da palavra tem uma função reguladora. Assim sendo, o "jogador" deve perder-se nele (jogo) e o "jogo ultrapassar o jogador". Isto é, "jogar é sempre ser jogado" (Gadamer). Donde, pode-se estabelecer a articulação entre o sistema comunicacional e as estruturas do poder, isto se aceitarmos que no "reino das mercadorias" a utilidade (felicidade) dos sujeitos e do seu bem estar, é quantificável (a informação, a cultura perdem conteúdo na apropriação) e logo o consumo legitimado pelo manuseamento das NTI é, em si, factor de prestígio e de poder. Ora, é reconhecido que, no seu campo específico, o investigador/docente não domina a linguagem tecnológica (linguagem-máquina) o que é um sério obstáculo que o impede de partilhar o poder (académico/simbólico) que detém no campo do saber. E é aí que tudo se joga. Percebe-se, pois, as reticências reveladas por quase todos os docentes e investigadores no manuseamento das NTI. E daí o meu espanto quando se pretende que os docentes/investigadores "migrem" para este novo espaço comunicacional e ao mesmo tempo possam manter intacto o seu poder.

quarta-feira, 25 de junho de 2003

ARRUMAÇÕES & LIVRAVALHAS


Curiosa ideia esta de organizar papéis, revistas, livros, fotos, coisas que nem sei que nome devo dar, jornais velhos ... Organizar, mas como? Fico sempre depressivo quando me dizem como se deve arrumar todos esses papéis. Não tenho a fúria do bibliómano, confesso, e sempre persegui essa ideia assumida de Eluard: sem ordem, nem desordem. Hoje fiz mais uma tentativa para redesenhar o caos. Não o consegui. Aliás, suspeito que nunca o farei. Começo a ceder logo ao segundo ou terceiro livro. Miro-o com olhar de espanto, folheio com o vagar das coisas solenes e nunca mais me lembro o que estava ali a fazer. É que "há seduções tão poderosas que não podem ser senão virtudes". Diria Baudelaire. Eu subscrevo.

Fiquei-me, pois, pelas separatas e pelos opúsculos. Sempre tive essa mania das separatas das revistas (como do Instituto, a minha paixão suprema) e dos folhetos. Não consegui resistir a tamanho encantamento. Eis algumas tiradas, sacadas entre o segundo café da tarde e o fim de tarde.

- "A caricatura é uma das mais terríveis armas de guerra aplicadas ao ridículo humano. Pior do que o canhão! Porque o canhão mata - a caricatura mutila. Antes das duas linhas de legenda que são vitríolo atirado ao rosto da personagem, a caricatura despenteia-a, deforma-a, desarticula-a, fá-la dançar o S. Vito da desfiguração, até categoria, poder, majestade se tornarem bonecos de pasta sobre que caiu chuva em quarta-feira de cinzas" [Joaquim Leitão, O Poço que Ri - Conferência sobre Rafael Bordalo Pinheiro e o seu tempo, proferida por ..., na Sociedade de belas Artes na noite de 8 de Fevereiro de 1936 ..., Publicações do Anais da Bibliotecas, ..., Lisboa, 1936]

- "Não costumo fazer erratas ao que aparece deturpado nesta secção, mas hoje tem de ser para evitar equívocos. No eco que dizia respeito a um miserável que escreveu o folheto infame dos AZEITEIROS, saiu: para excremento da espécie, onde eu tinha escrito escarmento da espécie. Vai isto para que conste. Quanto ao biltre, apesar de andar meio mundo a querer saber quem é, ainda não se deu por achado. É de força o mastim, que nem puxado pela arreata deu de si. Ele aparecerá um dia ..." [ João Paulo Freire (Mário), Azeite Escaldado, Lisboa, 1946 - Trata-se de uma polémica entre João Paulo Freire e o autor do célebre opúsculo Os Azeiteiros de Camilo, da autoria de Manuel de Castro]

- "E o sr. M. B., [Nota: Miguel Bombarda] usando alimentar-se intellectualmente de bugiarias, à maneira das mulheres pejadas que, no sempre judicioso parecer, ao menos para mim ..." [J. Mendes Martins, Sacudindo um Psychiatra, Porto, 1903 – curiosa polémica do autor com o Prof. Miguel Bombarda]

- "Em Portugal, nos últimos tempos, a crítica literária parece-me oscilar entre um modo geralmente teorizante, como que perceptivo, recensivamente pouco exacto, - e uma erudição comparativa de passos e ávida de descobrir influências..." [Gaspar Simões, citado por Eduardo Lourenço, in A Conversação Crítica de Nemésio, Eduardo Lourenço, Separata de Revista da F. L. Lisboa, nº 2, 1978]

terça-feira, 24 de junho de 2003

JMF 1 - PRD 0

O director do Público não é completamente desprovido de inteligência, mais a mais se segue com religiosidade a máxima de, "se não podes vencê-los junta-te a eles". Hoje apresentou 3-explêndidas-3 páginas do jornal que dirige, sobre os blogs e a blogosfera, e em lugar de destaque. Arrasou tudo e todos. Fez o que devia, pensam alguns, nada de estranho. Não é certo. É que o PRD do DNA, sobre o mesmo assunto, não só discursou sobre o que nunca entenderá como acabou a sua bestial prosa com uma enigmática “esperem pela pancada”. Assim sendo, declaramos que para sermos justos e sensatos, concedemos ao JMF um dia de tréguas. Para que conste.

COWBOYADAS AMERICANAS

Com muitos filmes visionados e total impunidade face aos crimes praticados, a soldadesca americana lá vai mostrando o que vale. Duas situações esclarecedoras: a primeira foi o ataque selvagem (já se perdeu a conta a estes actos criminosos, totalmente branqueados pelos nossos liberais lusitanos) a uma coluna (civil ou militar não se sabe) perto da fronteira com a Síria, com a explicação que lá se encontrava Saddam. Por ora, os criminosos americanos ficam pacientemente à espera dos resultados do DNA, para confirmar se era ou não o ditador Saddam que mataram, que nada os perturba. Até à próxima chacina.

A segunda é a extraordinária notícia da última página do Público, sobre a ocupação da piscina olímpica da cidade de Bagdad pelos soldados americanos que dela fazem veraneio, não permitindo que os atletas iraquianos possam utilizá-la, a não ser duas horitas por dia. Querem treinar - pensou o amigo americano - então que vão para as águas do rio Tigre, que por cá o calor é tanto que só apetece estar ... à beira da piscina. E assim continua a implantação da democracia no Iraque.

segunda-feira, 23 de junho de 2003

CAPABLANCA E O XADREZ

Alexandre Monteiro dá-nos a conhecer esta frase de José Raul Capablanca sobre o xadrez (onde foi exímio jogador). Obrigado AM.

«O Xadrez é algo mais do que um jogo. É uma diversão intelectual que tem algo de arte e muito de ciência»

MACHADO DE ASSIS


«Ah! indiscreta! ah! ignorantona! Mas é isso mesmo que nos faz senhores da Terra, é esse poder de restaurar o passado, para tocar a instabilidade das nossas impressões e a vaidade dos nossos afectos. Deixa lá dizer Pascal que o homem é um caniço pensante. Não; é uma errata pensante, isso sim. Cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que será corrigida também, até a edição definitiva, que o editor dá de graça aos vermes.»

Machado de Assis, in Memórias Póstumas de Brás Cubas

DO PRINCÍPIO DA REALIDADE AO PRINCÍPIO DO PRAZER

«(…) seria interessante ler blogues de outros cientistas sociais como António Barreto, Manuel Villaverde Cabral, Paquete de Oliveira ou Boaventura de Sousa Santos, não?» [JN, Socio[B]logue]

Acabo de ler no blog de João Nogueira, um curioso exercício laudatório ao blogar enquanto um noviciado espaço sociológico a não perder, que permitiria o construído de uma nova «gramática» discursiva a partir dos espaços ou dos interstícios presentes na blogosfera. Está, assim, assumido que os blogs (e a sua sedução) podem ser um campus de analise «cientificamente analisável», novo investimento sociológico que, a partir de registos conceptuais de rigor, possa aceder aos liames de uma problemática sociológica dita interessante. Daí que João Nogueira acredite, piedosamente, que a overdose de blogs caída sobre as nossas cabeças, permita que os cientistas do social deixem a parcimónia dos seus maples escolásticos, saiam do seu altar iluminado e iluminante, e corram para a desconstrução do real e do seu simulacro.
Mas nós tememos que esta nova comunicabilidade, expurgada da «ideologia dos dons» escolásticos que os cientistas sociais interiorizariam, levaria ao abando da constante acção de controlo social disciplinar, onde a confusão entre o trabalho curricular e não-curricular surgiria, o que seria manifestamente perigoso e, logo, de pouca aceitabilidade.

É evidente que blogs de António Barreto, Manuel Villaverde Cabral, Paquete de Oliveira ou Boaventura de Sousa Santos, seriam «socialmente úteis» e espaços conversáveis por excelência. Mas a questão é bem outra: porque razão os docentes universitários portugueses e as Universidades em geral, manifestam o mais completo desprezo pela utilização das novas tecnologias de informação, sendo raro encontrar páginas (ou blogs) sobre os seus docentes e os seus trabalhos académicos? O que no estrangeiro é absolutamente normal, por cá, a resistência aos novos modelos comunicacionais que as NPI permitem é elucidativo da não aceitação desse novo «espaço público», ou nova Àgora (Lídia da Silva, U.A.). E, assim, é de louvar essa «moral de prazer» que, ao comportar riscos vários e muitas vezes «iniciações» conflituosas, alguns bloguistas como JPP, JN, FJV, NM, VA, bem como os nossos jornalistas bloguistas, souberam defender, sem submissões.

Ou como diria René Char, é verdade que «o desejo de saber, é sempre o desejo de saber sobre o desejo».

CURTOS

- «Ó Pacheco, vá escrever o blog» [JM, in Flashback, TSF]. José Magalhães no seu melhor.

- «Se houvesse leis sobre a matéria e eu pudesse legislar, os "blogues" existiam, mas tinham esta reserva legal: a eles só deveriam ter acesso os que, pelas mais diversas razões, não têm espaço próprio nos meios de comunicação. Ponto final. Nessa medida, fazem sentido os "blogues" de gente anónima e cheia de raiva para destilar (…)» [PRD, DNA]

Expiação de um jornalista mestre-escola. Leu Pedro Oom e disse: «Espreitei na fechadura dos horizontes e o que eu julgava ser vácuo e raiva emplumada mostrou-se-me coalhado de cogumelos e de lagartos». Está bem!

A BD CHEGOU À BLOGOSFERA PORTUGUESA


Aqui: Saudações ao Beco das Imagens.

«Há no exercício do poder um momento particularmente bem conseguido, quando um indivíduo se submete aos desejos dos outros, não apenas com espontaneidade mas também com uma sensação de virtude. O momento mais sublime é quando o indivíduo não mais se apercebe que é comandado»

[Rasputine, in Corto Maltese, A Casa Dourada de Samarcanda]

domingo, 22 de junho de 2003

A TORNEIRA


"Entre os nossos artigos de quinquilharia preguiçosa, recomendamos a torneira que deixa de correr quando ninguém a ouve"

[Marcel Duchamp]

DUELO PRECISA-SE


A vida está perigosa, trivial de banalidades e de calúnias. Alguns sermões recitados na paróquia de Portugal, remetem não para um tratado da raiva, mas para um regresso do famoso e antiquado duelo, que à espadeirada, à pistola ou à faca, reponha a honra em moldes ritualistas, como a tradição exigia. Disso tive conta, lendo um texto de Mário Matos e Lemos, «O duelo em Portugal depois da implantação da República», publicado na Revista de História das Ideias, da FLUC, em 1993. E já antevia o duelar de alguns indígenas da nossa praça, se por acaso estivéssemos no principio do século XX e se o duelo como instituição social não tivesse fracassado. Pensando melhor, ter-se-ia que acreditar que os ofendidos aceitavam a afirmação de Bruneau de Laborie, que «o duelo só é admissível entre iguais [op.cit.]» , o que não nos parece que batesse certo. Depois sempre se poderia consultar a Acta de Carência, onde se poderia observar como foi dirimido a pendência, e resolvida a ofensa dos seus constituintes.

De referir que há literatura sobre esta matéria, seguindo-se os «códigos de honra franceses» como se esperaria. Assim, cite-se alguns retirados do texto de Mário Matos e Lemos, acima referido: Les Lois du Duel (Bruneau de Laborie, 1908); Regras do Duelo de 1901 (tradução de Conseils pour les Duels); O duelo em Portugal no sé. XIX e ínicios de sec. XX …(H. de Fátima Morais Almeida, 1989); Eu e o Visconde de Pedralva ou História documental de dois duelos fantásticos (João Terenas Júnior, 1914); Uma Pendência Célebre (António José de Almeida e Alfredo Pimenta, 1914).

Ora, seria curioso antever os intervenientes para duelar, face aos impropérios e ódios de estimação conhecidos. Avanço desde já com alguns:

- Martins da Cruz em 3 assaltos com sabre, perante Seixas Santos
- Eduardo Prado Coelho a esgrimir com Vasco Pulido Valente
- António Manuel Baptista em duelo com Boaventura Sousa Santos
- Eduardo Cintra Torres versus António Pedro de Vasconcelos
- Morais Sarmento à espada com Emílio Rangel
- Marcelo Rebelo Sousa à pistola com Santana Lopes
- Augusto Seabra desafiando José Manuel Fernandes
- João Pereira Coutinho exigindo satisfação a Daniel Oliveira
- Paulo Portas em duelo contínuo com um ror de gente da esquerda, da direita e do centro, cidadãos anónimos, funcionários públicos, peixeiras, feirantes, GNR e tropa vária.

sábado, 21 de junho de 2003

AMÉRICA



América dei-te tudo e agora não sou nada.
..............................
América quando serás tu angélica?
Quando é que te despes?
Quando é que olharás para ti através do sepulcro?

[Allen Ginsberg, in Antologia da Novissima Poesia Americana, Futura, 1973]

IRAQUE SEM FIM À VISTA

Continua a confusão no Iraque sem se saber bem o que se passa e como sair do pântano que os americanos e seus amigos criaram. Todos os dias as informações são preocupantes e já se assiste a um cansaço e frustração enorme entre as tropas americanas, que não sabem o que estão a fazer naquele país. Diz um sargento ao Wasghinton Post

«“What are we getting into here?" asked a sergeant with the U.S. Army's 4th Infantry Division who is stationed near Baqubah, a city 30 miles northeast of Baghdad. "The war is supposed to be over, but every day we hear of another soldier getting killed. Is it worth it? Saddam isn't in power anymore. The locals want us to leave. Why are we still here?”»

Questão: que irá fazer a GNR portuguesa para o Iraque? Que actuação se pretende que tenha? Quem comanda e como? Que meios dispõe para o efeito? Missão humanitária (quem disse), será?

BIBLIOTECA NACIONAL


A página on line da Biblioteca Nacional está excelente. Ficamos surpreendidos pelo trabalho desenvolvido. Não sei se repararam, mas está disponível para leitura um conjunto de livros e documentos digitalizados, que dificilmente se encontram, mesmo em antiquários alfarrabistas. Considerado como um «núcleo fundamental» da actividade da Biblioteca (helás, que pelo menos a modernidade está a passar por aqui), a série «Memórias» - da memória da ciência, da educação, da língua, da literatura, do livro e da música – apresenta uma já sugestiva listagem de obras para consulta, que coloca a Biblioteca Nacional numa invejável posição face às suas congéneres.

Refira-se a Memória do livro que apresenta alguns «”marcos estruturantes” do nosso conhecimento: as Fontes da memória historiográfica do livro em Portugal, desde os finais do século XV ao século XVIII». Da tipografia ao coleccionismo, pode-se ler os velhos textos de Ribeiro Santos, Gomes de Brito, Xavier da Cunha, Sousa Viterbo. Ou conhecer o Boletim de Bibliographia Portugueza de Annibal Fernandes Thomaz, Bibliografia das Bibliografias Portuguesas, de António Joaquim Anselmo e mesmo os Anais das Bibliotecas e Arquivos de Portugal, todos estimados e bastante invulgares, de consulta obrigatória. Não há palavras para tamanha felicidade.